de 28 de Março
A competição internacional no sector da marinha de comércio e extremamente forte, tendo conduzido à baixa acentuada e prolongada dos fretes marítimos, facto este que tem originado no sector margens de rentabilidade muito reduzidas.Dentro deste contexto, todos os factores de custo assumem uma relevância determinante na viabilização da actividade, pelo que se tem assistido, a nível internacional, ao aumento da importância quer das bandeiras de conveniência, quer dos registos especiais, quer ainda de outras soluções para vencer as dificuldades existentes.
Assim, para fazer face à situação da marinha de comércio, diversos Estados europeus criaram já os seus próprios segundos registos, como seja o caso do Reino Unido, da França, da Holanda, da Dinamarca e da Noruega, estando outros países presentemente a estudar soluções semelhantes.
Estes segundos registos criados por aqueles países têm permitido estancar os processos de saída de navios do registo principal para registos de conveniência, assim como atrair alguns novos armadores e navios aos novos registos, oferecendo a estes condições de custos semelhantes às dos registos mais competitivos.
A marinha de comércio, pelo seu carácter verdadeiro e inteiramente internacional, reveste características muito especiais, dado que o essencial da actividade se desenvolve normalmente em águas internacionais ou de países diferentes dos de registo.
É cada vez mais frequente que os navios não tenham mesmo quaisquer contactos com os países de origem, porque a sua inserção em pools de transporte internacional é muitas vezes indispensável para a respectiva rentabilização.
Face à situação de crise internacional do sector, dos níveis de competitividade e rentabilidade e das características especiais da actividade, assim como do recurso, já com alguma expressão no caso português, de armadores nacionais a bandeiras de conveniência, também em Portugal se tornou necessário analisar o interesse da constituição de um segundo registo.
Tendo em conta, por um lado, a conclusão pela vantagem da criação de um registo daquele tipo com vista a ajudar a solucionar os problemas da marinha de comércio nacional e, por outro, a existência de uma zona franca na Região Autónoma da Madeira, foi decidido criar pelo presente diploma o Registo Internacional de Navios da Madeira (MAR).
Pretende-se que este registo figure entre os registos internacionais considerados de qualidade, tanto mais que os navios que o vão utilizar arvorarão a bandeira portuguesa, pelo que se estabelece no presente diploma que todas as convenções internacionais de que o Estado Português seja signatário obrigarão também o Registo Internacional de Navios da Madeira.
Ainda com vista a assegurar a qualidade do registo terão de ser garantidos sistemas eficazes de fiscalização dos navios.
Este registo, para além de vir a funcionar como elemento de dinamização da marinha de comércio nacional e factor de estancagem da passagem de navios portugueses para bandeira de conveniência, será também um importante factor de dinamização económica da Região Autónoma da Madeira e do País, quer criando emprego neste sector, em que os Portugueses têm historicamente revelado aptidões especiais, quer permitindo o crescimento de actividades directa e indirectamente relacionadas com o MAR, tanto no campo económico como da educação e da investigação.
Face aos condicionalismos actuais, o presente diploma é uma peça indispensável para que Portugal possa cumprir a sua vocação também como país marítimo, reforçando as nossas actividades nesta área e fortalecendo as nossas potencialidades estratégicas em tudo o que respeita ao MAR.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio da Região Autónoma da Madeira.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Natureza, atribuições e competências
Artigo 1.º São criados, na dependência do Ministério da Justiça, os serviços do Registo Internacional de Navios da Madeira, adiante abreviadamente designados por MAR, e integrados na Conservatória do Registo Comercial privativa da zona franca da Madeira.
Art. 2.º O MAR tem por fim efectuar o registo de todos os actos e contratos referentes a navios a ele sujeitos.
