de 6 de Abril
1. A estrutura e a organização dos municípios têm continuado a reger-se pelas normas do Código Administrativo, cuja filosofia centralizadora contraria os princípios constitucionais vigentes sobre a autonomia das autarquias locais e a consagração do poder local.2. A consolidação daqueles princípios pressupõe a organização dos serviços municipais em moldes que permitam aos municípios dar resposta, de forma eficaz e eficiente, às solicitações decorrentes das suas novas atribuições e das competências acrescidas dos respectivos órgãos.
3. Neste contexto, procura-se que o presente decreto-lei se articule com o conjunto de diplomas sobre reorganização do poder autárquico, recentemente aprovado, estabelecendo os princípios gerais de organização e gestão que deverão orientar os órgãos autárquicos a definir, nos termos da competência exclusiva que passam a deter, a estrutura e funcionamento dos serviços que melhor se adequem à prossecução das suas atribuições.
4. Deste modo, a par de se abandonar a classificação administrativa dos municípios, libertando-os das discriminações por ela impostas em matéria de carreiras e categorias de pessoal, preconizou-se uma tipologia para os cargos de direcção e chefia que permitirá às autarquias, sem outras restrições que não as exclusivamente decorrentes de critérios objectivos de avaliação do nível das responsabilidades e qualificações exigidas para o desempenho dos cargos, dotar-se, em igualdade de situações com a administração central, de dirigentes habilitados.
5. A autonomia da decisão tem como contrapartida uma responsabilização mais directa dos autarcas, consubstanciada, designadamente, no reforço dos seus poderes de superintendência sobre a gestão das actividades camarárias.
Sem prejuízo da flexibilidade que sistematicamente se procurou instituir, houve, pois, a preocupação de introduzir regras que garantam a racionalidade e operacionalidade das estruturas e que travem a tendência para o excessivo empolamento dos quadros.
6. Por outro lado, no sentido de garantir o melhor aproveitamento dos recursos humanos existentes nos diversos níveis da Administração Pública, procurou-se ir tão longe quanto possível na instituição da intercomunicabilidade dos quadros, garantindo, desde já, que a transição da administração central para os quadros das autarquias se poderá processar sem perda de vínculo àquela.
7. Procurou-se ainda privilegiar a colocação de pessoal nas zonas mais carenciadas, objectivo a prosseguir através da regulamentação a que se procederá em consonância com a política que neste domínio irá ser implementada em toda a função pública.
Não só nesse caso como em toda a legislação regulamentar que decorrerá dos Decretos-Leis n.os 41/84, 42/84, 43/84 e 44/84, de 3 de Fevereiro, procurar-se-á explorar ao máximo as virtualidades existentes no conjunto de diplomas referidos para propiciar uma mais estreita adequação às reconhecidas especificidades do exercício de funções nas autarquias locais.
8. Quanto à extinção do quadro geral administrativo, que, por imperativo constitucional e como forma de reconhecer expressamente a plena gestão autonómica dos quadros próprios das autarquias locais, houve que prever, teve-se sempre presente a indispensabilidade de acautelar os legítimos interesses e salvaguardar os direitos adquiridos pelo respectivo pessoal, estabelecendo adequados mecanismos de transição relativamente aos quais houve o cuidado de auscultar todos os interessados. Neste como noutros capítulos, as soluções que acabaram por se consagrar foram precedidas de consulta e nelas forem acolhidas, na medida do possível e aconselhável, as sugestões apresentadas. Destaca-se a este propósito a garantia dos direitos dos funcionários titulares de lugares do quadro geral administrativo que, por causas a que eram totalmente alheios, se viram obrigados ao desempenho de funções em regime de interinidade.
Assim:
No uso da autorização legislativa concedida pela Lei 19/83, de 6 de Setembro, o Governo decreta, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
(Objecto e âmbito)
1 - O presente diploma estabelece os princípios a que obedece a organização dos serviços municipais.2 - Mantém-se em vigor a legislação especial aplicável aos Municípios de Lisboa e Porto em tudo o que não contrarie o presente diploma.
