A partir do dia 27 de Agosto de tarde este serviço será suspenso durante um periodo indeterminado que se espera curto. Lamento qualquer inconveniente que isto possa causar.

Outros Sites

Visite os nossos laboratórios, onde desenvolvemos pequenas aplicações que podem ser úteis:


Simulador de Parlamento


Desvalorização da Moeda

Acórdão 30/99, de 3 de Fevereiro

Partilhar:

Sumário

Tem por verificada a constitucionalidade e a legalidade do referendo local cuja realização foi deliberada pela Assembleia de Freguesia de Serreleis, na sua sessão de 20 de Dezembro de 1998. (Proc.º n.º 1140/98).

Texto do documento

Acórdão 30/99
Processo 1140/98
Acordam no plenário do Tribunal Constitucional:
1 - O presidente da Assembleia de Freguesia de Serreleis (concelho de Viana do Castelo) requereu ao Tribunal Constitucional, por carta enviada ao seu Presidente, datada de 26 de Dezembro de 1998 e com registo de entrada neste Tribunal de 29 do mesmo mês e ano, a apreciação da constitucionalidade e da legalidade, nos termos do artigo 11.º, n.º 1, da Lei 49/90, de 24 de Agosto (diploma a que, salvo indicação em contrário, se referem todos os preceitos citados), de uma consulta directa a nível local sobre a localização de um campo de jogos (polidesportivo).

Juntou fotocópia da proposta da consulta, subscrita por quatro membros da Assembleia de Freguesia, e da acta 6 da sessão deste órgão autárquico, onde aquela proposta foi aprovada.

D. e A., cumpre decidir.
2 - Com interesse para a decisão da causa, dos autos resulta assente o seguinte:

A - Subscrita por quatro membros da Assembleia de Freguesia de Serreleis, foi elaborada uma «proposta», datada de 18 de Novembro de 1998, nos seguintes termos:

«Considerando que:
1.º A Junta de Freguesia de Serreleis pretende construir um polidesportivo (campo para a prática de diversos jogos) por detrás do Salão Paroquial de Serreleis e em terreno próprio da freguesia e contíguo a este salão;

2.º A construção desse polidesportivo é uma aspiração dos jovens da freguesia de há muitos anos a esta parte;

3.º A publicidade feita ao possível início das obras do polidesportivo provocou uma reacção de oposição à execução de tal obra por parte da Comissão da Fábrica da Igreja Paroquial de São Pedro de Serreleis no local escolhido pela Junta de Freguesia;

4.º Em assembleia extraordinária desta Assembleia de Freguesia, convocada para se pronunciar sobre se deveria construir por detrás do Salão Paroquial, foi deliberado, por unanimidade, submeter a questão da localização a consulta directa dos cidadãos eleitores da freguesia, ou seja, a referendo.

Assim, esta Assembleia delibera, nos termos dos artigos 6.º, n.º 1, 8.º, alínea b), e 10.º da Lei 49/90, de 24 de Agosto, o seguinte:

1.º Consultar os eleitores da freguesia de Serreleis, através de referendo, sobre se o local escolhido pela Junta de Freguesia para a instalação do polidesportivo, por detrás do Salão Paroquial, deve ou não ser mantido;

2.º A pergunta a fazer aos eleitores deve ter o seguinte teor:
'Concorda com a construção de um campo de jogos para desportos diversos (polidesportivo) na parte de trás do Salão Paroquial de Serreleis?

Sim.
Não.'»
B - Em 20 de Dezembro seguinte realizou-se uma reunião ordinária da Assembleia de Freguesia de Serreleis, em que estiveram presentes todos os seus membros, à excepção de um, cuja falta foi devidamente justificada, com a seguinte ordem de trabalhos:

«1 - Aprovação do plano de actividades para noventa e nove.
2 - Deliberação sobre a proposta de referendo para consulta dos eleitores de Serreleis sobre a localização do polidesportivo.

3 - Aprovação da pergunta a fazer aos eleitores.»
C - Apresentada a proposta referida em A à votação da assembleia foi ela aprovada por unanimidade.

D - Igualmente por unanimidade, foi aprovada a pergunta a efectuar na consulta aos eleitores nos seguintes termos:

«Concorda com a construção de um campo de jogos para desportos diversos (polidesportivo) na parte de trás do Salão Paroquial de Serreleis?

Sim.
Não.
3 - Não se verificam irregularidades formais no processo, como se passa a demonstrar.

3.1 - O requerimento foi enviado pelo presidente do órgão competente ao Tribunal Constitucional, no prazo de oito dias a contar da deliberação, conforme estabelece o artigo 11.º, n.º 1, e veio acompanhado do texto da deliberação e da cópia da acta da sessão respectiva, como exige o disposto no n.º 2 do mesmo artigo 11.º

3.2 - A proposta de consulta directa foi, como se viu, apresentada por quatro membros da Assembleia de Freguesia de Serreleis, pelo que se mostra cumprido o disposto no artigo 8.º, alínea b).

Na verdade, de acordo com os dados fornecidos pelo STAPE, in Actualização do Recenseamento Eleitoral - 1997, a freguesia de Serreleis tinha inscritos, em Maio de 1997, 943 eleitores; nos termos do artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei 100/84, de 29 de Março, a Assembleia de Freguesia é composta por sete membros quando o número de eleitores é igual ou inferior a 1000; composta, assim, a Assembleia de Freguesia de Serreleis por sete membros, os quatro proponentes perfazem (e ultrapassam mesmo), o terço exigido pelo citado artigo 8.º, alínea b).

3.3 - Cumprido se mostra também o disposto no artigo 9.º, n.º 1 - a proposta apresentada contém a pergunta (única) a submeter aos eleitores.

3.4 - Datada a proposta de consulta local de 18 de Novembro de 1998 e tomada a deliberação em 20 de Dezembro de 1998, não terá sido cumprido o que prescreve o artigo 6.º, n.º 2 - a deliberação deveria ocorrer no prazo de 15 dias a contar da data da recepção da proposta para realização da consulta.

De todo o modo, não parece que o desrespeito de tal prazo determine a caducidade da proposta; a consagração de um prazo entre a recepção da proposta e a deliberação representará, antes, uma medida favorável ao seguimento da proposta visando obstar a que o órgão competente protele a sua votação.

Nesta medida, tomada efectivamente a deliberação com a aprovação da proposta, degrada-se em não essencial a formalidade, irrelevando o apontado incumprimento.

3.5 - Por último, a deliberação da Assembleia de Freguesia foi tomada à pluralidade de votos, como o impõe o artigo 10.º

4 - Sobre o conteúdo da consulta e a formulação da pergunta aprovada não se vislumbra qualquer inconstitucionalidade e ou ilegalidade.

4.1 - A pergunta a submeter aos eleitores da área da freguesia de Serreleis - se concordam com a construção de um campo de jogos para desportos diversos (polidesportivo) na parte de trás do Salão Paroquial de Serreleis - permite uma resposta inequívoca, pela simples afirmativa ou negativa.

Por outro lado, ela não sugere, explícita ou implicitamente, uma qualquer resposta.

Cumpridos se mostram assim os comandos ínsitos nos n.os 1 e 2 do artigo 7.º
4.2 - Nos termos do artigo 240.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (revisão de 1997) é lícito às autarquias locais «submeter a referendo dos respectivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas competências dos seus órgãos, nos casos, nos termos e com a eficácia que a lei estabelecer».

O preceito corresponde ao do anterior artigo 241.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, deixando, porém, de se qualificar como exclusiva a competência onde, necessariamente, se deveriam inserir as matérias susceptíveis de serem submetidas a referendo.

Teve já o Tribunal Constitucional oportunidade de se pronunciar sobre o sentido desta alteração, concluindo então que «haverá hoje que entender que são matérias de referendo local [...] as da competência meramente consultiva dos órgãos das autarquias locais»; deixou-se, porém, em aberto a questão de saber se, em face da segunda parte do n.º 1 do artigo 240.º da Constituição da República Portuguesa, «se deve ter por implicitamente revogado nessa parte o n.º 1 do artigo 2.º da Lei 49/90 ou se, desaparecido o obstáculo constitucional, a proibição ainda se mantém» (Acórdão 390/98, in Diário da República, 2.ª série, n.º 259, de 9 de Novembro de 1998, a p. 15834).

Também aqui, mas por outras razões, não se afigura decisivo tomar posição sobre uma tal questão, já que a matéria em causa se integra nas atribuições da freguesia e invadida não é a esfera de competência de órgãos de qualquer outro ente público.

Para este efeito, importa, antes do mais, deixar claro que a pergunta a colocar não visa apurar se os eleitores concordam, ou não, com a construção de um campo de jogos (e o investimento público que tal demandaria), mas tão-só com a afectação de um determinado terreno - que, dando por assente o que consta da proposta, se integra no património da freguesia («terreno próprio da freguesia») - a campo de jogos.

Nesta medida, não releva para determinar se a consulta local incide sobre matéria da competência dos órgãos da freguesia a consideração de poderes que se reportem, nomeadamente, à realização do investimento público respeitante à construção do referido campo (cf., v. g., artigos 1.º, n.º 2, 8.º, alínea f) do n.º 4, e 11.º do Decreto-Lei 77/84, de 8 de Março), ao regime de instalação e funcionamento de instalações desportivas de uso público (Decreto-Lei 317/97, de 25 de Novembro) ou de outros relacionados com o ordenamento urbanístico da área em causa.

