de 26 de Agosto
Lei de enquadramento do Orçamente Geral do Estado
A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164.º, alínea g), e 169.º, n.º 2, da Constituição, o seguinte:
ARTIGO 1.º
(Objecto)
As regras referentes ao Orçamento Geral do Estado, os procedimentos para a sua elaboração, execução, alteração e fiscalização e a responsabilidade orçamental obedecerão aos princípios e normas constantes dos artigos seguintes.
CAPÍTULO I
Princípios e regras orçamentais
ARTIGO 2.º
(Anualidade)
O Orçamento Geral do Estado é anual e o ano económico coincide com o ano civil.
ARTIGO 3.º
(Unidade e universalidade)
1. O Orçamento Geral do Estado é unitário e compreenderá todas as receitas e despesas da Administração Central do Estado, incluindo as receitas e despesas dos serviços e fundos autónomos.2. Os orçamentos das regiões autónomas, das autarquias locais e das empresas públicas são independentes, na sua elaboração, aprovação e execução, do Orçamento Geral do Estado, mas deste deverão constar, em mapas globais anexos, os elementos necessários à apreciação da situação financeira de todo o sector público.
ARTIGO 4.º
(Equilíbrio)
1. O Orçamento Geral do Estado deverá prever os recursos necessários para cobrir todas as despesas.2. As receitas correntes serão, pelo menos, iguais às despesas correntes, salvo se a conjuntura do período a que se refere o Orçamento o não permitir.
ARTIGO 5.º
(Orçamento bruto)
1. Todas as receitas serão inscritas no Orçamento Geral do Estado pela importância integral em que forem avaliadas, sem dedução alguma para encargos de cobrança ou de qualquer outra natureza.2. Todas as despesas serão inscritas no Orçamento pela sua importância integral, sem dedução de qualquer espécie.
ARTIGO 6.º
(Não consignação)
1. No Orçamento Geral do Estado não poderá afectar-se o produto de quaisquer receitas à cobertura de determinadas despesas.2. Exceptuam-se do disposto no número anterior os casos em que, por virtude de autonomia financeira ou de outra razão especial, a lei expressamente determine a afectação de certas receitas a determinadas despesas.
ARTIGO 7.º
(Especificação)
1. O Orçamento Geral do Estado especificará suficientemente as receitas nele previstas e as despesas nele fixadas.2. São nulos os créditos orçamentais que possibilitem a existência de dotações para utilização confidencial ou para fundos secretos, sem prejuízo dos regimes especiais de utilização de verbas que excepcionalmente se justifiquem por razões de segurança nacional, os quais serão autorizados pela Assembleia da República, sob proposta do Governo.
ARTIGO 8.º
(Classificação das receitas e despesas)
1. A especificação das receitas e despesas reger-se-á, no Orçamento Geral do Estado, por códigos de classificação orgânica, económica e funcional, devendo ser essas receitas e despesas sempre agrupadas, dentro da classificação económica, em correntes e de capital.
2. A estrutura dos códigos de classificação referidos no número anterior será definida por decreto-lei.
CAPÍTULO II
Procedimento para a elaboração do Orçamento Geral do Estado
ARTIGO 9.º
(Proposta de lei do Orçamento)
1. O Governo apresentará à Assembleia da República, até 15 de Setembro, uma proposta de lei do Orçamento para o ano económico seguinte, a qual será integrada com a proposta de lei do Plano anual.2. A proposta de lei referida no número anterior deverá ter em conta as orientações do Plano a médio prazo.
3. A proposta de lei referida no n.º 1 não poderá conter normas cuja vigência ultrapasse o ano económico a que se refere.
ARTIGO 10.º
(Conteúdo da proposta de lei do Orçamento)
1. O articulado da proposta de lei do Orçamento e os seus anexos, além das linhas gerais de organização do orçamento da segurança social, conterão a discriminação das receitas e a das despesas na parte respeitante às dotações globais correspondentes às funções e aos Ministérios e Secretarias de Estado.
