Nossa Senhora de Fátima.
A vinda da mais alta Autoridade da Igreja a território nacional - a primeira em mais de oito séculos de história pátria - despertou naturalmente em todos os portugueses espalhados pelo Mundo os mais profundos sentimentos de júbilo e gratidão.Interpretando fielmente estes sentimentos da Nação, o Governo deseja que o memorável acontecimento, ligado à recordação de um facto de tão alto significado na vida religiosa da comunidade, fique assinalado na legislação portuguesa por uma ampla medida de clemência, que, inspirada nos princípios mais puros da caridade e da fraternidade cristãs, não deixará de ser extremamente grata ao apostolado piedoso do Sumo Pontífice.
Em obediência ao nobre pensamento que as inspira, procurou-se que as medidas de amnistia e de perdão incluídas no presente diploma fossem tão largas quanto possível, sem prejuízo dos valores fundamentais confiados à tutela específica do direito penal.
Assim os beneficiados saibam corresponder ao generoso intuito da lei, trilhando o caminho da regeneração moral que a própria Igreja, no seu alto magistério espiritual, se não cansa de apontar a quantos, prevaricando, destroem as bases do são convívio social.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
I
Delinquentes civis
Artigo 1.º São amnistiados:
1.º Os crimes culposos de ofensas corporais e de dano e respectivas contravençõescausais;
2.º Os crimes previstos nos n.os 1.º e 2.º do artigo 365.º do Código Penal, quando oofendido conceda o perdão;
3.º Os crimes de ofensas corporais previstos nos n.os 1.º, 2.º, 3.º e 4.º do artigo 360.º, bem como os crimes previstos no artigo 363.º, do Código Penal, cometidos por um cônjuge contra o outro ou por um irmão contra outro irmão, ou por um ascendente contra um descendente, desde que o ofendido conceda o perdão;4.º Os crimes de difamação e de injúria previstos nos artigos 407.º e 410.º do Código Penal, quando cometidos através da imprensa, nos termos dos artigos 11.º e seguintes do Decreto 12008, de 29 de Julho de 1926, e o crime previsto no artigo 411.º do mesmo código, praticado por igual forma, quando já tenha sido objecto de julgamento à data da publicação deste diploma, e bem assim a infracção prevista no artigo 54.º daquele decreto;
5.º Os crimes contra a propriedade, puníveis com pena de prisão até seis meses, com ou
6.º Os crimes cujo procedimento criminal dependa de participação ou de acusação do ofendido, desde que a pena aplicável não seja superior a seis meses de prisão, com ousem multa;
7.º Os crimes previstos nos artigos 38.º, 45.º e 47.º do Decreto-Lei 41562, de 18 de Março de 1958, com a redacção que lhes foi dada pelo Decreto-Lei 47623, de 3 de Abril de 1967, considerando-se perdidos a favor do Estado os utensílios e as quantias apreendidos, com o destino fixado nos §§ 1.º e 2.º do citado artigo 45.º, a não ser que os arguidos requeiram o prosseguimento dos processos dentro do prazo de um mês, a contarda publicação do presente diploma.
8.º Os crimes previstos nos artigos 78.º e 79.º da Lei 1961, de 1 de Setembro de 1937, este último com a redacção dada pela Lei 2034, de 18 de Julho de 1949, quandocometidos há mais de vinte anos;
9.º As infracções meramente culposas, previstas na alínea c) do artigo 18.º do Decreto-Lei 41204, de 24 de Julho de 1957, excepto se os géneros forem por sua natureza susceptíveis de prejudicarem a saúde do consumidor ou não habitualmenteusados para consumo público;
10.º As contravenções previstas nos artigos 16.º e 29.º do Decreto-Lei 41204, de 24 de Julho de 1957; nos artigos 18.º e 20.º do regulamento aprovado pelo Decreto-Lei 43557, de 24 de Março de 1961; nos artigos 23.º e 27.º do Decreto-Lei 35846 e na Portaria 15348, de 19 de Abril de 1955 (apenas quanto à falta de características dos vinhos); nos artigos 1.º, 2.º e 4.º do Decreto-Lei 31565, de 10 de Outubro de 1941; nos artigos 36.º e 27.º da Lei 1889, de 23 de Março de 1935; no artigo 8.º do Decreto-Lei 27002, de 12 de Setembro de 1936, e no artigo 9.º do Decreto-Lei 40036, de 18 deJaneiro de 1955;
11.º As infracções de carácter meramente disciplinar, previstas nos artigos 46.º e 47.º do Decreto-Lei 41204, de 24 de Julho de 1957, este último com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 43860, de 16 de Agosto de 1961.
Art. 2.º - 1.º São perdoados:
a) Três meses de prisão a todos os condenados a penas privativas de liberdade por decisões já proferidas à data da publicação deste diploma, ainda que não transitadas emjulgado;
b) Um terço das penas correccionais de prisão, de multa ou de trabalho prisional, que tenham sido aplicadas em decisões já proferidas à data da publicação deste diploma, ainda que não transitadas, por crimes contra a propriedade;c) Metade do tempo de prisão resultante da conversão do imposto de justiça e da multa, desde que à data da publicação deste diploma se tenha iniciado o cumprimento da prisão
resultante dessa conversão.
2.º Será substituída por multa a pena de prisão aplicada em medida não superior a seis meses por decisão já proferida à data da publicação deste diploma, ainda que não transitada, desde que o condenado assim o requeira no prazo de um mês a contar da referida publicação ou do trânsito em julgado da decisão.3.º Descontar-se-á por inteiro no cumprimento da prisão maior toda a prisão preventiva sofrida pelos réus condenados por decisões já proferidas à data da publicação deste diploma, ainda que não transitadas em julgado.
4.º Considera-se sem efeito a pena prevista no artigo 61.º do Código Penal e no artigo 6.º do Decreto 12008, de 29 de Julho de 1926, quando já aplicada por decisão com trânsito
em julgado.
Art. 3.º Os benefícios previstos nos diversos números do artigo anterior não se cumulam, aplicando-se apenas aquele que concretamente mais favorecer o condenado.Art. 4.º É concedida a reabilitação de direito aos delinquentes que durante vinte anos após o cumprimento da última condenação e até à data deste diploma não tenham sido de novo condenados e se não encontrem incriminados; as condenações anteriores àquele prazo
serão canceladas no registo criminal.
II
Delinquentes pertencentes às forças armadas e às forças militarizadas
Art. 5.º São amnistiados os crimes previstos e punidos pelas seguintes disposições do Código de Justiça Militar: n.º 4.º do artigo 91.º, n.º 2.º do artigo 97.º, artigo 100.º, n.º 2.º do artigo 101.º, n.º 3.º do artigo 104.º, artigos 111.º, 112.º, 115.º e 116º, n.º 3.º do artigo 142.º, n.º 4.º do artigo 143.º, n.º 4.º do artigo 144.º, n.º 3.º do artigo 146.º, n.º 4.º do artigo 147.º, n.º 3.º do artigo 148.º, § 1.º do artigo 149.º, n.os 2.º e 3.º do artigo 157.º, artigos 158.º e 160.º, artigo 163.º, com referência quer à primeira parte do n.º 1.º do artigo 107.º, quer ao § 1.º deste artigo 170.º, quer ainda à primeira parte do artigo 171.º conjugado com o seu n.º 5.º, artigo 182.º, n.º 2.º do artigo 183.º, n.º 2.º com referência à segunda parte do corpo do artigo 184.º, artigos 186.º a 189.º, n.º 2.º do artigo 193.º, § único do artigo 195.º, § 1.º do artigo 211.º, § único do artigo 213.º, § 1.º do artigo 216.º, n.º 2.º do artigo 217.º e ainda os dos artigos 218.º, 226.º, 228.º e 229.º, quando o valor não exceda 2000$00 ou quando o agente tenha reparado totalmente o prejuízo causado, não sendo este superior a 10000$00.
§ único. A amnistia do crime de deserção depende da apresentação voluntária do desertor até ao dia 13 de Outubro do corrente ano, inclusive.
Art. 6.º São também amnistiados os crimes de abuso de autoridade e todos os outros previstos no Código Penal ou em lei especial puníveis com prisão, ou prisão e multa, não superior a um ano, bem como as contravenções, e ainda as infracções disciplinares
cometidas no exercício da condução auto.
Art. 7.º São perdoados 90 dias em cada uma das penas aplicadas, ou que venham a ser aplicadas, por crimes cometidos antes da publicação deste diploma e não previstos nosartigos anteriores.
Art. 8.º Serão anuladas as penas disciplinares previstas nos n.os 1.º a 3.º do artigo 7.º, nos n.os 1.º a 4.º do artigo 15.º, nos n.os 1.º a 6.º do artigo 21.º, nos n.os 1.º a 9.º do artigo 22.º e nos n.os 1.º a 3.º dos artigos 35.º e 36.º, todos do Regulamento de Disciplina Militar, e cancelados os respectivos registos, quando essas penas tenham sido impostas antes dapublicação deste decreto-lei.
