de 18 de Dezembro
O n.º 4 do artigo 4.º do Decreto-Lei 187/95, de 27 de Julho, estabeleceu um limite máximo ao crescimento tarifário para os consumidores de electricidade em baixa tensão igual à taxa de inflação prevista. Da aplicação desta limitação legal resultou que os custos e encargos associados ao funcionamento do Sistema Eléctrico Nacional (SEN) não puderam ser recuperados pelos proveitos gerados, originando-se um défice tarifário, a recuperar em anos futuros.O Decreto-Lei 29/2006, de 15 de Fevereiro, que, no contexto da liberalização do mercado eléctrico, estabelece as bases gerais da organização e funcionamento do SEN, bem como as bases gerais aplicáveis ao exercício das actividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de electricidade e à organização dos mercados de electricidade, veio determinar o fim daquela limitação.
A Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), no uso das suas competências relativamente ao SEN e tendo em conta os princípios definidos no actual Regulamento Tarifário, elaborou a sua proposta de tarifas e preços de electricidade para 2007. Nesta proposta verifica-se que, da conjugação entre a ausência de limite ao aumento tarifário para os consumidores em baixa tensão, a recuperação do défice tarifário em três anos e, ainda, os demais factores que intervêm na formação das tarifas iriam resultar aumentos tarifários excessivamente bruscos, especialmente na baixa tensão normal. Os aumentos propostos, a verificarem-se, teriam impactes negativos, tanto ao nível da inflação como do poder de compra dos consumidores.
Neste contexto, importa aumentar para 10 anos o período de recuperação do défice tarifário acumulado por forma a diluir os seus impactes. Por outro lado, atendendo a que 2007 é um ano de transição, o Governo, sem prejuízo dos princípios e regras constantes do Decreto-Lei 29/2006, de 15 de Fevereiro, considera dever ser estabelecido, com carácter transitório, um limite máximo de aumento das tarifas e preços de electricidade de 2007 para os consumidores em baixa tensão normal, limitando-se, assim, os impactes do seu aumento no respectivo poder de compra.
No âmbito da resolução do défice tarifário, define-se o mecanismo de recuperação através das tarifas, competindo à ERSE a sua operacionalização. Prevê-se, ainda, a possibilidade de transmissão a terceiros dos direitos de crédito associados ao défice tarifário.
Por último, e reconhecendo que a natureza previsional dos parâmetros utilizados para a fixação anual das tarifas de electricidade cria, em geral, ajustamentos, por vezes relevantes, entre o valor dos proveitos permitidos e dos proveitos facturados resultantes da aplicação dessas tarifas, apurados em cada ano, autoriza-se também a transmissibilidade a terceiros dos direitos de cobrança desses ajustamentos, nos termos previstos no Regulamento Tarifário.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas, as associações de consumidores e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Foi ouvida, a título facultativo, a ERSE.
Foi promovida a audição do Conselho Nacional do Consumo.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto e âmbito
1 - O presente decreto-lei define as regras aplicáveis à recuperação do défice tarifário devido às entidades titulares das concessões da rede nacional de transporte (RNT), da rede nacional de distribuição (RND), das redes de distribuição em baixa tensão, bem como às entidades detentoras de licenças de comercialização de último recurso.2 - O presente decreto-lei regula, ainda, o regime aplicável aos ajustamentos tarifários apurados em cada ano devidos às entidades titulares das concessões da RNT, da RND, das redes de distribuição em baixa tensão, das redes de transporte e distribuição da Região Autónoma dos Açores, das redes de transporte e distribuição da Região Autónoma da Madeira e ainda às entidades detentoras de licença de comercializador de último recurso no continente e nas Regiões Autónomas.
Artigo 2.º
Mecanismo de recuperação do défice tarifário
1 - O montante do défice tarifário que resulte da aplicação das tarifas de venda a clientes finais nos anos de 2006 e 2007, acrescido dos respectivos encargos financeiros calculados à taxa referida na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º, é integralmente recuperado pelos operadores regulados através da sua integração na tarifa de uso global do Sistema (tarifa UGS) relativa à baixa tensão, nos termos do Regulamento Tarifário, tendo em conta o disposto no n.º 4 do artigo 66.º do Decreto-Lei 172/2006, de 23 de Agosto, na redacção introduzida pelo artigo 5.º do presente decreto-lei.
2 - Os custos associados à convergência tarifária entre o continente e as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira na parte não reflectida nas tarifas fixadas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) para 2006 e 2007, por virtude da limitação imposta pelo artigo 138.º do Regulamento Tarifário e do disposto no n.º 2 do artigo 6.º do presente decreto-lei, acrescidos dos respectivos encargos financeiros calculados à taxa referida na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º, são recuperados através da tarifa UGS global, em prestações iguais, ao longo de um período de 10 anos, a contar a partir de 31 de Dezembro de 2007.
3 - A partir de 31 de Dezembro de 2007, os ajustamentos anuais entre os custos previstos e os efectivos, associados ao princípio da convergência tarifária entre o continente e as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, acrescidos dos respectivos encargos financeiros calculados à taxa referida na alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º, são recuperados na tarifa UGS global, nos termos do Regulamento Tarifário.