2. A proposta de lei referida no número anterior conterá ainda, além das normas necessárias para orientar a elaboração do decreto orçamental, a indicação das fontes de financiamento do eventual deficit orçamental, com discriminação das condições gerais de recurso ao crédito público, a indicação do destino a dar aos fundos resultantes do eventual excedente e todas as outras medidas que se revelarem indispensáveis à correcta administração orçamental do Estado para o ano económico a que o Orçamento se destina.
3. A proposta de lei referida no n.º 1 será acompanhada de todos os elementos necessários à justificação da política orçamental apresentada e designadamente de uma versão provisória do orçamento consolidado do sector público, das previsões de execução dos orçamentos administrativos e sociais, da evolução da dívida pública, dos orçamentos cambiais do sector público e da dívida global das restantes entidades integradas no sector público.
ARTIGO 11.º
(Votação da Lei do Orçamento)
A Assembleia da República votará a Lei do Orçamento até 15 de Dezembro.
ARTIGO 12.º
(Atraso na votação ou aprovação da proposta de lei do Orçamento)
1. Se a Assembleia da República não votar ou, tendo votado, não aprovar a proposta de lei do Orçamento de modo que possa entrar em execução no início do ano económico a que se destina, manter-se-á em vigor, por duodécimos, o Orçamento do ano anterior, de acordo com o disposto nos números seguintes.
2. A manutenção da vigência do Orçamento do ano anterior será feita com as alterações que nele forem introduzidas durante a sua execução.
3. Se a Assembleia da República aprovar a Lei do Plano anual e em sua execução forem autorizadas pelo Governo despesas de capital, estes poderão ser efectuadas ao abrigo daquela lei, enquanto não for aprovada a Lei do Orçamento.
4. O disposto nos números anteriores cessará no primeiro dia do mês seguinte ao decurso do prazo mínimo de quinze dias sobre a aprovação da Lei do Orçamento.
ARTIGO 13.º
(Elaboração do Orçamento)
1. O Orçamento Geral do Estado será elaborado pelo Governo de harmonia com a Lei do Orçamento e o Plano.2. Na especificação das dotações, o Governo dará prioridade absoluta às obrigações decorrentes de lei ou de contrato e, seguidamente, à execução de programas ou projectos plurianuais e outros empreendimentos constantes do Plano anual, devendo ainda assegurar a necessária correcção entre as previsões orçamentais e a evolução provável da conjuntura.
ARTIGO 14.º
(Decreto orçamental)
1. O Orçamento Geral do Estado será posto em execução pelo Governo através de decreto-lei, de modo que possa começar a ser executado no início do ano económico a que diz respeito, excepto nos casos previstos nos n.os 2 a 4 do artigo 12.º 2. O diploma referido no número anterior conterá, além das demais disposições reguladoras ou orientadoras da execução orçamental, a especificação das receitas do Estado, com discriminação suficiente de cada artigo no orçamento das receitas, o mapa das despesas autorizadas, pelo menos com a discriminação dos capitais de cada divisão administrativa, e a regulamentação das normas gerais constantes da Lei do orçamento, tendo em conta, designadamente, as normas a observar na disciplina da utilização racional das dotações orçamentais e na gestão da tesouraria.
ARTIGO 15.º
(Orçamento de programas)
1. As receitas e despesas relativas a programas e projectos que impliquem encargos plurianuais e que, no âmbito do Plano, possam ser considerados com autonomia, poderão constar de orçamentos de programas.2. Os créditos incluídos nos orçamentos de programas constituem o limite máximo que poderá ser despendido na execução da totalidade dos respectivos projectos ou programas, sem prejuízo da possibilidade da sua revisão periódica.
3. Do Orçamento Geral do Estado constarão as receitas e despesas dos orçamentos de programas que disserem respeito ao respectivo ano de execução, bem como, em anexo, os elementos plurianuais indispensáveis à apreciação da situação financeira dos respectivos projectos ou programas.
4. A elaboração, aprovação e execução dos orçamentos de programas referidos neste artigo far-se-ão nos termos que forem definidos na lei orgânica de cada projecto ou programa, a aprovar por decreto-lei.
CAPÍTULO III
Execução do Orçamento e alterações orçamentais
ARTIGO 16.º
(Efeitos do orçamento das receitas)
1. Nenhuma receita poderá ser liquidada ou cobrada, mesmo que seja legal, se não tiver sido objecto de inscrição orçamental.2. A cobrança poderá, todavia, ser efectuada mesmo para além do montante inscrito no Orçamento.
ARTIGO 17.º
(Efeitos do orçamento das despesas)
1. As dotações orçamentais constituem o limite máximo a utilizar na realização das despesas.2. Nenhuma despesa poderá ser efectuada sem que, além de ser legal, se encontre suficientemente discriminada no Orçamento Geral do Estado, tenha cabimento no correspondente crédito orçamental e obedeça ao princípio da utilização por duodécimos, salvas, neste último caso, as excepções autorizadas por lei.
3. Nenhum encargo poderá ser assumido sem que a correspondente despesa obedeça aos requisitos do número anterior.
ARTIGO 18.º
(Supressão ou redução de dotações)
1. O Ministro das Finanças, ouvido o Ministro competente, poderá suprimir as dotações que careçam de justificação ou reduzir os seus montantes, desde que não afectem a execução de investimentos e não violem as obrigações legais do Estado.
2. O disposto no número anterior poderá assumir carácter genérico, com a forma de redacções gerais ou anulações de dotações determinadas por decreto-lei.
ARTIGO 19.º
(Administração orçamental e contabilidade pública)
1. A aplicação das dotações orçamentais e o funcionamento da administração orçamental obedecerão às normas da contabilidade pública.
2. A vigência e a execução do Orçamento Geral do Estado obedecerão ao sistema do ano económico.
ARTIGO 20.º
(Alterações orçamentais)
1. As alterações que impliquem aumento de despesa total do Orçamento Geral do Estado ou dos montantes de ceda sector orgânico ou funcional fixados na Lei do Orçamento só poderão ser efectuadas por lei da Assembleia da República.2. Exceptuam-se do disposto não número anterior as despesas não previstas e inadiáveis, para as quais o Governo poderá efectuar inscrições ou reforços de verbas com contrapartida em dotação provisional a inscrever no orçamento do Ministério das Finanças, destinada a essa finalidade.
3. Exceptuam-se do regime consignado nos números anteriores as verbas relativas às contas de ordem, cujos quantitativos de despesas podem ser alterados automaticamente até à concorrência das cobranças efectivas de receitas.
4. Exceptuam-se ainda do regime definido nos n.os 1 a 3 as despesas que, por expressa determinação da lei, possam ser realizadas com utilização de saldos de dotações de anos anteriores, bem como as despesas que tenham compensação em receita.
5. O Governo definirá, por decreto-lei, as regras gerais a que deverão obedecer as alterações orçamentais que forem da sua competência.
CAPÍTULO IV
Fiscalização e responsabilidade orçamentais
ARTIGO 21.º
(Fiscalização orçamental)
1. A fiscalização administrativa da execução orçamental compete, além de à própria entidade responsável pela gestão e pela execução, a entidades hierarquicamente superiores e de tutela e a órgãos gerais de inspecção e contrôle administrativo, aos serviços de contabilidade pública, devendo ser efectuada nos termos da legislação aplicável.2. A fiscalização jurisdicionalizada da execução orçamental compete ao Tribunal de Contas e deverá ser efectuada nos termos da legislação aplicável.
3. A fiscalização a exercer pelas entidades referidas nos números anteriores atenderá aos princípios de que a execução orçamental deve obter a maior utilidade e rendimento sociais com o mais baixo custo.
(Contas pública)
1. O resultado da execução orçamental constará de contas provisórias e da Conta Geral do Estado.2. O Governo publicará mensalmente as contas provisórias e apresentará à Assembleia da República a Conta Geral do Estado, até 31 de Outubro do ano seguinte àquele a que respeite.
3. A Assembleia da República apreciará e aprovará a Conta Geral do Estado, precedendo parecer do Tribunal de Contas, e, no caso de não aprovação, determinará, se a isso houver lugar, a efectivação das correspondentes responsabilidades.
4. A aprovação das contas das restantes entidades do sector público e as respectivas formas de publicidade e fiscalização serão reguladas por lei especial.