Art. 3.º O MAR tem as seguintes competências:
a) Efectuar o registo de navios;
b) Fiscalizar as condições técnicas dos navios, de acordo com as convenções internacionais vigentes na ordem jurídica portuguesa ou a legislação nacional aplicável aos navios não abrangidos por aquelas;
c) Efectuar inspecções aos navios;
d) Proceder à atribuição de indicativos de chamada;
e) Proceder à atribuição e reserva dos nomes e números de registo dos navios;
f) Emitir os certificados dos navios;
g) Emitir, validar e controlar os papéis de bordo;
h) Fiscalizar a actividade das sociedades de classificação devidamente credenciadas;
i) Fixar as lotações mínimas dos navios e emitir os respectivos certificados;
j) Fazer a matrícula das tripulações;
l) Reconhecer os certificados académicos e técnicos estrangeiros referentes à actividade da marinha de comércio;
m) Realizar os demais actos inerentes às obrigações do registo.
Art. 4.º - 1 - O MAR tem uma comissão técnica constituída da seguinte forma:
a) Um representante do membro do Governo responsável pelo sector dos transportes, o qual presidirá;
b) Um representante da Região Antónoma da Madeira;
c) Um representante da Inspecção-Geral de Navios.
2 - Compete à comissão técnica pronunciar-se sobre os actos relativos ao registo de navios, exercer as demais competências previstas no artigo anterior e credenciar as sociedades de classificação.
3 - O capitão do porto assessorará a comissão sempre que esta o solicite.
4 - O apoio funcional à comissão e o suporte de todas as despesas por esta realizadas serão assegurados pela Região Autónoma da Madeira.
CAPÍTULO II
Exercício da actividade
Art. 5.º Para efeitos do disposto no presente diploma, entende-se por:a) Indústria do transporte marítimo - o exercício da actividade de transportador marítimo, em nome próprio ou alheio, através do recurso a navios próprios ou afretados;
b) Proprietário do navio - o titular do direito de propriedade sobre o navio;
c) Armador - o que explora comercialmente o navio de que é proprietário ou afretador;
d) Operador - o que explora comercialmente o navio em nome alheio;
e) Navio - toda a embarcação de comércio que opere no meio ambiental marítimo, incluindo plataformas fixas ou flutuantes.
Art. 6.º Os navios registados no MAR arvoram a bandeira portuguesa.
Art. 7.º - 1 - O MAR pode delegar em sociedades de classificação credenciadas o desempenho de algumas das suas funções e reconhecer os certificados por estas emitidos.
2 - A credenciação das sociedades de classificação será objecto de portaria do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
Art. 8.º - 1 - As sociedades e suas formas de representação bem como os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada que prossigam a actividade da indústria de transportes marítimos na Região Autónoma da Madeira farão parte da actividade desenvolvida no âmbito institucional da zona franca e como tal integrarão aquela zona para todos os efeitos, desde que o requeiram e sejam devidamente licenciadas.
2 - A constituição e funcionamento das entidades referidas no número anterior dependem de autorização do Governo Regional da Madeira, estando sujeitas ao pagamento de uma licença de instalação e de uma licença anual de funcionamento, nos termos a definir pelos respectivos órgãos de governo próprio.
Art. 9.º - 1 - As entidades referidas no n.º 1 do artigo anterior regem-se pelas disposições do Código das Sociedades Comerciais e do Decreto-Lei 248/86, de 25 de Agosto, em tudo o que não contrarie o disposto no presente diploma e o regime de registo e de funcionamento das sociedades e demais entidades licenciadas no âmbito institucional da zona franca da Madeira.
2 - As entidades referidas no número anterior não ficarão sujeitas aos requisitos de capital mínimo previstos no Código das Sociedades Comerciais e no Decreto-Lei 248/86, de 25 de Agosto.
Art. 10.º - 1 - As entidades de nacionalidade estrangeira que pretendam constituir na Região Autónoma da Madeira sociedade ou estabelecimento individual de responsabilidade limitada ou outra forma local de representação cujo objecto consista no exercício da indústria de transporte marítimo não carecem de autorização para efeitos de importação de capital.
