2. O sistema das provas vigente prejudica a investigação especializada e dificulta uma preparação profunda, pois obriga os candidatos a dispersarem-se no estudo de grande variedade de matérias. Contrariam-se, assim, as finalidades específicas do doutoramento, nomeadamente a averiguação da capacidade para a investigação científica e do espírito criador, bem como do nível cultural e crítico dos candidatos.
3. Importa, por isso, estabelecer um novo regime que, longe de diminuir o nível das provas e prejudicar a rigorosa apreciação do mérito dos candidatos, conduza à simplificação de processos e a mais perfeita harmonia do tipo de provas com as características dos vários ramos de conhecimento. Deverá ainda tornar-se possível a realização das provas em prazos mais curtos e a especialização das matérias sobre que elas incidam.
4. A apresentação e defesa de uma tese ou dissertação original constituirá a prova fundamental do acto. As provas complementares serão escolhidas pelas escolas de entre várias modalidades oferecidas à sua opção.
Deste modo se admitem fórmulas diferenciadas, dando acolhimento a métodos que, em países de elevado grau de desenvolvimento cultural, científico e tecnológico, se têm acreditado como processos idóneos de apreciação.
5. Procurou-se ainda que a nova orgânica das provas, a julgar por júris especialmente qualificados, vise a finalidade própria do doutoramento, que não é a de comprovar aptidões pedagógicas: o apuramento dessas resultará de metodologia diversa, em princípio já definida no estatuto do pessoal docente universitário.
6. É entre os doutores que a Universidade há-de recrutar os seus agentes de ensino mais altamente qualificados. Mas é absolutamente necessário que o seu número ultrapasse largamente as necessidades do ensino superior, de modo que o excedente possa desempenhar papel relevante no desenvolvimento sócio-económico, ocupando postos de administração, de investigação ou outros, no sector público ou no privado.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Disposições gerais
Artigo 1.º - 1. O grau de doutor é conferido pelas Universidades em cada uma das suas escolas e comprova alto nível cultural e aptidão para a investigação científica em determinado ramo do saber.2. O grau de doutor é designado pelos ramos do conhecimento correspondentes ao objecto principal da escola que o confere, acrescentando-se, quando necessário, a especialidade sobre que incidiram as provas.
Art. 2.º - 1. O Ministro da Educação Nacional fixará, sob proposta dos senados ou conselho universitários e parecer da Junta Nacional da Educação, as diferentes especialidades sobre as quais poderá ser admitido o doutoramento em cada escola.
2. As provas de doutoramento incidirão sobre matéria de um grupo de disciplinas afins, professadas em escolas superiores e incluídas no elenco das respectivas licenciaturas.
3. As disciplinas afins, que podem constituir matéria de cada especialidade para efeitos de doutoramento, serão fixadas pelo Ministro da Educação Nacional, sob proposta dos conselhos escolares e parecer da Junta Nacional da Educação.
Condições da admissão ao doutoramento
Art. 3.º - 1. O candidato ao doutoramento deverá ter a licenciatura correspondente ou outra cujo plano de estudos contenha disciplinas que o conselho escolar entenda assegurarem formação suficiente para aquele acto.
2. Podem candidatar-se ao grau de doutor:
a) Os licenciados pelas Universidades portuguesas com informação final mínima de 16 valores ou os equiparados, nos termos legais, com classificação equivalente;
b) Mediante parecer favorável do conselho escolar, os licenciados com informação final mínima de 14 valores que tenham servido como assistentes ou leitores, pelo menos três anos lectivos, na escola em que requerem o doutoramento;
c) Mediante parecer fundamentado do conselho escolar, aprovado por maioria de dois terços do número dos seus membros, aqueles que, embora não preenchendo os requisitos das alíneas anteriores, tenham realizado trabalhos de valor sobre as matérias em que pretendem doutorar-se.
Preparação das provas de doutoramento
Art. 4.º - 1. A preparação da dissertação deverá normalmente efectuar-se sob a orientação de um professor da Universidade em que o candidato pretende doutorar-se.
2. A orientação referida no número anterior poderá ainda caber a um investigador pertencente a outra instituição de ensino ou de investigação científica e reconhecido como idóneo pela escola.
