de 21 de Setembro
1. A agricultura está sujeita, mais do que qualquer outra actividade económica, a riscos de vária ordem, entre os quais avultam os ocasionados pelos agentes meteorológicos.Estes riscos, aliados a condicionalismos vários, nomeadamente os resultantes do atraso tecnológico, submetem a agricultura portuguesa a factores de grande insegurança, o que compromete não só o investimento e o progresso do sector como o nível de vida dos agricultores.
A instituição do seguro agrícola de colheitas, prevista neste diploma, vem dar resposta adequada a uma aspiração há muito sentida pelos agricultores portugueses, garantindo a estabilidade dos seus rendimentos.
Pretende-se também, e fundamentalmente, que o seguro agrícola seja um instrumento da política de ordenamento cultural e de melhoria das técnicas produtivas, contribuindo de forma decisiva para o desenvolvimento do sector.
Embora tenha carácter voluntário, admite-se a obrigatoriedade do seguro nos casos que venham a ser legalmente previstos, nomeadamente quando o empresário recorrer ao crédito a curto prazo e a consignação das receitas venha a constituir a forma de garantia prestada. Pretende-se assim criar a segurança necessária para que o investimento se processe, a qual deverá não só abranger o empresário agrícola como a entidade financiadora.
2. A ausência quase total de experiência em matéria de seguro agrícola e a inexistência de elementos técnicos e económicos que permitam quantificar os efeitos dos acidentes meteorológicos aconselham uma grande prudência na fase inicial de instituição do seguro.
Desta forma, é contemplado um número limitado de culturas, as quais representam, contudo, uma parcela importante da produção agrícola nacional.
As culturas a proteger foram seleccionadas entre aquelas que mais contribuem para a substituição de importações - caso dos cereais e das oleaginosas - ou para o incremento das exportações, como é o caso da vinha.
A experiência que entretanto vier a ser colhida e o aperfeiçoamento dos elementos de informação estatística e económica deverão permitir o alargamento progressivo deste tipo de seguro a outras culturas e actividades.
3. O Ministério da Agricultura e Pescas prestará ao sector segurador o apoio técnico de que este careça, nomeadamente habilitando-o com elementos estatísticos, técnicos e económicos que permitam caracterizar regionalmente as culturas abrangidas pelo seguro de colheitas.
O Ministério da Agricultura e Pescas procederá também aos estudos técnicos e económicos que permitam fundamentar o alargamento do seguro, bem como à recolha de elementos que permitam conhecer e quantificar os prejuízos sofridos pelas culturas como resultado da ocorrência de acidentes meteorológicos.
4. Estabelece-se ainda que o Estado venha a bonificar os prémios de seguros de colheitas, por forma que o seu custo seja compatível com a rentabilidade das culturas e a economia das explorações. Os critérios de bonificação terão em conta o ordenamento cultural, a estrutura produtiva das regiões e ainda o nível técnico das explorações agrícolas.
Prevê-se ainda que, de acordo com os mesmos critérios, venham a ser bonificados outros tipos de seguro abrangidos pelo ramo «Agrícola e Pecuário», nomeadamente os respeitantes às espécies pecuárias de maior significado económico.
5. Julga-se preferível, entre várias outras soluções possíveis, que o seguro de colheitas fique a cargo do sector segurador, assumindo, contudo, o Estado, através do MAP, o indispensável apoio técnico e financeiro. São assim aproveitados as estruturas e os meios técnicos e humanos existentes nas empresas seguradoras.
Dado o carácter especial de que se reveste este tipo de seguro, comete-se ao Instituto Nacional de Seguros a definição, regulamentação e coordenação do regime a observar pelo sector segurador.
6. É criado, através deste decreto-lei, o Fundo de Compensação do Seguro de Colheitas, que funcionará junto do Instituto Nacional de Seguros.
As receitas deste Fundo são constituídas essencialmente por uma dotação anual do Orçamento Geral do Estado e destinam-se a compensar parte dos prejuízos sofridos pelas empresas seguradoras que aderirem ao pool de seguros de colheitas. Caberá também a este Fundo a bonificação dos prémios de seguros.
Considera-se indispensável o apoio financeiro a prestar ao sector segurador através do Fundo agora criado. Efectivamente, o seguro de colheitas é um ramo normalmente deficitário, pelo que o auxílio financeiro do Estado se revela indispensável. É esta, aliás, a situação que ocorre na quase totalidade dos países em que o seguro de colheitas está a cargo das empresas seguradoras.
