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Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 3/2012, de 18 de Abril

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Sumário

Fixa a seguinte jurisprudência: visando o recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, basta, para efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, a referência às concretas passagens/excertos das declarações que, no entendimento do recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas, na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações.

Texto do documento

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2012

Processo 147/06.0GASJP.P1-A.S1 - 3.ª Secção

Fixação de jurisprudência

José Francisco do Nascimento e Flávio Joaquim Teixeira do Nascimento, nos termos dos artigos 437.º e seguintes do Código de Processo Penal, interpuseram recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 2 de Dezembro de 2010, proferido no Recurso Penal registado sob o n.º 147/06.0GASJP.P1, da 4.ª Secção, emergente do processo comum com intervenção de tribunal singular n.º 147/06.0GASJP, do Tribunal da Comarca de São João da Pesqueira, em que por sentença de 17 de Junho de 2009, foram condenados, para além de um outro arguido, e na ausência deste, pela prática de um crime de injúria, p.

p. pelo artigo 181.º, n.º 1, do Código Penal.

Invocam oposição entre a solução deste acórdão, que rejeitou o recurso por si interposto, por considerar não se tratar de verdadeira impugnação de matéria de facto, e a preconizada pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido em 21 de Outubro de 2009, no Recurso Penal n.º 1233/06.1TASTS.P1, da 1.ª Secção, proferido no âmbito do processo comum singular n.º 1233/06.1TASTS, do 1.º Juízo Criminal da Comarca de Santo Tirso, sobre situação alegadamente similar.

Por acórdão de 7 de Setembro de 2011, foi decidido verificarem-se os pressupostos de admissibilidade do recurso, nomeadamente, a oposição de julgados sobre a mesma questão de direito, e ordenado o seu prosseguimento.

Alegaram, nos termos do artigo 442.º, n.º 1, do CPP, os recorrentes e o Ministério Público.

Os recorrentes concluíram assim as alegações (em transcrição integral):

«1 - A falta de indicação dos minutos e segundos das expressões em causa não é de per si motivo bastante para por em crise o recurso apresentado, muito menos se considerarmos, como faz a Veneranda Relação, que tal deve ser feito 'facilitando a indagação a levar a cabo pelo tribunal de recurso [...]'.

2 - A vontade do legislador foi a de impedir as remições (sic) genéricas para a prova gravada susceptíveis de colocar o Tribunal de recurso diante da necessidade de fazer um novo julgamento em matéria de facto.

3 - Os recorrentes concordam inteiramente com a posição plasmada no acórdão fundamento.

4 - Entendem os recorrentes que a jurisprudência deve ser uniformizada no sentido de que o ónus de 'indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação' referido no n.º 4 do artigo 412.º do CPP vai no sentido de que tal segmento normativo se reporta ao consignado em acta quanto ao início e termo da gravação, ficando tal ónus cumprido caso o recorrente junte com a motivação de recurso ou efectue nesta as transcrições dos depoimentos que sustentam a impugnação da matéria de facto, indicando o respectivo depoente, porquanto a partir daquelas transcrições são perceptíveis as passagens da gravação, constantes da documentação da prova, em que se funda a sua impugnação.

5 - Pese embora actual redacção do n.º 4 do artigo 412.º do CPP não imponha já o ónus da transcrição, cremos, muito modestamente, que o recorrente que procede à transcrição dos trechos dos depoimentos em que funda a impugnação cumpre o dever de especificação das concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida.

6 - Por outro lado o dever de indicação das passagens concretas em que se funda impugnação a que alude aquele normativo não especifica de que forma devem essas concretas passagens ser indicadas - se por indicação do minuto e segundo das mesmas ou por transcrição.

7 - Por nós entendemos que em ambas as hipóteses se cumpre o ónus de especificação das concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, permitindo ao Tribunal de recurso a sua análise com desnecessidade da análise de toda a prova testemunhal produzida.

8 - A nosso ver o que a lei impõe é que se indiquem as concretas provas que conduzem a uma decisão diversa da recorrida, devendo o recorrente, em caso de prova gravada, indicar as concretas passagens em que se funda a impugnação, seja indicando os segundos, seja transcrevendo essas passagens.

9 - Em todo o caso a rejeição do recurso, ou a perda do benefício do prazo a que alude o n.º 4 do artigo 411.º do CPP, parece-nos uma solução desajustada e desproporcional.

10 - Se efectivamente for entendido que sobre o recorrente assenta o ónus de indicação dos minutos das passagens então, tendo o recorrente procedido à transcrição, deverá ser notificado para indicar os concretos segundos, já que tal indicação não consubstancia uma modificação do âmbito do recurso.

11 - As garantias de defesa do arguido assim o impõem.

12 - E, reiteramos, a interpretação dada pelo acórdão que se deixa em crise à norma do n.º 4 do artigo 412.º do CPP, é inconstitucional por violação das garantias de defesa dos arguidos, nomeadamente o seu direito ao recurso previsto no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa e do direito de acesso à justiça e aos tribunais constante do n.º 1 do artigo 20.º do mesmo diploma legal.

13 - Impedir nestas circunstâncias o direito de recurso dos arguidos é solução manifestamente gravosa, desproporcional e mesmo inconstitucional - por violação das garantias de defesa dos arguidos, nomeadamente o seu direito ao recurso previsto no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa e do direito de acesso à justiça e aos tribunais positivado no artigo 20.º, n.º 1, do mesmo diploma legal - e contrário ao Estado de Direito Democrático e ao próprio artigo 2.º do Protocolo 7.º da CEDH.

14 - Assim a norma do n.º 4 do artigo 412.º do CPC deve ser interpretada no sentido de as especificações constantes das alínea b) e c) do n.º 3 se mostrarem cumpridas caso o recorrente transcreva as concretas passagens em que funda a sua impugnação da matéria de facto.

Pedem a uniformização de jurisprudência nesse sentido.» Por seu turno, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto concluiu (incluídos os realces):

«7.1 - No que diz respeito ao paradigma do recurso sobre a matéria de facto e respectivo regime, a reforma do Código de Processo Penal introduzida pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto, procedeu, entre as mais relevantes, às seguintes alterações:

a) As declarações prestadas oralmente em audiência passaram a ser obrigatoriamente documentadas, sob pena de nulidade (artigo 363.º, n.º 3);

b) Havendo gravação magnetofónica ou audiovisual, deve ficar consignado na acta o início e o fim de cada declaração (artigo 364.º, n.º 2);

c) Exige-se que a especificação seja feita em relação: (i) aos concretos pontos de facto e (ii) às concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida. E quando as provas tiverem sido gravadas, as especificações das provas concretas fazem-se por referência ao consignado na acta, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação (artigo 412.º, n.º 3, alíneas a) e b), e n.º 4).

d) Eliminou-se a transcrição, que por razões de fidedignidade era antes um encargo do tribunal;

e) Elevou-se para 30 dias o prazo de interposição do recurso se este tiver por objecto a reapreciação da prova gravada (artigo 411.º, n.º 4).

7.2 - Visando impugnar a matéria de facto resultante da prova gravada, há que interpretar, por isso, o comando normativo contido no n.º 4 do artigo 412.º no sentido de que o que se pretendeu foi impor ao recorrente o ónus de indicar, na respectiva gravação, o momento, o instante onde se encontra o excerto das declarações que pretenda impugnar. A exigência prevista no 1.º segmento do preceito implica que, quanto às especificações das alíneas b) e c) do n.º 3, o recorrente tenha de indicar o momento, o instante, o sinal do suporte magnetofónico onde está o respectivo início e termo. E a do 2.º segmento diz respeito à localização das passagens concretas indicadas naquelas mesmas especificações. Vale por dizer que, estando consignado na acta de julgamento o início e o termo das declarações, o preceito impõe ao recorrente, naquela 1.ª parte o dever de fazer referência a tais indicações (passagens) por referência à acta, e na 2.ª parte o dever de circunstanciar, particularizar, pormenorizar os momentos, os instantes, na gravação, em que se encontram os excertos das declarações. Deveres estes que o recorrente não pode substituir pela mera transcrição de tais excertos.

7.3 - De resto, se é certo que a interpretação da lei não deve cingir-se à sua letra, não é menos certo que a letra da lei é um importante ponto de partida. E, na verdade, note-se que, em termos gramaticais, o vocábulo 'passagens' significa transições, mutações, mudanças. Ou seja, ao vocábulo está associada a ideia de actividade ou movimentação. Ora, fácil é de ver que não é gramaticalmente adequada a utilização da palavra 'passagens' para significar a referência a excertos, partes ou fragmentos de depoimentos/declarações. Consequentemente, se o legislador não quisesse referir-se concretamente à localização do instante, do momento, na gravação, mas, pelo contrário, tivesse admitido também, designadamente em alternativa, a possibilidade de transcrição do conteúdo do excerto ou fragmento das declarações, tê-lo-ia dito claramente, utilizando para tanto um termo apropriado como, por exemplo, que o recorrente deveria e ou poderia 'transcrever ou reproduzir o concreto excerto ou segmento ou parte das declarações em que funda a impugnação'.

7.4 - Ora, tendo em conta que o legislador aboliu a transcrição por razões de celeridade e fidedignidade, e ponderando, também a esta luz, que, como postulam elementares regras de interpretação, a lei não deve conter expressões inúteis, inócuas ou desnecessárias, redundaria em inadmissível contradição valorativa a dimensão interpretativa que apontasse no sentido de se permitir ao recorrente satisfazer aquele ónus apenas com recurso às, 'eliminadas', transcrições, com todas as implicações, em sede daquela fidedignidade e de celeridade, daí resultantes, nomeadamente para o tribunal e em particular nos processos de maior complexidade, como sucede, com frequência, nos casos em que existam dezenas ou centenas de pessoas a ouvir, sejam extensos e prolongados os depoimentos (ocorrendo os respectivos registos em mais do que um suporte magnetofónico), existam muitos recorrentes e sejam inúmeros os factos impugnados e controvertidos.

7.5 - Não pode, por outro lado, ignorar-se que estando em causa a impugnação da matéria de facto que foi produzida e examinada no decurso da audiência, e na qual teve participação activa o próprio sujeito processual que pretende pedir o seu reexame, é bom de ver que seja ele quem está em melhores condições para, no conjunto das declarações produzidas, as localizar temporalmente no suporte magnetofónico, pois conhece desde logo o momento temporal, relativo, em que as mesmas foram colhidas.

7.6 - Ademais, pelas próprias características do recurso em matéria de facto, para que o recorrente, de forma coerente e equilibrada, o possa adequadamente fundamentar, terá, ele próprio, de providenciar pelo acesso aos suportes magnetofónicos a fim de ouvir as declarações em que se funda a impugnação. E a partir daqui, não se vislumbra razão bastante para o dispensar do ónus de indicação, à medida que formula a motivação, das passagens, dos concretos instantes, onde se encontram os excertos que tem por controvertidos.

7.7 - E, como com distinto e, a nosso ver, inexcedível rigor interpretativo, se extrai do Acórdão deste Supremo Tribunal, de 22 de Novembro de 2007, proferido no Processo 9 2706/07-5.9 [e portanto já no domínio de vigência do actual regime], citamos, '[...] uma verdadeira impugnação exige que o impugnante motive ou fundamente concretamente a sua discordância, indicando os pontos de facto que se lhe afigurem mal julgados e apontando as provas concretas que contrariam, neste ou naquele ponto, a decisão tomada pelo tribunal. A exigência de referência aos suportes técnicos tem também como função obrigar o impugnante a materializar com precisão a localização dos pontos impugnados e a fundamentar a sua posição.

Responsabilizando-se o recorrente desta forma, também se facilita o trabalho do tribunal e erradicam-se recursos sem fundamento. Se a lei veio permitir um verdadeiro recurso em matéria de facto, fê-lo com as devidas cautelas, impondo regras e restrições destinadas a evitar a demagogia, a irresponsabilidade e o protelamento das decisões definitivas'.

7.8 - Introduzindo embora com total amplitude a possibilidade de, em recurso, poder ser pedido o reexame da decisão proferida em matéria de facto, o legislador dotou no entanto o respectivo regime dessa impugnação com os instrumentos e cuidados que permitam viabilizar a sua apreciação em tempo útil, com celeridade e de modo a que aquele meio de impugnação não seja banalizado ou utilizado como uma forma de 'entorpecimento da justiça'.

Razão pela qual quis que cada sujeito processual, em cada momento em que lhe compete intervir, colabore com os demais sujeitos e com o próprio tribunal de recurso, de molde a viabilizar, também em tempo útil, uma adequada e, na medida do possível, célere administração dessa justiça. E com esse desiderato introduziu, assim, regras mais ou menos apertadas, mas de todo o modo não excessiva ou desproporcionadamente onerosas para o recorrente, de modo a, ainda assim, não inviabilizar ou dificultar, de forma intolerável, o seu direito de recorrer.

7.9 - Como, de resto, a este propósito pode ler-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 140/2004 '[...] o legislador processual pode definir os requisitos adjectivos para o exercício do direito ao recurso, incluindo o ónus ou formalidades que não sejam desproporcionadas e visem uma finalidade processualmente adequada, sem que tal definição viole o direito ao recurso constitucionalmente consagrado. Ora, é manifestamente este o caso das exigências constantes do artigo 412.º, n.º 3, alínea b), e n.º 4 do Código de Processo Penal, cujo cumprimento (incluindo a referência aos suportes técnicos com indicação da cassete em causa e da localização nesta da gravação das provas em questão) não é desproporcionada e antes serve uma finalidade de ordenamento processual claramente justificada'.

7.10 - Contudo, se o recorrente, não cumprindo embora, de forma adequada, o ónus previsto naquele n.º 4 do artigo 412.º, ainda assim especifica na sua motivação aqueles concretos pontos de facto e aquelas concretas provas (posto que o faça através da indicação do nome das testemunhas e da transcrição das declarações sobre as quais incidem tais pontos), nem por isso o objecto do recurso deixa de ficar suficientemente circunscrito e o tribunal em condições de compreender o exacto âmbito e alcance do recurso.

Pelo que inexiste neste caso falta, substancial, de impugnação da matéria de facto, mas antes, apenas, uma imperfeita ou deficiente forma de sua exposição ou condensação. Como se diz no Acórdão deste STJ de 1 de Julho de 2010 - [publicado na a (STJ), 2010, t. ii, p. 218] - , "e um recorrente, tendo embora indicado os pontos concretos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e as provas que impõem decisão diversa, com a indicação, nomeadamente, das testemunhas cujos depoimentos incidiram sobre tais pontos, que expressamente indicou, só lhe faltando indicar as 'concretas passagens das gravações em que se funda a impugnação que imporia decisão diversa', não se pode dizer que há uma total falta de especificações, mas, quando muito, uma incorrecta forma de especificar".

7.11 - Por isso, essa deficiência, não implicando descaracterização do recurso como visando o reexame da matéria de facto, não pode também, de todo, equivaler à falta de impugnação, motivo pelo qual redundaria numa solução normativa desproporcionadamente violadora do princípio das garantias de defesa, mormente do direito ao recurso, constitucionalmente tutelado, a eventual rejeição liminar de um tal recurso em matéria de facto, sem dar previamente ao recorrente, nos termos expressamente densificados, aliás, no n.º 3 do artigo 417.º do CPP, a possibilidade de fazer aquelas indicações em falta - que se traduzem tão só, como é sabido, na especificação de elementos que devem constar da acta da audiência [início e termo das declarações], e na concretização, na gravação, dos momentos concretos onde se encontram as declarações, as quais, de resto, o recorrente tomou a iniciativa de transcrever.» Propõe-se, pois, que o Conflito de Jurisprudência seja resolvido nos seguintes termos:

«I - Nos termos do artigo 412.º, n.os 3 e 4, e para os efeitos do prazo previsto no artigo 411.º, n.º 4, ambos do CPP, o recorrente, no recurso em que vise impugnar a matéria de facto resultante da prova gravada, tem o ónus de fazer as especificações previstas nas alíneas a) e b) do n.º 3 por referência ao consignado na acta, indicando o início e o termo das declarações, e ainda de concretizar, na gravação, os momentos, os instantes onde podem ser ouvidos os excertos das declarações em que funda a sua impugnação.

II - A mera transcrição, pelo recorrente, dos referidos excertos das declarações configura uma imperfeita forma de proceder àquelas especificações e não substitui as menções que o n.º 4 do artigo 412.º do CPP manda fazer.

III - Não há, porém, nesse caso, lugar à rejeição do recurso sem que o tribunal formule, ao recorrente, prévio convite ao aperfeiçoamento.» Colhidos os vistos, foi realizado o julgamento em conferência pelo Pleno das Secções Criminais, nos termos do artigo 443.º do CPP, cumprindo decidir.

Fundamentação

Reapreciando os pressupostos.

Os recorrentes fundam o presente recurso na oposição entre o acórdão recorrido, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto em 19 de Maio de 2010, e um outro acórdão da mesma Relação, datado de 21 de Outubro de 2009, indicado como acórdão-fundamento, proferidos ambos no domínio da mesma legislação reguladora da impugnação de matéria de facto em processo penal e do prazo de interposição de recurso que tenha por objecto a reapreciação da prova gravada - artigos 411.º, n.º 4, e 412.º, n.º 3, alínea b), e n.º 4, do Código de Processo Penal, na redacção introduzida pela Lei 48/2007, de 25 de Agosto.

Sendo manifesta a sua legitimidade e interesse em agir, uma vez que o recurso apresentado foi rejeitado, bem como a tempestividade do recurso, passemos à questão Da oposição de julgados.

Certo sendo que a decisão tomada na secção criminal sobre a oposição de julgados não vincula o Pleno, que tem competência para reapreciar a verificação dos pressupostos processuais do recurso, há que proceder a esse reexame.

Começando pela análise do que estava em causa em cada um dos acórdãos em confronto, dos contornos das concretas situações versadas e do modo como foram abordadas as questões colocadas.

Em ambos os casos em causa está a impugnação de matéria de facto em processo comum singular em que teve lugar registo da prova produzida, visando a respectiva reapreciação, e a observância do comando do artigo 412.º, n.º 3, alínea b), e n.º 4, do CPP, de modo a ser possível o alongamento do prazo de interposição de recurso de 20 para 30 dias, previsto no artigo 411.º, n.º 4, do CPP.

Há uma diferença de tratamento da questão num e noutro acórdão, a nível processual, que em nada colide com o essencial em discussão.

Referimo-nos ao tempo e modo como a questão foi abordada num e noutro recurso.

No caso do acórdão recorrido teve lugar uma decisão sumária na qual foi decidido rejeitar, por interposto fora de prazo, o recurso apresentado pelos arguidos, a qual foi depois confirmada em acórdão proferido após reclamação para a conferência.

No caso do acórdão fundamento a questão é abordada em apreciação vestibular, face ao entendimento manifestado pelo M.º P.º na Relação do Porto, que sustentara no parecer emitido, que o recurso deveria ser rejeitado por ser extemporâneo, já que o prazo seria de 20 e não 30 dias, em virtude de não ter por objecto a reapreciação da prova gravada, por o recorrente não se ter apoiado na prova gravada para impugnar a matéria de facto, não devendo beneficiar do prazo alargado contemplado no artigo 411.º, n.º 4, do CPP.

Face a esta posição, o acórdão aborda em primeira linha a questão prévia da extemporaneidade do recurso.

Vejamos a forma de abordagem de um e outro dos acórdãos em confronto.

Em ambas as situações os recorrentes, pretendendo impugnar a matéria de facto fixada pelo tribunal singular, não procederam à indicação concreta das passagens em que fundam a impugnação, por reporte ao que constava (ou deveria constar) da acta, quanto ao início e termo da gravação, mas num e noutro caso, especificaram as concretas provas que em seu entendimento impunham uma decisão diversa da recorrida, e acabaram por identificar os depoimentos de que se pretendiam fazer valer e submeter a reexame, identificando quem os prestou e transcrevendo os mesmos, mais especificamente as concretas passagens da prova gravada que conduziriam a esse resultado na motivação.

A diferença entre um e outro dos acórdãos está no grau de exigência no cumprimento da formalidade imposta pelo n.º 4 do artigo 412.º do CPP, na amplitude da oneração, da observância do ónus de especificação das concretas provas gravadas, que impõem decisão diversa da recorrida, por referência ao que consta da acta, com indicação concretizada das passagens em que se funda a impugnação.

A questão central em debate num e noutro dos processos em confronto gira em torno da questão de saber se é de exigir a referência concretizada às passagens que justificam o reexame, referenciando o recorrente necessariamente o que foi consignado na acta, ou se tendo prescindido dessa indicação - suposto que a acta contenha os elementos necessários - será suficiente a transcrição dessas mesmas passagens.

Por outras palavras: transcrever depoimentos (passagens de depoimentos) que imponham solução diversa da adoptada pela decisão impugnada, mas sem o fazer referenciando o consignado na acta, é ainda fazer uma indicação concreta, satisfazendo-se a imposição legal do n.º 4 do artigo 412.º do CPP? Vejamos os pontos concretos em causa de forma mais detalhada.

Acórdão recorrido Este acórdão, proferido na sequência de reclamação de anterior decisão sumária que considerara o recurso extemporâneo, procurou indagar se o recurso visava a efectiva impugnação da matéria de facto, a reapreciação da prova gravada, o que constituía pressuposto do direito de os recorrentes poderem beneficiar da faculdade, excepcional, de o apresentar em 30 dias.

Para melhor percepção transcreve-se a argumentação utilizada.

Fundamenta o acórdão recorrido a posição assumida desta forma (realces nossos):

«O prazo para alegação de recurso não pode ser definido em função do objecto anunciado ou declarado mas do objecto real e verificado do recurso.

Doutra forma, estava encontrada uma maneira fácil de iludir a lei, bastando o recorrente declarar que o recurso tinha por objecto a reapreciação da prova gravada, para obter, sem qualquer controlo, o prazo mais longo dos 30 dias.

Deve-se entender, atendendo à razão de ser da atribuição de um prazo mais extenso, que não é a declaração de intenção de reapreciação da prova gravada que legitima a sua concessão, mas antes e tão só, a sua efectiva concretização, evidenciada através do teor do recurso, pela análise da respectiva motivação e conclusões.

Se o recorrente manifestar a intenção de reapreciação da prova gravada, mas depois, deixar cair essa intenção, na motivação ou, decisivamente, nas conclusões, restringindo-as a outras questões, sem a abordar, não pode deixar de se entender que este recurso teria que ter sido interposto no prazo de 20 dias.

Com efeito não se pode confundir impugnação da matéria de facto - no caso, desde logo, sem o cumprimento dos requisitos contidos no artigo 412.º, n.os 3 e 4, C. P. Penal - com reapreciação da prova gravada. Se esta pressupõe aquela, já aquela não se esgota nesta, no sentido de que se pode impugnar a matéria de facto sem que tal implique necessariamente a reapreciação da prova gravada (com base em outros elementos de prova, que não, de natureza pessoal).

Ora, como se verifica do confronto da motivação com as conclusões do recurso, se é certo que, tem por objecto a reapreciação da prova gravada, não é menos certo que os recorrentes não situaram na gravação, o local dos excertos e segmentos dos depoimentos e das declarações, das concretas provas afinal, que impõem decisão diversa.

O recorrente tem que referenciar as provas que impunham decisão diversa da recorrida aos precisos locais, nos suportes técnicos, onde se encontravam os excertos de que se serviu para fundamentar os seus pontos de vista - como resulta da conjugação dos artigos 412.º, n.os 3, alíneas b) e c), e 4, e 364.º, n.º 2, C. P. Penal.