3. Quando o conselho escolar julgar justificado, poderão ser aceites dissertações realizadas sob a responsabilidade individual do doutorando.
Art. 5.º - 1. Nos casos dos n.os 1 e 2 do artigo anterior, o candidato deverá comunicar ao conselho escolar, com um ano de antecedência pelo menos, a intenção de se preparar para o doutoramento, designando o orientador escolhido que o aceitou ou solicitando que lhe seja indicado um.
2. O conselho escolar decidirá, nos casos dos n.os 2 e 3 do artigo anterior, no prazo de trinta dias, sobre a admissão do candidato, e da decisão devidamente fundamentada ser-lhe-á dado conhecimento.
3. Se o candidato for admitido, o conselho escolar estabelecerá desde logo as condições a que deve obedecer a sua preparação, facultando-lhe o acesso aos meios de investigação necessários.
4. Quando nas escolas funcionarem, instituídos por diploma legal, cursos de pós-graduação de especialidades, os conselhos escolares poderão exigir do doutorando a frequência, com aproveitamento, desses cursos.
5. A frequência dos cursos de pós-graduação terá a duração mínima de um e máxima de dois anos lectivos.
6. Poderão os conselhos escolares reconhecer, para efeito do disposto nos n.os 4 e 5, o aproveitamento obtido em cursos de pós-graduação ou em carreiras profissionais realizados em outras Universidades ou, com prévia aprovação do Ministro da Educação Nacional, em instituições de ensino, investigação científica ou outras consideradas idóneas.
7. O orientador informará anualmente o conselho escolar sobre os trabalhos realizados pelo candidato.
Admissibilidade do candidato às provas de doutoramento
Art. 6.º - 1. Para a prestação das provas de doutoramento o candidato apresentará o seu requerimento na escola em que pretende realizá-las, com a indicação da disciplina ou grupo de disciplinas a que elas hão-de respeitar.
2. O requerimento, que poderá ser apresentado em qualquer época do ano lectivo será instruído com os seguintes elementos:
a) Documentação comprovativa de o candidato se encontrar nas condições a que se refere o artigo 3.º, salvo se essa documentação tiver já sido entregue nos termos do n.º 2 do artigo 5.º;
b) Informação sobre o aproveitamento de cursos de pós-graduação, no caso previsto nos n.os 4 a 6 do artigo anterior;
c) Dissertação de doutoramento, impressa ou policopiada, em número de exemplares fixado pelo conselho escolar no mínimo de trinta, dos quais quinze serão enviados ao Ministério da Educação Nacional;
d) Idêntico número de exemplares, impressos ou policopiados, do curriculum vitae.
Art. 7.º - 1. Em face do processo organizado nos termos do n.º 2 do artigo antecedente e do parecer favorável do orientador, o conselho escolar autorizará, no prazo máximo de trinta dias, a realização das provas.
2. No caso do n.º 3 do artigo 4.º, o conselho decidirá, no prazo de sessenta dias, sobre a admissão às provas, com base em parecer fundamentado, subscrito por dois professores da especialidade, designados para o efeito pelo conselho.
3. Decidida a admissão do candidato, o conselho escolar fixará imediatamente o tipo de provas complementares a que ele será sujeito e proporá ao Ministro da Educação Nacional a constituição do júri e a data da realização do acto, que deverá ter lugar no prazo máximo de cento e vinte dias, não podendo a realização das provas ter lugar em período de férias.
4. No caso de o conselho optar pelas provas complementares, a que se referem as alíneas b) ou c) do artigo 8.º, será dado ao candidato um prazo de noventa dias para apresentação de trinta exemplares do estudo ou projecto de investigação referidos, devendo, no entanto, o candidato, ao fim de trinta dias, indicar o tema escolhido.
Provas de doutoramento
Art. 8.º - 1. As provas de doutoramento incluem a crítica e defesa de uma dissertação original e especialmente escrita para o efeito.2. É admitido na elaboração da dissertação o aproveitamento, total ou parcial, do resultado de trabalhos já publicados, mesmo em colaboração, devendo, neste caso, o candidato esclarecer qual a sua contribuição pessoal.