Artigo 2.º
(Princípios de organização dos serviços)
1 - A organização dos serviços municipais deverá ser estabelecida por deliberação da assembleia municipal, mediante proposta fundamentada da respectiva câmara municipal, no sentido da prossecução das atribuições legalmente cometidas aos municípios, designadamente pelo artigo 2.º do Decreto-Lei 100/84, de 29 de Março, e das necessidades correspondentes de pessoal.
2 - A estrutura e o funcionamento dos serviços municipais adequar-se-ão aos objectivos de carácter permanente do município, bem como, com a necessária flexibilidade, aos objectivos de missão postos pelo desenvolvimento municipal e intermunicipal.
3 - A organização municipal reflectirá a interligação funcional entre os órgãos e serviços da administração autárquica e os periféricos e centrais da administração central.
Artigo 3.º
(Princípios de gestão dos serviços)
A gestão dos serviços municipais deve respeitar:a) A correlação entre o plano de actividades e o orçamento do município, no sentido da obtenção da maior eficácia e eficiência dos serviços municipais;
b) O princípio da prioridade das actividades operativas sobre as actividades instrumentais, devendo estas orientar-se essencialmente para o apoio administrativo daquelas;
c) O princípio da utilização de gestão por projectos quando a realização de missões com finalidade económico-social e carácter interdisciplinar integrado não possa ser eficaz e eficientemente alcançado com recurso a estruturas verticais permanentes.
Artigo 4.º
(Poderes de superintendência)
A superintendência da gestão das actividades enquadradas pelos níveis de direcção e chefia a que se reporta o n.º 1 do artigo 7.º será cometida ao presidente da câmara municipal e aos vereadores.
Artigo 5.º
(Quadros próprios dos municípios)
1 - Os municípios disporão de quadros de pessoal próprios, nos termos do artigo 244.º da Constituição, os quais deverão ser estruturados de acordo com as necessidades permanentes do município.2 - Os quadros municipais serão intercomunicáveis, devendo a regulamentação sobre as regras de mobilidade entre os quadros privilegiar a colocação de pessoal nas zonas de média e extrema periferia.
3 - Os funcionários dos quadros da administração central que ingressem nos quadros próprios dos municípios não perdem, por força da transição, o vínculo à função pública.
Artigo 6.º
(Restrições à admissão de pessoal não vinculado)
As restrições à admissão de pessoal não vinculado à função pública, bem como os respectivos efeitos, devem ser entendidas sem prejuízo das situações de constituição de reservas de recrutamento nos termos da Portaria 800/82, de 24 de Agosto, bem como de outras situações que venham a constituir-se ao abrigo de disposições regulamentares que promovam a adaptação à administração local do Decreto-Lei 44/84, de 3 de Fevereiro.
Artigo 7.º
(Pessoal dirigente)
1 - Para direcção das actividades organizadas no âmbito dos municípios com vista à prossecução dos seus objectivos, os serviços municipais poderão dispor dos cargos de direcção e chefia constantes do mapa I anexo, para além dos já previstos no anexo I ao Decreto-Lei 406/82, de 27 de Setembro.2 - Os cargos dirigentes não poderão ser criados sem a existência da correspondente unidade orgânica, devidamente estruturada, quer essa unidade seja de natureza permanente quer tenha a natureza de projecto.
3 - Os cargos dirigentes a que se refere o presente artigo são exercidos em comissão de serviço, sendo-lhes aplicável, com as necessárias adaptações, o regime definido na lei geral para cargos dirigentes de vencimento equiparado.
4 - O cargo de director de projecto municipal será exercido em comissão de serviço por tempo indeterminado, cessando a respectiva comissão com o termo do projecto.
5 - O recrutamento do pessoal dirigente far-se-á de entre indivíduos vinculados à administração local e central possuidores das necessárias qualificações e especializações, obedecendo às seguintes regras:
a) Director municipal ou de departamento municipal, de entre licenciados com curso superior adequado e assessores autárquicos, letras C e D, bem como diplomados pelo CEFA em condições a regulamentar por diploma legal;
b) Chefes de divisão municipal, de entre indivíduos habilitados com curso superior adequado e assessores autárquicos, letra F, bem como diplomados pelo CEFA em condições a regulamentar por diploma legal.