Defendem os recorrentes que nenhum contributo traz para a reapreciação da prova gravada a indicação da duração de determinado depoimento.

É certo.

Só que não é isso que se pretende, nem foi esse o fundamento da decisão sumária.

Os recorrentes referenciaram os suportes técnicos em que se encontravam as provas, donde pretendem obter decisão diversa, só que o não fizeram sequer de forma genérica para a totalidade dos depoimentos ou declarações, sequer indicando o ponto onde começam e onde acabam os depoimentos, nem como, decisivamente, lhes era imposto, situando o local, o momento concreto dos excertos, dos segmentos dos depoimentos ou declarações que têm a virtualidade por eles pretendida.

A ampla impugnabilidade da decisão de facto não pode tornar ilegítima a imposição ao arguido-recorrente de determinados ónus, no que respeita à delimitação do âmbito do recurso e à respectiva fundamentação - surgindo, aliás, tais ónus legitimados pela necessidade de obviar a uma 'banalização' da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, sem base séria e com objectivos puramente dilatórios.

Assim, é evidentemente legítimo, face ao princípio constitucional das garantias de defesa, cominar ao arguido-recorrente o ónus de, especificar, claramente o âmbito e os motivos da sua dissidência em relação ao decidido na 1.ª instância - apontando e especificando quais os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais as provas que, na sua óptica, foram erradamente valoradas pelo julgador, indicando concretamente as passagens em que se funda a impugnação, por referência ao consignado na acta relativamente ao início e termo da gravação de cada declaração.

Este encargo mais não representa do que impor ao recorrente o normal ónus de fundamentar, em termos concludentes, o recurso que interpôs: é que, bem vistas as coisas, tal ónus de motivar ou fundamentar, em termos concludentes, um recurso que visa precisamente demonstrar e convencer que ocorreu determinado erro na valoração das provas só pode considerar-se satisfatoriamente cumprido se o recorrente começar por demonstrar, na sua alegação, quais foram as provas relevantes e qual foi o resultado probatório delas emergente. Na verdade, pretender impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto sem proceder a uma expressa e concreta referenciação das provas realmente produzidas em audiência e a uma análise crítica da sua valoração pelo julgador - tendo em conta o teor efectivo e completo dos depoimentos produzidos - não traduzirá seguramente exercício fundado e adequado do 'direito ao recurso', que não comporta a possibilidade de vagas, genéricas e indemonstradas imputações de erros de julgamento à decisão do tribunal colectivo (sic) incidente sobre a matéria de facto.

Obviamente que este tipo de encargo só se aplica a quem recorre, por ser quem pretende demonstrar e convencer que ocorreu determinado erro na valoração das provas.» Após referir a dimensão constitucional do problema, diz ainda o acórdão:

«Independentemente da questão de saber se é exigível um qualquer particular (e, qual), modo de indicação da localização das provas em causa, o certo é que os recorrentes a ela não procederam, de todo, como acabam por reconhecer, argumentando com o argumento manifestamente infundado, do carácter ilegal, incompreensível e oneroso de tal tarefa.

De tudo se conclui que, tendo o recorrente especificado os pontos de facto que considerou incorrectamente julgados e indicado as concretas provas que impunham decisão diversa, não os referenciado, contudo, aos respectivos suportes técnicos, nem de uma forma genérica em relação a cada uma das provas, nem pela concretização, indicação das voltas onde começavam e acabavam os depoimentos gravados, nem muito mesmo - como lhe será imposto - localizou com precisão, nos respectivos suportes, os excertos das provas com que foi ilustrando os seus pontos de vista, donde não se pode ter como cumprido, substancialmente o ónus de impugnação que a lei lhe impõe.

No tocante a estes, a referência aos suportes magnéticos só se cumpre com a indicação do n.º de voltas do contador, se a gravação tiver sido feita em cassete, ou do momento, tempo, se gravadas em cd, em que se encontram as passagens dos depoimentos gravados que impõem diferente decisão, não bastando a indicação das rotações ou do tempo correspondentes ao início e ao fim da cada depoimento.

Isto não obstante e apesar de o Tribunal, para decidir, em reapreciação da prova gravada, ter que proceder à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que considere relevantes.

Nem se diga ser excessiva ou despropositadamente oneroso e gravoso, levar a cabo tal tarefa.

Se o recorrente para concretizar, ilustrar e demonstrar o seu raciocínio transcreve as passagens que lhe interessa, ao fazê-lo com base na audição da prova gravada, tem acesso facilitado, imediato e directamente apreensível ao momento, ao local, em que tais afirmações constam do suporte da gravação.

Só tem então que os indicar e situar.

Indicar o minuto e o segundo é o que, com efeito, se exige ao recorrente, sem que tal possa ser considerado como colocando em causa o seu direito ao recurso ou que tal obsta à realização da justiça.

Em conclusão:

Para os recorrentes poderem beneficiar do prazo de 30 dias não basta, alegar, identificar e transcrever na motivação os elementos de prova que exigem decisão diversa da recorrida;

Necessário é, ainda que impugnem a matéria de facto, pela forma prevista nos n.os 3 e 4 do artigo 412.º C. P. Penal, que pretendam a reapreciação da prova gravada e que indiquem concretamente as passagens em que se funda a impugnação, por referência ao consignado na acta - que contém o início e o termo do depoimento - ié, que situem no suporte - assim facilitando a indagação a levar a cabo pelo tribunal de recurso, da gravação o local e o momento em que constam as afirmações em causa;

Assim não tendo ocorrido, no caso concreto, esta derradeira exigência legal, a conclusão óbvia é que o recurso não só não visa a reapreciação da prova, como, nem sequer, no caso, tem por objecto a impugnação da matéria de facto, feita de forma adequada;

deveria, por isso, ter sido interposto dentro do prazo normal dos recursos em matéria penal e que é de 20 dias.

Donde, nada mais se suscitando referir, por absolutamente desnecessário, conclui-se, reafirmando-se e mantendo-se a posição assumida na decisão reclamada.» Adiante-se que, no caso concreto sobre que laborou o acórdão recorrido, no processo donde emergiu, como se colhe das actas de audiência de discussão e julgamento, apenas consta a identificação dos dois arguidos presentes, bem como do assistente, de nove testemunhas e de um interveniente acidental, o juramento legal daquelas, e a indicação de que as declarações e depoimentos prestados foram «gravados através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal», sem qualquer outra indicação, não tendo, por outro lado, sido formulado convite de aperfeiçoamento, nos termos do artigo 417.º, n.º 3, do CPP.

Acórdão fundamento Após referir que a concessão do prazo de 30 dias resultou da revisão de 2007 e dos termos em que se processou, diz o acórdão de 21 de Outubro de 2009 (realces nossos):

«Muito embora seja discutível a opção legislativa de conceder um prazo diferenciado, consoante se impugne a matéria de direito ou a matéria de facto, mediante recurso aos depoimentos gravados, conduzindo muitas vezes a impugnações fictícias da factualidade, sendo antes preferível a existência de um prazo único, o certo é que a lei fixou esse prazo distinto.

O fundamento desta diferenciação residirá na maior dificuldade temporal na impugnação da matéria de facto, quando esteja em causa a invocação da prova gravada, o que implica, como é óbvio, a disponibilização dos seus suportes áudio ou visuais, que será no prazo de 48 horas depois de requerido [101.º, n.º 3] e a sua subsequente audição ou visualização.

E isto porque preceitua-se um autêntico ónus de impugnação a que deve obedecer o reexame da matéria de facto, o qual encontra-se regulado no artigo 412.º, n.º 3, que passa pela indicação dos concretos pontos de facto incorrectamente julgados impugnados [a)], as concretas provas que impõem um julgamento distinto [b)] e as provas que devem ser renovadas [c)].

Mais se acrescenta no n.º 4 deste artigo 412.º, que 'Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do n.º 2 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação' - este último segmento normativo reporta-se ao consignado na acta quanto ao início e termo da gravação.

Mas se em vez da indicação dessa passagem o recorrente procede desde logo à transcrição dos depoimentos em causa, identificando o respectivo depoente [do próprio arguido e das testemunhas D... e E...], deverá ou não considerar-se cumprida a formalidade exigida pelo artigo 412.º, n.º 4, sendo certo que só o recurso e a resposta que tiver por base a reapreciação da prova gravada é que beneficia do prazo de 30 dias [411.º, n.º 4, e 413.º, n.º 2].

Desde logo será de referir que a identificação do que se encontra consignado em acta visa permitir que o tribunal de recurso tenha desde logo acesso à identificação da passagem do depoimento em causa, designadamente o momento da gravação magnetofónica ou áudio - visual [364.º, n.º 1] em que a mesma ficou registada, de modo a ter-se uma percepção célere e imediata do que foi relatado por esse depoente.

Daí que a reforma do processo civil introduzida pelo Decreto-Lei 303/2007, de 24 de Agosto, tenha sido mais feliz do que a do processo penal, ao aditar o artigo 685.º-B, n.º 2, que na sua parte final estipula que 'incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição'.

Aliás e segundo o n.º 4 deste mesmo artigo 685.º-B, 'Quando a gravação da audiência for efectuada através de meio que não permita a identificação precisa e separada dos depoimentos, as partes devem proceder às transcrições previstas nos números anteriores'.

Assim, torna-se claro que a par do disposto no citado artigo 412.º, que impõe um preciso ónus de especificação das conclusões de recurso, tanto versando a matéria de direito [n.º 2], como a matéria de facto [n.º 3], nesta última existe ainda um ónus de discriminação das passagens de gravação, de modo que, com o primeiro, se perceba claramente qual o sentido das pretensões do recorrente e, com o segundo, se identifique a passagem da gravação do depoimento que se pretende fazer valer no reexame dos factos.

Porém, tal exigência legal não pode ser tão implacável ou inflexível que conduza a uma quase impossibilidade de recurso, o qual acabaria por redundar numa preterição do princípio constitucional de acesso ao direito, decorrente do artigo 20.º, n.º 1, da C. Rep. [...]».

Após referir o texto deste preceito e do artigo 32.º, n.º 1, da CRP e a CEDH no seu Protocolo 7 e jurisprudência constitucional sobre o direito ao recurso, avança:

«Daí que não sejam admissíveis, numa perspectiva dos direitos de defesa, as rejeições formais que limitem intoleravelmente, dificultem excessivamente, imponham entraves burocráticos ou restringem desproporcionadamente tal direito.

Por isso e em sede interpretativa do citado artigo 412.º, n.º 2 e n.º 3, afigura-se-nos que está vedado um entendimento mediante o qual se fixem requisitos tão pesados e extensos que, na prática, suprimem esse direito de recurso, quando essa faculdade está legalmente prevista, mormente quando se pretende assegurar de modo pleno as garantias de defesa do arguido.

Assim, quando se perceba efectivamente a norma tida por violada ou a matéria de facto impugnada, mediante uma remissão, expressa ou implícita, para o corpo das alegações ou quando a mesma esteja, de tal modo claro e sem margem para dúvidas, subjacente nas conclusões de recurso, devemos dar por cumprido o correspondente ónus de alegação e de formulação de conclusões.

Aliás, foi este o posicionamento que o STJ chegou já em tempos a consagrar no seu Acórdão de 16 de Junho de 2005.

Convém também ter presente que as actuais gravações em CD identificam desde logo o início e o fim de quem presta o seu depoimento, mediante a identificação deste, sendo muito mais perceptível agora dar conta de quem presta o seu depoimento do que com as anteriores gravações em cassete.

Nesta conformidade caso o recorrente junte com a motivação ou efectue nesta as transcrições dos depoimentos que sustentam a impugnação da matéria de facto, identificando o respectivo depoente, não carece o mesmo de referenciar as especificações constantes da acta de julgamento, porquanto a partir daquelas transcrições são perceptíveis as passagens da gravação, constantes da documentação da prova, em que se funda a impugnação.

Por isso nestes casos não há lugar ao convite ao aperfeiçoamento, por se tratar de acto manifestamente inútil [artigo 147.º C. P. Civil] e muito menos à rejeição do seu recurso, por ser notoriamente desrazoável tal consequência.

O arguido recorrente ao impugnar a matéria de facto na sua motivação acaba por identificar os depoimentos de que se pretende fazer valer, transcrevendo os mesmos, pelo que temos como cumprido o respectivo ónus de especificação imposto pelo artigo 412.º, n.º 4.

Daqui também resulta que o mesmo suscitou o reexame da matéria de facto, mediante a reapreciação da prova gravada, sendo de indeferir a questão prévia suscitada pelo Ministério Público nesta Relação.» Do confronto dos dois acórdãos pode concluir-se que A questão jurídica colocada em um e outro dos acórdãos em confronto é exactamente a mesma, estando-se perante recurso de sentença proferida em processo comum singular, em que os arguidos pretendem impugnar matéria de facto, quando há registo de prova.

Em causa, pois, a interpretação da forma como abordar o tema do grau de exigência a colocar no cumprimento do ónus de especificação do artigo 412.º, n.º 3, alínea b), e n.º 4 e consequente permissão ou não do alongamento de prazo previsto no n.º 4 do artigo 411.º do CPP.

O acórdão recorrido fez uma interpretação mais exigente e considerou ser de chegar ao derradeiro argumento, à última exigência, para ver cumprida a formalidade, como se alcança dos passos seguintes:

«O recorrente tem que referenciar as provas que imponham decisão diversa da recorrida aos precisos locais, nos suportes técnicos, onde se encontravam os excertos de que se serviu para fundamentar os seus pontos de vista;

Tem de indicar o ponto onde começam e onde acabam os depoimentos, situando o local, o momento concreto dos excertos, dos segmentos dos depoimentos ou declarações que têm a virtualidade por eles pretendida;

Impondo-se a necessidade de cominar ao recorrente o ónus de, especificar, claramente o âmbito e os motivos da sua dissidência em relação ao decidido na 1.ª instância - apontando e especificando quais os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais as provas que, na sua óptica, foram erradamente valoradas pelo julgador, indicando concretamente as passagens em que se funda a impugnação, por referência ao consignado na acta relativamente ao início e termo da gravação de cada declaração.

No tocante a estes, a referência aos suportes magnéticos só se cumpre com a indicação do número de voltas do contador, se a gravação tiver sido feita em cassete, ou do momento, tempo, se gravadas em CD, em que se encontram as passagens dos depoimentos gravados que impõem diferente decisão, não bastando a indicação das rotações ou do tempo correspondentes ao início e ao fim da cada depoimento.

Necessário é, ainda que indique concretamente as passagens em que se funda a impugnação, por referência ao consignado na acta - que contém o início e o termo do depoimento - isto é, que situe no suporte da gravação, assim facilitando a indagação a levar a cabo pelo tribunal de recurso, do local e do momento em que constam as afirmações em causa;

Indicar o minuto e o segundo é o que, com efeito, se exige ao recorrente, sem que tal possa ser considerado como colocando em causa o seu direito ao recurso ou que tal obsta à realização da justiça.» O acórdão fundamento, após referir que as actuais gravações em CD identificam o início e o fim do depoimento, não deixando de focar as imposições legais, considera que «a exigência legal não pode ser tão implacável ou inflexível que redunde numa preterição do direito ao recurso, entendendo que caso o recorrente junte com a motivação do recurso ou efectue nesta as transcrições dos depoimentos que sustentam a impugnação da matéria de facto, identificando o respectivo depoente, não carece de referenciar as especificações constantes na acta de julgamento, tendo por cumprido o ónus de especificação imposto pelo artigo 412.º, n.º 4, do CPP e sem necessidade inclusive de apelar ao artigo 417.º, n.º 3, do CPP».

Definida a questão de direito que suscita a pedida fixação de jurisprudência e enunciadas as posições em confronto, cumpre decidir.

Do recurso em matéria de facto e da capacidade cognitiva das relações Para melhor compreensão do sistema actual de recurso em matéria de facto e da capacidade cognitiva das Relações, convirá passar em revista a evolução legislativa que se verificou na matéria, quer no domínio do processo criminal, como do processo civil, não olvidando os contributos jurisprudenciais para a sua solução.

No Código de Processo Penal de 1929, o regime de recursos em processo penal era tributário e dependente do regime de recursos em processo civil, seguindo a forma deste, sendo processado e julgado como o agravo de petição em matéria cível, não existindo regulamentação própria e autónoma, privativa, do processo penal.

De acordo com o corpo do artigo 649.º «Os recursos em processo penal serão interpostos, processados e julgados como os agravos de petição em matéria cível, salvas as disposições em contrário deste código», o que significava a adopção e incorporação/integração das soluções previstas para o recurso no processo civil.

No Código de Processo Penal de 1929, o recurso de matéria de facto estava previsto apenas nos processos correccionais e de polícia correccional (forma processual, entretanto, suprimida em Novembro de 1975, pelo Decreto-Lei 605/75, de 3 de Novembro), mas, totalmente arredado dos processos de querela, face à supremacia e domínio do então consagrado princípio da oralidade.

Na viragem do paradigma.

Entretanto, com o advento do Código de Processo Penal de 1987, passou a ser possível interpor recurso de matéria de facto, em termos amplos, para a Relação, nos novos processos comuns com intervenção de tribunal singular e no processo especial sumário - artigos 427.º e 428.º - podendo a Relação admitir a renovação da prova, nos termos do artigo 430.º Passou então a ser possível ainda recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça, de acórdãos finais proferidos pelo tribunal colectivo, a nível de matéria de facto, em termos muito restritos, com fundamento na verificação dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2 - artigos 432.º, alínea c), e 433.º Face a esta coexistência/confluência/sucessão de regimes legais, no que toca aos processos antigos, natural era que as concretas situações pendentes, ainda não resolvidas, demandassem uma definição.

Na vigência do Código de Processo Penal de 1987, passou a ser discutida a possibilidade de recurso em matéria de facto fixada em deliberações de tribunal colectivo, mas surgindo a então vexata quaestio, num plano de direito intertemporal, com a introdução da discussão do sentido e alcance de norma relativa aos antigos processos de querela, ainda subsistentes, em causa, no fundo, estando o exercício da garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto e a dimensão da capacidade cognitiva das Relações em tal domínio.

Neste contexto, assume óbvio relevo, O artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929 A discussão dos poderes de cognição em matéria de facto pelas relações conduz à análise do artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929.

Para a situação actual de reconhecimento de um duplo grau de jurisdição em matéria de facto, maxime, relativamente a decisões finais de tribunais colectivos e quanto à capacidade cognitiva dos Tribunais das Relações em sede de matéria de facto, contribuiu de forma assinalável a jurisprudência do Tribunal Constitucional incidente sobre o artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929, com a redacção introduzida pelo Decreto com força de lei 20147, de 1 de Agosto de 1931, e após a interpretação dada pelo Assento do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de Junho de 1934, desde logo com os acórdãos n.º 219/89, de 15 de Fevereiro de 1989, e n.º 124/90, de 19 de Abril de 1990, este em sentido contrário daquele, originando por isso o acórdão tirado em Plenário, n.º 340/90, de 19 de Dezembro de 1990, e cuja orientação foi seguida nos acórdãos n.os 23/91, 48/91, 77/91, 187/91, 236/91, 335/91 e 350/91, e depois com o acórdão 401/91, de 30 de Outubro de 1991, in Diário da República, 1.ª série-A, n.º 6, de 8 de Janeiro de 1992, que declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral da norma do artigo 665.º do CPP/1929, na interpretação dada pelo assento de 29 de Junho de 1934, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da CRP, vindo mais tarde a ser declarada a inconstitucionalidade da mesma norma, agora desacompanhada da interpretação do assento, o que foi feito pelo acórdão 190/94, tirado em Plenário, em 23 de Fevereiro de 1994 e publicado no Diário da República, de 12 de Dezembro de 1995, cuja doutrina veio a ser aplicada nos acórdãos n.º 430/94, de 25 de Maio de 1994, n.º 184/96, de 27 de Fevereiro de 1996, e n.º 420/96, de 7 de Março de 1996, sendo de ter em conta ainda o acórdão do STJ de 18 de Dezembro de 1991, produzido no âmbito do processo que conduziu ao sobredito acórdão do Tribunal Constitucional n.º 190/94, que nos termos do artigo 10.º, n.º 3, do Código Civil, veio a «recriar» uma nova norma, no respeito pelo espírito do sistema, e a que se seguiu, em termos idênticos, um outro acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22 de Janeiro de 1992, produzido no âmbito do processo que conduziu ao acórdão do Tribunal Constitucional n.º 264/98, de 5 de Março de 1998.

No âmbito do Código de Processo Penal de 1929, ressaltava a norma do artigo 665.º, pelo seu papel determinante na definição da capacidade cognitiva das relações em sede de recurso.

A Constituição de 1976, entrada em vigor em 25 de Abril de 1976, no artigo 32.º, n.º 1, estabeleceu que «O processo criminal assegurará todas as garantias de defesa».

Entre essas garantias sempre se entendeu que estaria o direito ao recurso.

A nova lei adjectiva penal só surgiu onze anos depois, o que significa a vigência do CPP/1929, ao longo desse período e até 31 de Dezembro de 1987, havendo que regular as situações pendentes com zonas de incompatibilidade entre o regime processual anterior e o novo até pela pendência de processos de querela, forma processual proscrita na nova lei, e que subsistiam em número, pelo menos, não despiciendo.

É nesse contexto que devem ser entendidas as evoluções do problema e as soluções encontradas, sendo a este título elucidativo o facto de a recriação da norma ao abrigo do artigo 10.º, n.º 3, do Código Civil, feita pelos acórdãos do STJ de 1991 e 1992, concitar a aproximação dos novo e antigo regimes (tendo em conta o CPP/1929, o CPP/1987, o CPC/1961 - artigos 712.º, n.º 2, e 729.º, n.º 3 - e os princípios contidos no artigo 32.º da Constituição), e congregando, aproximando e integrando as margens do direito pretérito e das novas concepções, na fusão de um produto intermédio, ou solução de compromisso, como a alusão às soluções de constitucionalidade dos artigos 410.º e 433.º do novo Código e à nova figura do erro notório na apreciação da prova.

Para melhor percepção, convirá contextualizar o quadro normativo então em vigor, dominado pelo artigo 466.º, lido em conjunção com o disposto nos artigos 531.º, 532.º e 536.º, com referência aos artigos 236.º, 436.º e 457.º, § 1.º, todos do CPP/1929.

No domínio do Código de Processo Penal de 1929, os julgamentos em processo de querela eram realizados por tribunais colectivos, com prova produzida oralmente, e organização de quesitos sobre os factos e suas circunstâncias alegados pela acusação e defesa, ou que resultassem da discussão da causa, conforme o artigo 468.º (sobre o conteúdo dos quesitos regia o artigo 494.º e sobre vários outros e específicos quesitos, os artigos 495.º a 501.º), não sendo fundamentadas as respostas aos quesitos - artigo 469.º Os tribunais colectivos e de júri tinham competência para decidir definitivamente, em matéria de facto, havendo lugar a segundo julgamento pelo júri se anulada, por iníqua, a primeira decisão.

Estabelecia o artigo 469.º na versão originária que «O tribunal colectivo julga de facto, definitivamente, segundo a sua consciência, com plena liberdade de apreciação, e de direito, com recurso para a respectiva relação» e após alteração do decreto 20147, de 1 de Agosto de 1931, que «O tribunal colectivo responderá especificadamente a cada um dos quesitos, assinando todos os vogais, sem qualquer declaração».

