Lei 15/90
de 30 de Junho
Atribuições, competências, organização e funcionamento da Alta Autoridade para a Comunicação Social
A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164.º, alínea d), 167.º, alínea l), e 169.º, n.º 3, da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO I
Natureza, atribuições e competências
Artigo 1.º
Âmbito
A presente lei regula as atribuições, competências, organização e funcionamento da Alta Autoridade para a Comunicação Social.
Artigo 2.º
Natureza do órgão
A Alta Autoridade para a Comunicação Social, adiante abreviadamente designada por Alta Autoridade, é um órgão independente, que funciona junto da Assembleia da República.
Artigo 3.º
Atribuições
Incumbe à Alta Autoridade:
a) Assegurar o exercício do direito à informação e à liberdade de imprensa;
b) Zelar pela independência dos órgãos de comunicação social perante os poderes político e económico;
c) Salvaguardar a possibilidade de expressão e confronto, através dos meios de informação, das diversas correntes de opinião;
d) Contribuir para a isenção do processo de licenciamento dos emissores privados de radiodifusão e de radiotelevisão;
e) Providenciar pela isenção e rigor da informação;
f) Contribuir para garantir a independência e o pluralismo de cada órgão de comunicação social do sector público;
g) Garantir o exercício dos direitos de antena, de resposta e de réplica política.
Artigo 4.º
Competências
1 - Compete à Alta Autoridade, para a prossecução das suas atribuições:
a) Elaborar directivas genéricas e recomendações que visem a realização dos objectivos constantes das alíneas a), b), c), e), f) e g) do artigo anterior;
b) Apreciar as condições de acesso aos direitos de antena, de resposta e de réplica política, pronunciando-se sobre as queixas que, a esse respeito, lhe sejam apresentadas;
c) Arbitrar os conflitos suscitados entre os titulares do direito de antena, na rádio e na televisão, quanto à elaboração dos respectivos planos gerais de utilização;
d) Deliberar sobre os recursos interpostos em caso de recusa de exercício do direito de resposta;
e) Emitir parecer prévio, público e fundamentado, sobre a nomeação e exoneração dos directores dos órgãos de comunicação social pertencentes ao Estado e a outras entidades públicas ou a entidades directa ou indirectamente sujeitas ao seu controlo económico;
f) Emitir parecer prévio à decisão de licenciamento, pelo Governo, de canais privados de televisão;
g) Apreciar as candidaturas à atribuição de alvará para o exercício da actividade de radiodifusão e emitir parecer fundamentado sobre as mesmas, a apresentar ao Governo;
h) Fiscalizar o cumprimento das normas referentes à participação de capital nacional e estrangeiro nas empresas de comunicação social;
i) Fiscalizar o cumprimento das normas que obriguem as empresas de comunicação social à publicitação de dados de qualquer espécie;
j) Elaborar e tornar público, anualmente, durante o 1.º trimestre seguinte ao período a que disser respeito, um relatório da sua actividade;
l) Apreciar, a título gracioso, queixas em que se alegue a violação das normas legais aplicáveis aos órgãos de comunicação social, adoptando as providências adequadas;
m) Exercer as funções relativas à publicação de sondagens nos termos das leis aplicáveis;
n) Classificar as publicações periódicas;
o) Praticar os demais actos previstos na lei ou necessários ao desempenho das suas competências.
2 - A Alta Autoridade pode, fundamentadamente, solicitar a todas as entidades públicas as informações necessárias ao exercício das suas competências.
3 - A Alta Autoridade pode, fundamentadamente, solicitar às entidades referidas na alínea e) do n.º 1 as informações necessárias ao exercício das suas funções ou a presença ou participação nas suas reuniões de membros dos seus órgãos sociais ou de direcção.
Artigo 5.º
Natureza das deliberações
1 - As deliberações da Alta Autoridade tomadas no exercício das competências previstas nas alíneas b), c) e d) do artigo anterior têm carácter vinculativo.
2 - No exercício da actividade de fiscalização prevista nas alíneas h) e i) do artigo anterior, a Alta Autoridade comunicará aos órgãos competentes para a instrução do respectivo processo a violação das normas aí referidas.