6 - Os chefes de repartição poderão ainda ser recrutados de entre chefes de secção e tesoureiros, letra H, com, pelo menos, 3 anos de bom e efectivo serviço na categoria e de entre assessores autárquicos, letras F e G, não se lhes aplicando o n.º 3 do presente artigo.
7 - Por razões devidamente fundamentadas em função do perfil do cargo a prover ou do grau de especialização exigida, poderá ser dispensada mediante diploma legal adequado, sob proposta da câmara aprovada pela assembleia municipal, a vinculação à função pública ou a posse das habilitações literárias normalmente exigidas, para os cargos referidos no n.º 5.
Artigo 8.º
(Gabinete de apoio pessoal)
1 - Os presidentes das câmaras municipais poderão constituir um gabinete de apoio pessoal, composto por 1 adjunto e 1 secretário, com remunerações a fixar pelo executivo municipal, que não poderão exceder, respectivamente, 80% e 60% do subsídio legalmente previsto para os vereadores em regime de permanência.2 - Os membros do referido gabinete são livremente providos e exonerados pelo presidente da câmara municipal, sendo dado por findo o exercício das suas funções com a cessação do mandato do presidente.
3 - Os membros do gabinete são providos em regime de comissão de serviço, com a faculdade de optarem pelas remunerações correspondentes aos cargos de origem.
4 - Os membros do gabinete a que se refere o n.º 1 não podem beneficiar de quaisquer gratificações ou abonos suplementares, nomeadamente trabalho extraordinário.
Artigo 9.º
(Assessoria técnica)
1 - Sempre que os municípios careçam de pessoal especializado deverão, preferencialmente, recorrer à assessoria dos gabinetes de apoio técnico.2 - A assessoria técnica no âmbito de cada gabinete de apoio técnico poderá ser ampliada de acordo com modalidades a acordar caso a caso, comparticipando os municípios do agrupamento e a administração central no aumento das despesas daí decorrentes.
Artigo 10.º
(Limite dos encargos)
1 - Os encargos com pessoal, incluindo os resultantes da estrutura a adoptar, bem como os que correspondem às despesas com o pessoal referido no artigo 8.º não poderão exceder 60% das despesas correntes do ano anterior.2 - As despesas com o pessoal fora do quadro não podem ultrapassar 25% dos encargos referidos no número anterior.
3 - Se as despesas com pessoal do quadro existente em 31 de Dezembro de 1983 forem superiores ao limite fixado no n.º 1, será a respectiva diferença suportada pelo montante referido no n.º 2, com a correspondente redução da verba disponível para despesas com pessoal fora do quadro.
Artigo 11.º
(Eficácia e tramitação das deliberações)
1 - A acta da deliberação sobre a organização dos serviços bem como a proposta do executivo e a respectiva fundamentação será enviada ao Ministério da Administração Interna para verificação do cumprimento dos limites estabelecidos no artigo anterior.
2 - O Ministério da Administração Interna informará, no prazo de 60 dias, a contar da recepção dos elementos referidos no número anterior, da conformidade ou desconformidade da deliberação, comunicando, neste último caso e para efeitos de reformulação, os fundamentos de tal decisão.
3 - É condição de eficácia da deliberação da assembleia municipal sobre organização dos serviços municipais ser publicada no Diário da República, 2.ª série.
4 - O desrespeito pelo disposto no artigo 10.º considera-se ilegalidade grave e constitui fundamento para a dissolução do órgão ou órgãos responsáveis por tal facto.
Artigo 12.º
(Apoio à organização)
O Ministério da Administração Interna prestará, a solicitação dos municípios, o indispensável apoio técnico no âmbito da organização dos respectivos serviços.
Artigo 13.º
(Extinção do quadro geral administrativo)
1 - É extinto o quadro geral administrativo dos serviços externos do Ministério da Administração Interna, criado nos termos do Decreto-Lei 27424, de 31 de Dezembro de 1936, na parte correspondente às autarquias locais.
2 - O pessoal provido nas categorias do quadro geral administrativo dos serviços externos do Ministério da Administração Interna mantém as actuais categorias, continuando no exercício das suas funções nos quadros próprios dos municípios.
3 - As competências cometidas ao Ministério da Administração Interna relativamente ao pessoal do quadro geral administrativo passam a ser exercidas pelos órgãos executivos municipais, que procederão à sua gestão com respeito pelas normas específicas que regem o ingresso e a progressão na carreira.