2 - A importação de capitais destinada à finalidade prevista no número anterior deve ser comunicada ao Banco de Portugal.
Art. 11.º - 1 - As entidades previstas no artigo 8.º não serão obrigadas a ter a sua sede social na Região Autónoma da Madeira.
2 - Nos casos em que a sede social se situe fora da Região Autónoma da Madeira devem aquelas entidades dispor localmente de sucursal, delegação, agência ou qualquer outra forma de representação, dotada de todos os poderes necessários para, perante as autoridades do Estado ou da Região Autónoma da Madeira e perante terceiros, assegurar uma representação plena, com escolha de domicílio particular para o efeito.
3 - Os poderes referidos no número anterior incluirão obrigatoriamente o de receber citações.
Art. 12.º Os membros da administração, direcção ou gerência das entidades referidas no artigo 8.º não ficarão sujeitos a requisitos de nacionalidade ou residência.
CAPÍTULO III
Compra, venda e registo de navios
Art. 13.º A compra e venda de navios registados no MAR não está sujeita a qualquer autorização.Art. 14.º - 1 - A venda de navios poderá ser feita por declaração de venda (bill of sale), com reconhecimento presencial da assinatura do vendedor.
2 - O acto de constituição ou modificação de hipoteca sobre navio deve constar de documento assinado pelas partes, com reconhecimento presencial das assinaturas.
Art. 15.º - 1 - São objecto de registo no MAR os navios de que sejam proprietários:
a) Entidades off-shore licenciadas, a que se refere o artigo 8.º;
b) Entidades não inseridas no âmbito institucional da zona franca da Madeira.
2 - Serão igualmente registáveis no MAR, a título provisório, os navios afretados em casco nu pelas entidades referidas no número anterior, desde que devidamente autorizadas pelos seus proprietários e pela autoridade competente do país no qual se encontra feito o registo de propriedade.
3 - Os navios registados no MAR não poderão transportar passageiros ou carga entre portos nacionais, salvo na situação prevista no n.º 2 do artigo 7.º do Decreto-Lei 34/87, de 20 de Janeiro.
4 - Os navios registados no MAR não poderão beneficiar de quaisquer apoios ou regimes proteccionistas, os quais são exclusivamente reservados à restante frota sob bandeira nacional.
5 - Os navios de bandeira portuguesa que tenham recebido incentivos ao investimento não poderão transferir o seu registo para o MAR antes de satisfazerem os compromissos assumidos para com o Estado Português.
Art. 16.º - 1 - Os navios referidos no artigo anterior poderão ser provisoriamente registados nos consulados de Portugal.
2 - O tempo de vigência do registo provisório e os requisitos necessários à sua conversão em definitivo serão fixados mediante decreto regulamentar.
Art. 17.º - 1 - As entidades off-shore requerentes do registo farão prova dos requisitos a seguir indicados:
a) Licenciamento na Região Autónoma da Madeira, nos termos do presente diploma e demais legislação aplicável;
b) Título de aquisição do navio;
c) Liquidação das taxas a que se refere o n.º 2 do artigo 8.º 2 - As demais entidades referidas no artigo 8.º farão prova do seguinte:
a) Indicação da firma ou denominação social, domicílio ou sede do requerente, com junção do respectivo contrato de sociedade, em caso de se tratar de pessoa colectiva;
b) Identificação completa, em caso de se tratar de pessoa singular;
c) Título de aquisição do navio.
3 - Nos casos em que se situe fora da Região Autónoma da Madeira o domicílio ou sede das entidades referidas no número anterior que tenham por objecto a indústria de transporte marítimo deverão ser cumpridos os requisitos a que aludem os n.os 2 e 3 do artigo 11.º Art. 18.º O MAR poderá autorizar o registo temporário no estrangeiro de navios afretados em casco nu.
Art. 19.º A emissão dos certificados dos navios registados no MAR fica subordinada aos padrões estabelecidos pelas convenções internacionais em vigor na ordem jurídica portuguesa.
CAPÍTULO IV
Tripulações e lotações
Art. 20.º - 1 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o comandante e pelo menos metade dos tripulantes dos navios registados no MAR devem ser cidadãos portugueses.2 - Em casos especiais devidamente justificados, nomeadamente quando não existam tripulantes portugueses disponíveis, poderá o ministro com tutela sobre os transportes marítimos autorizar o MAR a permitir o embarque de tripulantes estrangeiros para além do máximo estipulado no número anterior.
Art. 21.º - 1 - Os tripulantes deverão satisfazer as qualificações académicas e técnicas exigidas para o exercício das respectivas funções, em conformidade com as convenções internacionais vigentes na ordem jurídica portuguesa sobre a matéria.
2 - O Regulamento de Inscrição Marítima, Matrícula e Lotações não será aplicável aos navios registados no MAR.
3 - O regime disciplinar será objecto de legislação própria.
Art. 22.º A contratação e as condições de trabalho das tripulações deverão apenas obedecer ao disposto nas convenções internacionais vigentes na ordem jurídica portuguesa sobre a matéria.
Art. 23.º Os critérios a que deverá obedecer a fixação de lotações mínimas serão estabelecidos em diploma próprio.
CAPÍTULO V
Regime fiscal
Art. 24.º - 1 - O regime fiscal aplicável às entidades referidas no artigo 8.º é o previsto na legislação relativa à zona franca da Madeira.2 - O regime referido no número anterior aplica-se também aos navios registados no MAR.
Art. 25.º Os tripulantes e as empresas proprietárias de navios registados no MAR não estão obrigados a descontos para a Segurança Social, sem prejuízo, porém, de serem assegurados os sistemas de segurança decorrentes das convenções internacionais em vigor na ordem jurídica portuguesa.
Art. 26.º Os actos de registo comercial previstos neste diploma encontram-se isentos de quaisquer taxas ou emolumentos.
Art. 27.º - 1 - Os actos de registo dos navios implicam o pagamento de uma taxa aquando da efectivação do registo e de uma taxa de manutenção anual, destinada a cobrir as despesas com o serviço de registo, cujo produto constitui receita da Região Autónoma da Madeira.
2 - O incumprimento do disposto no número anterior implica o imediato cancelamento do registo.
3 - Pelas restantes prestações de serviços do MAR aos utentes, a que se refere o artigo 3.º, serão devidas taxas, que constituirão receitas da Região Autónoma da Madeira.
4 - O montante das taxas referidas nos números anteriores será fixado pelos respectivos órgãos de governo próprio.
Art. 28.º - 1 - A violação dos artigos 6.º, 8.º, n.º 2, 11.º, n.º 2, 15.º, n.º 3, 20.º, n.º 1, 21.º, n.º 1, e 25.º constitui contra-ordenação punível com coima até 200000$00 ou 3000000$00, conforme se trate de pessoa singular ou colectiva.
2 - A violação do n.º 2 do artigo 8.º e do n.º 3 do artigo 15.º pode determinar também a aplicação, como sanção acessória, da suspensão temporária ou do cancelamento do registo.
3 - A negligência é punível.
4 - O processamento das contra-ordenações e a aplicação das respectivas coimas competem à entidade indicada pelos órgãos de governo próprio da Região, para quem reverterá o produto das coimas aplicadas.
CAPÍTULO VI
Disposições transitórias e finais
Art. 29.º Até à entrada em vigor da legislação complementar a este diploma aplicar-se-á, com as devidas adaptações, a legislação vigente sobre cada uma das matérias a disciplinar.Art. 30.º O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 19 de Janeiro de 1989. - Aníbal António Cavaco Silva - Lino Dias Miguel - Eurico Silva Teixeira de Melo - Miguel José Ribeiro Cadilhe - Joaquim Fernando Nogueira - José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
Promulgado em 11 de Março de 1989.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 16 de Março de 1989.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.