3 - O licenciamento, pelo Governo, dos canais privados de televisão só pode recair sobre candidatura que tenha sido objecto de parecer favorável da Alta Autoridade.
4 - A Alta Autoridade deve participar às entidades competentes o eventual desrespeito das suas directivas, recomendações ou deliberações por parte de qualquer membro da direcção dos órgãos de comunicação social referidos na alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º
Artigo 6.º
Nomeação e exoneração dos directores
1 - Em caso de nomeação ou exoneração dos directores, o parecer a que se refere a alínea e) do artigo 4.º deve ser emitido no prazo de 10 dias úteis, contados a partir da data de recepção do respectivo pedido.
2 - A não emissão, dentro do prazo, do parecer referido no número anterior equivale à emissão de parecer favorável.
3 - Em caso de urgência, devidamente fundamentada, previamente comunicada à Alta Autoridade, os órgãos de gestão podem proceder à nomeação dos directores, a título interino, até à emissão do parecer da Alta Autoridade.
Artigo 7.º
Recusa do direito de resposta
1 - Em caso de recusa do exercício do direito de resposta por parte de qualquer órgão de comunicação social, o titular daquele pode recorrer para a Alta Autoridade no prazo de 30 dias a contar da verificação da recusa.
2 - A Alta Autoridade deve solicitar às partes interessadas todos os elementos, incluindo registos magnéticos, necessários ao conhecimento do recurso, que devem ser enviados no prazo de cinco dias a contar da recepção do pedido.
3 - A recusa da prestação dos elementos solicitados nos termos do número anterior constitui contra-ordenação punível com coima de 100000$00 a 1000000$00, cabendo o respectivo processamento à Direcção-Geral da Comunicação Social.
4 - A Alta Autoridade deve proferir a sua deliberação até ao 15.º dia a contar da apresentação do recurso.
Artigo 8.º
Dever de colaboração
Os órgãos de comunicação social devem prestar à Alta Autoridade toda a colaboração que, fundamentadamente e no quadro da presente lei, lhes seja solicitada como necessária à prossecução das suas atribuições e ao exercício das suas competências.
CAPÍTULO II
Membros da Alta Autoridade
Artigo 9.º
Composição
1 - A Alta Autoridade é constituída por:
a) Um magistrado, designado pelo Conselho Superior da Magistratura, que preside;
b) Cinco membros eleitos pela Assembleia da República segundo o sistema proporcional e método da média mais alta de Hondt;
c) Três membros designados pelo Governo;
d) Quatro membros cooptados pelos demais, representativos, designadamente, da opinião pública, da comunicação social e da cultura.
2 - Os membros da Alta Autoridade elegem de entre si o vice-presidente deste órgão.
Artigo 10.º
Incapacidade e incompatibilidades
1 - Não podem ser membros da Alta Autoridade os cidadãos que não se encontrem no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos.
2 - Sem prejuízo do disposto na lei, a função de membro da Alta Autoridade é ainda incompatível com o exercício dos seguintes cargos ou funções:
a) Membro efectivo dos órgãos sociais ou de direcção de qualquer órgão de comunicação social;
b) Dirigente em órgãos de partidos, de associações políticas ou de fundações com eles conexos e de organizações de classe.
Artigo 11.º
Posse
Os membros da Alta Autoridade tomam posse perante o Presidente da Assembleia da República, no decurso dos 10 dias seguintes ao da publicação da lista dos eleitos na 1.ª série do Diário da República.
Artigo 12.º
Duração do mandato
1 - O mandato dos membros da Alta Autoridade tem a duração de quatro anos, contados desde a data da tomada de posse referida no artigo anterior, sem prejuízo do disposto no n.º 4.
2 - Os membros da Alta Autoridade não podem ser chamados a exercer mais de dois mandatos consecutivos.
3 - As vagas que ocorrerem no decurso de um mandato devem ser preenchidas no prazo de 30 dias pelas entidades competentes, salvo motivo de força maior, não havendo lugar à contagem de novo mandato para os substitutos.
4 - O exercício do mandato dos membros cessantes da Alta Autoridade prolongar-se-á até à posse dos substitutos.