4 - A salvaguarda do direito de regresso à actividade do pessoal do quadro geral administrativo que se encontra em situação de licença sem vencimento ou ilimitada reportar-se-á ao quadro do município onde exercia funções à data em que foi autorizada a respectiva licença.
5 - Aos funcionários providos na categoria de chefe de secretaria é assegurado o direito ao provimento na categoria de assessor autárquico, de acordo com o mapa anexo II.
6 - Nos quadros actualmente existentes de cada município serão aditados os lugares necessários à execução do disposto no número anterior, os quais serão extintos à medida que vagarem.
7 - Os mesmos funcionários poderão continuar a exercer funções notariais sempre que o órgão executivo do município o julgue conveniente, não podendo auferir anualmente, a título de participação emolumentar, remuneração superior a 50% do seu vencimento base como assessores autárquicos.
8 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, será aplicável àquelas remunerações acessórias o regime definido nos diplomas que estabelecem a tabela de vencimentos dos funcionários e agentes da administração pública central e local.
9 - Sem prejuízo do disposto no n.º 7, o recrutamento de notários privativos para o município deverá recair em indivíduos licenciados em Direito, habilitados com estágio de notariado, podendo ainda as funções notariais ser cometidas a notários pertencentes aos quadros da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado.
10 - As competências atribuídas aos chefes de secretaria nos termos do artigo 137.º do Código Administrativo e demais legislação em vigor passarão a ser asseguradas pelos assessores autárquicos até à reorganização dos serviços, processada nos termos do presente diploma.
11 - Após a reorganização dos serviços, de acordo com o disposto no presente diploma, as competências atribuídas aos chefes de secretaria, nos termos do artigo 137.º do Código Administrativo e demais legislação em vigor, passarão a ser asseguradas, nos termos a fixar caso a caso, por deliberação do executivo municipal.
Artigo 14.º
(Transição)
1 - Os mecanismos de transição do pessoal para os lugares dos quadros próprios dos municípios que vierem a ser criados ao abrigo do presente diploma serão definidos no âmbito da legislação que regular o regime jurídico do funcionalismo autárquico, sem prejuízo das letras de vencimento actualmente detidas, designadamente nos diplomas regulamentares que adaptarem à administração local as medidas sobre mobilidade de recursos humanos e os princípios de recrutamento e selecção de pessoal, a que se referem os Decretos-Leis n.os 41/84 e 44/84, de 3 de Fevereiro.2 - Os funcionários titulares de lugares do quadro geral administrativo que se encontram a desempenhar, ou tenham desempenhado, cargos do mesmo quadro em regime de interinidade consideram-se providos, a título definitivo, nas categorias que venham ocupando ou tenham ocupado, desde que contem mais de 2 anos de bom e efectivo serviço nas mesmas, à data de entrada em vigor do presente diploma.
(Regulamentação)
A regulamentação das matérias constantes do presente decreto-lei será objecto de decreto regulamentar da responsabilidade conjunta dos Ministros da Administração Interna e das Finanças e do Plano e do membro do Governo que tiver a seu cargo a Administração Pública.
Artigo 16.º
(Actualização de vencimentos)
Os vencimentos fixados pelo presente diploma serão actualizados pela forma prevista no diploma de vencimentos da função pública.
Artigo 17.º
(Regiões autónomas)
A aplicação do presente diploma às regiões autónomas será regulamentada por decreto das respectivas assembleias regionais, com as adaptações justificadas pelas especificidades regionais.
Artigo 18.º
(Norma revogatória)
Ficam revogadas as disposições do Código Administrativo e demais legislação contrárias ao presente diploma.
Artigo 19.º
(Entrada em vigor)
O presente diploma entra em vigor 30 dias após a sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 28 de Fevereiro de 1984. - Mário Soares - Carlos Alberto da Mota Pinto - António de Almeida Santos - Eduardo Ribeiro Pereira - Ernâni Rodrigues Lopes.
Promulgado em 25 de Março de 1984.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.
Referendado em 28 de Março de 1984.
O Primeiro-Ministro, Mário Soares.
MAPA I
(ver documento original)
MAPA II
(ver documento original)