de 8 de Março
A Lei 1/79, de 2 de Janeiro, prevê, no artigo 10.º, n.º 1, que o Governo apresentasse até 30 de Abril de 1979 uma proposta de lei de delimitação e coordenação das actuações da administração central, regional e local em matéria de investimentos. Por razões várias, até ao presente ainda não foi apresentada proposta que obtivesse vencimento.Para suprir tal lacuna surge o presente decreto-lei, elaborado ao abrigo da autorização legislativa concedida através da Lei 10/83, de 6 de Setembro, que não descura os contributos de projectos ou propostas de lei já apresentados em ocasiões anteriores, embora se haja adoptado uma sistemática diferente da habitualmente seguida.
Esta lei, cuja execução em termos práticos se iniciará já em 1984, deve, no entanto, dada a sua complexidade, ter aplicação gradual de molde a poder permitir uma adequada adaptação das estruturas do município ao exercício de novas competências em matéria de investimentos.
Por isso se estabelece que é no Orçamento do Estado que, anualmente, se indicam as novas competências e os meios financeiros que serão transferidos para os municípios e se prevê que os serviços da administração central, no período transitório, garantam o necessário apoio técnico.
O modo e a forma das transferências serão objecto de regulamentação específica para cada uma das novas competências.
Por outro lado, importa salientar que é ao Governo que incumbe a definição das diferentes políticas, bem como o exercício das funções de planeamento, quer a nível global, quer a nível sectorial, prevendo o presente diploma a articulação entre os diferentes níveis decisórios.
Saliente-se, ainda, que às freguesias não são atribuídas competências próprias em matéria de investimentos, unicamente lhes cabendo actuar por delegação da administração municipal.
Finalmente, prevê-se que a aplicação às regiões autónomas da presente lei será regulamentada pelas respectivas assembleias regionais, com as adaptações ditadas pela especificidade regional.
No uso da autorização conferida pela Lei 19/83, de 6 de Setembro, o Governo decreta, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO I
Princípios gerais
Artigo 1.º
(Objecto)
1 - O presente diploma estabelece o regime da delimitação e da coordenação das actuações da administração central e local em matéria de investimentos públicos.2 - A delimitação de actuações consiste na identificação dos investimentos públicos cuja execução cabe, em regime de exclusividade, aos municípios.
3 - A coordenação de actuações consiste na articulação do exercício das competências, em matéria de investimentos públicos, pelos diferentes níveis de administração, quer sejam exercidas em regime de exclusividade quer em regime de colaboração.
Artigo 2.º
(Carácter unitário)
A definição de áreas de investimento público, nomeadamente no que concerne às autarquias locais, não prejudica o carácter unitário da gestão de recursos pela Administração Pública, na prossecução dos fins comuns que pela comunidade lhe são impostos.
(Investimentos públicos)
A realização de investimentos públicos compreende a identificação, a elaboração e a aprovação de projectos, o financiamento e a execução dos empreendimentos, a respectiva manutenção, a gestão e o funcionamento dos equipamentos.
Artigo 4.º
(Actividade privada e cooperativa)
O regime de delimitação de competências definido neste diploma não afecta a actividade das entidades privadas e cooperativas que actuem nos domínios aqui referidos, nem a colaboração e o apoio que lhes possa ser prestado por entidades públicas.
Artigo 5.º
(Articulação com o sistema de planeamento)
As competências em matéria de investimentos públicos que por este diploma são atribuídas aos diversos níveis de administração serão exercidas tendo em conta os objectivos e os programas de acção constantes dos planos de médio e de longo prazo e, ainda, nos termos dos planos anuais reguladores da actividade da administração central e das autarquias locais.
Artigo 6.º
(Competência de planeamento)
1 - É da competência da administração central a elaboração dos planos nacionais de desenvolvimento económico-social e dos planos regionais de ordenamento e a definição das políticas nacionais para os diversos sectores da Administração Pública.2 - É da competência do município a elaboração e aprovação dos planos directores municipais, dos planos gerais e parciais de urbanização e dos planos de pormenor, bem como a delimitação e aprovação de áreas de desenvolvimento urbano prioritário e áreas de construção prioritária, com respeito pelos planos nacionais e regionais e pelas políticas sectoriais referidos no número anterior.
3 - Estão sujeitos à ratificação do Governo os planos directores municipais e os planos gerais e parciais de urbanização, devendo o respectivo acto ser publicado no Diário da República.
4 - Resulta da ratificação, referida no número anterior, a declaração de utilidade pública urgente de expropriação dos prédios e direitos a eles relativos, necessários à realização dos planos, bem como a autorização para a posse administrativa dos mesmos pelo município, caso se verifique, no prazo de 6 meses após aquela ratificação, estarem esgotadas as negociações para a aquisição extrajudicial.
5 - A faculdade conferida ao município nos termos do número anterior caduca se, no prazo de 2 anos a contar da publicação do acto de ratificação, não tiver adquirido os bens por expropriação amigável ou não tiver promovido a constituição da arbitragem.
6 - Relativamente às declarações de utilidade pública de expropriação que hajam caducado nos termos do número anterior, e haja necessidade de renovar, e ainda quaisquer outras declarações de utilidade pública de expropriação e respectiva posse administrativa que se mostrem necessárias ao desenvolvimento normal da actividade dos municípios, fixa-se o prazo de 90 dias para que o ministro competente tome a respectiva decisão.
7 - Quando os prédios ou direitos expropriados não forem aplicados ao fim que determinou a expropriação e ainda no caso de ter cessado a aplicação a esse fim, dá-se a reversão do prédio a favor do expropriado, tendo este direito a ser indemnizado nos termos fixados pela lei.
8 - Mantém-se em vigor, com tudo o que não contrarie o presente artigo, o disposto no Código das Expropriações.
9 - Todos os níveis de administração devem promover a participação dos cidadãos na elaboração das políticas e dos planos respectivos.
Artigo 7.º
(Competência regulamentar)
Compete ao Governo a aprovação de normas e regulamentos gerais relativos à realização de investimentos públicos e respectiva fiscalização, sem prejuízo do exercício da competência regulamentar própria das autarquias locais.
CAPÍTULO II
Das competências em matéria de investimentos públicos
SECÇÃO I
Delimitação
Artigo 8.º
(Competências municipais)
É da competência dos municípios a realização de investimentos públicos nos seguintes domínios:a) Equipamento rural e urbano:
1) Espaços verdes;
2) Ruas e arruamentos;
3) Cemitérios municipais;
4) Instalações dos serviços públicos do município;
5) Mercados municipais;
6) Bombeiros;
b) Saneamento básico:
1) Sistemas municipais de abastecimento de água;
2) Sistemas de esgotos;
3) Sistemas de lixos e limpeza pública;
c) Energia:
1) Distribuição de energia eléctrica em baixa tensão;
2) Iluminação pública urbana e rural;
d) Transportes e comunicações:
1) Rede viária urbana e rural;
2) Rede de transportes colectivos urbanos;
3) Transportes colectivos não urbanos que se desenvolvam exclusivamente na área do município;
e) Educação e ensino:
1) Centros de educação pré-escolar;
2) Escolas dos níveis de ensino que constituem o ensino básico;
3) Residências e centros de alojamento para estudantes dos níveis de ensino referidos no número anterior;
4) Transportes escolares;
5) Outras actividades complementares da acção educativa na educação pré-escolar e no ensino básico, designadamente nos domínios da acção social escolar e da ocupação de tempos livres;
6) Equipamentos para educação de base de adultos;
f) Cultura, tempos livres e desporto:
1) Centros de cultura, bibliotecas e museus municipais;
2) Património cultural, paisagístico e urbanístico do município;
3) Parques de campismo;
4) Instalações e equipamento para a prática desportiva e recreativa de interesse municipal;
g) Saúde:
Artigo 9.º
(Entidades particulares)
É ainda da competência do município aprovar projectos de obras de equipamento social relativas a entidades particulares de interesse municipal e assegurar apoio técnico na respectiva execução, de acordo com as disposições legais aplicáveis.
Artigo 10.º
(Urbanismo e política de solos)
1 - A delimitação de zonas de defesa e controle urbano, de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística, dos planos de renovação urbana de áreas degradadas e de recuperação de centros históricos previstos no Decreto-Lei 794/76, de 5 de Novembro, e no Decreto-Lei 8/73, de 8 de Janeiro, são da competência da câmara municipal, sempre que os respectivos projectos estiverem previstos no programa de gestão urbanística do plano director municipal ou no faseamento do plano de urbanização geral, parcial ou de pormenor devidamente aprovados e ratificados.2 - Na falta de planos, a aprovação compete à assembleia municipal, por proposta da câmara, instruída, quando for o caso, com os pareceres que a lei tornar obrigatórios.
3 - É ainda da competência da câmara municipal a aprovação de planos de pormenor e operações de loteamento, independentemente da sua localização e dimensão, sempre que esteja vigente o plano director municipal ou plano geral de urbanização ou, estando o mesmo em elaboração, existam normas provisórias legalmente aprovadas ou ainda se estiverem abrangidas por áreas de desenvolvimento urbano prioritário ou de construção prioritária.
4 - Fora do caso previsto no número anterior, as operações de loteamento, sempre que, pela sua dimensão ou localização, impliquem alterações significativas das condições ambientais e das infra-estruturas existentes, na área do município ou dos municípios vizinhos, carecem de parecer prévio dos serviços competentes da administração central e, nos casos que taxativamente vierem a ser fixados por decreto-lei, ficam ainda sujeitas à ratificação do Governo.