É função das autarquias locais, nos termos do artigo 235.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, a prossecução de interesses próprios das populações respectivas, interesses esses que «radicam nas comunidades locais, enquanto tais, isto é, que são comuns nos residentes e que se diferenciam dos interesses da colectividade nacional e dos interesses próprios das restantes comunidades locais» (Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., p. 882).

Este princípio fundamental mostra-se concretizado no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei 100/84, de 29 de Março (LAL), que consagra como «atribuição» das autarquias locais «o que diz respeito aos interesses próprios, comuns e específicos das populações respectivas».

O mesmo preceito enumera, a título exemplificativo, alguns desses «interesses», relevando, para o caso, o que respeita à «administração de bens próprios» e à «cultura, tempos livres e desporto».

No que concerne à «administração de bens próprios» - poder inerente à autonomia de uma pessoa colectiva com património próprio -, já o Código Administrativo, no seu artigo 253.º, apontava como atribuição das juntas de freguesia (então único órgão paroquial) deliberar «sobre a administração dos bens próprios da freguesia» (n.º 6).

No âmbito das citadas atribuições, o artigo 15.º, n.º 1, alínea i), da LAL confere à assembleia de freguesia competência para estabelecer as normas gerais de administração do património da freguesia e o artigo 27.º, n.º 1, alínea h), do mesmo diploma atribui à junta de freguesia o poder de prover à administração corrente do património da freguesia.

Com a Lei 23/97, de 2 de Julho, que expressamente reforça as atribuições e competências das freguesias (artigo 1.º), inscreve-se como um dos domínios das atribuições da freguesia o da «cultura, tempos livres e desporto» [artigo 2.º, alínea f)].

Ora, neste quadro de atribuições e competências, a afectação de um bem próprio da freguesia a um certo fim integra-se no poder de administração dos orgãos da autarquia, e a prossecução desse fim, no caso, visando a satisfação de necessidades comuns e específicas da respectiva população na área do desporto, mostra-se legalmente legitimada pelo citado artigo 2.º, alínea f), da Lei 23/97.

A consulta local em apreço incide, deste modo, sobre matérias da competência dos órgãos da freguesia de Serreleis, sendo da competência - no caso, efectivamente exercida - da assembleia de freguesia respectiva a deliberação sobre a sua realização, nos termos do artigo 6.º, n.º 1.

5 - Pelo exposto, e em conclusão, decide o Tribunal Constitucional ter por verificada a constitucionalidade e a legalidade do referendo local cuja realização foi deliberada pela Assembleia de Freguesia de Serreleis na sua sessão de 20 de Dezembro de 1998.

13 de Janeiro de 1999. - Artur Maurício - Messias Bento - Guilherme da Fonseca - Vítor Nunes de Almeida - José de Sousa e Brito - Paulo Mota Pinto - Alberto Tavares da Costa - Bravo Serra - Maria Fernanda Palma - Maria dos Prazeres Beleza - Maria Helena Brito - Luís Nunes de Almeida - José Manuel Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/99659.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1984-03-08 - Decreto-Lei 77/84 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Administração Interna

    Estabelece o regime da delimitação e da coordenação das actuações da administração central e local em matéria de investimentos públicos.

  • Tem documento Em vigor 1984-03-29 - Decreto-Lei 100/84 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Administração Interna

    Revê a Lei n.º 79/77, de 25 de Outubro, que define as atribuições das autarquias locais e competências dos respectivos órgãos.

  • Tem documento Em vigor 1990-08-24 - Lei 49/90 - Assembleia da República

    Estabelece o regime de consultas directas aos cidadãos eleitores a nível local.

  • Tem documento Em vigor 1997-07-02 - Lei 23/97 - Assembleia da República

    Estabelece o regime quadro do reforço das atribuições e competências das freguesias e possibilita a sua livre associação. As competências dos órgãos da freguesia podem ser próprias ou delegadas. Dispõe sobre o financiamento das freguesias e sobre o regime do pessoal que nelas exerça funções. O disposto no nº1 do art 10º produzirá os seus efeitos com a entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para o próximo ano económico.

  • Tem documento Em vigor 1997-11-25 - Decreto-Lei 317/97 - Presidência do Conselho de Ministros

    Estabelece o regime de instalação e funcionamento das instalações desportivas de uso público, independentemente da sua titularidade ser pública ou privada e visar ou não fins lucrativos.

Ligações para este documento

Este documento é referido no seguinte documento (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

O URL desta página é:

Outros Sites

Visite os nossos laboratórios, onde desenvolvemos pequenas aplicações que podem ser úteis:


Simulador de Parlamento


Desvalorização da Moeda