de 27 de Novembro
Da experiência acumulada se poderá hoje afirmar que a avaliação do impacte ambiental, prévia ao processo decisório, garante uma visão mais completa e integrada das incidências sobre o ambiente em que vivemos.Esta maior responsabilização social pelos projectos motivadores de uma maior criatividade para investigar novas soluções técnicas e tecnológicas e estudar e prevenir com maior profundidade todos os aspectos que convergem na tomada de uma decisão com impactes no ambiente tem crescentemente vindo a ser observada como a mais recente doutrina nos órgãos das Comunidades Europeias, em matéria de aplicação dos fundos estruturais.
Justifica-se, pois, e caberá aqui lembrar que, nos termos do artigo 130.º do Acto Único, a acção da Comunidade em matéria de ambiente assentará nos princípios da acção preventiva e da correcção preferencialmente na fonte.
Longe de constituir um travão ao desenvolvimento e ao progresso - recorda-se -, é na garantia do ambiente - promovida aqui pela avaliação prévia de impactes ambientais - que se conseguirá inverter a lógica de soluções ultrapassadas e de economias não sustentáveis.
No contexto da transposição já operada pelo Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho, das normas constantes da Directiva n.º 85/337/CEE, de 27 de Junho, necessário se torna proceder à regulamentação dos aspectos que decorrem daquele diploma.
Assim:
Ao abrigo dos n.os 2 do artigo 7.º e 7 do artigo 10.º do Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho, e nos termos da alínea c) do artigo 202.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Âmbito
1 - O presente decreto regulamentar aplica-se à avaliação de impacte ambiental (AIA) dos projectos referidos no anexo I do Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho, e dos projectos agrícolas, industriais, habitacionais e turísticos ou de infra-estruturas listados no anexo III do mesmo diploma, quando, verificada a sua ocorrência, real ou potencial, em território português, esta exceda os limites ou dimensões descritos no anexo deste diploma, que dele faz parte integrante.2 - Sempre que não sejam ultrapassados os limites ou dimensões dos projectos referidos no anexo deste regulamento, as incidências sobre o ambiente são obrigatoriamente salvaguardadas no processo de licenciamento ou autorização respectivo, sem prejuízo da realização de um estudo de impacte ambiental quando tal resulte de específica exigência de lei.
Artigo 2.º
Estudo de impacte ambiental
12 - Para efeitos de AIA dos projectos do anexo I do Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho, deve o dono da obra apresentar à entidade licenciadora, previamente a qualquer licenciamento ou autorização, um estudo de impacte ambiental (EIA) que, consoante as circunstâncias do projecto, seja elaborado atendendo aos seguintes aspectos:a) Descrição do projecto, referindo:
Localização;
Características funcionais relativas às fases de construção e operação, bem como, se for caso disso, descrição dos processos de fabrico;
Exigências de utilização de recursos, incluindo a ocupação do solo, matérias-primas e meios humanos;
b) Situação de referência actual e perspectivas de evolução do local da zona envolvente nos seguintes aspectos susceptíveis de serem operados pela actividade:
Factores físicos, nomeadamente topografia, geologia, hidrologia, climatologia e solos;
Factores bióticos e ecológicos, nomeadamente fauna e flora, habitats e ecossistemas, em particular a sua importância, raridade, espécies protegidas, património arqueológico e arquitectónico;
Qualidade do ambiente e seus componentes (água, ar, solo, níveis de ruído, odores e luminosidade);
População e actividade - quadro demográfico, sócio-económico e cultural;
Uso do solo e sua relação com figuras de ordenamento, nomeadamente áreas protegidas, sítios classificados, reserva ecológica nacional, reserva agrícola nacional, planos urbanísticos e de ordenamento do território, servidões e outros condicionamentos;
c) Incidências sobre o ambiente e medidas mitigadoras:
Incidência sobre o sistema de drenagem e características hidrológicas e hidrodinâmicas em geral, designadamente no que respeita a aquíferos, cursos de água, albufeiras, zonas ribeirinhas e sistemas estuarinos e costeiros;
Incidência de emissão de resíduos líquidos e gasosos e ruído sobre os parâmetros de qualidade do meio receptor, nomeadamente o solo, água e ar;
Alterações profundas ou irreversíveis na estrutura do ecossistema e factores de desequilíbrio ecológico;
Alteração do património cultural e ou dos patrimónios construído e arqueológico e qualquer acção que afecte os usos e costumes locais e regionais;
Implicações na utilização de recursos naturais afectos ao projecto e alterações no uso do solo e dos recursos;
Alterações nos parâmetros demográficos e sócio-económicos da população;
Análise dos riscos para o ambiente e população decorrentes de acidentes graves e respectivas medidas de prevenção e planos de emergência;
Medidas mitigadoras das incidências negativas sobre o ambiente.