4 - O montante do ajustamento tarifário ocorrido no período entre 1999 e 2003, resultante do pagamento faseado das responsabilidades relativas aos terrenos referidos nos n.os 3 e 4 do n.º 6.º da Portaria 96/2004, de 23 de Janeiro, é recuperado através da sua integração na tarifa UGS global, nos termos a definir no Regulamento Tarifário, tendo em consideração a protecção dos consumidores e um prazo para a recuperação compatível, no mínimo, com o definido para recuperação do défice tarifário.
5 - Os direitos reconhecidos nos números anteriores mantêm-se mesmo em caso de insolvência ou cessação superveniente da actividade que cada uma das entidades referidas no n.º 1 do artigo anterior desenvolve actualmente.
Artigo 3.º
Transmissibilidade do direito ao recebimento do défice tarifário e dos
ajustamentos tarifários
1 - Os operadores regulados podem ceder a terceiros, para quaisquer efeitos, no todo ou em parte, o direito a receber através das tarifas da electricidade os montantes relativos ao pagamento dos valores referidos no artigo anterior, bem como dos ajustamentos tarifários previstos no actual Regulamento Tarifário.2 - No caso de cessão do direito ao recebimento do défice ou dos ajustamentos tarifários e encargos financeiros associados, os respectivos cessionários não são considerados, para qualquer efeito, como entidades intervenientes no SEN, mas beneficiam do regime previsto no presente decreto-lei para a tutela dos direitos dos operadores regulados, nomeadamente no que respeita à facturação e cobrança dos créditos cedidos e à entrega dos montantes cobrados através das tarifas de electricidade que continuam a ser asseguradas.
3 - Em caso de insolvência de qualquer das entidades referidas no n.º 1, ou dos respectivos depositários, os montantes que estejam na sua posse, decorrentes de pagamentos relativos a défices ou ajustamentos tarifários, não integram a respectiva massa insolvente.
4 - Para efeitos do número anterior, compete à ERSE proceder, no mais curto prazo possível, à determinação do montante do défice ou dos ajustamentos tarifários para sua entrega imediata ao operador regulado relevante ou às entidades a que haja cedido o direito ao seu recebimento.
5 - Os valores dos encargos incluídos nas tarifas de electricidade, de acordo com o disposto no artigo anterior e no presente artigo, são exclusivamente afectos ao pagamento a cada um dos operadores regulados dos montantes mencionados naqueles preceitos, pelo que não respondem, nomeadamente, por outras dívidas de quaisquer entidades compreendidas na cadeia de facturação do SEN ou dos respectivos depositários e estão sujeitos a adequada descrição contabilística e a depósito, segregados nessas entidades e nos respectivos depositários.
Artigo 4.º
Cálculo e divulgação
1 - Anualmente, a ERSE, no despacho de fixação das tarifas aplicáveis ao ano seguinte, procede ao cálculo e divulgação pública dos seguintes montantes:a) Saldo do défice tarifário actualizado à taxa EURIBOR a três meses, em vigor no último dia do mês de Junho do ano em que ocorre a fixação das tarifas de electricidade, acrescida de meio ponto percentual, em conformidade com o disposto no actual artigo 137.º do Regulamento Tarifário, e deduzido dos montantes estimados a receber pelos operadores regulados no ano em curso, devendo identificar, segregadamente, em relação a cada operador, o montante global que se encontra em dívida e o montante que será recuperado nas tarifas durante o ano seguinte, nos termos do artigo 2.º do presente decreto-lei;
b) Dos ajustamentos tarifários apurados em relação aos dois anos anteriores, devendo identificar, segregadamente, em relação a cada operador regulado, o montante que será integrado nas tarifas por actividade a que respeitem os ajustamentos para permitir a recuperação, nos termos previstos no artigo 3.º do presente decreto-lei, do valor integral daqueles ajustamentos e dos encargos financeiros, actualizados à taxa de juro prevista no Regulamento Tarifário para actualização destes montantes.
2 - Para os efeitos do número anterior, a ERSE deve identificar, de forma clara e segregada, o valor global do encargo a integrar nas tarifas de electricidade que, em cada momento relevante, se destina a permitir a recuperação de um determinado montante do défice tarifário ou dos ajustamentos tarifários por cada um dos operadores regulados, conforme previsto no Regulamento Tarifário.
Artigo 5.º
Alteração ao Decreto-Lei 172/2006, de 23 de Agosto
O artigo 66.º do Decreto-Lei 172/2006, de 23 de Agosto, passa a ter a seguinte redacção:
«Artigo 66.º
[...]
1 - ...........................................................................2 - ...........................................................................
3 - ...........................................................................
4 - O défice tarifário acumulado é recuperado nas tarifas, no prazo de 10 anos a contar de 31 de Dezembro de 2007, sendo os respectivos montantes repartidos em prestações constantes durante o período de recuperação.»
Tarifas para 2007
1 - A título transitório, as tarifas a fixar para o ano de 2007 aplicáveis aos consumidores em baixa tensão normal não podem sofrer um aumento superior a 6% relativamente às tarifas que vigoram no ano de 2006.2 - Igualmente a título transitório, e tendo em conta que os aumentos das tarifas para 2007 serão superiores à taxa de inflação prevista, as tarifas de venda de electricidade a clientes finais a fixar para o ano de 2007 não incluirão os custos com a convergência tarifária entre o continente e as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
Artigo 7.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 16 de Novembro de 2006. - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - António José de Castro Guerra.
Promulgado em 14 de Dezembro de 2006.
Publique-se.O Presidente da República, ANÍBAL CAVACO SILVA.
Referendado em 15 de Dezembro de 2006.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.