3. Além da dissertação, devem os conselhos escolares optar, de acordo com a índole do doutoramento, por uma das seguintes provas:
a) Discussão de dois pontos sobre temas estritamente relacionados com matérias do grupo de disciplinas afins a que corresponde o doutoramento;
b) Discussão de um estudo, proposto pelo candidato, que constitua uma actualização de conhecimentos ou uma análise crítica original sobre tema delimitado abrangido no grupo de disciplinas afins a que corresponde o doutoramento;
c) Discussão de um projecto de investigação apresentado pelo candidato dentro das matérias do grupo de disciplinas afins a que corresponde o doutoramento, mas distinto do trabalho elaborado como dissertação.
4. O texto do estudo ou do projecto de investigação referidos nas alíneas b) e c) do número anterior não deverá exceder cinquenta páginas de formato 21 cm x 29,7 cm, dactilografados a dois espaços.
Art. 9.º - 1. A dissertação será apreciada por um ou dois membros do júri, um dos quais, neste caso e sempre que possível, pertencerá a escola diferente daquela em que se realizarem as provas.
2. A discussão não poderá exceder cento e vinte minutos, ou uma hora, quando seja um só arguente, cabendo um período máximo de trinta minutos a cada arguente e devendo ser proporcionada ao candidato a possibilidade de responder às críticas feitas.
Art. 10.º - 1. Os pontos para a discussão a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 8.º serão sorteados entre quinze propostos pelo júri.
2. A afixação dos pontos e o respectivo sorteio terão lugar trinta dias antes da data do início da prestação das provas.
3. Cada um dos dois pontos será discutido por um membro do júri durante o período máximo de quarenta e cinco minutos.
4. As discussões a que se referem as alíneas b) e c) do n.º 3 do artigo 8.º ficarão a cargo de um único membro do júri e terão a duração máxima de duas horas.
Art. 11.º - As provas de que consta o doutoramento serão separadas por intervalos mínimos de vinte e quatro horas.
Júri do doutoramento
Art. 12.º - 1. O júri das provas do doutoramento será constituído:a) Pelo reitor da Universidade, presidente, o qual poderá fazer-se substituir por um vice-reitor ou pelo director da Faculdade ou Escola;
b) Pelo professor ou investigador que orientou o candidato, quando o houver;
c) Por mais três a cinco vogais professores de matérias do grupo de disciplinas a que corresponde o doutoramento.
2. Um dos vogais do júri poderá ser, se necessário, professor de outra Universidade ou investigador de um organismo de investigação de reconhecida idoneidade, nacionais ou estrangeiros.
Art. 13.º - 1. Concluídas as provas, o júri reunir-se-á para a apreciação destas, cujo resumo constará da respectiva acta, e para a classificação do candidato por votação em escrutínio secreto.
2. Só podem participar na votação os membros do júri que tenham assistido a todas as provas.
3. O presidente do júri só vota em caso de empate, salvo se for professor do grupo de disciplinas afins a que corresponde o doutoramento.
4. O resultado final será expresso pelas fórmulas de Recusado ou Aprovado com Distinção e Aprovado com Distinção e Louvor.
Doutoramento «honoris causa»
Art. 14.º - 1. As Universidades poderão conferir o grau de doutor honoris causa a individualidades eminentes, nacionais ou estrangeiras, sob proposta devidamente fundamentada apresentada pelo menos por dois professores e aprovada pela maioria de dois terços do número de componentes do respectivo conselho escolar.2. A deliberação compete ao respectivo senado universitário.
3. Quando o doutorando for estrangeiro, a concessão do grau depende de autorização do Ministro da Educação Nacional.
Disposições finais
Art. 15.º - Durante dois anos a contar da entrada em vigor deste diploma, os candidatos ao doutoramento poderão optar pelo regime agora instituído ou pelo anteriormente vigente.Art. 16.º - As dúvidas sobre a interpretação e aplicação deste diploma serão resolvidas por despacho do Ministro da Educação Nacional, ouvidos os senados ou conselho universitários e sob parecer da Junta Nacional da Educação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Marcello Caetano - José Veiga Simão.
Promulgado em 5 de Agosto de 1970.
Publique-se.Presidência da República, 18 de Agosto de 1970. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ.