de 6 de Junho
A protecção ambiental, como forma de promoção da qualidade de vida dos cidadãos, assume um papel de assinalável relevo na sociedade portuguesa.A melhor política de ambiente é, sem dúvida, o contributo para a criação de condições que permitam evitar as perturbações do ambiente, em vez de se limitar a combater posteriormente os seus efeitos.
Há, pois, que adoptar princípios gerais de avaliação do impacte de projectos, públicos ou privados, no ambiente, com vista a coordenar os processos da respectiva aprovação.
Com efeito, o impacte ambiental deve ser sempre avaliado no sentido não só de garantir a diversidade das espécies e conservar as características dos ecossistemas enquanto patrimónios naturais insubstituíveis, mas também como forma de protecção da saúde humana e de promoção da qualidade de vida das comunidades.
O presente diploma introduz no direito interno as normas constantes da Directiva n.º 85/337/CEE, do Conselho, de 27 de Junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente, para além de dar concretização aos objectivos que presidem à Lei de Bases do Ambiente.
Assim:
Ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º - 1 - O presente diploma transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 85/337/CEE, do Conselho, de 27 de Junho de 1985, que estabelece as normas relativas à avaliação dos efeitos de determinados projectos, públicos e privados, no ambiente.
2 - Para efeitos do presente diploma, entende-se por:
a) Projecto - a realização de obras de construção ou de outras instalações ou obras, ou outras intervenções no meio natural ou na paisagem, incluindo as intervenções destinadas à exploração de recursos do solo;
b) Dono da obra - o autor do pedido de aprovação de um projecto privado ou a entidade pública que toma a iniciativa relativa a um projecto;
c) Aprovação - a decisão da autoridade ou das autoridades competentes que confere ao dono da obra o direito de realizar o projecto.
Art. 2.º - 1 - A aprovação de projectos que, pela sua natureza, dimensão ou localização, se considerem susceptíveis de provocar incidências significativas no ambiente fica sujeita a um processo prévio de avaliação do impacte ambiental (AIA), como formalidade essencial, da competência do membro do Governo responsável pela área do ambiente.
2 - A AIA atende aos efeitos directos e indirectos dos projectos sobre os seguintes factores:
a) O homem, a fauna e a flora;
b) O solo, a água, o ar, o clima e a paisagem;
c) A interacção dos factores referidos nas alíneas anteriores;
d) Os bens materiais e o património cultural.
3 - Consideram-se abrangidos pelo disposto no n.º 1 os projectos constantes do anexo I ao presente diploma, do qual faz parte integrante.
4 - Em casos excepcionais, os projectos referidos no número anterior podem ser isentos da AIA, por decisão conjunta do membro do Governo competente na área do projecto, em razão da matéria, adiante designado «de tutela», e do membro do Governo responsável pela área do ambiente.
5 - Para efeitos do número anterior, o Governo, através dos seus membros ali referidos, decidirá se é conveniente uma outra forma de avaliação e facultará informações sobre a isenção concedida, nos termos do n.º 3 do artigo 2.º da Directiva n.º 85/337/CEE. Art. 3.º - 1 - Para efeitos da AIA, os donos da obra devem apresentar, no início do processo conducente à autorização ou licenciamento do projecto, à entidade pública competente para tal decisão um estudo de impacte ambiental (EIA).
2 - A entidade pública referida no número anterior enviará, de imediato, ao membro do Governo responsável pela área do ambiente:
a) O projecto em causa;
b) O EIA;
c) Outros elementos que considere convenientes para a correcta apreciação do projecto.
3 - O EIA deve conter as especificações constantes do anexo II ao presente diploma, do qual faz parte integrante.
Art. 4.º - 1 - O membro do Governo responsável pela área do ambiente determinará qual a entidade encarregue da instrução do processo da AIA, a quem cabe apreciar e emitir parecer sobre o projecto, bem como promover uma consulta do público interessado, de molde a permitir uma alargada participação das entidades interessadas e dos cidadãos na apreciação do projecto.
2 - A consulta prevista no número anterior pressupõe uma divulgação prévia dos estudos efectuados e respectivos resultados, bem como uma explicitação dos elementos mais caracterizadores do empreendimento em análise, sem prejuízo da observância das normas legais que protegem os conhecimentos técnicos não patenteados.
Art. 5.º - 1 - No prazo máximo de 120 dias contados a partir da data de recepção da documentação referida no n.º 2 do artigo 3.º, o membro do Governo responsável pela área do ambiente enviará à tutela e à entidade competente para licenciar ou autorizar o projecto o respectivo parecer, acompanhado do relatório da consulta pública que tenha promovido e da análise do mesmo.