7. Cumpre-se assim, através deste decreto-lei, o preceito constitucional que determina a obrigação de o Estado promover a criação de um sistema de apoio aos agricultores que «conduza à socialização dos riscos resultantes dos acidentes climatéricos e fitopatológicos imprevisíveis ou incontroláveis».
Efectivamente, o presente diploma, em conjugação com o Decreto-Lei 82/77, de 5 de Março, assegura aos agricultores uma coberta apreciável de alguns dos riscos a que está sujeita a sua actividade. Pretende-se ainda, e com a brevidade possível, alargar o âmbito do presente diploma quanto aos riscos e culturas cobertos, conferindo à agricultura um carácter não mais aleatório do que o das restantes actividades económicas.
O carácter social deste seguro é-lhe conferido pela contribuição de toda a colectividade, através do Orçamento Geral do Estado, e ainda pelo reflexo, que se espera amplamente positivo, que esta medida virá a ter no progresso e modernização da agricultura portuguesa.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º Nas condições do presente diploma, é instituído o seguro agrícola de colheitas, adiante designado por seguro de colheitas, instrumento fundamental da política de ordenamento cultural, de incentivo ao investimento agrícola e à melhoria das técnicas de produção e de protecção dos agricultores.
Art. 2.º O seguro de colheitas abrange o território do continente, prevendo-se o seu alargamento às Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
Art. 3.º O seguro de colheitas tem carácter voluntário, excepto nos casos especialmente previstos por lei.
Art. 4.º - 1 - Na sua fase inicial, o seguro abrangerá as seguintes culturas: trigo, centeio, cevada, aveia, triticale, milho, arroz, cártamo, girassol, tomate, hortícolas em regime de forçagem, vinha e pomíferas.
2 - O seguro cobrirá os riscos de incêndio, raio e explosão, tornados, trombas de água, granizo e geada.
3 - O seguro deverá ser progressivamente alargado a outras culturas e riscos à medida que se disponha dos elementos técnicos e estatísticos suficientes e de acordo com a experiência entretanto colhida.
Art. 5.º - 1 - O seguro garantirá ao agricultor os prejuízos sofridos pelas culturas e que tenham origem em qualquer dos riscos abrangidos pela apólice.
2 - O montante a indemnizar será o correspondente ao valor da produção final, deduzido dos encargos inerentes às operações culturais não efectuadas, e tendo em conta o disposto nos n.os 4 e 5 deste artigo.
3 - Quando o sinistro ocorrer numa fase do ciclo produtivo em que técnica e economicamente seja viável a renovação da cultura ou a implantação de outra de substituição, os prejuízos a indemnizar serão os correspondentes aos encargos suportados até essa data.
4 - Com excepção dos riscos de incêndio, raio e explosão, só serão indemnizáveis 80% dos prejuízos realmente sofridos.
5 - Com excepção dos riscos de incêndio, raio e explosão, haverá uma franquia, a cargo do segurado, de 5% do valor seguro.
Art. 6.º - 1 - Para efeitos do cálculo do valor seguro, bem como o das indemnizações em caso de sinistro, serão consideradas as produções unitárias médias regionais do último decénio e os preços de garantia ou de intervenção, acrescidos de eventuais subsídios, ou, na ausência destes preços, os praticados regionalmente.
2 - Quando as produções declaradas na proposta se afastarem significativamente dos valores médios referidos no número anterior, o segurado deverá facultar adequada comprovação.
Art. 7.º O MAP prestará ao sector segurador o necessário apoio técnico, habilitando-o, designadamente, com elementos que permitam caracterizar regionalmente as culturas e actividades abrangidas por este tipo de seguro.
Art. 8.º O seguro poderá ser efectuado em qualquer companhia de seguros autorizada a explorar o ramo e contratado individual ou colectivamente.
Art. 9.º - 1 - As seguradoras que explorem o ramo «Agrícola e Pecuário» constituirão entre si o pool do seguro de colheitas, com vista à divisão equitativa das responsabilidades assumidas por cada uma.
2 - Caberá ao Instituto Nacional de Seguros definir e regulamentar o regime do pool mencionado no número anterior, coordenando e assegurando o funcionamento dos respectivos serviços.