Artigo 13.º
Inamovibilidade
Os membros da Alta Autoridade são inamovíveis, não podendo as suas funções cessar antes do termo do mandato para que foram escolhidos, salvo nos seguintes casos:
a) Morte ou impossibilidade física permanente;
b) Renúncia ao mandato;
c) Perda do mandato.
Artigo 14.º
Renúncia
Os membros da Alta Autoridade podem renunciar ao mandato através de declaração escrita apresentada ao seu presidente e publicada na 2.ª série do Diário da República.
Artigo 15.º
Perda do mandato
1 - Perdem o mandato os membros da Alta Autoridade que:
a) Venham a ser abrangidos por qualquer das incapacidades ou incompatibilidades previstas na lei;
b) Faltem a três reuniões consecutivas ou a seis interpoladas, salvo invocação de motivo que a Alta Autoridade considere atendível;
c) Cometam violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º, comprovada por decisão judicial.
2 - A perda do mandato será objecto de deliberação a publicar na 2.ª série do Diário da República.
Artigo 16.º
Direitos e regalias
1 - Os membros da Alta Autoridade são remunerados e percebem os demais abonos e regalias sociais de acordo com a tabela indiciária e o regime fixados para o cargo de director-geral, com a faculdade de optar pelas remunerações correspondentes ao lugar de origem.
2 - O presidente da Alta Autoridade tem direito a um abono mensal para despesas de representação de valor percentual sobre o respectivo vencimento igual ao fixado para os presidentes dos grupos parlamentares da Assembleia da República.
3 - Os membros da Alta Autoridade beneficiam das seguintes garantias:
a) Não podem ser prejudicados na estabilidade do seu emprego, na sua carreira profissional, nomeadamente nas promoções a que entretanto tenham adquirido direito, nem nos concursos públicos a que se submetam e ainda no regime de segurança social de que beneficiem;
b) O período correspondente ao exercício do mandato considera-se, para todos os efeitos legais, como prestado no lugar de origem, mantendo-se todos os direitos, subsídios, regalias sociais, remuneratórias e quaisquer outras correspondentes àquele lugar;
c) Quando à data do início do seu mandato se encontrem investidos em cargo público de exercício temporário, por virtude de lei, acto ou contrato, ou em comissão de serviço, o respectivo prazo é suspenso pelo período correspondente ao do mandato;
d) O período de duração do respectivo mandato suspende, a requerimento do interessado, a contagem dos prazos para a apresentação de relatórios curriculares ou prestação de provas para a carreira docente do ensino superior ou para a de investigação científica, bem como a contagem dos prazos dos contratos de professores convidados, assistentes, assistentes estagiários e assistentes convidados;
e) Quando cessem funções, retomam automaticamente as que exerciam à data da designação, só podendo os respectivos lugares de origem ser providos em regime de substituição, nos termos da lei geral.
Artigo 17.º
Deveres
1 - Constituem deveres dos membros da Alta Autoridade:
a) Exercer o respectivo cargo com isenção, rigor, independência e elevado sentido de autoridade moral;
b) Participar activa e assiduamente nos trabalhos do órgão que integram;
c) Guardar sigilo sobre as questões que estejam a ser objecto de apreciação pela Alta Autoridade ou sobre as posições expressas, a propósito das mesmas, por cada um dos seus membros.
2 - O exercício do cargo com isenção, rigor e independência implica a proibição da emissão de opiniões e juízos de valor, através da comunicação social, sobre questões que sejam objecto de deliberação da Alta Autoridade.
CAPÍTULO III
Organização e funcionamento
Artigo 18.º
Presidente
1 - O presidente representa a Alta Autoridade, convoca e dirige as reuniões deste órgão e superintende os respectivos serviços de apoio.
2 - O vice-presidente substitui o presidente nas suas ausências e impedimentos.
Artigo 19.º
Reuniões
1 - A Alta Autoridade funciona em reuniões ordinárias e extraordinárias.
2 - As reuniões extraordinárias têm lugar:
a) Por iniciativa do presidente;
b) A pedido de quatro dos seus membros.
Artigo 20.º
Ordem de trabalhos
1 - A ordem de trabalhos para cada reunião é estabelecida na reunião imediatamente anterior.