2 - Relativamente aos projectos enumerados no anexo III do Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho, e especificados no anexo deste diploma, deve o EIA a apresentar pelo dono da obra salvaguardar a análise dos seguintes aspectos principais:
Localização, descrição e características funcionais do projecto;
Incidência sobre o sistema de drenagem, zonas ribeirinhas e sistemas costeiros e estuarinos;
Incidência da emissão de resíduos ou efluentes sobre os parâmetros de qualidade do solo, água e ar;
Factores de desequilíbrio na estrutura do ecossistema;
Medidas mitigadoras das incidências negativas sobre o ambiente.
3 - Na apreciação do EIA ter-se-ão em conta os efeitos cumulativos ou sinérgicos do empreendimento sobre os componentes ambientais.
Artigo 3.º
Entidades competentes
1 - A entidade da Administração Pública competente para a instrução do processo de AIA é designada por despacho do ministro responsável pela área do ambiente.2 - A competência referida no número anterior é excercida conjuntamente com o ministro responsável pelo ordenamento do território, nos casos de projectos situados dentro de perímetros urbanos ou que atravessem povoações.
3 - Quando o projecto se localize numa região autónoma, a entidade competente para a instrução do processo de AIA é designada pelos respectivos órgãos de governo próprio.
Artigo 4.º
Consulta do público
1 - A entidade competente para a instrução do processo de AIA promove a consulta do público interessado, a qual, consoante a natureza e extensão dos impactes previsíveis, deve realizar-se por um período de tempo:a) Não inferior a 40 nem superior a 60 dias, nos projectos do anexo I do Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho;
b) Não inferior a 20 nem superior a 30 dias, nos projectos do anexo III do Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho.
2 - Para efeitos de acesso e participação considera-se como público interessado:
a) Os cidadãos, as suas organizações representativas, nomeadamente as associações de defesa do ambiente, bem como as autarquias locais da região abrangida relativamente a empreendimentos em cujo processo não tenham já participado, nos projectos do anexo I do Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho;
b) As freguesias onde se localize o empreendimento ou por onde ele passe, bem como as que lhes sejam limítrofes se por ele possam ser afectadas, os cidadãos nelas residentes e suas organizações representativas, nomeadamente as associações locais de defesa do ambiente, nos projectos do anexo III do Decreto-Lei 186/90, de 6 de Junho.
3 - A consulta do público é desencadeada mediante a divulgação de um resumo não técnico fornecido pelo dono da obra, do qual constem os efeitos mais importantes que o projecto pode gerar no ambiente, referindo, designadamente, a utilização de recursos naturais, a emissão de poluentes, a criação de perturbações (ruídos, cheiros) ou a eliminação de resíduos, identificando ainda os métodos preventivos para avaliar e diminuir os efeitos no ambiente.
4 - No âmbito do processo de consulta do público serão consideradas e apreciadas as exposições e reclamações que, apresentadas por escrito, especificamente se relacionem com o projecto.
5 - Quando pelas circunstâncias do projecto tal se mostre necessário, são promovidas audiências públicas abertas aos interessados, com vista à discussão e debate de aspectos específicos do projecto, previamente divulgados.
6 - Findo o prazo fixado para a consulta do público, é elaborado, nos cinco dias subsequentes, um relatório sucinto especificando as diligências efectuadas, a participação registada e as conclusões a extrair.
Artigo 5.º
Indemnizações
1 - Para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 48.º da Lei 11/87, de 7 de Abril, o montante de indemnização é calculado com base na estimativa do custo das acções e estudos alternativos à situação antes existente e necessários à minimização dos impactes provocados.2 - Na total impossibilidade de fixar o montante da indemnização por recurso à caracterização de alternativas à situação antes existente, são os danos ao ambiente indemnizados como danos não patrimoniais de montante a fixar equitativamente pelo tribunal.
Artigo 6.º
Auditorias
1 - A não adopção do parecer emitido pela entidade competente sobre impacte ambiental de um projecto implica a inclusão, no licenciamento, de obrigações de controlo sobre os impactes negativos sobre o ambiente e de mecanismos de acompanhamento, realização de auditorias, controlos e monitorizações que permitam avaliar os efeitos sobre o estado do ambiente decorrentes da realização do projecto, por forma a permitir a sua compensação atempada.2 - O acompanhamento e controlo referidos no número anterior são da responsabilidade dos serviços competentes do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.
Artigo 7.º
Fiscalização
A fiscalização da disciplina estabelecida no presente diploma cabe aos serviços competentes do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais.Presidência do Conselho de Ministros, 25 de Junho de 1990.
Aníbal António Cavaco Silva - Luís Francisco Valente de Oliveira - Arlindo Marques de Carvalho - Luís Fernando Mira Amaral - Joaquim Martins Ferreira do Amaral - Fernando Nunes Ferreira Real.
Promulgado em 8 de Novembro de 1990.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 14 de Novembro de 1990.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.