2 - O prazo referido no número anterior pode ser prorrogado por 30 dias, mediante despacho conjunto dos membros do Governo responsáveis pela área do ambiente e da tutela.
3 - Considera-se favorável o parecer se, decorridos os prazos estabelecidos nos números anteriores, nada for comunicado à entidade competente para licenciar ou autorizar o projecto.
Art. 6.º A entidade competente para a aprovação do projecto deve ter em consideração o parecer a que se refere o n.º 1 do artigo anterior e, em caso da sua não adopção, incorporar na decisão as razões de facto e de direito que para tal forem determinantes.
Art. 7.º - 1 - Os projectos constantes do anexo III a este diploma, que dele faz parte integrante, serão submetidos a AIA, nos termos e de acordo com os critérios e limites a definir mediante decreto regulamentar.
2 - O decreto regulamentar a que se refere o número anterior deve especificar, relativamente aos projectos constantes dos anexos I e III, os elementos a serem entregues pelo dono da obra, definir o processo a seguir e indicar as entidades competentes para o mesmo e, bem assim, a instituição de mecanismos de acompanhamento e fiscalização.
Art. 8.º O disposto no presente diploma não se aplica aos empreendimentos considerados pelo Governo como de interesse para a defesa e segurança nacionais.
Art. 9.º As decisões finais tomadas sobre os projectos apreciados nos termos do presente diploma, bem como os respectivos processos, devem ser objecto de divulgação pública.
Art. 10.º - 1 - A execução de projectos sujeitos a AIA sem a necessária aprovação ou em violação do conteúdo dessa decisão constitui contra-ordenação punível com coima de 500 a 6000 contos.
2 - A negligência é punível.
3 - A entidade competente para a aplicação da coima prevista no número anterior é o membro do Governo responsável pela área do ambiente.
4 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1, o membro do Governo responsável pela área do ambiente pode ainda, a título de sanção acessória e nos termos da lei geral, nas situações aí previstas, determinar:
a) A apreensão de máquinas ou utensílios;
b) O encerramento de instalações;
c) A interdição de exercer a profissão ou actividade;
d) A privação do direito de participação em arrematações e concursos promovidos por entidades ou serviços públicos, de obras públicas, de fornecimento de obras e serviços ou concessão de serviços, licenças ou alvarás.
5 - Para além do previsto nos números anteriores, às infracções previstas no n.º 1 aplica-se o disposto no artigo 48.º da Lei 11/87, de 7 de Abril.
6 - Sempre que a ordem de demolição ou o dever de reposição da situação no estado anterior não sejam voluntariamente cumpridos, os serviços do Estado actuarão directamente por conta do infractor, sendo as despesas cobradas coercivamente, através do processo previsto para as execuções fiscais.
7 - As normas processuais relativas à execução do disposto no presente artigo são aprovadas por decreto regulamentar.
Art. 11.º - 1 - O presente diploma entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.
2 - O presente regime não se aplica aos projectos cujo processo de aprovação esteja em curso à data da entrada em vigor do presente diploma.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 8 de Fevereiro de 1990. - Aníbal António Cavaco Silva - Eugénio Manuel dos Santos Ramos - Luís Francisco Valente de Oliveira - José Manuel Cardoso Borges Soeiro - Arlindo Marques da Cunha - Luís Fernando Mira Amaral - João Maria Leitão de Oliveira Martins - Fernando Nunes Ferreira Real.
Promulgado em 24 de Maio de 1990.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 29 de Maio de 1990.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.
ANEXO I
1 - Refinarias de petróleo bruto (excluindo as empresas que produzem unicamente lubrificantes a partir do petróleo bruto) e instalações de gasificação e de liquefacção de, pelo menos, 500 t de carvão ou de xisto betuminoso por dia.2 - Centrais térmicas e outras instalações de combustão com uma calorífica de, pelo menos, 300 MW e centrais nucleares e outros reactores nucleares (excluindo as instalações de pesquisa para a produção e transformação de matérias cindíveis e férteis, cuja potência máxima não ultrapasse 1 kW de carga térmica contínua).
3 - Instalações exclusivamente destinadas à armazenagem permanente ou à eliminação definitiva de resíduos radioactivos.
4 - Fábricas integradas para a primeira fusão de ferro fundido e de aço.
5 - Instalações destinadas à extracção de amianto e transformação do amianto e de produtos que contêm amianto: em relação aos produtos de amianto-cimento, uma produção anual de mais de 20000 t de produtos acabados; em relação ao material de atrito, uma produção anual de mais de 50 t de produtos acabados; em relação às outras utilizações do amianto, uma utilização de mais de 200 t por ano.
6 - Instalações químicas integradas.
7 - Construção de auto-estradas, de vias rápidas (ver nota 1), de vias para o tráfego de longa distância dos caminhos-de-ferro e de aeroportos (ver nota 2) cuja pista de descolagem e de aterragem tenha um comprimento de 2100 m ou mais.
8 - Portos de comércio marítimos e vias navegáveis e portos de navegação interna que permitam o acesso a barcos com mais de 1350 t.
9 - Instalações de eliminação nos resíduos tóxicos e perigosos por incineração, tratamento químico ou armazenagem em terra.
(nota 1) Entende-se por «via rápida» uma estrada que corresponda à definição do Acordo Europeu de 15 de Novembro de 1975 sobre as Grandes Vias do Tráfego Internacional.
(nota 2) Entende-se por «aeroporto» um aeroporto que corresponda à definição da Convenção de Chicago de 1944 Relativa à Criação da Organização da Aviação Civil Internacional (anexo n.º 14).
ANEXO II
1 - Descrição do projecto, incluindo, em especial:Uma descrição das características físicas da totalidade do projecto e exigências no domínio da utilização do solo, aquando das fases de construção e de funcionamento;
Uma descrição das principais características dos processos de fabrico, por exemplo a natureza e as quantidades de materiais utilizados;
Uma estimativa dos tipos e quantidades de resíduos e emissões esperados (poluição da água, da atmosfera e do solo, ruído, vibração, luz, calor, radiação, etc.) em resultado do funcionamento do projecto proposto.
2 - Se for caso disso, um esboço das principais soluções da substituição examinadas pelo dono da obra e a indicação das principais razões dessa escolha, atendendo aos efeitos no ambiente.
3 - Uma descrição dos elementos do ambiente susceptíveis de serem consideravelmente afectados pelo projecto proposto, nomeadamente a fauna, a flora, o solo, a água, a atmosfera, os factores climáticos, os bens materiais, incluindo o património arquitectónico e arqueológico, a paisagem, bem como a inter-relação entre os factores mencionados.
4 - Uma descrição (ver nota 1) dos efeitos importantes que pode ter no ambiente resultantes:
Da existência da totalidade do projecto;
Da utilização dos recursos naturais;
Da emissão de poluentes, da criação de perturbações ou da eliminação dos resíduos, e a indicação pelo dono da obra dos métodos de previsão utilizados para avaliar os efeitos no ambiente.
5 - Um resumo não técnico das informações transmitidas com base nas rubricas mencionadas.
6 - Um resumo das eventuais dificuldades (lacunas técnicas ou nos conhecimentos) encontradas pelo dono da obra na compilação das informações requeridas.
(nota 1) Esta descrição deve mencionar os efeitos e, se for caso disso, os efeitos indirectos secundários, cumulativos, a curto, médio e longo prazos, permanentes e temporários, positivos e negativos do projecto.
ANEXO III
1 - Agricultura:a) Projectos de emparcelamento rural;
b) Projectos para destinar as terras não cultivadas ou as áreas seminaturais à exploração agrícola intensiva;
c) Projectos de hidráulica agrícola;
d) Primeiros repovoamentos florestais, quando podem provocar transformações ecológicas negativas, e reclamação de terras para permitir a conversão num outro tipo de exploração do solo;
e) Instalação para a criação de aves de capoeira;
f) Instalação para a criação de gado porcino;
g) Piscicultura de salmónidas;
h) Recuperação de terrenos ao mar.
2 - Indústria extractiva:
a) Extracção de turfa;
b) Perfurações em profundidade, com excepção das perfurações para estudar a estabilidade dos solos, nomeadamente:
Perfurações geométricas;
Perfurações para armazenagem de resíduos nucleares;
Perfurações para o abastecimento de água;
c) Extracção de minerais não metálicos nem produtores de energia, como o mármore, a areia, o cascalho, o xisto, o sal, os fosfatos e a potassa;
d) Extracção de hulha e de linhite em explorações subterrâneas;
e) Extracção de hulha e de linhite em explorações a céu aberto;
f) Extracção de petróleo;
g) Extracção de gás natural;
h) Extracção de minérios metálicos;
i) Extracção de xistos betuminosos;
j) Extracção, a céu aberto, de metais não metálicos nem produtores de energia;
k) Instalações de superfícies para a extracção de hulha, de petróleo, de gás natural, de minérios e de xistos betuminosos;
l) Instalações para fabrico de coque (destilação seca do carvão);
m) Instalações destinadas ao fabrico de cimento.