Segundo o artigo 38.º «Os tribunais colectivos das comarcas julgam de facto, definitivamente, e de direito, com recurso para a Relação, as infracções a que corresponda processo de querela e que por lei não forem exceptuadas da sua competência» e de acordo com o artigo 39.º «Os jurados decidem definitivamente, em matéria de facto, nos crimes políticos não sujeitos a tribunais especiais e nos demais casos previstos na lei». (Estes dois preceitos viriam a ser revogados pelo Decreto-Lei 377/77, de 6 de Setembro).

Estabelecia o artigo 466.º, com a epígrafe (Oralidade) que «O interrogatório do réu, os depoimentos das testemunhas e as declarações dos ofendidos ou outras pessoas, feitos na audiência, serão prestados oralmente, salvo quando a lei determinar o contrário».

Entre as excepções à preponderância da oralidade, para além do caso de segundo julgamento em tribunal do júri - artigo 517.º - estavam na secção iii, os artigos 531.º, 532.º e 536.º - normas específicas do julgamento em processo correccional, como melhor se verá infra, a propósito da «Documentação da prova» - prescrevendo sobre a «produção escrita da prova quando a acusação ou a defesa não prescindem de recurso», os designados «depoimentos escritos», os quais deveriam constar da acta - artigo 457.º, § 1.º - regendo sobre a redacção dos mesmos os artigos 236.º e 436.º Inserto no título ix, «Dos recursos» - artigos 645.º a 672.º - do livro ii, «Do processo», o artigo 665.º do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto 16489, de 15 de Fevereiro de 1929, entrado em vigor no dia 1 de Março do mesmo ano no continente e nas ilhas adjacentes, com a epígrafe (Poderes das Relações), dispunha na versão originária:

«As Relações conhecerão de facto e de direito, nas causas que julguem em 1.ª instância e nos recursos interpostos das decisões proferidas pelos juízes de 1.ª instância e conhecerão só de direito, nos recursos interpostos das decisões finais dos tribunais colectivos e das decisões proferidas nos processos em que intervenha o júri, salvo o disposto no artigo 517.º» Este preceito reportava a recurso no caso de segundo julgamento, perante tribunal de júri e que foi revogado pelo artigo 22.º do Decreto-Lei 605/75, de 3 de Novembro.

O Decreto com força de lei 20 147, de 1 de Agosto de 1931, introduziu nova redacção no preceito, que passou a estabelecer:

«As Relações conhecerão de facto e de direito nas causas que julguem em 1.ª instância, nos recursos interpostos das decisões proferidas pelos juízes da 1.ª instância, das decisões finais dos tribunais colectivos e das proferidas nos processos em que intervenha o júri, baseando-se, para isso, nos dois últimos casos, nos documentos, respostas ao questionário e em quaisquer outros elementos constantes dos autos.» O Assento do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de Junho de 1934, publicado no Diário do Governo, 1.ª série, de 11 de Julho de 1934 (e na Col.

Of., 33.º, 194, e na RLJ, ano 67.º, pp. 92 e segs.), interpretou o normativo do seguinte modo:

«O artigo 665.º do Código de Processo Penal, modificado pelo Decreto 20147, de 1 de Agosto de 1931, relativamente à competência das Relações em matéria de facto, tem de entender-se no sentido de as mesmas Relações só poderem alterar as decisões dos tribunais colectivos de 1.ª instância em face de elementos do processo que não pudessem ser contrariados pela prova apreciada no julgamento e que haja determinado as respostas aos quesitos.» Consagrou-se assim um entendimento restritivo da competência das relações em matéria de facto, na apreciação dos recursos das decisões dos tribunais colectivos, só lhes sendo lícito alterar as decisões da primeira instância quando do processo constassem todos os elementos de prova que lhes serviram de base, ou quando se tratasse de factos plenamente provados, por meio de documentos autênticos. Qualquer elemento de prova produzido perante o colectivo impedia que as Relações alterassem as respostas aos quesitos. (Cf. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal, Anotado e Comentado, Almedina, 4.ª ed., 1980, p. 700).

Os juízos sobre a constitucionalidade do artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929, emitidos pelo Tribunal Constitucional (o Supremo Tribunal de Justiça considerava então não enfermar a norma em questão - na medida em que negava a possibilidade do duplo grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, não assegurando todas as garantias de defesa - de inconstitucionalidade - v. g., acórdão de 21 de Novembro de 1990, processo 41419, in BMJ, n.º 401, p. 437), colocaram-se quanto às versões introduzidas pelos citados Decreto de 1931 e Assento de 1934, estando em causa então a observância do disposto no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República, que até à 4.ª revisão constitucional, de 1997, dispunha que «O processo criminal assegurará todas as garantias de defesa».

Analisando a jurisprudência do Tribunal Constitucional.

O Acórdão 219/89, de 15 de Fevereiro de 1989, da 1.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 148, de 30 de Junho de 1989 (e no BMJ, n.º 384, p. 265), julgou inconstitucional a norma do artigo 665.º, com a sobreposição interpretativa do Assento de 29 de Junho de 1934, «na parte em que determina que as relações, no recurso das decisões condenatórias dos tribunais colectivos criminais, ao conhecerem de matéria de facto, haverão de basear-se exclusivamente nos documentos, respostas aos quesitos e em outros elementos constantes dos autos, a ponto de só lhes ser lícito alterar, a esse nível, aquelas decisões em face de elementos do processo que não tivessem podido ser contrariados pela prova apreciada em julgamento e que houvesse determinado as respostas aos quesitos».

Em tal acórdão, partindo-se do princípio de que a norma do artigo 665.º CPP/1929, na interpretação do Assento de 1934, colocava limitações ao conhecimento, por parte das relações, da matéria de facto, nos recursos interpostos das decisões finais dos tribunais colectivos, punha-se a questão de saber se a mesma infringia ou não o princípio do duplo grau de jurisdição em processo penal.

A este respeito sublinhava-se: «[...] a garantia do duplo grau de jurisdição de mérito, decorrente do princípio de defesa, tal como o firma o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, não pode deixar de valer mesmo face a julgamentos realizados em 1.ª instância por tribunais colectivos».

Concluía-se que tal norma desrespeitava, indiscutivelmente, o princípio constitucional de duplo grau de jurisdição em processo penal condenatório.

Por seu turno, a 2.ª Secção, no Acórdão 124/90, de 19 de Abril de 1990, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 8 de Fevereiro de 1991 (e no BMJ, n.º 396, p. 141), não julgou inconstitucional a norma do artigo 665.º do CPP/1929, com a referida sobreposição do Assento de 1934.

Deste acórdão foi interposto recurso pelo M.º P.º, nos termos do artigo 79.º-D, da Lei 28/82, de 7 de Setembro, com fundamento em divergência entre este acórdão da 2.ª Secção e o referido acórdão 219/89, da 1.ª Secção, a fim de ser alcançada decisão uniformizadora de jurisprudência.

Assim, na sequência da questão colocada, o Acórdão 340/90, de 19 de Dezembro de 1990, proferido em Plenário, no processo 58/89, da 2.ª Secção, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 65, de 19 de Março de 1991 (e no BMJ, n.º 402, p. 169), veio a julgar inconstitucional a norma do artigo 665.º do CPP/1929, na interpretação que lhe foi dada pelo Assento de 29 de Junho de 1934, revogando, nessa parte o acórdão recorrido.

Acolhendo esta orientação, seguiram-se os acórdãos n.º 23/91, de 6 de Fevereiro, e n.º 48/91, de 26 de Fevereiro (referenciado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Março de 1997, processo 45 789, publicado no BMJ, n.º 465, p. 437, que determinou a baixa dos autos ao Tribunal da Relação, cumprindo-lhe jurisprudencialmente criar outra «norma» destinada a suprir a lacuna deixada pela declaração da inconstitucionalidade do artigo 665.º), ambos da 1.ª Secção, e ainda os acórdãos n.º 77/91, de 10 de abril (BMJ, n.º 406, p. 686); n.º 187/91, de 7 de Maio; n.º 236/91, de 23 de Maio (referido infra); n.º 335/91, de 3 de Julho (igualmente referenciado abaixo); e n.º 350/91, de 4 de Julho, todos da 2.ª Secção.

Com esta base jurisprudencial veio a ser proferido, em Plenário de 30 de Outubro de 1991, o Acórdão 401/91, proferido no processo 205/91, da 1.ª Secção, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, n.º 6, de 8 de Janeiro de 1992 (e no BMJ, n.º 410, p. 236), o qual declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral da norma do artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929, na interpretação que lhe foi dada pelo Assento de 29 de Junho de 1934, por violação do disposto no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição.

Mais tarde, veio a ser declarada a inconstitucionalidade do artigo 665.º do CPP de 1929, desacompanhado da interpretação restritiva que lhe foi dada pelo Assento de 29 de Junho de 1934, o que aconteceu no âmbito de acórdãos proferidos pelo mesmo Colectivo do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de Dezembro de 1991 (proferido no processo 40508, publicado no BMJ, n.º 412, p. 378) e de 22 de Janeiro de 1992 (este no processo 41 419, publicado no BMJ, n.º 413, p. 119), e que estão na base, respectivamente, dos acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 190/94, de 23 de Fevereiro de 1994, tirado em Plenário, proferido no âmbito do processo 62/92 e publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 285, de 12 de Dezembro de 1995 (e no BMJ, n.º 434, p. 231) e n.º 264/98, de 5 de Março de 1998, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 9 de Novembro de 1998, p. 15 831.

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Dezembro de 1991 No processo do 3.º Juízo Criminal de Lisboa em que foi proferido este acórdão havia sido já declarada a inconstitucionalidade da norma do artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929, na formulação do Assento de 1934, pelo já referido acórdão do Tribunal Constitucional n.º 236/91, da 2.ª Secção, de 23 de Maio de 1991, que, como vimos, entendera dever seguir o decidido no Acórdão 340/90, de 19 de Dezembro, por não constituir garantia suficiente dos direitos de defesa aludidos no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, quando a prova produzida perante o tribunal colectivo não era reduzida a escrito e as respostas aos quesitos não eram fundamentadas.

Volvido o processo ao Supremo, o acórdão recusou a aplicação da norma do artigo 665.º do CPP 1929, mesmo sem a sobreposição definida pelo assento de 1934, por a considerar «não constitucional», não assegurando todas as garantias de defesa, violando o disposto no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República.

Entendeu então o Supremo Tribunal de Justiça, que face à redacção do preceito, mesmo sem a restrição emergente do assento de 1934, e pois, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto 20 147, de 1 de Agosto de 1931, subsistiam efectivos limites aos poderes cognitivos das relações na apreciação da matéria de facto constante das decisões do colectivo, sendo a norma inaplicável pelos tribunais, optando por preencher a lacuna resultante da decretada inconstitucionalidade, através de norma própria e «criando» então uma nova norma no respeito pelo espírito do sistema (artigo 10.º, n.º 3, do Código Civil).

Na sequência, para integrar a lacuna, o Supremo Tribunal de Justiça recriou a norma do artigo 665.º do CPP/1929, nos termos que abaixo se indicarão, e ordenou a baixa do processo à Relação para conhecer do objecto do recurso, tendo em atenção a norma do artigo 665.º tal como fora formulada.

Desse acórdão foi interposto recurso pelo M.º P.º para o Tribunal Constitucional fundando-se na recusa de aplicação da norma do artigo 665.º, sem a sobreposição do assento de 1934, por violação do disposto no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, tendo aquele Tribunal pelo acórdão 190/94, de 23 de Fevereiro de 1994, tirado em Plenário, proferido no âmbito do processo 62/92 e publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 285, de 12 de Dezembro de 1995 (e no BMJ, n.º 434, p. 231), confirmado o acórdão recorrido e decidido que «A norma constante do artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929, na redacção oriunda do decreto 20147, de 1 de Agosto de 1931, desacompanhada da interpretação emergente do assento de 29 de Junho de 1934, padece de inconstitucionalidade, porquanto subsistem perante ela, as limitações dos poderes das Relações na apreciação da matéria de facto constante das decisões do colectivo que conduziram à inconstitucionalização daquela norma, com a sobreposição interpretativa do citado assento».

A doutrina firmada neste acórdão 190/94 veio a ser aplicada nos acórdãos do mesmo Tribunal n.º 430/94, de 25 de Maio de 1994 (referido infra); n.º 184/96, de 27 de Fevereiro de 1996, proferido em plenário, no processo 416/91, publicado in Diário da República, 2.ª série, n.º 118, de 21 de Maio de 1996 (e BMJ, n.º 454, p. 298), e ainda no n.º 420/96, de 7 de Março de 1996 (cf. referência a este, no acórdão 291/98, de 28 de Abril de 1998, proferido em plenário no processo 58/98, e publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 287, de 14 de Dezembro de 1998).

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Janeiro de 1992 No processo da Comarca de Figueira da Foz que conduziu a este acórdão, havia sido declarada a inconstitucionalidade da norma do artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929, com a sobreposição interpretativa do Assento de 1934, na medida em que limitava os poderes das relações, na apreciação da matéria de facto, nos recursos para si interpostos das decisões do tribunal colectivo pelo já referido acórdão do Tribunal Constitucional n.º 335/91, de 3 de Julho - que entendera igualmente fazer aplicação da jurisprudência firmada pelo citado Acórdão 340/90, que julgara inconstitucional a norma impugnada, na interpretação constante do assento referido.

Volvido o processo ao Supremo, o acórdão recusou a aplicação do artigo 665.º do Código de Processo Penal de 1929, sem a sobreposição interpretativa definida pelo assento de 1934, ou seja, na redacção advinda do Decreto de 1931, por a considerar «não constitucional».

Entendeu então de novo o Supremo Tribunal de Justiça, que face à redacção do preceito, mesmo sem a restrição emergente do assento, subsistiam efectivas limitações dos poderes cognitivos das relações.

Nesse acórdão de 22 de Janeiro de 1992, tal como acontecera no anterior, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu que o citado artigo 665.º, relativamente à competência das relações quanto à reapreciação da matéria de facto acolhida nas decisões dos tribunais colectivos, continuava a estar ferido de inconstitucionalidade, mesmo sem a sobreposição do assento de 29 de Junho de 1934, e não havendo norma para regular o caso concreto, impunha-se ao julgador criar ele próprio a norma adequada, como se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema a fim de integrar a lacuna.

Na recriação da norma, dentro do espírito do sistema, foram tidos em consideração os princípios da chamada «constituição processual criminal», contidos no artigo 32.º da Constituição, pelas normas do Código de Processo Penal de 1929 e do Código de Processo Penal de 1987.

A norma «eleita», em ambos os casos, sem qualquer discrepância, foi, então, enunciada da seguinte forma:

«1 - As Relações conhecerão de facto e de direito nas causas que julguem em 1.ª instância, nos recursos interpostos das decisões proferidas pelos juízes de 1.ª instância, das decisões finais dos tribunais colectivos e das proferidas nos processos em que intervenha o júri, baseando-se para isso, nos dois últimos casos, nos documentos, respostas aos quesitos e em quaisquer outros elementos constantes dos autos, por si só ou conjugados com as regras da experiência comum.

2 - As Relações podem anular as decisões do tribunal colectivo, mesmo oficiosamente, quando reputem deficientes, obscuras ou contraditórias as respostas aos quesitos formulados ou quando considerem indispensável a formulação de outros quesitos, ou quando haja erro notório na apreciação da prova.

3 - As Relações podem determinar oficiosamente a renovação da prova para evitar a anulação da decisão do tribunal colectivo.

4 - A decisão que determinar a renovação da prova é definitiva e fixa os termos e a extensão com que a prova produzida em 1.ª instância pode ser renovada.

5 - Havendo lugar à renovação da prova, intervêm na audiência os juízes do processo, sob a presidência do relator, observando-se, na parte aplicável, o disposto nos artigos 423.º e 430.º do Código de Processo Penal de 1987.» Acrescentou ainda o citado acórdão inovador/recriador alguns esclarecimentos pertinentes - da mesma forma como acontecera em 1991 -, que se passam a transcrever:

«Pela redacção do n.º 1 da norma transcrita, a competência das relações em matéria de facto fica efectivamente alargada em relação à redacção constante do correspondente preceito do Código.

Quanto ao n.º 2 chamou-se directamente ao artigo 665.º os poderes de anulação já contemplados no n.º 2 do artigo 712.º do Código de Processo Civil, aplicáveis subsidiariamente, mas aditando-se o caso de erro notório na apreciação da prova, por inspiração do novo Código de Processo Penal (cf.

artigos 410.º, n.º 2, alínea c) e 428.º, n.º 2).

Relativamente ao n.º 3, introduz-se na norma em causa a inovação da renovação da prova, que caracteriza os poderes das relações na estrutura da nova lei de processo, e que possibilita ao tribunal de recurso fazer reproduzir perante si próprio determinada prova, em vez de ordenar a anulação da decisão recorrida, nos termos previstos no n.º 2.

O n.º 5 limita-se a regular os trâmites da audiência de julgamento de recurso com renovação da prova em termos análogos aos do novo Código de Processo Penal.

Crê-se que, globalmente, a norma enunciada vai ao encontro das mais prementes garantias de defesa constitucionalmente garantidas.

A elas acresce ainda a existência de um grau de recurso das decisões das Relações para o Supremo Tribunal de Justiça, que, embora circunscrito à matéria de direito, pode levar este Tribunal a ordenar a baixa do processo à Relação quando entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito (artigo 729.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente), o que não deixa de constituir certamente uma garantia suplementar quanto ao apuramento da matéria de facto.» O acórdão, tal como no outro caso, ordenou a baixa do processo à Relação para conhecer do objecto do recurso, tendo em atenção a «norma do artigo 665.º do CPP acima formulada».

Desse acórdão foi igualmente interposto recurso pelo M.º P.º para o Tribunal Constitucional na parte em que recusou a aplicação da norma do artigo 665.º, na redacção do decreto com força de lei 20147, de 1 de Agosto de 1931, tendo aquele Tribunal pelo acórdão 430/94, de 25 de Maio de 1994, negado provimento ao recurso, seguindo a jurisprudência estabelecida no supra citado acórdão 190/94.

Seguiu-se o acórdão da Relação de Coimbra, de 27 de Novembro de 1994, que procedeu à reforma da decisão condenatória com base na recriada norma, sendo desta decisão interposto recurso para o STJ que, por acórdão de 18 de Maio de 1995, negou provimento ao recurso, e de que o arguido recorreu para o Tribunal Constitucional.

Nesse recurso estavam em causa as normas constantes dos n.os 1, 2 e 3, do citado preceito criado ad hoc.

Pelo Acórdão 264/98, de 5 de Março de 1998, proferido no processo 636/95, da 2.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 259, de 9 de Novembro de 1998, p. 15831 a 15834, foi decidido «não julgar inconstitucional a norma respeitante aos poderes das relações em matéria de facto nos recursos das decisões penais condenatórias dos tribunais colectivos, criada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Janeiro de 1992, no uso do poder previsto no artigo 10.º, n.º 3, do Código Civil».

Nesse aresto teve-se em conta a identidade substancial entre o recriado artigo 665.º do CPP de 1929 e as normas dos artigos 410.º, n.º 2, e 433.º do CPP de 1987, que não foram julgadas inconstitucionais em vários acórdãos e referindo que o segundo grau de jurisdição em matéria de facto em parte alguma reveste a natureza de um direito potestativo do arguido a ver repetida «sem quaisquer limitações» a prova produzida.

O Acórdão 181/99, de 10 de Março de 1999, proferido no processo 699/98, Diário da República, 2.ª série, n.º 174, de 28 de Julho de 1999, ainda sobre o artigo 665.º, reconstruído pelo acórdão do STJ de 22 de Janeiro de 1992, invocando o aludido acórdão 264/98, atento o conteúdo substancialmente idêntico entre a norma recriada e as dos artigos 410.º, n.º 2, 426.º e 433.º do Código de Processo Penal de 1987 não julgadas inconstitucionais nos acórdãos n.os 234/93, 322/93, 356/93, 141/94, 170/94 e 171/94, conclui que a solução a conferir à questão da conformidade constitucional da norma recriada há-de ser semelhante à que o Tribunal Constitucional tem dispensado àqueloutra questão, com os mesmos fundamentos, concluindo que a norma (ou o complexo normativo) criada pelo STJ não enferma do vício de inconstitucionalidade.

Sobre a questão, embora não conhecendo do recurso, que visava a apreciação de inconstitucionalidade da norma do artigo 665.º reconstruída pelo STJ, na sua função integradora, veja-se o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 291/98, de 28 de Abril de 1998, proferido em plenário, no processo 58/98, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 287, de 14 de Dezembro de 1998, p. 17669 (na sequência do processo onde foram proferidos os acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 420/96, de 7 de Março de 1996, este aplicando a doutrina do acórdão do Tribunal Constitucional n.º 190/94 e do Supremo Tribunal de Justiça, de 10 de Outubro de 1996).

Em sentido diverso, mas em caso inédito de recurso interposto por assistente, o acórdão 71/99, de 3 de Fevereiro de 1999, proferido no processo 484/97, da 1.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 181, de 5 de Agosto de 1999.

Com interesse para a questão vejamos a forma como é regulada a documentação da prova.

O registo da prova produzida em julgamento é essencial como angariação de base para efectivação de reapreciação da matéria de facto.

Dar-se-á conta das alterações legislativas que se verificaram ao longo do tempo, no que reporta ao registo da prova produzida.

No Código de Processo Penal de 1929 No regime do CPP/1929, a regra era a da oralidade, como decorria do artigo 466.º, salvo quando a lei determinasse o contrário.

Nessas excepções, para além do artigo 517.º, ressaltavam as normas dos artigos 531.º e 532.º, normas privativas do processo correccional, prevendo a redução a escrito das provas produzidas oralmente, constando os depoimentos escritos da acta, conforme artigo 457.º, § 1.º, e versando os artigos 236.º e 436.º sobre a redacção dos mesmos.

A documentação da prova estava directamente relacionada com a afirmação do exercício do direito ao recurso, ou renúncia ao mesmo.

Sintomaticamente, a epígrafe do preceito que a previa era exactamente «Renúncia ao recurso».

Integrando o título iv «Do julgamento», com início no artigo 400.º, capítulo ii, «Da audiência de julgamento», secção iii, «Do julgamento em processo correccional» - artigos 528.º a 538.º - estabelecia o artigo 531.º (corpo):

«Antes do interrogatório do réu, o juiz perguntará aos representantes da acusação e da defesa se renunciam ou não ao recurso. Se declararem que prescindem de recurso, os interrogatórios do réu, depoimentos das testemunhas, declarações dos ofendidos e outras pessoas serão verbais; no caso contrário, serão escritos. Esta declaração deverá constar da acta».

Sobre a «Produção escrita da prova quando a acusação ou a defesa não prescindem de recurso», regia o artigo 532.º:

«Quando a acusação ou a defesa declarem que não prescindem do recurso, escrever-se-ão resumidamente na acta da audiência as respostas do réu, os depoimentos das testemunhas e as declarações dos ofendidos e outras pessoas que devam prestá-las.» Tinham em vista tais depoimentos escritos fornecer ao tribunal ad quem elementos para decidir quanto à matéria de facto.

Estabelecia o § 1.º do artigo 457.º, versando sobre a «Acta de audiência de julgamento», que «Os depoimentos das testemunhas e as declarações dos ofendidos e dos réus, quando deverem ser escritos, constarão da própria acta».

Sobre a redacção dos depoimentos escritos regiam os artigos 236.º e 436.º do CPP.