ANEXO
Actividades do anexo III, considerando o disposto no n.º 1 do artigo 7.º doDecreto-Lei 186/90, de 6 de Junho
1 - Agricultura:1.1 - Projectos de emparcelamento rural em áreas de regadio abrangendo uma área superior a 350 ha;
1.2 - Projectos de reconversão para exploração agrícola intensiva de áreas não cultivadas ou áreas seminaturais superiores a 100 ha;
1.3 - Projectos de arborização com espécies de crescimento rápido que incidam sobre áreas superiores a 350 ha ou de que resultem áreas de idêntica ordem de grandeza na continuidade de povoamentos preexistentes das mesmas espécies;
1.4 - Projectos de hidráulica agrícola, associados à regularização de cursos de água permanentes, beneficiando mais de 2500 ha;
1.5 - Exploração de suiniculturas com capacidade igual ou superior a 4000 animais ou 400 porcas reprodutoras;
1.6 - Instalações para exploração intensiva de espécies bovinas com capacidade igual ou superior a 500 cabeças;
1.7 - Instalações para criação de aves de capoeira de acordo com o seguinte:
a) Galinhas reprodutoras e galinhas poedeiras - instalações com capacidade b) Frangos - instalações com capacidade superior a 150000 animais;
c) Patos - instalações com capacidade superior a 75000 animais;
d) Perus - instalações com capacidade superior a 75000 animais;
1.8 - Instalações agro-industriais com capacidade de laboração igual ou superior a 10000 t de matéria-prima por ano;
1.9 - Instalações de abate e ou integradas, destinadas à preparação e transformação de produtos e subprodutos da carne, que processem uma quantidade bruta de carcaça abatida superior a 30000 t por ano.
2 - Indústrias extractivas:
2.1 - Extracção de minerais não metálicos, nem produtores de energia, como o mármore, a areia, o cascalho, o xisto, o sal, os fosfatos a a potassa, cuja área seja superior a 5 ha e ou a produção anual ultrapasse 150000 t;
2.2 - Extracção de minerais energéticos, nas suas diversas formas, em explorações subterrâneas ou a céu aberto, cuja área seja superior a 5 ha e ou a produção anual ultrapasse 150000 t;
2.3 - Extracção de minerais metálicos cuja área seja superior a 5 ha e ou a produção anual ultrapasse 150000 t.
3 - Instalações industriais:
3.1 - Instalações destinadas ao fabrico de cimento;
3.2 - Instalações para a produção ou enriquecimento de combustíveis nucleares;
3.3 - Instalações para a recolha e processamento de resíduos radioactivos;
3.4 - Instalações destinadas à armazenagem de gases inflamáveis com mais de 300 t e de líquidos com mais de 100000 t. Para efeitos de obrigatoriedade do processo de AIA, duas ou mais instalações são consideradas como uma só, desde que os seus perímetros se encontrem a uma distância inferior a 500 m, independentemente de terem ou não o mesmo proprietário;
3.5 - Fabrico de pasta de papel e de papel.
4 - Infra-estruturas:
4.1 - Barragens com altura superior a 15 m contados da base até ao coroamento, ou com volume de armazenamento superior a 100000 m3, ou área da albufeira superior a 5 ha, ou desenvolvimento do coroamento superior a 500 m, ou, ainda, cuja importância e dimensão da obra sejam susceptíveis de ter condições especiais de fundações ou possam pôr em risco populações a jusante;
4.2 - Linhas de transporte de electricidade com tensão superior a 200 kV;
4.3 - Projectos de desenvolvimento urbano que ocupem uma área superior a 10 ha;
4.4 - Oleodutos, gasodutos e outros sistemas similares destinados ao transporte de substâncias inflamáveis, explosivas e corrosivas;
4.5 - Marinas, portos de recreio e docas de recreio.
4.5.1 - Localizados em estuários de rios:
4.5.1.1 - Todos os localizados em áreas protegidas;
4.5.1.2 - Quando não localizados em áreas protegidas, desde que prevejam mais de 100 postos de amarração destinados a embarcações com comprimento fora a fora até 12 m, admitindo-se que até 7% dos postos de amarração se destinem a embarcações com comprimento superior;
4.5.2 - Localizados em rios (com exclusão dos estuários), lagos e albufeiras que prevejam mais de 25 postos de amarração para embarcações com comprimento fora a fora inferior a 6 m, admitindo-se que até 7% desses postos de amarração se destinem a embarcações com comprimento superior;
4.5.3 - Localizados na costa marítima, desde que prevejam mais de 250 postos de amarração destinados a embarcações com comprimento fora a fora inferior a 12 m, admitindo-se que até 7% desses postos de amarração se destinem a embarcações de comprimento superior;
4.6 - Aldeamentos turísticos não incluídos em planos regionais do ordenamento do território, planos directores municipais ou planos de urbanização plenamente eficazes, que ocupem uma área superior a 50 ha ou que prevejam uma ocupação superior a 70 habitantes por hectare ou um índice de construção superior a 0,6 m3/m2;
4.7 - Complexos de instalações hoteleiras e ou meios complementares de alojamento turístico ou outras formas de alojamento turístico não incluídos em planos regionais de ordenamento do território, planos directores municipais ou planos de urbanização plenamente eficazes ou que prevejam o alojamento de mais de 1000 pessoas.