2 - A Alta Autoridade pode alterar a ordem das matérias inscritas na ordem de trabalhos ou aditar-lhes novos assuntos.
3 - Antes da ordem do dia é reservado um período de duração não superior a uma hora para exposição dos assuntos que os membros da Alta Autoridade queiram submeter a apreciação ou discussão.
Artigo 21.º
Quórum
A Alta Autoridade só pode reunir e deliberar com a presença de um número de membros não inferior a sete.
Artigo 22.º
Deliberações
1 - As deliberações da Alta Autoridade são tomadas por maioria absoluta dos membros presentes.
2 - Carecem, porém, de aprovação por maioria absoluta dos membros em efectividade de funções as deliberações a que se referem a alínea f) do artigo 4.º e o n.º 2 do artigo 15.º
Artigo 23.º
Publicidade das deliberações
1 - As directivas genéricas e as recomendações da Alta Autoridade são obrigatoriamente difundidas nos órgãos de comunicação social a que digam directamente respeito, nos termos das notas oficiosas.
2 - As directivas genéricas da Alta Autoridade são publicadas na 2.ª série do Diário da República.
3 - Os relatórios da Alta Autoridade são publicados na 2.ª série do Diário da Assembleia da República.
Artigo 24.º
Regimento
1 - A Alta Autoridade elabora o seu regimento, que deve ser publicado na 2.ª série do Diário da República.
2 - O regimento define, nomeadamente, o modo de designação e o funcionamento dos grupos de trabalho que a Alta Autoridade entenda constituir.
Artigo 25.º
Encargos, pessoal e instalações
1 - Os encargos com o funcionamento da Alta Autoridade são cobertos por orçamento próprio por ela proposto e cuja dotação é inscrita no orçamento da Assembleia da República.
2 - A Alta Autoridade dispõe de um serviço de apoio privativo, composto por um corpo permanente de funcionários do quadro da Assembleia da República, nomeados por despacho do Presidente da Assembleia da República, sob proposta do presidente da Alta Autoridade.
3 - O serviço de apoio será chefiado por um director de serviços, cujo lugar é criado no quadro de pessoal da Assembleia da República.
4 - A Alta Autoridade funciona em instalações cedidas, para o efeito, pela Assembleia da República.
Artigo 26.º
Coimas
Cabe à Alta Autoridade aplicar as coimas previstas na presente lei, bem como as que digam respeito a contra-ordenações por violação de normas relativas a condutas legalmente obrigatórias no domínio da comunicação social por cuja observância não caiba a outra entidade velar.
CAPÍTULO IV
Disposições finais e transitórias
Artigo 27.º
Legislação revogada
São nomeadamente revogados:
a) Os artigos 17.º, 18.º, n.os 2 e 4, 22.º, alínea a), e 65.º do Decreto-Lei 85-C/75, de 27 de Fevereiro;
b) A Lei 31/78, de 20 de Junho;
c) A Lei 23/83, de 6 de Setembro;
d) O artigo 28.º da Lei 87/88, de 30 de Julho.
Artigo 28.º
Norma transitória
1 - As referências em normas legais ao Conselho de Comunicação Social e à Comissão Consultiva para a Radiodifusão, constantes de outros diplomas, entendem-se como reportadas à Alta Autoridade em tudo o que não contrarie o disposto na presente lei.
2 - As verbas atribuídas pelo orçamento da Assembleia da República para o ano de 1990 ao Conselho de Comunicação Social e ao Conselho de Imprensa consideram-se afectas à Alta Autoridade.
3 - Considera-se transitoriamente atribuído à Alta Autoridade o pessoal afecto ao Conselho de Comunicação Social e ao Conselho de Imprensa.
Aprovada em 8 de Março de 1990.
O Presidente da Assembleia da República, Vítor Pereira Crespo.
Confirmada a aprovação, nos termos do n.º 2 do artigo 139.º da Constituição, em 15 de Maio de 1990.
O Presidente da Assembleia da República, Vítor Pereira Crespo.
Promulgada em 24 de Maio de 1990.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendada em 14 de Junho de 1990.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.