Dispunha o artigo 536.º, «Recurso»:

«Se a acusação ou a defesa tiverem declarado que não prescindem de recurso, poderá recorrer-se da decisão do juiz para a respectiva Relação, que conhecerá da matéria de facto e de direito, e da decisão desta, para o Supremo Tribunal de Justiça, que conhecerá apenas de direito.» Sobre os efeitos inibitórios da declaração de renúncia ao recurso, dispunha o artigo 648.º - corpo - que «A renúncia ao recurso na audiência do julgamento, nos processos em que é permitida por este código, inibe a acusação e a defesa de recorrerem de qualquer despacho ou sentença neles proferidos».

O âmbito deste preceito foi restringido pelo artigo 20.º do Decreto-Lei 605/75, de 3 de Novembro.

No Código de Processo Penal de 1987 Com a reforma do processo penal de 1987, operada pelo Decreto-Lei 78/87, de 17 de Fevereiro (emergindo da lei de autorização 43/86, aprovada em 25 de Julho de 1986, promulgada em 5 de Setembro de 1986, referendada em 8 de Setembro de 1986 e publicada em 26 de Setembro de 1986), entrado em vigor em 1 de Janeiro de 1988 (artigo único da Lei 17/87, de 1 de Junho), foi proclamada a assunção de um novo paradigma, reclamada a autonomia e a auto-suficiência do regime de recursos em processo penal, assumidamente tido como regulação, suficientemente bastante, abrangente, autónoma e tendencialmente privativa do regime de recursos em processo penal, o que viria, de resto, a ser reafirmado ainda no AUJ n.º 9/2005.

No regime processual penal introduzido com o Código de Processo Penal de 1987, ao contrário do que sucedia com o tribunal singular, os acórdãos finais dos tribunais colectivos eram irrecorríveis, no que tange a uma ampla, verdadeira e efectiva reapreciação da matéria de facto.

De acordo com a versão originária e nos termos dos artigos 427.º e 432.º, alínea c), dos acórdãos finais proferidos pelo tribunal colectivo recorria-se directamente para o Supremo Tribunal de Justiça.

Tal recurso visava exclusivamente o reexame da matéria de direito, sem prejuízo do disposto no artigo 410.º, n.os 2 e 3 - artigo 433.º daquele Código.

No tocante à matéria de facto, o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça só podia ter por fundamento os vícios previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP.

Este sistema da então chamada «revista alargada» conferia ao Supremo Tribunal de Justiça poderes de intromissão em aspectos fácticos, mesmo quando o recurso fosse restrito à matéria de direito.

Tal poder de sindicar dados fácticos era, porém, limitado, restrito, parcial, mitigado, exercido de forma indirecta, dentro do condicionalismo estabelecido pelo artigo 410.º; a cognição da matéria de facto cinge-se aos vícios da decisão (e não do julgamento), elencados nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 daquele preceito, a partir do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, não se socorrendo nunca do registo de prova, acaso feito na primeira instância, ao abrigo do artigo 363.º Em tal tipo de intervenção o objecto da reapreciação é a decisão, o texto da decisão, e não o julgamento.

A cognição de matéria de facto pelo Supremo era restrita aos vícios do artigo 410.º, n.º 2, e a renovação da prova era admitida pela Relação a partir da verificação desses vícios e desde que houvesse razões para crer que a renovação, por força da existência daqueles, permitiria evitar o reenvio do processo para novo julgamento.

A modificabilidade da decisão sobre a matéria de facto era possível pela detecção dos vícios decisórios a determinar o reenvio para novo julgamento, ou para o evitar, com a renovação das provas - artigos 430.º e 431.º Inserto no título i, «Dos recursos ordinários», do livro ix, «Dos Recursos», no capítulo iii, «Do recurso perante as relações», estabelecia-se, no que ora importa, o seguinte complexo normativo:

Artigo 427.º (Recurso para a relação) Exceptuados os casos em que há recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça, o recurso da decisão proferida por tribunal de primeira instância interpõe-se para a relação.

Artigo 428.º (Poderes de cognição) 1 - As relações conhecem de facto e de direito.

2 - Sem prejuízo do disposto no artigo 410.º, n.os 2 e 3, a falta da declaração referida no artigo 364.º, n.os 1 e 2, e no artigo 389.º, n.º 2, vale como renúncia ao recurso em matéria de facto.

Vejamos o que então se prescrevia a respeito de documentação.

Integrado no livro vii, «Do julgamento», título ii, «Da audiência», capítulo iv, «Da documentação da audiência», após o artigo 362.º dispor sobre a «Acta» da audiência e seu conteúdo, proclamava o artigo 363.º, como princípio geral de «Documentação de declarações orais»:

«As declarações prestadas oralmente na audiência são documentadas na acta quando o tribunal puder dispor de meios estenotípicos, ou estenográficos, ou de outros meios técnicos idóneos a assegurar a reprodução integral daquelas, bem como nos casos em que a lei expressamente o impuser.» Trata-se de uma disposição datada, de finais da década de oitenta, já ingressado o País na CEE, como emerge da referência aos meios técnicos então concretamente especificados, em que alguns serviços do Estado dispunham de serviços de estenografia e estenotipia, relevantes no caminho daquele ingresso.

A documentação estava então absolutamente dependente da disponibilidade de «meios técnicos», que não só não abundavam, como depois nem sequer eram assegurados com um mínimo de sustentabilidade e credibilidade do sistema, como de resto, aconteceu, pelo menos, no início da década de noventa do século passado, no Palácio de Justiça de Lisboa (obviamente, na área do processo civil).

Muito claro e elucidativo, expressando essa impotência, ausência de disponibilidade de recursos, é nesse sentido o acórdão do STJ de 6 de Março de 1996, recurso n.º 48770, CJSTJ 1996, t. 2, p. 165, proferido quase dez anos transcorridos sobre o ingresso na CEE, quando refere que o artigo 363.º não é uma norma exequível por si mesma, pois que dependente de afectação permanente e institucional do apetrechamento necessário à reprodução integral das declarações, apontando as faltas de saída para a solução que a lei preconizava, desde logo por falta de regulamentação, adiantando não se compreenderem nos «meios técnicos» as máquinas de escrever e os computadores, porque não susceptíveis de reprodução integral das declarações que o preceito prevenia, não se divisando, por outro lado, nos quadros do Estado estenógrafos a requisitar. Restariam, então, os meios de gravação magnetofónica ou audiovisuais, mas adiantando não se conhecer qualquer serviço do Estado capaz de disponibilizar esses meios para o tribunal.

Nesse realista quadro, nos casos de obrigatoriedade de documentação, o juiz ditaria para a acta o que resultasse das declarações prestadas, havendo que socorrer-se da escrita comum, com máquinas de escrever ou computadores.

Neste contexto, o artigo 363.º só podia ser entendido como um programa, uma ideia, a expressão de um desejo, que à época em que foi formulado, não era alcançável/exequível no país que produziu tal norma...

Aliás, a lei de autorização de que emergiu o novo Código não impunha, nem tão pouco concitava a que se fosse muito mais além, atentas as parcas linhas traçadas a propósito dos recursos nas alíneas 70 a 75 do n.º 2 do artigo 2.º, definidor do sentido e extensão da autorização, sendo de anotar a promessa consignada na alínea 76) de «Definição adequada das formas de documentação das declarações orais no julgamento, com a crescente adopção de meios de gravação magnetofónica ou audio-visual, de modo a substituir as formas escritas de reprodução» e na alínea 77) de «modernização dos meios técnicos utilizados para a redacção de actos processuais que tiverem de praticar-se sob a forma escrita[...]».

Maia Gonçalves, no Código de Processo Penal Anotado, 1987, Almedina, dizia então a p. 427 (e a fls. 509 da 5.ª ed., 1992) «Não está no espírito desta norma a sistemática redução a escrito das declarações, com preterição do princípio da oralidade, nomeadamente quando as partes se prestem a facultar os meios técnicos indispensáveis para assegurar a reprodução. Isso significaria a preterição do princípio da oralidade e seria fontes de delongas processuais, que o Código quis afastar. A primeira parte do artigo é uma norma programática, virada ao futuro, e por enquanto inexequível; quanto à segunda desconhecem-se casos (além do do artigo 364.º, conforme aditamento introduzido em 1992) em que a lei exija a documentação das declarações».

De acordo com jurisprudência então dominante - cf. acórdãos do STJ, de 20 de Junho de 1990, processo 40958/3, BMJ, n.º 399, p. 431; de 1 de Julho de 1993, BMJ, n.º 429, p. 465; de 17 de Fevereiro de 1992, processo 42885; de 25 de Março de 1993, processo 43154; de 1 de Julho de 1993, processo 43022; de 30 de Outubro de 1997, processo 456797, BMJ, n.º 470, p. 448; de 17 de Junho de 1998, processo 354/98, BMJ, n.º 478, p.

101; de 12 de Novembro de 1998, processo 383798, BMJ, n.º 481, p. 325 - a documentação da prova oralmente prestada em audiência de julgamento destinava-se a servir como meio de trabalho e orientação do tribunal em sede de deliberação e votação da matéria de facto, não funcionando para efeitos de recurso para o STJ, designadamente para detectar vícios da decisão da matéria de facto.

Ainda de acordo com o último acórdão citado, proferido a poucos dias do início da vigência da reforma de 1998, em que foi reconhecido o duplo grau de jurisdição em matéria de facto, o sistema de revista alargada consagrado nos artigos 410.º e 433.º do CPP, na versão então em vigor, assegurava ao arguido todas as garantias de defesa e preservava o «núcleo essencial» do direito ao recurso em matéria de facto, não sendo exacto que a Constituição consagrasse o duplo grau de jurisdição em matéria de facto no campo penal.

Segundo o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 253/92, Diário da República, 2.ª série, de 27 de Outubro de 1992, aquele registo de prova não tinha no sistema do Código de Processo Penal então vigente a finalidade de permitir ao tribunal de recurso o controlo do julgamento de facto, feito pelo tribunal recorrido.

Artigo 364.º (Audiência perante tribunal singular) 1 - As declarações prestadas oralmente em audiência que decorrer perante tribunal singular são documentadas na acta sempre que, até ao início das declarações do arguido previstas no artigo 343.º, o Ministério Público, o defensor, ou o advogado do assistente declararem que não prescindem da documentação. A declaração fica a constar da acta e aproveita aos restantes sujeitos processuais.

2 - O disposto no número anterior é correspondentemente aplicável às partes civis, no tocante ao pedido de indemnização civil.

Cautelosamente, prevenindo a plausível e relativamente expectável ausência de meios materiais disponíveis, certamente atendendo à realidade do país real, então nos primórdios da integração na CEE, estabelecia desde logo o n.º 3 que «Se não estiverem à disposição do tribunal meios técnicos idóneos à reprodução integral das declarações, o juiz dita para a acta o que resultar das declarações prestadas. É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 100.º, n.os 2 e 3».

Na verdade, não se divisava então no horizonte a introdução nos tribunais de equipamentos técnicos que permitissem o recurso a meios de telecomunicações em tempo real, em simultâneo com a audiência de julgamento, nomeadamente a teleconferência, o que só seria possível em 2000, com a alteração do CPP introduzida pelo Decreto-Lei 200-C/2000 (Diário da República, 1.ª série-A, n.º 288, de 15 de Dezembro de 2000, p.

7342 (18), segunda col., último parágrafo - cf. artigo 318.º, n.os 1 e 5).

Comentando o preceito, Maia Gonçalves no Código de Processo Penal Anotado, 1987, Almedina, p. 428, dizia: «A declaração, feita pelas partes, de que não prescindem de documentação equivale à declaração de que não prescindiam de recurso em matéria de facto, a que aludia o artigo 532.º do CPP de 1929. A documentação, como no regime anterior, destina-se aqui fundamentalmente a facilitar a apreciação da prova pelo tribunal superior, o que não sucede no caso do artigo anterior.» E a propósito do recurso em matéria de facto.

Na versão originária, o artigo 412.º (Motivação do recurso), estabelecendo os requisitos da motivação, em termos mais exigentes do que acontecia com a estruturação das alegações do direito anterior, após o n.º 2 estabelecer regras, absolutamente imperativas, sob pena de rejeição, sobre o recurso versando apenas matéria de direito, no n.º 3 fazia referência aos casos de renovação de prova, nos termos seguintes:

«Quando, nos termos do artigo 430.º, houver lugar a renovação da prova, o recorrente indica, a seguir às conclusões, as provas que entende deverem ser renovadas perante o tribunal de recurso, mencionando em relação a cada uma os factos que se destina a esclarecer e as razões que justificam a renovação.» Por seu turno, dispunha então o artigo 430.º, n.º 1: «Quando deva conhecer de facto e de direito, a relação admite a renovação da prova se se verificarem os vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º e houver razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo.» Como então referia o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de Abril de 1997, in BMJ, n.º 466, p. 227, a regra do duplo grau de jurisdição em matéria de facto no ordenamento nacional era apenas tendencial.

O recurso em matéria de facto, na versão inicial do Código de Processo Penal de 1987, era, assim, admitido mediante a reapreciação através da documentação das declarações prestadas em audiência nos casos de julgamento perante tribunal singular, ou com a renovação da prova.

Assim se manteve o sistema processual penal até à reforma de 1998, diferentemente do que aconteceu no plano do processo civil.

Volvendo agora, após a introdução da reforma do processo penal de 1987, ao regime dos registos de prova produzida em julgamento, como base de recurso em matéria de facto, no plano do processo civil.

O Decreto-Lei 39/95, de 15 de Fevereiro, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, n.º 39/95 (é mesmo coincidência e não lapso), daquela data (objecto de rectificação com a Declaração respectiva, publicada no Diário da República, 1.ª série-A, de 31 de Maio de 1995, 3.º suplemento), alterando o Código de Processo Civil, estabeleceu a possibilidade de documentação ou registo das audiências finais e da prova nelas produzida, definindo a regulamentação da execução da gravação da prova, enquanto meio que permite a constituição de uma base para a reapreciação da decisão em matéria de facto pelo tribunal de recurso.

O diploma, verdadeiramente pioneiro, visou consagrar, na área do processo civil, uma solução legislativa substancialmente inovadora, ao prever e regulamentar a possibilidade de documentação ou registo das audiências finais e das provas nelas produzidas, pondo termo ao peso excessivo que a lei processual então vigente conferia ao princípio da oralidade e concretizando uma aspiração de sucessivas gerações de magistrados e advogados.

A admissibilidade do registo das provas produzidas ao longo da audiência de discussão e julgamento permitiria alcançar um triplo objectivo, de que ressaltava desde logo, como primordial, o de, na perspectiva das garantias das partes no processo, as soluções instituídas implicarem a criação de um verdadeiro e efectivo 2.º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, facultando às partes uma maior e mais real possibilidade de reacção contra eventuais e excepcionais erros do julgador na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto relevante para a solução jurídica do pleito; em segundo lugar, procurando evitar o possível perjúrio do depoente que intencionalmente deturpe a verdade dos factos, e por fim, tendo em atenção considerações de satisfação do tribunal quanto à força persuasiva das decisões e do prestígio da administração da justiça, inviabilizando acusações de julgamento à margem (ou contra) da prova produzida.

O registo das provas permitiria ainda auxiliar de forma relevante o julgador a rever e confirmar no momento da decisão, com maior segurança, as impressões pessoais que foi colhendo ao longo de julgamentos demorados, fraccionados no tempo e comportando a inquirição de numerosos depoentes sobre matérias complexas.

Abrir-se-á aqui um parêntesis para dizer que, no plano do processo penal, o disposto, há então mais de oito anos, no artigo 363.º do CPP/1987, apenas serviria este, para o processo civil, pragmático escopo.

O estabelecimento do reconhecimento desta inovadora garantia das partes, consistente na possibilidade de requerer e obter o integral registo das audiências e a consequente efectividade de um segundo grau de jurisdição na apreciação dos pontos questionados da matéria de facto fixados na primeira instância, conduziu ao desaparecimento da (necessidade da) garantia decorrente da colegialidade da decisão sobre a matéria de facto, com a dispensa da intervenção do tribunal colectivo no processo ordinário [artigo 646.º, n.º 2, alínea c), do CPC], e nos casos excepcionais, em que tal intervenção tivesse sido requerida no processo comum sumário [faculdade comummente exercida no âmbito das acções destinadas à efectivação da responsabilidade civil emergente da eclosão de acidentes de viação (cf. n.º 2 do artigo 462.º do CPC, introduzido pelo Decreto-Lei 242/85, de 9 de Julho, e suprimido pela Lei 3/99, de 13 de Janeiro), e outrora, em acções de despejo (artigo 791.º, n.º 4, do CPC, igualmente suprimido em 1999)].

O diploma, no que ora interessa, alterou os artigos 705.º e 712.º do CPC - artigo 1.º - e aditou, pelo artigo 2.º, os artigos 522.º-A, 522.º-B, 522.º-C e 690.º-A.

O artigo 522.º-A passou a impor o registo dos depoimentos prestados antecipadamente ou por carta.

O artigo 522.º-B, com a epígrafe (Registo dos depoimentos prestados em audiência final) veio permitir que fosse o próprio tribunal a determinar oficiosamente a gravação da audiência, sempre que, apesar das partes terem prescindido da documentação da prova, se entendesse que os interesses da administração da justiça a reclamam, estabelecendo:

«1 - As audiências finais e os depoimentos, informações e esclarecimentos nelas prestados são gravados sempre que alguma das partes o requeira, por não prescindir da documentação da prova nelas produzida, ou quando o tribunal oficiosamente determinar a gravação.

2 - O requerimento a que se refere o número anterior é apresentado nos dez dias subsequentes à notificação prevista no artigo 512.º» O artigo 522.º-C, por seu turno, dispunha sobre a forma de gravação, conferindo prevalência ao sistema sonoro.

Dizia o preceito «A gravação é efectuada, em regra, por sistema sonoro, sem prejuízo do uso de meios audiovisuais ou de outros processos técnicos semelhantes de que o tribunal possa dispor».

O artigo 690.º-A, com a epígrafe (Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão de facto), passou a estabelecer:

«1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, proceder à transcrição, mediante escrito dactilografado, das passagens da gravação em que se funda.

3 - Na hipótese prevista no número anterior, incumbe à parte contrária, sem prejuízo dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, proceder, na contra-alegação que apresente, à transcrição dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente.

4 - O disposto nos n.º s 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 684.º-A.» Este preceito, na altura, mereceu de Abílio Neto na 13.ª edição actualizada do Código de Processo Civil Anotado, o seguinte comentário: «Com o preceituado neste artigo, o legislador conseguiu o feito notável de tornar praticamente inviável o recurso sobre a matéria de facto, após ter consagrado, na lei, um duplo grau de jurisdição sobre o resultado da prova.» A introdução na reforma de Fevereiro de 1995 no Código de Processo Civil do novo artigo 690.º-A veio implicar, naturalmente, por força da imposição do acrescido ónus de especificação, a alteração, pelo artigo 1.º, do mesmo Decreto-Lei 39/95, da alínea a) do n.º 1 do artigo 712.º, «Modificabilidade das decisões», que passou a estabelecer:

«1 - As respostas do tribunal aos quesitos não podem ser alteradas pela Relação, salvo:

a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à resposta ou se, tendo ocorrido gravação de todos os depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690.º-A, a decisão sobre a matéria de facto com base neles proferida.» Por outro lado, o novel/acrescido ónus, imposto ao recorrente, pelo artigo 690.º-A, justificou o possível alargamento do prazo para elaboração e apresentação das alegações de recurso, consentido pelo artigo 705.º, n.º 6, que passou a estabelecer:

6 - Se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada, são acrescidos de 10 dias os prazos referidos nos números anteriores.

Face ao carácter inovador da admissibilidade do registo das audiências e efectividade do segundo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, a impor - naturalmente - a realização gradual por fases e a adaptação aos diferentes operadores judiciários das novas realidades processuais e às suas acrescidas exigências numa primeira fase, o diploma apenas se aplicou aos processos de natureza civil instaurados após a data da sua entrada em vigor (16 de Abril de 1995) e tão só em tribunais de ingresso, onde, segundo a perspectiva do legislador, as repercussões da gravação das audiências seriam presumivelmente menores, atento, desde logo, o volume do serviço, prevendo-se a sua observância sucessiva nos restantes tribunais do País, nos processos de natureza civil instaurados após entrada em vigor de portaria a publicar a partir de 1 de Janeiro de 1996 (artigo 12.º, n.os 2 e 3).

O sistema de registo da prova então introduzido no processo civil manteve-se, permanecendo, no que respeita a este específico ponto, praticamente intocado, pela imensa Reforma de 1995/1996, muito pouco, neste concreto domínio, tendo sido alterado pelo Decreto-Lei 329-A/95, de 12- de Dezembro de 1995 (Diário da República, 1.ª série-A, n.º 285, de 1995, suplemento) e pelo «corrector/revisor» Decreto-Lei 180/96, de 25 de Setembro de 1996 (Diário da República, 1.ª série-A, n.º 223/96).

(Aliás, isso mesmo - leia-se, registo de intocabilidade da grande reforma do processo civil neste preciso domínio - se antevia pela leitura do artigo 7.º da lei de autorização de revisão do Código de Processo Civil - Lei 33/95, de 18 de Agosto -, onde se procedeu à delimitação do quadro das alterações a introduzir no regime de recursos, ao longo das alíneas a) a e), sem uma única referência a recurso de matéria de facto).

Reconhecido o duplo grau de jurisdição em matéria de facto pelo diploma de Fevereiro de 1995, no final desse ano, o legislador avançou para outras perspectivas e abordagens sequenciais, prevendo, inclusive, a sobrecarga que do novo regime adviria para as Relações, ampliando os respectivos poderes com a alteração do artigo 712.º e provendo a questões procedimentais, relacionadas com o tempo dos requerimentos de gravação.

Como consta do preâmbulo do primeiro dos citados reformadores diplomas, a pp. 7780 - (15) da publicação oficial, «[...] a implementação de um verdadeiro segundo grau de jurisdição no âmbito da matéria de facto, já resultante de diploma anteriormente aprovado (exactamente, o citado Decreto-Lei 39/95!), obriga a procurar formas de aligeiramento das tarefas a cargo das Relações nas outras áreas, sob pena de se correr o risco do seu rápido e irremediável afundamento», e, nessa perspectiva, instituiu-se então «a inovadora figura do recurso per saltum da 1.ª instância para o Supremo Tribunal de Justiça [...]», pretendendo-se - ibidem (16) - «com este sistema, propiciar um certo grau de 'especialização funcional' dos tribunais superiores». (sublinhado e intercalação de nossa responsabilidade).

Do mesmo registo, a pp. 7780 (17), pode ler-se:

«Dando mais um passo no sentido de transformar as relações numa verdadeira 2.ª instância de reapreciação da matéria de facto decidida na 1.ª instância, ampliam-se os poderes que o artigo 712.º do CPC lhes confere, permitindo-se excepcionalmente a renovação de meios de prova que se revelem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade material e ao esclarecimento cabal das dúvidas surgidas quanto aos pontos da matéria de facto impugnados.» O Decreto-Lei 329-A/95 procedeu à redefinição do momento de formulação de requerimento da gravação da audiência final, fixando-a, nos termos do artigo 512.º, n.º 1, in fine, para os casos em que não se tivesse realizado audiência preliminar, e para as hipóteses em que houvesse lugar a audiência preliminar, esta destinar-se-ia complementarmente, entre o mais, a «requerer a gravação da audiência final», como passou a prescrever o aditado artigo 508.º-A, n.º 2, alínea c), o que veio a implicar, por seu turno, a reformulação do artigo 522.º-B, retirando o respectivo n.º 2, face ao novo timing estabelecido em função da possibilidade de audiência preliminar.