5 - O Governo regulamentará, no prazo de 90 dias, as competências agora atribuídas aos municípios nos termos dos números anteriores, fixando igualmente os prazos limites para a emissão e ou homologação de pareceres da administração central.
Artigo 11.º
(Delegação de competências na freguesia)
A freguesia pode realizar investimentos referidos no artigo 8.º por delegação do município, devendo este assegurar o respectivo financiamento e o apoio técnico necessário.
SECÇÃO II
Coordenação
Artigo 12.º
(Competências exercidas em regime de colaboração)
1 - As actuações relativas a investimentos públicos não referidos no artigo 8.º devem ser exercidas pela administração central ou pelas autarquias locais, mediante acordo prévio a celebrar com o Governo, e sem qualquer apoio financeiro não previsto na Lei das Finanças Locais ou, ainda, em regime de colaboração nos termos dos números seguintes.
2 - As actuações das autarquias locais, no exercício das competências em regime de colaboração, serão objecto de regulamentação que constará dos contratos-tipo que os departamentos competentes da administração central colocarão, para o efeito, à subscrição voluntária pelas autarquias locais.
3 - Concomitantemente com a divulgação de cada contrato-tipo referido no número anterior serão fixados, prevendo a eventualidade de o montante disponível para o programa ser insuficiente para todos os pedidos de subscrição, os critérios de selecção dos municípios interessados.
4 - Os acordos de que resulte o desenvolvimento das competências, em regime de colaboração com uma ou mais autarquias, compreenderão o modo da sua participação na elaboração dos planos nacionais e na gestão dos equipamentos ou dos serviços públicos correspondentes, bem como as formas de informação sobre o exercício destas competências.
5 - Poderá o Ministério do Trabalho e Segurança Social, através dos centros regionais de segurança social, realizar acordos com os municípios, tendo em vista a execução de investimentos na respectiva área, nomeadamente em relação a creches, jardins-de-infância, centros de dia e lares para idosos.
CAPÍTULO III
Normas finais e transitórias
Artigo 13.º
(Titularidade do património)
1 - O património e os equipamentos eventualmente afectos a investimentos públicos que agora ficam a cargo das autarquias locais constituem, salvo acordo em contrário, património da autarquia, devendo as transferências a que houver lugar processar-se sem qualquer indemnização e mediante a celebração de protocolos.2 - Para efeitos do disposto no número anterior, salvo acordo em contrário, a titularidade dos contratos de arrendamento, porventura existentes, transfere-se para as autarquias sem dependência de quaisquer formalidades.
Artigo 14.º
(Novas competências dos municípios em matéria de investimentos públicos)
1 - O exercício de novas competências pelos municípios em matéria de investimentos públicos previsto no artigo 8.º será progressivo, devendo o Orçamento do Estado indicar, tendo em atenção o disposto na lei em matéria de atribuições das autarquias locais, as competências e os correspondentes meios financeiros.
2 - Os departamentos da administração central até agora responsáveis pela execução dos investimentos públicos cuja competência passa, nos termos do presente diploma, para os municípios fornecerão a estes últimos todos os planos, programas e projectos que respeitem aos respectivos territórios, bem como, durante o período de transição, o apoio técnico necessário.
Artigo 15.º
(Regulamentação)
A transferência de novas competências em matéria de investimentos públicos será objecto de regulamentação sobre o modo e a forma como se processarão.
Artigo 16.º
(Transferência de pessoal)
A transferência para as autarquias locais de novas competências em matéria de investimentos públicos será, quando for caso disso, acompanhada de uma progressiva transferência de recursos humanos, em termos a definir, em cada situação, por diploma legal específico.
Artigo 17.º
(Empreendimentos em curso)
Os empreendimentos em curso serão concluídos pelas entidades que os iniciaram, salvo acordo expresso em contrário.
Artigo 18.º
(Áreas urbanas)
O disposto no presente diploma não prejudica as competências em matéria de investimentos públicos que forem atribuídas às organizações territoriais.
Artigo 19.º
(Regiões autónomas)
A aplicação do presente diploma às regiões autónomas será regulamentada por decreto das respectivas assembleias regionais com as adaptações justificadas pela especificidade regional.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 2 de Fevereiro de 1984. - Mário Soares - Carlos Alberto da Mota Pinto - António de Almeida Santos - Eduardo Ribeiro Pereira - Ernâni Rodrigues Lopes - José Augusto Seabra - António Manuel Maldonado Gonelha - José Veiga Simão - Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto - António Antero Coimbra Martins - João Rosado Correia - António d'Orey Capucho.
Promulgado em 25 de Fevereiro de 1984.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.
Referendado em 27 de Fevereiro de 1984.
O Primeiro-Ministro, Mário Soares.