3 - Indústria de energia:
a) Instalações industriais destinadas à produção de energia eléctrica, de vapor e de água quente (que não constem do anexo I);
b) Instalações de indústrias destinadas ao transporte de gás, vapor e água quente, transporte de energia eléctrica por cabos aéreos;
c) Armazenagem à superfície de gás natural;
d) Armazenagem subterrânea de gases combustíveis;
e) Armazenagem à superfície de combustíveis fósseis;
f) Aglomeração industrial de hulha e de linhite;
g) Instalações para a produção ou enriquecimento de combustíveis nucleares;
h) Instalações para o reprocessamento de combustíveis nucleares irradiados;
i) Instalações para a recolha e processamentos de resíduos radioactivos (que não constem do anexo I);
j) Instalações destinadas à produção de energia hidroeléctrica.
4 - Processamento de metais:
a) Siderurgias, incluindo fundições, forjas, trefilarias e laminadores (excepto os referidos no anexo I);
b) Instalações de produção, incluindo fusão, refinação, estiragem e laminagem dos metais não ferrosos;
c) Estampagem e corte de grandes peças;
d) Tratamento de superfícies e revestimento de metais;
e) Fabrico de caldeiras, fabrico de reservatórios e outras peças de chapa;
f) Fabrico e montagem de veículos automóveis e de motores de automóveis;
g) Estaleiros navais;
h) Instalações para construção e reparação de aeronaves;
i) Fabrico de material ferroviário;
j) Estampagem de fundos por explosivos;
k) Instalação de calcinação e de sinterização de minérios metálicos.
5 - Fabrico de vidro.
6 - Indústria química:
a) Tratamento de produtos intermédios e fabrico de produtos químicos (que não constem do anexo I);
b) Fabrico de pesticidas e produtos farmacêuticos, de tintas e vernizes, elastómeros e peróxidos;
c) Instalações para armazenagem de petróleo e de produtos petroquímicos e químicos.
7 - Indústria dos produtos alimentares:
a) Indústria de gorduras vegetais e animais;
b) Fabrico de conservas de produtos animais e vegetais;
c) Produção de lacticínios;
d) Indústria de cerveja e de malte;
e) Confeitaria e fabrico de xaropes;
f) Instalações destinadas ao abate de animais;
g) Instalações para o fabrico industrial de amido;
h) Fábricas de farinha de peixe e de óleo de peixe;
i) Açucareiras.
8 - Indústria têxtil, indústria de cabedais, da madeira e do papel:
a) Fábricas de lavagem, desengorduramento e branqueamento da lã;
b) Fabrico de painéis de fibra e de partículas e de contraplacados;
c) Fabrico de pasta de papel, de papel e de cartão;
d) Tinturarias de fibras;
e) Fábricas de produção e tratamento de celulose;
f) Fábricas de curtumes e vestuário de couro.
9 - Indústria da borracha:
a) Fabrico e tratamento de produtos à base de elastómeros.
10 - Projectos de infra-estruturas:
a) Projectos de desenvolvimento de zonas industriais;
b) Projectos de desenvolvimento urbano;
c) Funiculares e teleféricos;
d) Construção de estradas, de portos (incluindo portos de pesca) e de aeródromos (projectos que não constem do anexo I);
e) Obras de canalização e de regularização dos cursos de água.
f) Barragens e outras instalações destinadas a reter a água ou a armazená-la a longo prazo.
11 - Outros projectos:
a) Aldeias de férias, complexos hoteleiros;
b) Pistas permanentes de corrida e de treinos para automóveis e motociclos;
c) Instalações de eliminação de resíduos industriais e de lixos domésticos (que não constem do anexo I);
d) Estações de depuração;
e) Locais de depósito de lamas;
f) Armazenagem de sucatas;
g) Bancos de ensaio para motores, turbinas ou reactores;
h) Fabrico de fibras minerais artificiais;
i) Fabrico, acondicionamento, carregamento ou colocação em cartucho de pólvora e explosivos;
j) Instalações de esquartejamento de animais impróprios para o consumo alimentar.
12 - Alteração de projectos que constam do anexo I e dos projectos do anexo III que se destinam exclusiva ou principalmente a desenvolver ou ensaiar novos métodos ou produtos e que não são utilizados durante mais de um ano.