O diploma alterou a redacção do corpo do n.º 1 e primeiro segmento da alínea a) do artigo 712.º, apenas por força de ajustamento por mudança de paradigma - passando a figurar decisão sobre a matéria de facto e decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa, em vez de respostas aos quesitos - deixando incólume a segunda parte, respeitante a gravação).

O alargamento do prazo para as alegações de recurso, no caso de impugnação de matéria de facto, dantes previsto no artigo 705.º, n.º 6, passou a constar do artigo 698.º, n.º 6, que passou a estabelecer: «Se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada, são acrescidos de 10 dias os prazos referidos nos números anteriores.» (O supra citado Decreto-Lei 180/96, que reviu e aperfeiçoou regimes e formulações acolhidas no diploma de Dezembro de 1995, deixou intocados os preceitos assinalados com interesse para a questão; apenas o artigo 512.º, n.º 1, foi alterado, mas somente em termos de simplificação de texto).

O Decreto-Lei 375-A/99, de 20-09 (Diário da República, 1.ª série-A, n.º 220, de 1999), entrado em vigor em 20 de Outubro de 1999, veio reafirmar a dispensa de colectivo nos processos ordinários, esclarecendo o preâmbulo, no § 2.º, que «Assim, estabelece-se agora, como regra, no processo declarativo comum ordinário, a intervenção do juiz singular na fase do julgamento, condicionando a requerimento das partes a intervenção do tribunal colectivo e mantendo o princípio de que esta fica precludida se alguma das partes tiver requerido a gravação da prova».

Em consonância com esta posição, foram alterados os dois preceitos que previam o anterior necessário requerimento da parte - artigos 508.º-A, n.º 2, alínea c), e 512.º, n.º 1, in fine, - passando a prescrever-se que as partes poderiam requerer «a gravação da audiência final ou a intervenção do colectivo».

Tendo-se verificado em 1995, no âmbito do processo civil, as variadas alterações no regime de recursos e o alargamento do prazo da pretensão recursória ao nível da matéria de facto, nada ocorreu nesta matéria no domínio do processo penal, nomeadamente, com a alteração do Código de Processo Penal, operada pelo Decreto-Lei 317/95, de 28 de Novembro.

A inovação nesta matéria no âmbito do processo penal chegaria apenas em 1998.

Com a Lei 59/98, de 25 de Agosto, entrada em vigor em 1 de Janeiro de 1999, foram alterados, no que ora importa os artigos 364.º, 412.º, 428.º, 431.º e 432.º A alteração do artigo 412.º do Código de Processo Penal visou tornar admissível o recurso para a Relação da matéria de facto fixada pelo Colectivo, dando seguimento à consagração do 2.º grau de jurisdição no julgamento da matéria de facto e possibilidade de recurso nesta matéria, na sequência do aditamento da expressão «incluindo o recurso» da parte final do n.º 1 do artigo 32.º, da Constituição da República, introduzido na 4.ª revisão constitucional, operada pela lei Constitucional 1/97 (Diário da República, 1.ª série, de 20 de Setembro de 2007), que veio criar pela primeira vez no nosso sistema processual penal, um verdadeiro direito a recurso em matéria de facto das decisões do tribunal colectivo, a exercer nas condições e com os requisitos enunciados nos n.os 3 e 4 do aludido preceito, o que viria a ser «confirmado» pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 10/2005, de 20 de Outubro de 2005, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 7 de Dezembro de 2005, o qual estabeleceu a seguinte orientação: «Após as alterações ao Código de Processo Penal, introduzidas pela Lei 59/98, de 25/08, em matéria de recursos, é admissível recurso para o Tribunal da Relação da matéria de facto fixada pelo tribunal colectivo.» (Mais tarde, num outro plano, dissipando dúvidas - desaparecidas em 2007 com a actual redacção do artigo 432.º, n.º 1, alínea c), do CPP - , o acórdão uniformizador de 14 de Março de 2007 n.º 8/2007, Processo 2792/06-5.ª, in Diário da República, 1.ª série, de 4 de Junho de 2007, fixou jurisprudência nos termos seguintes: «Do disposto nos artigos 427.º e 432.º, alínea d), do Código de Processo Penal, este último na redacção da Lei 59/98, de 25 de Agosto, decorre que os recursos dos acórdãos finais do tribunal colectivo visando exclusivamente o reexame da matéria de direito devem ser interpostos directamente para o Supremo Tribunal de Justiça.».) Maia Gonçalves, no Código de Processo Penal Anotado, 9.ª ed., p. 729, alertava então que a lei é aqui particularmente exigente, tratando-se de «matéria a que haverá que prestar particular cuidado, pois o Código denota o intuito de não deixar prosseguir recursos inviáveis ou em que os recorrentes não exponham com clareza o sentido das suas pretensões».

A alteração assentava em dois vectores anunciados na Exposição de Motivos da Proposta de Lei 157/VII, in Diário da Assembleia da República, 2.ª série-A, n.º 27, de 28 de Janeiro de 1998, a saber:

1 - A ampliação dos poderes de cognição das Relações - alínea f) do n.º 16;

2 - O assegurar-se um recurso efectivo em matéria de facto - alínea g) do mesmo n.º 16.

Passou a estabelecer o n.º 3 do artigo 412.º do CPP, na redacção dada pela Lei 59/98, de 25 de Agosto:

«3 - Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar:

a) Os pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As provas que impõem decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas.» E o n.º 4: «Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência aos suportes técnicos, havendo lugar a transcrição.» O n.º 3 já não se refere apenas a renovação da prova e o originário foi desdobrado em três alíneas, fazendo especificação do ónus do recorrente, sendo patente a similitude com o disposto no artigo 690.º-A, n.º 1, do CPC, na redacção de 1995 (DL 39/95).

Artigo 428.º (Poderes de cognição):

1 - As relações conhecem de facto e de direito.

2 - Sem prejuízo do disposto no artigo 410.º, n.os 2 e 3, a declaração referida no artigo 364.º, n.os 1 e 2, ou a falta do requerimento previsto no artigo 389.º, n.º 2, ou no artigo 391.º-E, n.º 2, vale como renúncia ao recurso em matéria de facto.

Absolutamente nova foi a disposição introduzida com o artigo 431.º, fixando as condições em que as relações podem alterar a decisão da 1.ª instância em matéria de facto, pois não havia disposição correspondente (o originário 431.º versava sobre o reenvio do processo), sendo de anotar a grande similitude com o artigo 712.º do CPC, então na versão do Decreto-Lei 39/95, versando igualmente sobre a modificabilidade da decisão de facto.

Com a epígrafe «Modificabilidade da decisão recorrida» passou a estabelecer o novo artigo 431.º:

«Sem prejuízo do disposto no artigo 410.º, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser modificada:

a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que lhe serviram de base;

b) Se, havendo documentação da prova, esta tiver sido impugnada nos termos do artigo 412.º, n.º 3; ou c) Se tiver havido renovação da prova.» Artigo 432.º (Recurso para o STJ):

«Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça:

...

d) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal colectivo, visando exclusivamente o reexame de matéria de direito.» Com a introdução da parte final, ficou claro que a reapreciação por parte do Supremo abrange apenas matéria de direito, deixando de ser possível invocar os vícios do artigo 410.º, n.º 2, como fundamento do recurso.

A partir de 1 de Janeiro de 1999 passou assim a ser possível impugnar (para a Relação) a matéria de facto fixada pelo colectivo de duas formas: a já existente, com fundamento na invocação dos vícios decisórios previstos no n.º 2 do artigo 410.º, mas agora dirigida apenas à Relação, com a possibilidade de sindicar as anomalias ou disfunções emergentes do texto da decisão, e uma outra, com maior amplitude, mais abrangente, porque não confinada ao texto da decisão, possibilitando a sindicância da matéria de facto fixada com base nos elementos de documentação da prova produzida em julgamento, permitindo um efectivo grau de recurso em matéria de facto, mas impondo-se na sua adopção, porque o direito ao recurso ínsito no n.º 1 do artigo 32.º da CRP não é ilimitado, não envolvendo uma irrestrita impugnabilidade das decisões de facto dos tribunais colectivos, a observância de certas formalidades.

Passou a estar nas mãos do recorrente, no caso de acórdão de tribunal colectivo, a definição do tribunal ad quem, recorrendo para o Supremo Tribunal de Justiça no caso de cingir a divergência a matéria de direito e para a Relação no caso de pretender sindicar matéria de facto, e neste caso, optar por uma das duas citadas vias - uma mais restrita, outra mais abrangente -, escolhendo o tipo e âmbito de cognição da matéria de facto por parte da Relação.

A partir de então, o conhecimento da matéria de facto passa a ser feito com maior amplitude, competindo à Relação reapreciar a prova produzida na audiência de julgamento da 1.ª instância, desde que cumpridos determinados ónus.

Vejamos o que passou a prescrever a respeito de documentação.

A documentação passou a ter uma maior amplitude, abrangendo os casos de julgamento na ausência do arguido, nos termos do artigo 334.º, n.º 3, e sendo prevista no novel processo especial abreviado (aditados artigos 391.º-A a 391.º-E), tendo mudado o paradigma no processo comum singular.

Dantes, para haver documentação, era necessária a declaração dos sujeitos processuais no sentido de não prescindirem da mesma, bastando uma declaração que aproveitava aos restantes sujeitos processuais.

A partir da reforma de 1998, a regra passou a ser a documentação, que só não teria lugar, se os sujeitos processuais declarassem, unanimemente, que dela prescindiam, sendo que a documentação teria sempre lugar no caso de ausência do arguido.

Dantes, a imposição de uma tomada de posição, de uma expressa afirmação de pretensão recursiva, a formulação de um requerimento; agora, noutra perspectiva, para o recorrente, mais confortável, a documentação, elevada a regra, que poderá ser afastada, mas exigindo-se unanimidade no afastamento.

Mantém-se a necessidade de requerimento para documentação no processo especial sumário (artigo 389.º, n.º 2), alargado ao processo especial abreviado (aditado artigo 391.º-E, n.º 2), valendo a sua falta, bem como a declaração - unânime - de afastamento no processo comum singular, como renúncia ao recurso em matéria de facto (artigo 428.º, n.º 2, do CPP.).

Permanecendo intocado o artigo 363.º, o artigo 364.º foi alterado, desde logo na epígrafe, denunciando alargamento das hipóteses de gravação.

Artigo 364.º (Audiência perante tribunal singular ou na ausência do arguido) 1 - As declarações prestadas oralmente em audiência que decorrer perante tribunal singular são documentadas na acta, salvo se, até ao início das declarações do arguido previstas no artigo 343.º, o Ministério Público, o defensor ou o advogado do assistente declararem unanimemente para a acta que prescindem da documentação.

2 - O disposto no número anterior é correspondentemente aplicável às partes civis, no tocante ao pedido de indemnização civil.

3 - Quando a audiência se realizar na ausência do arguido, nos termos do artigo 334.º, n.º 3, as declarações prestadas oralmente são sempre documentadas.

4 - (Anterior n.º 3.) Artigo 334.º (Audiência na ausência do arguido em casos especiais e de notificação edital) «1 - ...

2 - ...

3 - Se não for possível notificar o arguido sujeito a termo de identidade e residência do despacho que designa dia para julgamento para a audiência, previsto nos artigos 313.º e 333.º, n.º 2, o arguido é notificado daquela data por editais, com a cominação de que será julgado na ausência caso não esteja presente. É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 335.º, n.º 2.

4 a 9 - ...» Entretanto, em 2000, sobrevieram novas alterações no âmbito do processo civil e do processo penal.

Em primeiro lugar, o Decreto-Lei 183/2000, de 10 de Agosto, in Diário da República, 1.ª série-A, n.º 184, entrado em vigor em 1 de Janeiro de 2001 (artigo 8.º) - na mesma data do infra referido Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro - procurando, em primeira linha, igualmente, combater a morosidade processual, definiu no preâmbulo, a pp. 3888, a propósito de recursos, o seguinte: «Prevê-se ainda que o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento deva ser registado na acta da audiência de julgamento, possibilitando-se assim que as partes possam recorrer da matéria de facto com base na simples referência ao assinalado na acta, devendo o tribunal de recurso proceder à audição e visualização do registo áudio e vídeo, respectivamente, excepto se o juiz relator considerar necessária a sua transcrição, a qual será realizada por entidades externas para tanto contratadas pelo tribunal.» (Realces nossos.) Atenta esta proclamação de intenções, poderá afirmar-se que a imposição de consignação, do registo, na acta de audiência de julgamento, do «início e termo da gravação de cada depoimento» foi encarada na perspectiva de conferir uma «vantagem» para o recorrente, possibilitando-lhe o recurso da matéria de facto com base na simples referência ao que fosse assinalado na acta.

O artigo 1.º do citado decreto-lei alterou a redacção, inter altera, dos artigos 522.º-B, 522.º-C, 646.º e 690.º-A.

O artigo 522.º-B passou a dispor:

«As audiências finais e os depoimentos, informações e esclarecimentos nelas prestados são gravados sempre que alguma das partes o requeira, por não prescindir da documentação da prova nelas produzida, quando o tribunal oficiosamente determinar a gravação e nos casos especialmente previstos na lei.» (A alteração consistiu em aditar a parte final «e nos casos [...]»).

O artigo 522.º-C sofreu a seguinte alteração:

«1 - A gravação é efectuada, em regra, por sistema sonoro, sem prejuízo do uso de meios audiovisuais ou de outros processos técnicos semelhantes de que o tribunal possa dispor.

2 - Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, deve ser assinalado na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento.» (A alteração consistiu em (intro/re) produzir no n.º 1 o anterior corpo do artigo, inovando com o n.º 2).

O artigo 646.º, em termos substanciais, teve apenas a seguinte alteração:

«1 - A discussão e julgamento da causa são feitos com intervenção do tribunal colectivo se ambas as partes assim o tiverem requerido.» Face à manutenção do regime subsistente, impunha-se, face ao disposto nos seguintes n.os 2, 3, 4 e 5, o acordo das partes quanto à possibilidade de intervenção de um tribunal plural, o que não invalidava, caso aquela intervenção operasse, a gravação da prova produzida, o que só poderia significar a adição de um outro elemento de segurança com vista a eventual reapreciação.

O artigo 690.º-A foi modificado nos n.os 2, 3 e 5, passando a estabelecer (em itálico as inovações):

«1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julga;

b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C.

3 - Na hipótese prevista no número anterior, incumbe à parte contrária proceder, na contra alegação que apresente, à indicação dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente, também por referência ao assinalado na acta, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C.

4 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 684.º-A.

5 - Nos casos referidos nos n.os 2 a 4, o tribunal de recurso procederá à audição ou visualização dos depoimentos indicados pelas partes, excepto se o juiz relator considerar necessária a sua transcrição, a qual será realizada por entidades externas para tanto contratadas pelo tribunal.» No mais, foi mantida a extensão de prazo de recurso prevista no artigo 698.º, n.º 6.

Com esta nova versão de 2000 dispensava-se o recorrente de proceder à transcrição das passagens da gravação em que se baseava (imposta pelo anterior n.º 2 do artigo 690.º-A), mas impondo-se-lhe, para além do mais, sob pena de rejeição, a indicação dos depoimentos em que se fundasse, por referência ao assinalado na acta.

E assim, em vez da transcrição, passou a reapreciação pelo tribunal superior, a servir-se da audição ou visualização dos depoimentos indicados pelas partes.

No processo penal não se notou repercussão imediata das alterações processadas em 2000 no regime de recursos em processo civil, muito embora não deixasse a transcrição de constituir causa de morosidade da tramitação do recurso.

Porém, na sequência da lei de autorização legislativa n.º 27-A/2000, de 17 de Novembro (Diário da República, n.º 266, suplemento), surge o Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro (Diário da República, 1.ª série-A, n.º 288, rectificado pela Declaração de Rectificação 9-F/2001, 2.º suplemento, de 31 de março de 2001), entrado em vigor, tal como o supra referido Decreto-Lei 183/2000, em 1 de Janeiro de 2001 (artigo 4.º), adoptando medidas de simplificação e de combate à morosidade processual, alterando, no que ora importa, os artigos 333.º, n.º 2, e 364.º, n.º 3, do CPP.

A documentação de declarações em caso de ausência do arguido passou do artigo 334.º para o 333.º, passando o n.º 2 deste a estabelecer: «2 - Se o tribunal considerar que a audiência pode começar sem a presença do arguido, ou se a falta de arguido tiver como causa os impedimentos enunciados nos n.os 2 a 4 do artigo 117.º, a audiência não é adiada, sendo inquiridas ou ouvidas as pessoas presentes pela ordem referida nas alíneas b) e c) do artigo 341.º, sem prejuízo da alteração que seja necessária efectuar no rol apresentado, e as suas declarações documentadas, aplicando-se sempre que necessário o disposto no n.º 6 do artigo 117.º» E o artigo 364.º:

«...

3 - Quando a audiência se realizar na ausência do arguido, nos termos do artigo 333.º, n.os 1 e 4, as declarações prestadas oralmente são sempre documentadas.» Aqui, apenas mudou a referência ao «artigo 334.º, n.º 3» por «artigo 333.º, n.os 1 e 4».

(Este diploma introduziu a referência a «passagens» no artigo 188.º, n.º 1).

À reforma do processo civil de 2000, no que ora nos importa (as subsequentes alterações introduzidas pela Lei 30-D/2000, de 20 de Dezembro, pelos Decretos-Leis n.os 272/2001, de 13 de Outubro, e 323/2001, de 17 de Dezembro, pela Lei 13/2002, de 19 de Fevereiro, pelos Decretos-Leis n.os 38/2003, de 8 de Março, 199/2003, de 10 de Setembro, 324/2003, de 27 de Dezembro, e 53/2004, de 18 de Março, pela Lei 6/2006, de 27 de Fevereiro, pelo Decreto-Lei 76-A/2006, de 29 de Março, e pela Lei 14/2006, de 26 de Abril, neste segmento nada trouxeram de novo), seguiu-se em 2007 uma grande reforma da arquitectura do sistema de recursos no Código de Processo Civil, com a opção por um sistema unitário de recursos nas 1.ª e 2.ª instâncias.

De acordo com a Lei 6/2007, de 2 de Fevereiro [Diário da República, 1.ª série, n.º 24, pp. 917/8 - Lei de autorização legislativa de alteração dos regimes dos recursos em processo civil e dos conflitos de competência], donde emergiu o Decreto-Lei 303/2007 - a alínea n) do artigo 2.º, definidor do sentido e extensão da autorização, concretizava a modificação no segmento que ora importa, dizendo que consistia na «alteração das regras que regem os ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão de facto, determinando que cabe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, proceder à identificação da passagem da gravação em que funde essa impugnação, com referência aos meios de gravação áudio que permitem uma identificação precisa e separada dos depoimentos, sem prejuízo de as partes poderem proceder à transcrição das passagens da gravação em que se funde a impugnação». (Realces nossos.) E assim, com a versão de 2007 do Código de Processo Civil, introduzida pelo Decreto-Lei 303/2007, de 24 de Agosto (publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 163, em vigor - artigo 12.º - a partir de 1 de Janeiro de 2008), é alterado de forma substancial o regime de recursos, esclarecendo o preâmbulo que a reforma é norteada por três objectivos fundamentais:

simplificação, celeridade processual e racionalização do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, acentuando-se as suas funções de orientação e uniformização da jurisprudência.

É revogado o artigo 690.º-A, do CPC [artigo 9.º, alínea a)].

É republicado em anexo (artigo 10.º) o capítulo vi (Dos recursos), do subtítulo i do título ii do livro iii do Código de Processo Civil, compreendendo os artigos 676.º a 782.º A matéria que ora nos interessa - impugnação de matéria de facto - passou a estar prevista no artigo 685.º-B - aditado pelo artigo 2.º -, que sob a epígrafe (Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto), passou a estabelecer o seguinte:

«1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do n.º 2 do artigo 552.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.

3 - Na hipótese prevista no número anterior, incumbe ao recorrido, sem prejuízo dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, proceder, na contra-alegação que apresente, à indicação dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente, podendo, por sua iniciativa, proceder à sua transcrição.

4 - Quando a gravação da audiência for efectuada através de meio que não permita a identificação precisa e separada dos depoimentos, as partes devem proceder às transcrições previstas nos números anteriores.

5 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 684.º-A.» Em consonância com esta alteração foi modificado o artigo 712.º, que passou a dispor:

«1 - A decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:

a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685.º-B, a decisão com base neles proferida.» Relativamente ao alargamento de prazo, antes previsto no artigo 698.º, n.º 6, revogado pelo artigo 9.º, alínea a), do Decreto-Lei 303/2007, passou a estar previsto no artigo 685.º, n.º 7, que estabelece: «Se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e de resposta acrescem 10 dias.» Entretanto, no domínio do processo penal, e a partir de 15 de Setembro de 2007.

A 15.ª alteração do Código de Processo Penal, operada pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto (Diário da República, 1.ª série, n.º 166, de 29 de Agosto, rectificada pela Declaração de Rectificação 100-A/2007, Diário da República, n.º 207, suplemento, de 26 de Outubro, por seu turno, rectificada pela Declaração de Rectificação 105/2007, Diário da República, n.º 216, de 9 de Novembro), entrada em vigor no imediato dia 15 de Setembro seguinte (artigo 7.º), procedeu, no que ora interessa, às seguintes modificações:

Artigo 363.º (Documentação de declarações orais) «As declarações prestadas oralmente na audiência são sempre documentadas na acta, sob pena de nulidade.» Artigo 364.º (Forma de documentação) (agora sem referência a forma de processo) «1 - A documentação das declarações prestadas oralmente na audiência é efectuada, em regra, através de gravação magnetofónica ou audiovisual, sem prejuízo da utilização de meios estenográficos ou estenotípicos, ou de outros meios técnicos idóneos a assegurar a reprodução integral daquelas. É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 101.º 2 - Quando houver lugar a gravação magnetofónica ou audiovisual, deve ser consignado na acta o início e o termo da gravação de cada declaração.» Artigo 412.º (Motivação do recurso e conclusões) «...

3 - Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;

c) As provas que devem ser renovadas.

4 - Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.

5 - Havendo recursos retidos, o recorrente especifica obrigatoriamente, nas conclusões, quais os que mantêm interesse.

6 - No caso previsto no n.º 4, o tribunal procede à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que considere relevantes para a descoberta da verdade e a boa decisão da causa.» Cotejando a redacção do actual n.º 3, aparentemente inalterado, com a da versão da reforma de 1998, a diferença única está em, nas respectivas alíneas a) e b), terem sido intercaladas as expressões «concretos» e «concretas», o que de resto, está em perfeita sintonia com o registo, do então ainda não vigente regime do processo civil, que no artigo 685.º-B, do CPC, se reporta aos «concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados» e aos «concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida».

A aproximação, pelo menos, textual, dos dois regimes não espanta, se tivermos em conta que, independentemente das diferentes «vacatio legis» de um e de outro dos diplomas em causa, as publicações foram muito próximas:

o Decreto-Lei 303/2007 foi publicado em 24 de Agosto de 2007, entrando em vigor em 1 de Janeiro de 2008, e a Lei 48/2007, publicada em 29 de Agosto de 2007, entrou em vigor em 15 de Setembro de 2007, num registo de aplicação de vigência de inovadora lei, decididamente repentista - apenas dezassete dias depois da publicação feita em férias judiciais - quando o diploma veio a ser rectificado em 26 de Outubro, quando já se encontrava em vigor, sendo rectificado, pela segunda vez, com a rectificação da declaração de rectificação em 9 de Novembro de 2007.