CAPÍTULO V
Normas programáticas e transitórias
ARTIGO 23.º
(Reformas orçamentais)
1. O Governo coordenará e incentivará o desenvolvimento dos estudos e acções conducentes à racionalização da gestão orçamental.2. O Governo coordenará, com as medidas tomadas no sentido do número anterior, a reforma da contabilização, gestão e contrôle patrimonial do Estado e das demais entidades públicas, bem como as medidas de gestão da tesouraria, cujos princípios gerais proporá à Assembleia da República.
3. O Governo tomará medidas tendentes a garantir a crescente subordinação da gestão financeira e, em especial, da gestão orçamental às necessidades da estabilização da conjuntura e à estratégia e objectivos do Plano.
ARTIGO 24.º
(Reforma da contabilidade pública)
O Governo promoverá a reforma da contabilidade pública, a qual deverá ser orientada pelos princípios da desconcentração de competências e do contrôle da economicidade das despesas e custo dos serviços públicos, e proporá as respectivas linhas gerais à Assembleia da República.
ARTIGO 25.º
(Serviços e fundos autónomos)
1. O regime financeiro dos serviços e fundos autónomos será regulado por lei especial, com base na presente lei e tendo em conta a necessidade da sua integração num orçamento consolidado da Administração Central do Estado, devendo ainda o Governo proceder gradualmente a essa integração.2. Os orçamentos de todos os institutos ou fundos públicos que ainda não tenham sido integrados no Orçamento Geral do Estado, por Ministérios ou Secretarias de Estado, deverão constar, em anexo, do diploma referido no artigo 14.º
ARTIGO 26.º
(Reforma dos fundos financeiros)
1. O Governo promoverá a reforma dos fundos financeiros, integrando-os tanto quanto possível no sistema financeiro estadual ou nacionalizado e suprimindo os fundos financeiros e os fundos de facto cuja existência careça de justificação suficiente, devendo apresentar à Assembleia da República uma proposta nesse sentido.2. O Governo elaborará um relatório sobre a situação dos fundos financeiros existentes e apresentá-lo-á à Assembleia da República até 1 de Dezembro de 1977.
ARTIGO 27.º
(Fundo da estabilização conjuntural)
O Governo apresentará à Assembleia da República uma proposta tendente à criação de um fundo de estabilização conjuntural ao qual sejam afectados os excedentes da execução orçamental, os quais deverão ser prioritariamente destinados a financiar os encargos suscitados pela necessidade de satisfazer obrigações legais do Estado ou de praticar uma política expansionista.
ARTIGO 28.º
(Data de apresentação da proposta de lei do Orçamento)
Até à efectivação das reformas previstas nos artigos 23.º e 24.º, a data da apresentação da proposta de lei do Orçamento à Assembleia da República será a de 15 de Outubro.
ARTIGO 29.º
(Orçamento da segurança social)
1. O Governo aprovará, por decreto-lei, o orçamento da segurança social, do qual constarão, pelo menos, a discriminação das receitas correntes e de capital e das despesas e as providências necessárias à regulamentação da Lei do Orçamento, nessa parte, e à disciplina da respectiva execução orçamental.2. O regime previsto no número anterior aplicar-se-á ao orçamento da previdência social, enquanto não for possível organizar o orçamento da segurança social.
ARTIGO 30.º
(Contas públicas)
1. Até à publicação de lei especial definidora da estrutura e regime das contas públicas estaduais, elas reger-se-ão pela lei em vigor, com as alterações que o Governo introduzir para o ano em curso.2. A Conta Geral do Estado integrará progressivamente as contas dos serviços e fundos autónomos da Administração Central, devendo ainda conter, a partir da Conta referente a 1977, a título meramente informativo, os resultados da respectiva gestão.
3. A Conta Geral do Estado referente a 1976 será comunicada à Assembleia da República até 31 de Outubro de 1977.
ARTIGO 31.º
(Regulamentação)
O Governo procederá, por decreto-lei, ao desenvolvimento dos princípios gerais contidos na presente lei e publicará a necessária regulamentação.Aprovada em 7 de Julho de 1977. - O Presidente da Assembleia da República,
Vasco da Gama Fernandes.
Promulgada em 9 de Agosto de 1977.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES. - O Primeiro-Ministro, Mário Soares.