Art. 10.º - 1 - O Estado bonificará os prémios do seguro agrícola de colheitas segundo critérios que tenham em conta o ordenamento cultural, a estrutura produtiva da região, o nível técnico das explorações e a rentabilidade das culturas.
2 - O Estado poderá ainda bonificar segundo os mesmos critérios os prémios do seguro pecuário, já instituído na actividade seguradora.
3 - As bonificações, a conceder por culturas, regiões e tipos de empresa, serão definidas por espaço conjunto do MAP e do MFP, ouvida a comissão de gestão do Fundo a que refere o artigo 14.º Art. 11.º É criado junto do instituto Nacional de Seguros um fundo de compensação do seguro de colheitas.
Art. 12.º O Fundo de Compensação do Seguro de Colheitas destina-se a:
a) Compensar o pool do seguro de colheitas pelo valor dos sinistros, líquidos das receitas de resseguro cedido, na parte em que excedam em cada ano civil 125% dos prémios, e seus adicionais processados nesse ano;
b) Bonificar os prémios do seguro, nas condições expressas no artigo 10.º Art. 13.º - 1 - Constituem receitas do Fundo:
a) Uma dotação do Orçamento Geral do Estado;
b) 0,3% de todos os prémios e respectivos adicionais processados pelas seguradoras que explorem o ramo «Agrícola e Pecuário», com excepção do ramo «Vidal»;
c) 10% do prémio de todos os seguros de colheitas efectuados sem intervenção do mediador;
d) Quaisquer outras receitas ou dotações;
e) Aplicações financeiras das importâncias correspondentes às dotações e percentagens acima referidas.
2 - A dotação do Orçamento Geral do Estado deve ser anualmente revista, não podendo, no entanto, em caso algum, ser inferior à estabelecida para o ano de 1980.
3 - O saldo que eventualmente se verifique no Fundo transitará para o ano seguinte.
4 - No caso de o Fundo não ter disponibilidades para satisfazer integralmente as suas responsabilidades, será reforçada a dotação do Orçamento Geral do Estado.
Art. 14.º A gestão do Fundo será assegurada por uma comissão de três membros, representantes dos Ministérios da Agricultura e Pescas e das Finanças e do Plano e do Instituto Nacional de Seguros, respectivamente.
Art. 15.º A comissão de gestão do Fundo e o Instituto Nacional de Seguros, como gestor do pool, poderão recorrer, sempre que o entendam necessário, aos serviços regionais do MAP, ao Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica e ao Instituto Nacional de Estatística.
Art. 16.º Será criada uma comissão consultiva do seguro de colheitas, a funcionar no MAP, como órgão consultivo no domínio do seguro agrícola, e que integrará os seguintes elementos:
Três representantes do MAP;
Dois representantes do Ministério das Finanças e do Plano;
Um representante das seguradoras;
Um representante do Instituto Nacional de Estatística;
Um representante do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica;
Dois representantes dos agricultores individuais;
Um representante das cooperativas agrícolas, excepto as de produção;
Um representante das cooperativas agrícolas de produção.
Art. 17.º Os agricultores detentores de apólices do seguro de colheitas beneficiarão prioritariamente dos subsídios a que se refere a alínea a) do artigo 2.º do Decreto-Lei 82/77, de 5 de Março, nos termos que vierem a ser definidos pelo MAP.
Art. 18.º O presente decreto-lei produz os seus efeitos noventa dias após a sua publicação.
Disposições transitórias
Art. 19.º Considera-se como primeiro ano do seguro o período compreendido entre a data da entrada em vigor do presente decreto-lei e 31 de Dezembro de 1980.Art. 20.º A dotação do Orçamento Geral do Estado a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo 13.º será fixada, em relação ao ano de 1980, por forma a cobrir, no mínimo, as bonificações a que se refere o artigo 10.º e uma sinistralidade, a cargo do Fundo, não inferior a 150% dos prémios estimados para o referido ano.
Art. 21.º O presente diploma legislativo será devidamente regulamentado, por despacho conjunto dos Ministérios da Agricultura e Pescas e das Finanças e do Plano, no prazo de sessenta dias após a sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 11 de Julho de 1979. - Carlos Alberto da Mota Pinto - Manuel Jacinto Nunes - Apolinário José Barbosa da Cruz Vaz Portugal.
Promulgado em 6 de Setembro de 1979.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.