Artigo 431.º (Modificabilidade da decisão recorrida) «Sem prejuízo do disposto no artigo 410.º, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre matéria de facto pode ser modificada:

a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que lhe serviram de base;

b) Se a prova tiver sido impugnada nos termos do n.º 3 do artigo 412.º; ou c) Se tiver havido renovação da prova.» Eliminada na revisão foi apenas a referência à agora dissonante expressão 'documentação da prova' presente na anterior redacção.

Vejamos agora, em síntese final, a evolução na específica regulamentação do exercício do ónus de especificação dos meios probatórios gravados.

No processo civil.

I - Nos termos do n.º 2 do artigo 690.º-A, na versão inicial, conferida pelo Decreto-Lei 39/95, incumbia ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, proceder à transcrição das passagens da gravação em que se fundava.

Já o n.º 3, reportado à incumbência da parte contrária, referia-se a transcrição dos depoimentos gravados.

II - De acordo com o mesmo preceito, agora na versão introduzida pelo Decreto-Lei 183/00, o recorrente deveria indicar, sob pena de rejeição do recurso, os depoimentos em que se fundava por referência ao assinalado na acta, nos termos do n.º 2 do artigo 522.º-C, ou seja, reportar ao que constava assinalado na acta quanto a «início e termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento».

E segundo o n.º 3, incumbia à parte contrária proceder, na contra alegação à indicação dos depoimentos gravados que infirmassem as conclusões do recorrente, também por referência ao assinalado na acta.

III - A partir da reforma de 2007, nos termos do n.º 2 do artigo 685.º-B, passou a incumbir ao recorrente, desde que seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do n.º 2 do artigo 522.º-C, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.

Nos termos do n.º 3, incumbe ao recorrido, sem prejuízo dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, proceder, na contra-alegação que apresente, à indicação dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente, podendo, por sua iniciativa, proceder à sua transcrição.

IV - Quando a gravação da audiência for efectuada através de meio que não permita a identificação precisa e separada dos depoimentos, as partes devem proceder às transcrições.

No processo penal.

I - Nos termos do artigo 412.º, n.º 4, na versão da Lei 59/98, as especificações das concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida e das que devem ser renovadas, fazem-se por referência aos suportes técnicos, havendo lugar a transcrição.

II - De acordo com o mesmo preceito, na versão de 2007, essas especificações fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364.º (consignação do «início e termo da gravação de cada declaração»), devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.

Como resulta da comparação entre os dois regimes, a versão introduzida pela Lei 48/2007, de 25 de Agosto, incorporou no n.º 2 do artigo 364.º, a referência ao consignado na acta quanto a início e termo de cada declaração, que constava já do n.º 2 do artigo 522.º-C, do CPC, na versão do Decreto-Lei 183/2000.

Em síntese, os pontos de contacto e afastamento entre os actuais regimes do processo penal e civil, nesta matéria, podem resumir-se aos seguintes aspectos:

I - Em ambos os casos, há a obrigatoriedade de especificar - o recorrente «deve especificar», diz o processo penal, e no caso do processo civil, de forma superlativa e assertiva, afirma-se: «deve o recorrente obrigatoriamente especificar», aqui sob pena de rejeição, mostrando-se ambos em sintonia verbal num primeiro plano, na afirmação da necessidade de identificar «os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados», e de seguida, com diferente terminologia, mas com identidade na essência da comunicação, no processo penal, referindo «as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida», e no processo civil, dizendo «os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida».

No processo penal ainda deverá o recorrente especificar «as provas que devem ser renovadas», figura processual igualmente presente no processo civil (artigo 712.º, n.º 3).

II - As especificações consubstanciadoras do dissídio quanto ao que ficou provado, fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364.º do CPP e do n.º 2 do artigo 522.º-C, do CPC (consignação na acta do «início e termo» de cada declaração).

Mas, no processo civil, a incumbência imposta ao impugnante da matéria de facto só é exequível, desde que seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, pois, quando a gravação da audiência for efectuada através de meio que não permita tal identificação, as partes devem proceder às transcrições.

III - No processo penal, o recorrente deve «indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação» e no processo civil, igualmente «indicar com exactidão as passagens em que se funda», mas aqui sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição, sendo que quando se trata da incumbência do recorrido, com vista a infirmar as conclusões do recorrente, impõe-se já a indicação dos «depoimentos gravados» e não das passagens.

IV - No processo civil, o incumprimento determina a imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, o que não acontece no penal.

V - No que respeita à actuação do tribunal superior, no processo penal (artigo 412.º, n.º 6) o tribunal procede à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que considere relevantes para a descoberta da verdade e a boa decisão da causa.

No processo civil não há actualmente norma equivalente - dantes o n.º 5 do artigo 690.º-A, na redacção de 2000, prescrevia que o tribunal de recurso procederia à audição ou visualização dos depoimentos indicados pelas partes, excepto se o juiz relator considerasse necessária a sua transcrição.

Na revisão de 2007 o artigo 685.º-A não tem correspondente; apenas no n.º 3, a reportar-se à incumbência do recorrido, ressalva os poderes de investigação oficiosa do tribunal.

Do incumprimento do ónus prescrito no artigo 412.º, n.º 3, e do suprimento da deficiência, através de despacho de convite ao aperfeiçoamento Diversamente do que ocorre no processo civil, em que se impõe a rejeição do recurso no caso de incumprimento dos ónus impostos ao recorrente [dantes rejeição no n.º 2 do artigo 690.º-A, em 1995 (DL 39/95) e em 2000 (DL 183/2000) e actualmente no n.º 1 do artigo 685.º-A (DL 303/2007), e imediata rejeição, no que se refere à impugnação da matéria de facto, no n.º 2 do mesmo preceito], por força da jurisprudência do Tribunal Constitucional, foi introduzida no CPP, a norma do n.º 3 do artigo 417.º, permitindo a formulação de convite ao aperfeiçoamento.

Estabelece o n.º 3 do artigo 417.º do CPP, na redacção dada pela reforma de 2007:

«Se a motivação do recurso não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.os 2 a 5 do artigo 412.º, o relator convida o recorrente a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afectada.» Mas sem deixar de se esclarecer - n.º 4 - que o aperfeiçoamento não permite modificar o âmbito do recurso que tiver sido fixado na motivação.

É vasta a jurisprudência sobre a constitucionalidade da rejeição de recursos, designadamente, quanto a incumprimento ou deficiente observância dos ónus das partes nos recursos em processo penal e contra-ordenacional, pronunciando-se o Tribunal Constitucional pela inadmissibilidade do estabelecimento de desproporcionados e gravosos ónus e ou preclusões ao recorrente em processo penal e assinalando a desconformidade com o princípio das garantias de defesa com a imposição ao arguido de ónus ou preclusões tidos por excessivos ou desproporcionados.

O Tribunal Constitucional analisou as exigências de formalismo em matéria de recursos, à luz do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, em conjugação com o princípio da proporcionalidade.

A questão foi analisada igualmente na vertente de conjugação do direito de acesso à justiça e aos tribunais consignado no artigo 20.º da Constituição e o princípio da proporcionalidade e as garantias de defesa, incluindo o direito ao recurso para apreciação da conformidade constitucional das normas da qual resultava o não conhecimento de recurso.

Em vários registos e no fundo tendo em vista evitar decisões surpresa, encara-se a necessidade de o tribunal convidar o recorrente a apresentar as conclusões antes de se rejeitar o recurso como correspondendo à exigência de um processo equitativo.

Para melhor percepção da questão, dos antecedentes jurisprudenciais de onde emergiu a nova norma, que conduz inevitavelmente à prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento, ao contrário do que ocorre no processo civil em que a rejeição se impõe, o que se compreende, face à primazia do princípio do dispositivo ali, e aqui ao contraditório e descoberta da verdade material, e à consideração do direito ao recurso como uma da emanações das garantias de defesa, consagradas no artigo 32.º da CRP, vejamos então a evolução da jurisprudência do Tribunal Constitucional, de que emergiu o n.º 3 do artigo 417.º do Código de Processo Penal.

Acórdão 193/1997, de 11 de Março de 1997, proferido no processo 28/95, da 2.ª Secção [Acórdãos do Tribunal Constitucional (ATC), vol. 36.º, pp.

395 a 406].

Acórdão 43/1999, de 19 de Janeiro de 1999, proferido no processo 46/98, da 1.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 72, de 26 de março de 1999.

Acórdão 417/1999, de 29 de Junho de 1999, proferido no processo da 1.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 61, de 13 de março de 2000.

Acórdão 275/1999, de 5 de Maio de 1999, proferido no processo 744/98, da 3.ª Secção e publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 161, de 13 de Julho de 1999, e no BMJ, n.º 487, p. 61.

Acórdão 532/2001, de 4 de Dezembro de 2001 (Plenário), proferido no processo 452/2001, Diário da República, 2.ª série, n.º 23, de 28 de Janeiro de 2002, no mesmo processo da 8.ª Vara Criminal de Lisboa, onde foi proferido o anterior acórdão 275/99.

Acórdão 303/1999, de 18 de Maio de 1999, proferido no processo 942/98, da 2.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 164, de 16 de Julho de 1999, e no BMJ, n.º 487, p. 124.

Acórdão 319/1999, de 26 de Maio de 1999, proferido no processo 668/98, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 247, de 22 de Outubro de 1999.

Acórdão 288/2000, de 17 Maio de 2000, proferido no processo 395/99, da 3.ª Secção, publicado no BMJ, n.º 497, p. 103.

Acórdão 337/2000, de 27 de Junho de 2000, proferido em Plenário, no processo 183/2000, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, n.º 167, de 21 de Julho de 2000 (e ATC, vol. 47.º), na sequência de julgamentos de inconstitucionalidade formulados nos supra referidos acórdãos n.os 43/99 e 417/99 (publicados no Diário da República, 2.ª série, de 26 de Março de 1999, e de 13 de Março de 2000) e n.º 43/00, de 26 de Janeiro de 2000 (proferido na sequência do acórdão 275/99 e no mesmo processo e publicado em ATC, vol. 46.º, p. 803).

Acórdão 340/2000, de 4 de Julho de 2000, proferido, em Plenário, no processo 287/2000, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 259, de 9 de Novembro de 2000 - confirma a decisão do aludido acórdão 43/2000, de 26 de Janeiro de 2000 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 46.º, p.

803), ... ou seja, reitera nos seus precisos termos a decisão proferida no acórdão 43/99.

Acórdão 265/2001, de 19 de Junho de 2001, proferido no processo 213/2001, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 16 de Julho de 2001, aprovado em Plenário, após julgamento de inconstitucionalidade no acórdão 319/99, de 26 de Maio de 1999 (Diário da República, 2.ª série, n.º 247, de 22 de Outubro de 1999) supra referido e n.os 509/2000 e 590/2000 (não publicados, e lavrados na sequência de reclamações interpostas de decisões sumárias, que se ancoraram nos citados acórdãos n.os 303/99 e 319/99), com a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, por violação dos artigos 32.º, n.º 10, e 18.º, n.º 2, da Constituição, da norma que resulta das disposições conjugadas constantes do n.º 3 do artigo 59.º e do n.º 1 do artigo 63.º, do Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro, na dimensão interpretativa segundo a qual a falta de formulação de conclusões na motivação de recurso, por via do qual se intenta impugnar a decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima, implica a rejeição do recurso, sem que ao recorrente seja previamente convidado a efectuar tal formulação.

Citando o acórdão 319/99 aí se escreveu que o dever de convidar o recorrente a apresentar as conclusões antes de rejeitar o recurso corresponde à exigência de um processo equitativo, porquanto o essencial do próprio recurso - as alegações ou a motivação - já se encontra nos autos, apenas faltando a fase conclusiva.

Acórdão 388/2001, de 26 de Setembro de 2001, proferido no processo 333/2001, da 2.ª Secção, in Diário da República, 2.ª série, n.º 258, de 7 de Novembro de 2001.

Acórdão 401/2001, de 26 de Setembro de 2001, proferido no processo 746/2000, da 2.ª Secção, in Diário da República, 2.ª série, n.º 258, de 7 de Novembro de 2001.

Acórdão 320/2002, de 9 de Julho de 2002, proferido, em sessão plenária, no processo 754/01, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, n.º 231, de 7 de Outubro de 2002, na sequência de julgamentos de inconstitucionalidade formulados nos acórdãos n.os 288/2000, de 17 de Maio, da 3.ª Secção, 388/2001 e 401/2001, ambos de 26 de Setembro, da 2.ª Secção (o primeiro publicado no BMJ, n.º 497, p. 103, e os restantes no Diário da República, 2.ª série, n.º 258, de 7 de Novembro de 2001), declarou «com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, da norma constante do artigo 412.º, n.º 2, do CPP, interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções contidas nas suas alíneas a), b) e c) tem como efeito a rejeição liminar do recurso do arguido, sem que ao mesmo seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência».

(Deste acórdão foi feita aplicação no acórdão 524/2003.) Acórdão 323/2003, de 2 de Julho de 2003, proferido no processo 195/2003, da 2.ª Secção, inédito.

Acórdão 428/2003, de 24 de Setembro de 2003, proferido no processo 532/2002, da 3.ª Secção, in Diário da República, 2.ª série, n.º 269, de 20 de Novembro de 2003.

Acórdão 529/2003, de 31 de Outubro de 2003, proferido no processo 667/2003, da 3.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 290, de 17 de Dezembro de 2003 (e ATC, vol. 57.º) - decidiu «julgar inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, a norma constante do artigo 412.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções contidas nas suas alíneas a), b) e c) tem como efeito o não conhecimento da impugnação da matéria de facto e a improcedência do recurso do arguido nessa parte, sem que ao mesmo seja facultada oportunidade de suprir tal deficiência».

Acórdão 322/2004, de 5 de Maio de 2004, proferido no processo 98/2004, da 3.ª Secção, referido em ATC, vol. 59.º, p. 884, citado no seguinte - decidiu julgar inconstitucional «a norma constante dos n.os 3 e 4 do artigo 412.º, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso em que o arguido impugne a decisão sobre a matéria de facto, das menções contidas nas alíneas a), b) e c) daquele n.º 3, pela forma prevista no referido n.º 4, tem como efeito o não conhecimento daquela matéria e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja facultada oportunidade de suprir tal deficiência».

Acórdão 405/2004, de 2 de Junho de 2004, proferido no processo 802/2003, 3.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 172, de 23 de Julho de 2004 (e ATC, vol. 59.º, p. 665) sobre a norma dos n.os 3 e 4 do artigo 412.º, no sentido do anterior.

Após anotar que, diferentemente do que sucedia no recurso julgado pelo acórdão 140/2004, verifica-se no caso em apreciação que as faltas apontadas apenas ocorrem nas conclusões da motivação, e não na própria motivação em si, decidiu «julgar inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, a norma dos n.os 3 e 4 do artigo 412.º, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso em que o arguido impugna a decisão sobre a matéria de facto, das menções contidas na alínea a) e, pela forma prevista no n.º 4, nas alíneas b) e c) daquele n.º 3, tem como efeito o não conhecimento da impugnação da matéria de facto e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal deficiência».

Acórdão 487/2004, de 7 de Julho de 2004, proferido no processo 267/99, da 2.ª Secção (referenciado em ATC, vol. 60.º, p. 920).

Acórdão 357/2006, de 8 de Junho de 2006, proferido no processo 730/2005, da 2.ª Secção, publicado nos ATC, vol. 65.º, p. 722 - «julga inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, a norma constante do artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso do arguido, de forma clara, das provas que impunham decisão diversa da recorrida, tem como efeito o não conhecimento da impugnação da matéria de facto e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal deficiência».

Acórdão 485/2008, de 7 de Agosto de 2008, proferido no processo 360/08, da 2.ª Secção, Diário da República, 2.ª série, de 11 de Novembro de 2008 (ATC, vol. 73, p. 199) julga inconstitucional a norma constante do artigo 412.º, n.os 2, alínea b), 3, alínea b), e 4, do CPP, interpretada no sentido de que a inserção apenas nas conclusões da motivação do recurso das menções aí referidas determina a imediata rejeição do recurso.

Em todos estes casos tem-se em vista o respeito pelo princípio da proporcionalidade, a desrazoabilidade das exigências formuladas e o efeito drástico que se associa ao incumprimento.

O Tribunal Constitucional pronunciou-se de modo diverso, mas em situações em que a deficiência estava presente em simultâneo no teor da motivação e nas subsequentes conclusões, considerando que se é admissível a correcção das conclusões no sentido de harmonizar com o teor da motivação, já será inadmissível permitir o suprimento das deficiências das conclusões com o aditamento de alusões sem suporte na precedente motivação, assim o fazendo nos seguintes acórdãos.

Acórdão 259/2002, de 18 de Junho de 2002, proferido no processo 101/2002, da 1.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 288, de 13 de Dezembro de 2002 (e ATC, vol. 53.º), decidiu sobre a dimensão normativa em causa num recurso interposto pelo assistente.

Não julgou inconstitucional que a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso em que se impugne a decisão sobre a matéria de facto, das menções contidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 3 e no n.º 4 do artigo 412.º do CPP tenha como efeito o não conhecimento daquela matéria e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada oportunidade de suprir o vício dessa falta de indicação, «se também da motivação do recurso não constar tal indicação».

Acórdão 140/2004, de 10 de Março de 2004, proferido no processo 565/2003, da 2.ª Secção, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 91, de 17 de Abril de 2004 (e ATC, vol. 58.º, p. 633).

O recurso tinha por objecto a apreciação da constitucionalidade das normas do artigo 412.º, n.os 3, alínea b), e 4, do Código de Processo Penal, interpretadas no sentido de que a falta de indicação, na motivação do recurso em que se impugne matéria de facto, das menções exigidas nesses n.os 3 e 4, tem como efeito o não conhecimento desta matéria, sem que ao recorrente seja dada oportunidade de suprir tais deficiências.

No caso, não estava em causa qualquer falta das especificações exigidas nos n.os 3, alínea b), e 4 apenas nas conclusões do recurso, mas a sua falta quer nas conclusões quer no próprio texto da motivação do recurso.

A questão tem similitude neste particular com a do acórdão 259/2002, com a diferença de que o recurso é de arguido e não como ali de assistente, mas segue a fundamentação daquele, a par e passo, e que transcreve em larga medida.

Afirma que no caso, não está em causa apenas uma certa insuficiência ou deficiência formal das conclusões apresentadas pelo arguido, mas antes a indicação exigida pela alínea b) do n.º 3 e pelo n.º 4 do artigo 412.º, que é imprescindível logo para a delimitação do âmbito da impugnação da matéria de facto, e não um ónus meramente formal. «O cumprimento destas exigências condiciona a própria possibilidade de se entender e delimitar a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, exigindo-se, pois, referências específicas, e não apenas uma impugnação genérica da decisão proferida em matéria de facto».

Decidiu «não julgar inconstitucional a norma do artigo 412.º, n.os 3, alínea b), e 4, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que a falta, na motivação e nas conclusões de recurso em que se impugne matéria de facto, da especificação nele exigida tem como efeito o não conhecimento desta matéria e a improcedência do recurso, sem que ao recorrente tenha sido dada oportunidade de suprir tais deficiências».

(Este acórdão foi seguido no acórdão 342/2006, da 2.ª Secção, de 23 de Maio de 2006 - referido a fls. 721 do 65.º vol. de ATC - a confirmar decisão sumária que não julgou inconstitucional a norma do artigo 412.º, n.º 3, alíneas a), b) e c), e n.º 4, do CPP).

Acórdão 488/2004, de 7 de Julho de 2004, proferido no processo 671/2004, da 3.ª Secção (igualmente referenciado em ATC, vol. 60.º, p. 920) - confirma decisão sumária, que não julgou inconstitucional a norma do artigo 412.º, n.os 3, alínea b), e 4, do CPP, interpretada no sentido de que a falta, na motivação e nas conclusões de recurso em que se impugne matéria de facto, da especificação nele exigida tem como efeito o não conhecimento desta matéria e a improcedência do recurso, sem que ao recorrente tenha sido dada oportunidade de suprir tais deficiências.

Do prazo de interposição do recurso, no caso de este ter como objecto a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, envolvendo a reapreciação de prova gravada.

Com a reforma de 2007, o prazo de interposição de recurso passou de 15 para 20 dias, de acordo com os n.os 1 e 3 do artigo 411.º do CPP.

O n.º 4 estabelece que «Se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada, os prazos estabelecidos nos n.os 1 e 3 são elevados para 30 dias».

Como vimos, no âmbito do processo civil, em contrapartida do estabelecimento de ónus acrescido consistente nas especificações do recurso em matéria de facto, foi estabelecido o acréscimo de 10 dias, consagrado no artigo 705.º, n.º 6, do CPC, na redacção do Decreto-Lei 39/95, mantido posteriormente no n.º 6 do artigo 698.º, nas versões da reforma de 1995/1996 (DL 329-A/95) e do Decreto-Lei 183/2000, constando a partir de 2007 no artigo 685.º-B.

Sendo possível no processo penal, a partir da reforma de 1998, o recurso em matéria de facto de decisões do tribunal colectivo, tendo por base o suporte das provas gravadas, foi posta em discussão a questão de saber se como contrapartida do acrescido encargo com os ónus impostos ao recorrente, consubstanciados na fixação das especificações da motivação referidas no n.º 3 do 412.º, deveria ser aumentado o prazo de interposição de recurso, que em 1998, passou de 10 para 15 dias (artigo 411.º, n.º 1), isto é, se a este deveria acrescer um outro tal como acontecia no processo civil.

Passou a ser discutida a questão de saber se o alargamento do prazo de recurso, então previsto no processo civil desde o Decreto-Lei 39/95, era ou não aplicável subsidiariamente em processo penal, acrescendo ao prazo fixado no n.º 1 do artigo 411.º do CPP, quando o recorrente pretende impugnar a matéria de facto, solicitando a reapreciação da prova.

A questão, ponderando-se a suficiência da regulação do recurso em processo penal ou a existência de uma lacuna, foi resolvida, no primeiro sentido, em acórdão uniformizador - o Acórdão 9/2005, de 11 de Outubro de 2005, proferido no processo 3172/2004-3.ª Secção, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, n.º 233, de 6 de Dezembro de 2005.

Estando em discussão a aplicabilidade aos recursos penais, da regra do acréscimo de 10 dias dos prazos para alegações, estabelecidos então no artigo 698.º, n.º 6, do CPC, sempre que o recurso tivesse por objecto a reapreciação da prova gravada, confirmando o acórdão recorrido, fixou, em unanimidade, a seguinte jurisprudência:

«Quando o recorrente impugne a decisão em matéria de facto e as provas tenham sido gravadas, o recurso deve ser interposto no prazo de 15 dias, fixado no artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, não sendo subsidiariamente aplicável em processo penal o disposto no artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil.» O Tribunal Constitucional no acórdão 542/2004, de 15 de Julho de 2004, processo 609/2004, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 60, p. 349, decidira não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 411.º, n.os 1 e 3, do CPP, na interpretação segundo a qual não acrescia o prazo de 10 dias a que se referia o artigo 698.º, n.º 6, do CPC, em caso de recurso que tivesse por objecto a reapreciação da prova gravada.