Art. 9.º Serão anuladas as penas de prisão disciplinar e de prisão disciplinar agravada aplicadas antes da publicação deste diploma e cancelados os respectivos registos,observando-se, porém, o seguinte:
a) Se o infractor não tiver averbada mais do que uma pena de prisão, a anulação e ocancelamento serão feitos imediatamente;
b) Se, havendo mais do que uma pena de prisão, a sua totalidade, feitas as equivalências regulamentares, não exceder dez dias de prisão disciplinar, a anulação e o cancelamento serão feitos apenas decorridos seis meses a contar da data da aplicação da última pena, de qualquer natureza, cujo averbamento a lei imponha;c) Se, havendo mais do que uma pena de prisão, a sua totalidade, feitas as equivalências regulamentares, não exceder vinte dias de prisão disciplinar, a anulação e o cancelamento deverão ser feitos apenas decorrido um ano a contar da data da aplicação da última pena, de qualquer natureza, cujo averbamento a lei imponha;
d) Se, havendo mais do que uma pena de prisão, a sua totalidade, feitas as equivalências regulamentares, não exceder 30 dias de prisão disciplinar, a anulação e cancelamento serão feitos apenas decorridos dois anos a contar da data da aplicação da última pena, de qualquer natureza, cujo averbamento a lei imponha;
e) Se, havendo mais do que uma pena de prisão, a sua totalidade, feitas as equivalências regulamentares, exceder 30 dias de prisão disciplinar, a anulação e o cancelamento serão feitos apenas decorridos três anos a contar da data da aplicação da última pena, de qualquer natureza, cujo averbamento a lei imponha.
§ único. Nos casos das alíneas b) a e), a anulação das penas e o cancelamento dos respectivos registos só poderão dar-se quando os infractores não tenham cometido qualquer infracção penal ou disciplinar dentro dos prazos estabelecidos.
Art. 10.º Se houver autos de reclamação ou de recurso pendentes à data da publicação deste decreto-lei, a aplicação das medidas de clemência, na parte disciplinar, só poderá ocorrer depois de ter sido proferida decisão final.
Art. 11.º Os militares já transferidos para o Depósito Disciplinar, nos termos dos artigos 201.º e 202.º do Regulamento de Disciplina Militar, regressarão às suas anteriores situações e não será aplicável o disposto nos mencionados preceitos aos que estejam nas condições neles previstas à data da publicação deste diploma.
Art. 12.º As disposições da II parte deste diploma apenas se aplicam às infracções criminais e disciplinares cometidas durante o período em que os seus agentes pertenciam a qualquer dos departamentos do Estado das forças armadas, das forças militarizadas ou se encontravam em qualquer das situações previstas nos artigos 35.º e 36.º do
Regulamento de Disciplina Militar.
§ 1.º Os benefícios constantes da II parte deste diploma, na parte criminal, não aproveitam aos reincidentes, aos delinquentes de difícil correcção, nem aos militares referidos no corpo do artigo 40.º do Código de Justiça Militar que tenham cometido qualquer dos crimes previstos nesse preceito legal. A baixa de posto aplicada por força docitado código não será anulada.
§ 2.º Os benefícios de natureza disciplinar não compreendem a anulação dos efeitos de transferência, mudança de quadro, baixa de posto, eliminação, baixa de serviço, passagem à reforma, descida na escala de antiguidade e preterição, já verificada, na promoção.§ 3.º As penas disciplinares anuladas nos termos deste decreto-lei serão sempre tomadas em consideração para o efeito do disposto no artigo 187.º do Regulamento de Disciplina
Militar.
III
Disposições comuns
Art. 13.º A amnistia não extingue a responsabilidade civil emergente dos factos praticados, de harmonia com o disposto no § 1.º do artigo 125.º do Código Penal.Art. 14.º O presente decreto-lei entra imediatamente em vigor.
Publique-se e cumpra-se como nele se contém.
Paços do Governo da República, 15 de Maio de 1967. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ - António de Oliveira Salazar - António Jorge Martins da Mota Veiga - Manuel Gomes de Araújo - Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior - João de Matos Antunes Varela - Ulisses Cruz de Aguiar Cortês - Joaquim da Luz Cunha - Fernando Quintanilha Mendonça Dias - Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira - José Albino Machado Vaz - Joaquim Moreira da Silva Cunha - Inocêncio Galvão Teles - José Gonçalo da Cunha Sottomayor Correia de Oliveira - Carlos Gomes da Silva Ribeiro - José João Gonçalves de Proença - Francisco Pereira Neto de Carvalho.Para ser publicado no Boletim Oficial de todas as províncias ultramarinas. - J. da Silva
Cunha.