(O citado AUJ e este acórdão do TC foram citados no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 17/2006, de 6 de Janeiro de 2006, processo 383/04-2.ª, in Diário da República, 2.ª série, n.º 33, de 15 de Fevereiro de 2006, e Acs.

TC, vol. 64, p. 273).

Em sentido oposto, defendendo o acréscimo no âmbito do processo laboral (CPT 1981), pronunciou-se o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 24/2005, proferido no processo 928/2003, 2.ª Secção, de 18 de Janeiro de 2005, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 111, de 9 de Junho de 2005.

Mas, como se viu, em 2007 a alteração legislativa operada pela Lei 48/2007, consignou a solução de elevação do prazo para 30 dias - artigo 411.º, n.º 4.

Do ónus de especificação A impugnação da matéria de facto, nos termos do artigo 412.º, n.os 3 e 4, do Código de Processo Penal, constitui a área por excelência, a hipótese única, em que se verifica o duplo grau de jurisdição em matéria de facto.

A consagração desta nova garantia das partes no processo civil e penal implica naturalmente a criação de um específico ónus de alegação do recorrente, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação.

Nestes casos de impugnação da matéria de facto, a apreciação pelo tribunal superior - Relação - não se restringe ao texto da decisão, mas abrange a análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre a partir de balizas fornecidas pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus imposto pelos n.os 3 e 4 do artigo 412.º, tendo em vista o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento e visando a modificação da matéria de facto, nos termos do artigo 431.º, alínea b), do Código de Processo Penal.

Impõe-se ao recorrente a necessidade de observância de requisitos formais da motivação de recurso face à imposta especificação dos concretos pontos da matéria de facto, que considera incorrectamente julgados, das concretas provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, tudo com referência ao consignado na acta, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso. Esta exigência é de entender como contemplando o princípio da lealdade processual, de modo a definir em termos concretos o exacto sentido e alcance da pretensão, de modo a poder ser exercido o contraditório.

A reapreciação por esta via não é global, antes sendo um reexame parcelar, restrito aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e às concretas razões de discordância, necessário sendo que se especifiquem as provas que imponham decisão diversa da recorrida e não apenas a permitam, não bastando remeter na íntegra para as declarações e depoimentos de algumas testemunhas.

O especial/acrescido ónus de alegação/especificação dos concretos pontos de discórdia do recorrente (seja ele arguido, ou assistente), em relação à fixação da facticidade impugnada, bem como das concretas provas, que, em seu entendimento, imporão (iam) uma outra, diversa, solução ao nível da definição do campo temático factual, proposto a subsequente tratamento subsuntivo, justifica-se plenamente, se tivermos em vista que a reapreciação da matéria de facto não é, não pode ser, um segundo, um novo, um outro integral, julgamento da matéria de facto.

Pede-se ao tribunal de recurso uma intromissão no julgamento da matéria de facto, um juízo substitutivo do proclamado na 1.ª instância, mas há que ter em atenção que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em segunda instância, não impõe uma avaliação global, não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso do complexo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida e muito menos um novo julgamento da causa, em toda a sua extensão, tal como ocorreu na 1.ª instância, tratando-se de um reexame necessariamente segmentado, não da totalidade da matéria de facto, envolvendo tal reponderação um julgamento/reexame meramente parcelar, de via reduzida, substitutivo.

Esta limitação da capacidade cognitiva da matéria de facto por parte do Tribunal da Relação sempre esteve presente, como desde logo esclareceu o primeiro diploma legal onde se estabeleceu a documentação das declarações orais.

Com efeito, como foi afirmado no preâmbulo do Decreto-Lei 39/95, de 15 de Fevereiro, «o objecto do 2.º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto não é a pura e simples repetição das audiências perante a Relação, mas, mais singelamente, a detecção e correcção de concretos, pontuais e claramente apontados e fundamentados erros de julgamento, o que atenuará sensivelmente os riscos emergentes da quebra da imediação na produção da prova (que, aliás, embora em menor grau, sempre ocorreria, mesmo com a gravação em vídeo da audiência)».

O Supremo Tribunal de Justiça tem reafirmado que o recurso da matéria de facto perante a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª instância, como se o julgamento não existisse, tratando-se antes de um remédio jurídico, destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros e não indiscriminadamente, de forma genérica, quaisquer eventuais erros.

(Neste sentido podem ver-se, i. a., os acórdãos de 17 de Maio de 2007, processo 1397/07 - 5.ª, CJSTJ 2007, t. 2, p. 197 (citando o acórdão do Tribunal Constitucional, n.º 59/2006, de 18 de Janeiro de 2006, proferido no processo 199/2005, da 2.ª secção); de 5 de Dezembro de 2007, processo 3406/07 - 3.ª; de 9 de Janeiro de 2008, processo 2075/07 - 3.ª e processo 4457/07 - 3.ª; de 17 de Janeiro de 2008, processo 2696/07-5.ª, CJSTJ 2008, t. 1, p. 206 (fazendo aquela mesma citação do acórdão 59/2006); de 23 de Abril de 2008, processo 899/08-3.ª, CJSTJ 2008, t. 2, p. 205; de 7 de Maio de 2008, processo 294/08 - 3.ª; de 14 de Maio de 2008, processo 1139/08 - 3.ª; de 4 de Junho de 2008, processo 1126/08 - 3.ª; de 18 de Junho de 2008, processo 1971/08 - 3.ª; de 20 de Novembro de 2008, processo 3269/08 - 5.ª; de 3 de Setembro de 2008, processo 2031/04 - 3.ª; de 15 de Outubro de 2008, processo 2894/08 - 3.ª; de 23 de Outubro de 2008, processo 2869/08 - 5.ª; de 29 de Outubro de 2008, processo 1016/07 - 5.ª; de 27 de Janeiro de 2009, processo 3978/08 - 3.ª (trata-se de um julgamento de via reduzida, de remédio para deficiências factuais circunscritas); de 26 de Fevereiro de 2009, processo 3270/08 - 5.ª; de 27 de Maio de 2009, processo 145/05 - 3.ª e processo 1511/05.7PBFAR.S1 - 3.ª; de 10 de Março de 2010, processo 112/08.2GACDV.L1.S1, in CJSTJ 2010, t. i, p. 212, e de 25 de Março de 2010, no processo 427/08.0TBSTB.E1.S1, ambos relatados pelo presente relator).

E como se pode ver dos acórdãos do Tribunal Constitucional, n.º 124/90, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 8 de Fevereiro de 1991; n.º 322/93, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 29 de Outubro de 1993;

n.º 677/99, de 21 de Dezembro de 1999, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 28 de Fevereiro de 2000, o sentido é o mesmo: «Com o recurso não se pretende um novo julgamento da matéria de facto. Tratando-se de matéria de facto, há razões de praticabilidade e outras (decorrentes da exigência da imediação da prova) que justificam não poder o recurso assumir aí o mesmo âmbito e a mesma dimensão que em matéria de direito: basta pensar que uma identidade de regime, nesse capítulo, levaria, no limite, a ter de consentir-se sempre a possibilidade de uma repetição integral do julgamento perante o tribunal de recurso».

A intromissão da Relação no domínio factual cingir-se-á a uma intervenção «cirúrgica», no sentido de delimitada, restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção, se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação.

Os condicionamentos ou imposições a observar no caso de recurso de facto, referidos nos n.os 3 e 4 do artigo 412.º constituem mera regulamentação, disciplina e adaptação aos objectivos do recurso, já que a Relação, como se referiu, não fará um segundo julgamento de facto, mas tão só o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento, que tenham sido referidos no recurso e às provas que imponham (e não apenas sugiram ou permitam outra) decisão diversa indicadas pelo recorrente, uma reapreciação restrita aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e das razões de discordância.

Como se referiu no acórdão de 5 de Dezembro de 2007, processo 3406/07-3.ª, «Esse imprescindível e indeclinável contributo do recorrente para a pedida reponderação da matéria de facto corresponde a um dever de colaboração por parte do recorrente e sua responsabilização na demarcação da vinculação temática deste segmento da impugnação, constituindo tais formalidades factores ou meios de segurança, quer para as partes quer para o tribunal».

O que está em causa é no fundo a delimitação objectiva do recurso, com a fundamentação da pretensão e o esclarecimento dos objectivos a que se propõe o recorrente, com um especial ónus a seu cargo, impondo-se-lhe o dever de tomar posição clara nas conclusões sobre o que é objecto do recurso, especificando o que no âmbito factual pretende ver reponderado, assim como na hipótese de renovação deve especificar as provas que devem ser renovadas [alínea c) do n.º 3 do artigo 412.º].

Como se diz no acórdão de 8 de Março de 2006, processo 185/06-3.ª «O ónus conexiona-se com a inteligibilidade e concludência da própria impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto», e como se sintetiza nos acórdãos de 10 de Janeiro de 2007, processo 3518/06-3.ª e de 15 de Outubro de 2008, processo 2894/08-3.ª «A delimitação precisa dos pontos de facto controvertidos constitui um elemento determinante na definição do objecto do recurso em matéria de facto e para a consequente possibilidade de intervenção do tribunal de recurso» (cf. ainda acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Junho de 2005, processo 1577/05-3.ª; de 8 de Fevereiro de 2006, processo 2892/05-3.ª (no sentido de que não vale uma impugnação genérica); de 4 de Janeiro de 2007, processo 4093/06-3.ª; de 25 de Janeiro de 2007, processo 4551/06-5.ª;

de 28 de Fevereiro de 2007, processos n.os 4698/06 e 35/07, ambos da 3.ª Secção; de 16 de Maio de 2007, processo 1395/07-3.ª; de 4 de Julho de 2007, processo 2304/07-3.ª).

Como se refere no acórdão de 27 de Janeiro de 2009, processo 3978/08-3.ª «O julgamento efectuado pela Relação é de via reduzida, de remédio para deficiências factuais circunscritas, confinadamente a pontos específicos, concretamente indicados, não valendo uma impugnação genérica, repousando em considerações mais ou menos alargadas ou simplesmente abrangentes da leitura pessoal, unilateralista e interessada que os sujeitos processuais fazem das provas e do resultado a que devam chegar».

Os ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão em matéria de facto, a exemplo do que ocorria com o artigo 690.º-A, e actualmente do artigo 685.º-A do CPC e artigo 412.º, n.os 3 e 4, do CPP, decorrem dos princípios estruturantes da cooperação, lealdade e boa fé processuais, com vista a assegurar a seriedade do recurso e obviar que os poderes da Relação sejam utilizados para fins dilatórios.

Revertendo ao caso concreto Não estando obviamente em causa a imposição dos ónus de especificação, a questão é saber qual o modo de execução, qual o grau de exigência no seu cumprimento, até onde deve ir a obrigação de localização das provas, sem prejuízo de «perda do benefício do prazo», como referem os recorrentes na conclusão 9.ª, se bem que no contexto a afirmação não tenha qualquer conexão com a civilística figura prevista nos artigos 779.º e 780.º do Código Civil.

Como flui do acórdão recorrido, dúvidas não há de que para ilustrarem os seus pontos de divergência com o decidido, os recorrentes procederam a transcrições de passagens dos depoimentos que, em seu entender, colocariam em crise o fixado.

Nesse caso, como de resto, no do acórdão fundamento, os recorrentes não se limitaram a fazer referências genéricas aos depoimentos produzidos em julgamento e constantes da prova gravada, mencionaram passagens, que transcreveram. Num e noutro caso, balizaram o sentido e o alcance do dissídio, mas sem indicar o «início e o termo das declarações».

Como diz o acórdão recorrido, o recorrente especificou os pontos de facto que considerou incorrectamente julgados e indicou as concretas provas que impunham decisão diversa, não os referenciando, contudo, aos respectivos suportes técnicos, nem de uma forma genérica em relação a cada uma das provas, nem pela concretização, indicação das voltas onde começavam e acabavam os depoimentos gravados, nem localizou com precisão, nos respectivos suportes, os excertos das provas com que foi ilustrando os seus pontos de vista, donde não se pode ter como cumprido, substancialmente o ónus de impugnação que a lei lhe impõe.

Em suma, em causa a falta de indicação do ponto onde começam e onde acabam os depoimentos e do local e momento concreto dos excertos, dos segmentos dos depoimentos ou declarações que têm a virtualidade pretendida, a falta de indicação dos minutos e segundos das expressões em causa.

No caso do acórdão recorrido dúvidas não há de que os recorrentes transcreveram excertos e segmentos dos depoimentos e das declarações das concretas provas que em seu entender impunham decisão diversa. A deficiência apontada é apenas no sentido de não terem situado na gravação, o local desses excertos e segmentos.

Refere o acórdão recorrido que «o recorrente tem que referenciar as provas aos precisos locais, nos suportes técnicos, onde se encontravam os excertos de que se serviu para fundamentar os seus pontos de vista», o que significa que os recorrentes transcreveram excertos para fundamentar a divergência, só que não referenciaram os precisos locais, nos suportes técnicos, onde se encontravam.

Os recorrentes mencionaram o suporte, efectuaram transcrição de passagens, faltando a indicação no suporte de gravação do local e momento em que constam as afirmações em causa, «sem indicar o minuto e o segundo, o que é de exigir ao recorrente».

A questão é de saber se a partir das transcrições das passagens da gravação em que se funda a impugnação são ou não perceptíveis as razões da divergência, não se podendo ter apenas a perspectiva de facilitar o trabalho ao tribunal de recurso.

Estando em causa a falta de referência ao que (alegadamente) constava da acta, vejamos o que efectivamente constava da acta de julgamento no processo que deu origem ao acórdão recorrido.

No processo comum singular n.º 147/06.0GASJP, de São João da Pesqueira, de que emergiu o acórdão recorrido, com sessões a 6 e 29 de Maio de 2009, consta das actas que a identificação e declarações dos arguidos, da assistente e depoimentos de nove testemunhas e interveniente acidental foram «gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal».

Trata-se de registo absolutamente nada esclarecedor, convenhamos, quanto a indicação do «início e termo» do que quer que seja, incluídos os depoimentos, cuja valoração foi impugnada.

Por seu turno, no processo comum singular n.º 1233/06.1TASTS, do 1.º Juízo de Santo Tirso, de que emergiu o acórdão fundamento, na sessão de 26 de Janeiro de 2009, foram ouvidos o arguido, duas testemunhas de acusação e duas de defesa.

Da acta apenas consta que aquele prestou declarações e estas depuseram, sem qualquer referência sequer a registo de prova.

A questão que se coloca é a de saber se hoje em dia é exequível o cumprimento da obrigação de indicação do «início e termo» das declarações prestadas em audiência, quando as actas, muitas vezes, são omissas a esse respeito.

Apontam-se como exemplos alguns registos diversos, sendo evidente que em alguns casos não é cumprida a consignação na acta do «início e termo da gravação» de cada declaração, como preceitua o artigo 364.º, n.º 2, do CPP.

Como «bons exemplos» de consignação, apontam-se:

PCC n.º 312/05.7GAESP - Tribunal Judicial de Esposende, com sessões de julgamento de 14 de Fevereiro a 8 de Maio de 2008 - «depoimento gravado em CD, de 003254 a 004952»;

PCC n.º 595/10.0GFLLE - Loulé, acta de 14 de Março de 2011 - Dela consta:

«o seu depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso neste tribunal», mas especificando:

«1 - [(11.38) (11. 53)]; 2 - [(11.53) (11.55)]; 3 - [(11.55) (12.01)].» PCC n.º 907/09.0PBBRR - 3.º Juízo Moita - acta de 17 de Setembro de 2010 - como no anterior, mas acrescentando as coordenadas, v. g., «14.34.14 a 14.53.05».

Mas, em muitos casos não é assim.

A fórmula o depoimento ou declarações foi (foram) «gravado (s), através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste tribunal», sem qualquer especificação, foi utilizada, por exemplo, no PCC n.º 172/07.3GDEVR, do 1.º Juízo Criminal de Évora (sessão de 19 de Janeiro de 2009); no PCS n.º 1466/07.3TABRG, do 1.º Juízo de Esposende (1 de Fevereiro de 2010); no PCC n.º 303/09.9JDLSB, do 2.º Juízo do Cartaxo (10 de Maio de 2010); no PCC n.º 26/09.9PTEVR, do 2.º Juízo Criminal de Évora (21 de Maio de 2010); no PCC n.º 158/08.0SVLSB, da 2.ª Vara Criminal de Lisboa (24 de Setembro de 2010); no PCC n.º 3283/09.7TACBR, do Tribunal Judicial da Comarca de Sátão (28 de Junho de 2011); no PCC n.º 8/11.0PBRGR, do Tribunal Judicial de Ribeira Grande (20 de Setembro de 2011), no PCC n.º 132/11.0JELSB, da 6.ª Vara Criminal de Lisboa (3 e 15 de Novembro de 2011).

No PCC n.º 422/02.SJPRT, da 2.ª Vara Criminal do Porto, foi usada a mesma fórmula na sessão de 29 de Junho de 2009, o que acontecera na anterior sessão de 14 de Maio de 2009, mas aqui com o acrescento da duração do depoimento (v. g., «com a duração de 34m39s»).

No PCC n.º 2381/07.6PAPTM, do 2.º Juízo Criminal de Portimão, na sessão de 4 de Abril de 2011, foi utilizada a mesma fórmula, mas na anterior de 11 de Março de 2011, com a audição de três testemunhas, o registo foi «depoimento ficou gravado em suporte digital».

Outras fórmulas, igualmente incumpridoras e incontornavelmente deficientes, à luz da exigência legal:

PCC n.º 29/01.1TACBC, do Tribunal Judicial de Cabeceiras de Basto, com sessões de julgamento em 6 e 27-11-2008 - «As suas declarações encontram-se gravadas em CD-ROM».

PCC n.º 34/05.9PAVNG, da 2.ª Vara de Competência Mista Vila Nova de Gaia - Sessão de 12 de Novembro de 2009 - Após identificação das testemunhas e prestação de juramento, consta «Registo do seu depoimento em suporte digital».

Esta mesma fórmula foi usada no PCC n.º 1042/07.0PAVNG, da mesma 2.ª Vara de Competência Mista de Vila Nova de Gaia, nas sessões de 28 de Setembro de 2010 e de 29 de Outubro de 2010.

PCC n.º 224/10.2JAGRD, do Tribunal Judicial de Almeida - acta da sessão de 5 de Julho de 2011 - declarações e depoimentos «gravados através do sistema Habilus Media Studio».

Face a estas concretas actas e a estes concretos modos de actuação a nível de registo dos tribunais onde é produzida a sindicável prova, cumpre colocar a questão de saber como, falhando, a montante, este pressuposto de recorribilidade, se possa exigir que o recorrente actue em conformidade com o disposto no n.º 4 do artigo 412.º e por via dele ao artigo 364.º, n.º 2, e proceda a especificações, de cariz meramente temporal, de situação temporal de registos de máquinas, por reporte a algo que, na verdade, nas actas, não existe, não está presente, logo, ausente está, como na injunção de contorno meramente formal, suposto era.

Como fazê-lo, com referência ao assinalado na acta, se desta nada consta, se nada assinalado está? A exigência contida no n.º 4 do artigo 412.º, ao impor que as especificações se façam por referência ao consignado na acta, supõe a existência de uma acta elaborada de acordo com a lei, onde se consigne, efectivamente, o início e o termo da gravação de cada declaração.

Se da acta nesse específico conspecto, contrariamente ao esperado e desejável cumprimento, nada consta, de concreto, pertinente e útil para esse efeito, de nada valerá, em boa verdade, a remissão para a acta.

Não pode o tribunal superior rejeitar o recurso, quando o tribunal recorrido não faz o chamado «trabalho de casa», isto é, fazer observar o comando do artigo 364.º, n.º 2, do CPP, e não compete aos sujeitos processuais o ónus de, em cada sessão, quais inspectores, assegurarem-se de que a acta está ou não a ser feita, como deve.

Num quadro de normalidade, o grau de exigência do tribunal de recurso tem de se compatibilizar com o grau de cumprimento das imposições legais por parte do tribunal recorrido, pois as partes não têm de pagar a factura de um menos conseguido modo de actuação e inexistente ou deficiente cumprimento das prescrições legais, por parte de quem tem o dever de cumprir a lei.

Mesmo nos casos em que se consignem tais elementos, ou seja, nos casos em que da acta, constem «o início e o termo da gravação de cada declaração», e o recorrente os omita, não é possível rejeitar liminarmente o recurso, quando pela conformação do seu objecto, dúvidas não há, de que se pretende uma efectiva impugnação de facto, maxime, pelo cumprimento das especificações dos pontos de facto que se considera incorrectamente julgados e as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, ou seja, quando por aquilo, que é substancial, na conformação da vinculação temática, se percebe o que é pretendido.

Importará olhar a substância e não dar prevalência ao formal.

Não é por tal omissão, referente apenas ao modo de especificação, que o recurso deixará de ser um efectivo recurso de facto, e esse desvio processual, quando o for, não justificará, nunca, no actual contexto da lei vigente, o radical, imediato, definitivo e incontornável indeferimento da pretensão recursiva, sem a legalmente prevista formulação de convite ao aperfeiçoamento, ao cabível suprimento da deficiência formal.

No caso do acórdão recorrido, não fazia sentido os recorrentes reportarem as especificações de impugnação ao que constava da acta, porque para tal efeito, a acta, diversamente do que era suposto acontecer, falhara no registo narrativo, era um documento absolutamente vazio, irrelevante, impertinente, inútil, perfeitamente anódino, enfim, nada reproduzia ou dizia.

Uma tal interpretação seria obviamente inconstitucional, desadequada, desproporcionada e contrária ao claro comando do artigo 417.º, n.º 3, do CPP.

Supondo ser de cumprir o disposto no artigo 417.º, n.º 3, do CPP, perguntar-se-á como realizar a injunção, como corresponder ao convite de preenchimento de deficiência, quando o quadro referencial nada adianta, ou seja, por nada conter, em nada contribui para a efectivação/preenchimento desse ónus, sendo, portanto, um convite ao inexequível, ao impossível cumprimento da injunção, enfim, ao natural desperdício, porque arredados os pressupostos que aquele exercício pressupunha.

Neste contexto, mais avisado e de acordo com as realidades da vida concreta, é, seguramente, o regime do processo civil, pois segundo o artigo 685.º-B do CPC, é imposto o ónus de especificação, apenas, desde que seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do n.º 2 do artigo 552.º-C (ou seja, com necessidade de ser assinalado na acta «o início e o termo da gravação» de cada depoimento, informação ou esclarecimento), devendo então indicar com exactidão as passagens em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição. Ou seja, o recorrente poderá transcrever as passagens, no sentido de excertos, vertendo na forma escrita, passos do discurso oral que foi gravado.

Mas, se não for possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, não se justificará a injunção, e daí não será possível, obviamente, o cumprimento do ónus.

E daí, naturalmente, a prevista transcrição - n.º 4 do artigo 685.º-B, do CPC.

A referência a «passagens» corresponde a «excertos», «partes», «segmentos», «trechos», «expressões parciais», não necessariamente descontextualizadas, de componentes extraídos do global discurso oral produzido em audiência, que foi gravado, e que, obviamente, têm de ter uma correspondência verbal e de sentido, com a base donde são extraídas, o que sempre será facilmente escrutinável.

A utilização dos vocábulos «passagens» e «depoimento» andam a par desde 1995.

Assim, no artigo 690.º-A do CPC, na versão do Decreto-Lei 39/95:

N.º 2 - refere passagens da gravação;

N.º 3 - refere-se já a depoimentos;

umas e outros sujeitos a transcrição.

No mesmo artigo 690.º-A, n.os 2, 3 e 5, na versão do Decreto-Lei 183/2000, só se refere «depoimentos», abandonando-se a referência a «passagens».

No actual artigo 685.º-B do CPC:

No n.º 2, referem-se «passagens» e respectiva transcrição;

No n.º 3, quando na dinâmica do mesmo recurso, está em causa a contra-alegação do recorrido, já não se refere a passagens, mas a «depoimentos» e respectiva transcrição.

Quando no n.º 4 do artigo 412.º se refere «passagens» pretende significar-se excertos dos depoimentos e não apenas o momento ou instante da gravação (cf. conclusão 7.ª apresentada pelo M.º P.º), bastando para tanto atender à prevista, quando possível, transcrição das passagens, como vimos, expressamente prevista actualmente, como acontecia em 1995, no processo civil.

Só em relação a passagens, no sentido de «excertos», «trechos», «segmentos», «passos», faz sentido reportar a respectiva transcrição, pois em relação aos momentos, aos instantes, aos minutos ou segundos, em que teve lugar a prestação da declaração e o consequente registo dessa prova oralmente produzida, como simples registos, consignações, anotações da temporalidade da respectiva produção/emissão, não caberá nunca a transcrição, mas apenas a anotação, a referência, apenas ao tempo em que se produziram (quanto tempo durou o depoimento e o inevitável simultâneo respectivo registo).

Por último, há que ter em consideração que a imposição da referência ao início e termo das declarações surgida no processo civil em 2000 (Decreto-Lei 183/2000), justificava-se por à época serem utilizadas nas gravações cassetes, havendo que identificar, precisar as «voltas» onde se encontravam os depoimentos, pois as cassetes não «falavam por si» quanto à localização e tempo de duração de cada depoimento.Com o avanço tecnológico passou a gravação a ser efectuada em CD, em que a leitura da localização passou a ser mais fácil, não se justificando a obrigatória participação do recorrente, pelo menos pelas mesmas razões.

Como assinalou o acórdão fundamento «Convém também ter presente que as actuais gravações em CD identificam desde logo o início e o fim de quem presta o seu depoimento, mediante a identificação deste, sendo muito mais perceptível agora dar conta de quem presta o seu depoimento do que com as anteriores gravações em cassete».

No momento histórico em que surgiu o n.º 4 do artigo 412.º na redacção de 2007, acolhendo o que no processo civil constava já de 2000, a referência ao «início e termo da declaração» fazia obviamente todo o sentido, pois a esse tempo o registo era efectuado através de cassetes, só vindo a ser alterado mais tarde.

Como se colhe do jornal da Habilândia, de 14 de Maio de 2008, dava-se conta de que iria ter início a implementação nos tribunais do sistema de gravação digital integrado no Habilus/Citius, o Habilus Media Studio.

As evoluções tecnológicas demandam novos normativos. A necessária adequação dos normativos às inovações tecnológicas conduzirá à supressão da referência ao início e termo da gravação, por carecer de justificabilidade substancial, ingressando muito provavelmente nos tempos próximos no rol das coisas caídas em desuso.

De qualquer forma, sempre se adiantará que a solução não passaria pela rejeição e nesse sentido citam-se dois acórdãos deste Supremo.

Segundo o acórdão de 1 de Julho de 2010, processo 241/08.2GAMTR.P1.S1, 5.ª Secção, CJSTJ 2010, t. 2, p. 218, «Se o recorrente, tendo embora indicado os pontos concretos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e as provas que impõem decisão diversa, com a indicação, nomeadamente, das testemunhas cujos depoimentos incidiram sobre tais pontos, que expressamente indicou, só lhe faltando indicar 'as concretas passagens das gravações em que se funda a impugnação que imporia decisão diversa', não se pode dizer que há uma total falta de especificações, mas quanto muito, uma incorrecta forma de especificar».

Tanto mais que, se o recorrente tem o ónus de indicar as concretas passagens das gravações, o tribunal tem o dever de atender a outras que considere relevantes para a descoberta da verdade (artigo 412.º, n.º 6, do CPP), sob pena de o recorrente «escolher» a passagem que mais lhe convém e omitir tudo o mais que não lhe interessa, assim se defraudando a verdade material.

E de acordo com o acórdão de 4 de Dezembro de 2008, processo 1886/08, 5.ª Secção, CJSTJ 2008, t. 3, p. 248, «Tendo o recorrente especificado os pontos de facto que considerou incorrectamente julgados e indicado as concretas provas que impunham decisão diversa, referenciando-as aos respectivos suportes técnicos, mas de uma forma genérica em relação a cada uma das provas, pela indicação das voltas onde começavam e acabavam os depoimentos gravados, cumpriu substancialmente o ónus de impugnação que a lei lhe impõe.

O facto de o recorrente não ter localizado com precisão, nos respectivos suportes, os excertos das provas com que foi ilustrando os seus pontos de vista, não constituía fundamento de rejeição liminar do recurso. Antes de rejeitar o recurso, devia o tribunal ter convidado o recorrente a corrigir as conclusões, referenciando as provas que impunham decisão diversa da recorrida aos precisos locais, nos suportes técnicos, onde se encontravam os excertos de que se serviu para fundamentar os seus pontos de vista».

Por tudo o que ficou exposto, afigura-se-nos que, em casos como o presente, a norma do n.º 4 do artigo 412.º do CPP deve ser interpretada no sentido de as especificações constantes das alíneas b) e c) do n.º 3 se mostrarem cumpridas, caso o recorrente transcreva as concretas passagens em que funda a impugnação da matéria de facto.

Decisão Pelo exposto, acorda-se no Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça em, na procedência do presente recurso extraordinário, revogar o acórdão recorrido e fixar jurisprudência nos seguintes termos:

«Visando o recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, basta, para efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, a referência às concretas passagens/excertos das declarações que, no entendimento do recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas, na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações».

Em consequência ordena-se que, oportunamente, o processo seja remetido à Relação do Porto para que profira nova decisão em conformidade com a jurisprudência fixada - artigo 445.º do Código de Processo Penal.

Não é devida taxa de justiça - artigo 513.º, n.º 1, do CPP.

Cumpra-se oportunamente o disposto no artigo 444.º, n.º 1, do CPP.

Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

Lisboa, 8 de Março de 2012. - Raul Eduardo do Vale Raposo Borges (relator) - Isabel Celeste Alves Pais Martins - Manuel Joaquim Braz - José António Carmona da Mota (com declaração de voto em anexo) - António Pereira Madeira - José Vaz dos Santos Carvalho (com a declaração de voto que junto) - António Silva Henriques Gaspar - António Artur Rodrigues da Costa - Armindo dos Santos Monteiro - José António Henriques dos Santos Cabral - António Jorge Fernandes de Oliveira Mendes - José Adriano Machado Souto de Moura - Eduardo Maia Figueira da Costa - António Pires Henriques da Graça - Luís António Noronha Nascimento (tem voto de conformidade do Cons. Arménio Sottomayor que não vota por não estar presente).

Declaração de voto Se «em ambos os casos (acórdão recorrido e acórdão fundamento) está ou esteve em causa a impugnação de matéria de facto registada, visando a respectiva reapreciação e, de modo a ser possível o alongamento do prazo de interposição de recurso de 20 para 30 dias, a observância do comando do artigo 412.º, n.º 3, alínea b), e n.º 4, do CPP;

Se, no caso do acórdão recorrido teve lugar uma decisão sumária na qual foi decidido rejeitar, porque interposto fora de prazo, o recurso apresentado pelos arguidos, a qual foi depois confirmada em acórdão proferido após reclamação para a conferência;

Se, no caso do acórdão fundamento, a questão, abordada em apreciação vestibular, era a de saber se o recurso deveria ser rejeitado por extemporâneo, já que o prazo seria de 20 dias e não 30 dias, por o recorrente (aparentemente) não se ter apoiado na prova gravada para impugnar a matéria de facto, não devendo por isso beneficiar do prazo alargado contemplado no artigo 411.º, n.º 4, do CPP».

Se, em ambas as situações os recorrentes, pretendendo impugnar a matéria de facto fixada pelo tribunal singular, não indicaram concretamente as passagens em que fundaram a impugnação, por reporte ao que constava (ou deveria constar) da acta, quanto ao início e termo da gravação, mas num e noutro caso, especificaram as concretas provas que em seu entendimento impunham uma decisão diversa da recorrida, acabando por identificar os depoimentos de que se pretendiam fazer valer e submeter a reexame, identificando quem os prestou e transcrevendo-os (mais especificamente, as concretas passagens da prova gravada que conduziriam a esse resultado na motivação);

Se a diferença entre um e outro dos acórdãos está no grau de exigência no cumprimento da formalidade imposta pelo n.º 4 do artigo 412.º do CPP, na amplitude do ónus de especificação das concretas provas gravadas, que imporiam decisão diversa da recorrida, por referência ao que consta da ata, com indicação concretizada das passagens em que se funda a impugnação;

Se a questão central em debate num e noutro dos processos em confronto gira em torno da questão de saber se é de exigir a referência concretizada às passagens que justificam o reexame, referenciando o recorrente necessariamente o que foi consignado na ata, ou se, tendo prescindido dessa indicação - suposto que a acta continha os elementos necessários -, será suficiente a transcrição dessas mesmas passagens;

Perguntar-se-á, desde logo, se «transcrever os depoimentos (passagens de depoimentos) que imponham solução diversa da adoptada pela decisão impugnada, mas não referenciando o consignado na ata quando esta é omissa a esse respeito, é ainda fazer uma indicação concreta, satisfazendo-se a imposição legal do n.º 4 do artigo 412.º do CPP».

Por outro lado, não tendo o relator convidado o recorrente a completar as conclusões formuladas, apesar de estabelecer o n.º 3 do artigo 417.º do CPP, na redação dada pela reforma de 2007, que «o relator convida o recorrente a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afetada [...] se a motivação do recurso não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.os 2 a 5 do artigo 412.º», concluir-se-á que «antes de rejeitar o recurso, devia o tribunal ter convidado o recorrente a corrigir as conclusões, referenciando as provas que impunham decisão diversa da recorrida aos precisos locais, nos suportes técnicos, onde se encontravam os excertos de que se serviu para fundamentar os seus pontos de vista».

Mas não tendo sido consignado em ata «o início e o termo da gravação de cada declaração» nem tendo o relator convidado o recorrente a corrigir as conclusões do recurso, referenciando as provas que imporiam decisão diversa da recorrida aos precisos locais onde, nos respectivos suportes técnicos, se encontravam consignadas, terá de se concluir, como concluiu o acórdão de uniformização, que a norma do n.º 4 do artigo 412.º do CPP deve ser interpretada no sentido de as especificações constantes das alíneas b) e c) do n.º 3 deverem ter-se por satisfeitas quando o recorrente especifique as concretas provas que em seu entendimento imponham decisão diversa da recorrida e indique os depoimentos de que se pretende fazer valer e submeter a reexame, identificando quem os prestou e transcrevendo-os, mais especificamente as concretas passagens da prova gravada que conduziriam a esse resultado.

Justificar-se-ia, pois, que o assento, além do mais, tivesse encarado a convolação do prazo geral para o prazo especial em caso de recurso da matéria de facto e, bem assim, o convite ao aperfeiçoamento - se a acta o consentisse, mesmo depois de eventualmente rectificada a pedido ou oficiosamente - das conclusões desse recurso Ainda que sem sucesso, sugerimos por isso para o assento, durante a sua discussão, a seguinte redação alternativa, mais próxima, que a do projecto, da letra dos textos interpretados:

«I - Visando o recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, haverá lugar à elevação de 20 para 30 dias do prazo para interposição do recurso, nos termos do artigo 411.º, n.º 4, do CPP, se, na ausência de consignação em ata do início e termo da gravação digital de cada declaração (artigo 364.º, n.º 2), o recorrente tiver identificado e transcrito as concretas passagens/excertos da prova gravada que, no seu entendimento, impusessem decisão diversa da recorrida.

II - Se, diversamente, a ata contiver essa consignação, o recorrente deverá fazer as especificações por referência ao consignado e, não o fazendo, deverá ser convidado a suprir a omissão, sob pena de rejeição do respectivo recurso (artigo 417.º, n.º 3, do C. P. P.» J. Carmona da Mota - J. Santos Carvalho.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2012/04/18/plain-290915.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/290915.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1929-02-15 - Decreto 16489 - Ministério da Justiça e dos Cultos - Direcção Geral da Justiça e dos Cultos

    APROVA O CODIGO DE PROCESSO PENAL.

  • Tem documento Em vigor 1975-11-03 - Decreto-Lei 605/75 - Ministério da Justiça - Gabinete do Ministro

    Altera o Código de Processo Penal e institui o júri.

  • Tem documento Em vigor 1977-09-06 - Decreto-Lei 377/77 - Ministério da Justiça

    Revê diversas disposições relativas à legislação de Processo Penal.

  • Tem documento Em vigor 1982-10-27 - Decreto-Lei 433/82 - Ministério da Justiça

    Institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1985-07-09 - Decreto-Lei 242/85 - Ministério da Justiça

    Altera vários artigos do Código de Processo Civil.

  • Tem documento Em vigor 1987-02-17 - Decreto-Lei 78/87 - Ministério da Justiça

    Aprova o Código de Processo Penal.

  • Tem documento Em vigor 1987-06-01 - Lei 17/87 - Assembleia da República

    Altera, para 1 de Janeiro de 1988, a data de entrada em vigor do Código de Processo Penal, prevista no n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 78/87 de 17 de Fevereiro.

  • Tem documento Em vigor 1992-01-08 - Acórdão 401/91 - Tribunal Constitucional

    DECLARA A INCONSTITUCIONALIDADE COM FORÇA OBRIGATÓRIA GERAL, DA NORMA DO ARTIGO 665 DO CODIGO DE PROCESSO PENAL DE 1929, (RECURSO DAS DECISÕES CONDENATORIAS DOS TRIBUNAIS COLECTIVOS CRIMINAIS PARA O TRIBUNAL DA RELACAO), NA INTERPRETAÇÃO QUE LHE FOI DADA PELO ASSENTO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE 29 DE JUNHO DE 1934, POR VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 32, NUMERO 2 DA CONSTITUICAO.

  • Tem documento Em vigor 1995-02-15 - Decreto-Lei 39/95 - Ministério da Justiça

    Revê, em ordem a consagração da regra da gravação sonora, sem inviabilizar o recurso a meios audiovisuais ou a outros processos técnicos semelhantes de que o tribunal possa dispor, varias matérias em sede dos Códigos de Processo Civil (aprovado pelo Decreto Lei 44129, de 28 de Dezembro de 1961), e das Custas Judiciais (aprovado pelo Decreto Lei 44329, de 8 de Maio de 1962). Dispõe, nomeadamente, quanto ao registo dos depoimentos, aos procedimentos cautelares, aos processos especiais e sumário, adiamento da (...)

  • Tem documento Em vigor 1995-08-18 - Lei 33/95 - Assembleia da República

    AUTORIZA O GOVERNO A REVER O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, O CÓDIGO CIVIL E AS LEIS DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA NOS TERMOS RESULTANTES DA PRESENTE LEI. AS ALTERAÇÕES A INTRODUZIR NA EXECUÇÃO DESTA AUTORIZAÇÃO VISAM CONCRETIZAR, NO PROCESSO CIVIL, O DIREITO FUNDAMENTAL DE ACESSO A JUSTIÇA E AOS TRIBUNAIS, CONSAGRANDO QUE TAL DIREITO ENVOLVE A OBTENÇÃO, EM PRAZO RAZOÁVEL, DE UMA DECISÃO DE MÉRITO E AFIRMANDO COMO PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES DO PROCESSO CIVIL O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO, DESIGNADAMENTE NA MEDIDA EM QU (...)

  • Tem documento Em vigor 1995-11-28 - Decreto-Lei 317/95 - Ministério da Justiça

    Revê o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87 de 17 de Fevereiro.

  • Tem documento Em vigor 1995-12-12 - Decreto-Lei 329-A/95 - Ministério da Justiça

    Revê o Código de Processo Civil. Altera o Código Civil e a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais

  • Tem documento Em vigor 1996-09-25 - Decreto-Lei 180/96 - Ministério da Justiça

    Revê o Código de Processo Civil, altera o Decreto-Lei 329-A/95 de 12 de Dezembro que o reviu e republicou e rectifica algumas inexactidões na republicação do Código em anexo ao citado diploma.

  • Tem documento Em vigor 1997-09-20 - Lei Constitucional 1/97 - Assembleia da República

    Aprova a quarta revisão da Constituição da República Portuguesa, de 2 de Abril de 1976, e fixa normas para aplicação no tempo de alguns dos preceitos revistos. Publica, em anexo, o novo texto constitucional.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-25 - Lei 59/98 - Assembleia da República

    Altera o Código do Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87 de 17 de Fevereiro, na redacção introduzida pelos Decretos-Leis 387-E/87, de 29 de Dezembro, 212/89, de 30 de Junho e 317/95, de 28 de Novembro. Republicado na integra, o referido código, com as alterações resultantes deste diploma.

  • Tem documento Em vigor 1999-01-13 - Lei 3/99 - Assembleia da República

    Aprova a lei de organização e funcionamento dos Tribunais Judiciais.

  • Tem documento Em vigor 1999-09-20 - Decreto-Lei 375-A/99 - Ministério da Justiça

    Altera o Código de Processo Civil, o Código do Registo Predial, o Código do Registo Comercial, o Código do Registo Civil, o Código do Notariado e o Código da Propriedade Industrial.

  • Tem documento Em vigor 2000-07-21 - Acórdão 337/2000 - Tribunal Constitucional

    Declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante dos artigos 412º, nº 1, e 420º, nº 1, do Código do Processo Penal (na redacção anterior à Lei nº 59/98, de 25 de Agosto), quando interpretados no sentido de a falta de concisão das conclusões da motivação implicar a imediata rejeição do recurso, sem que previamente seja feito convite ao recorrente para suprir tal deficiência.

  • Tem documento Em vigor 2000-08-10 - Decreto-Lei 183/2000 - Ministério da Justiça

    Altera o Código de Processo Civil, estabelecendo nalgumas situações a possibilidade da citação por via postal simples; prevê um novo regime legal de prestação de depoimento pelo surdo, mudo ou surdo mudo; desonera as secretarias judiciais das tarefas de liquidação, emissão de guias e contabilidade da taxa de justiça inicial e subsequente ao longo do Processo, e dispõe também quanto ao adiamento da audiência por falta de testumunha, de advogado, de peritos ou consultores técnicos. Altera ainda o Decreto-Lei (...)

  • Tem documento Em vigor 2000-12-15 - Decreto-Lei 320-C/2000 - Ministério da Justiça

    Altera o Código de Processo Penal, estabelecendo medidas de simplificação e combate à morosidade processual.

  • Tem documento Em vigor 2000-12-20 - Lei 30-D/2000 - Assembleia da República

    Altera o Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei 44129, de 28 de Dezembro de 1961.

  • Tem documento Em vigor 2001-03-31 - Declaração de Rectificação 9-F/2001 - Presidência do Conselho de Ministros

    Rectifica o Decreto-Lei 320-C/2000, de 15 de Dezembro - Altera o Código de Processo Penal, estabelecendo medidas de simplifiação e combate à morosidade processual.

  • Tem documento Em vigor 2001-07-16 - Acórdão 265/2001 - Tribunal Constitucional

    Declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade [por violação do nº 10 do art. 32º, em conjugação com o nº 2 do art. 18º da Constituição] da norma que resulta das disposições conjugadas constantes do n.º 3 do artigo 59.º e do n.º 1 do artigo 63.º, ambos do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, na dimensão interpretativa segundo a qual a falta de formulação de conclusões na motivação de recurso, por via do qual se intenta impugnar a decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima (...)

  • Tem documento Em vigor 2002-02-19 - Lei 13/2002 - Assembleia da República

    Aprova o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, altera o regime jurídico das empreitadas de obras públicas, o Código de Processo Civil, o Código das Expropriações e a Lei de Bases do Ambiente.

  • Tem documento Em vigor 2002-10-07 - Acórdão 320/2002 - Tribunal Constitucional

    Declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma do artigo 412.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções contidas nas suas alíneas a), b) e c) tem como efeito a rejeição liminar do recurso do arguido, sem que ao mesmo seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência (Proc.º 754/01).

  • Tem documento Em vigor 2005-12-06 - Acórdão 9/2005 - Supremo Tribunal de Justiça

    Fixa jurisprudência no seguinte sentido: quando o recorrente impugne a decisão em matéria de facto e as provas tenham sido gravadas, o recurso deve ser interposto no prazo de 15 dias, fixado no artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, não sendo subsidiariamente aplicável em processo penal o disposto no artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil.

  • Tem documento Em vigor 2006-02-27 - Lei 6/2006 - Assembleia da República

    Aprova o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), que estabelece um regime especial de actualização das rendas antigas, e altera o Código Civil, o Código de Processo Civil, o Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e o Código do Registo Predial. Republica em anexo o capítulo IV do título II do livro II do Código Civil.

  • Tem documento Em vigor 2006-03-29 - Decreto-Lei 76-A/2006 - Ministérios das Finanças e da Administração Pública e da Justiça

    Actualiza e flexibiliza os modelos de governo das sociedades anónimas, adopta medidas de simplificação e eliminação de actos e procedimentos notariais e registrais e aprova o novo regime jurídico da dissolução e da liquidação de entidades comerciais. Torna facultativas as escrituras públicas relativas a actos da vida das empresas, deixam de ser obrigatórias, designadamente, as escrituras públicas para constituição de uma sociedade comercial, alteração do contrato ou estatutos das sociedades comerciais, aume (...)

  • Tem documento Em vigor 2006-04-26 - Lei 14/2006 - Assembleia da República

    Altera o Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28 de Dezembro de 1961, bem como o Estatuto da Câmara dos Solicitadores, o regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, e o Decreto-Lei n.º 202/2003, de 10 de Setembro.

  • Tem documento Em vigor 2007-02-02 - Lei 6/2007 - Assembleia da República

    Autoriza o Governo a alterar o regime dos recursos em processo civil e o regime dos conflitos de competência.

  • Tem documento Em vigor 2007-08-24 - Decreto-Lei 303/2007 - Ministério da Justiça

    Altera, no uso de autorização legislativa concedida pela Lei n.º 6/2007, de 2 de Fevereiro, o Código de Processo Civil, procedendo à revisão do regime de recursos e de conflitos em processo civil e adaptando-o à prática de actos processuais por via electrónica; introduz ainda alterações à Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais e aos Decretos-Leis n.os 269/98, de 1 de Setembro ( procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não (...)

  • Tem documento Em vigor 2007-08-29 - Lei 48/2007 - Assembleia da República

    Altera (15.º alteração) e republica o Código de Processo Penal.

  • Tem documento Em vigor 2007-10-26 - Declaração de Rectificação 100-A/2007 - Assembleia da República

    Rectifica a Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto (15ªalteração ao Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87, de 17 de Fevereiro) procedendo à republicação integral quer da Lei quer do Código de Processo Penal, em anexo.

  • Tem documento Em vigor 2007-11-09 - Declaração de Rectificação 105/2007 - Assembleia da República

    Rectifica a Declaração de Rectificação n.º 100-A/2007, de 26 de Outubro, que rectifica a Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, que procede à 15.ª alteração e republica o Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, procedendo á republicação integral da declaração de rectificação, da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, e do respectivo anexo com a republicação do Código de Processo Penal.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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