de 14 de Junho
O sistema de poupança-crédito criado pelo Decreto-Lei 540/76, de 9 de Julho, foi concebido de forma a propiciar o duplo alcance de promover o investimento nos sectores habitacional e agrícola e de incentivar a entrada no País das poupanças geradas pela emigração.Se dúvidas se não oferecem quanto à bondade dos seus propósitos e à conveniência da sua manutenção, certo é também que a experiência entretanto colhida da aplicação do aludido sistema de há muito aconselhava uma alteração significativa do respectivo quadro legal.
Na verdade, impunha-se a introdução de mecanismos de controle eficazes nos aspectos fulcrais do sistema de poupança-crédito, tais como a aquisição da qualidade de emigrante e a proveniência dos fundos canalizados para crédito das contas.
Aliás, o desvirtuamento do sistema em apreço, potenciado pela permissividade da estruturação legal e traduzido em aproveitamentos indevidos, obrigou já à publicação do Decreto-Lei 37/86, de 4 de Março.
Neste se referem os prejuízos sociais derivados de tal situação, traduzidos também em vultosos encargos suportados pelo Estado a título de bonificações.
Objectivos de transparência de funcionamento e de operacionalidade na aplicação do sistema obrigam, consequentemente, à sua reformulação.
Para o efeito:
O conceito de emigrante e equiparado passa a ser consagrado em termos mais estreitos e ajustados à realidade;
A qualidade de emigrante ou equiparado fica sujeita a requisitos probatórios mais severos constantes de portaria regulamentadora do presente diploma legal.
Por outro lado, passa também a denominar-se de maneira diferente a até agora chamada «conta poupança-crédito». Para vincar bem a sua ligação ao estatuto de emigrante, e só a este, a conta denominar-se-á «poupança-emigrante».
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
(Contas de emigrantes)
1 - Os emigrantes portugueses podem ser titulares, nos termos deste diploma, de:a) Contas poupança-emigrante;
b) Contas em moeda estrangeira;
c) Quaisquer contas acessíveis a residentes.
2 - A conta poupança-crédito criada nos termos do Decreto-Lei 540/76, de 9 de Julho, passa, para todos os efeitos legais, a denominar-se «conta poupança-emigrante».
Artigo 2.º
(Definição de emigrante)
1 - Considera-se emigrante português, para os efeitos do presente diploma, o cidadão que tiver deixado o território nacional para, no estrangeiro, exercer uma actividade remunerada por conta de outrem, com exclusão dos trabalhadores fronteiriços e sazonais.2 - Equiparam-se, todavia, a emigrantes portugueses:
a) Os cidadãos portugueses que, posteriormente à emigração, se tenham estabelecido por conta própria no estrangeiro e aí exclusivamente residam;
b) Aqueles que, após a emigração, tenham adquirido outra nacionalidade e continuem a residir no estrangeiro, aí exercendo a sua actividade;
c) Os descendentes directos em 1.º grau de emigrantes portugueses, tenham estes mantido a nacionalidade ou adquirido outra, desde que os mesmos descendentes residam no estrangeiro e aí exerçam uma actividade remunerada;
d) Os pensionistas e reformados que tenham sido emigrantes, bem como os seus cônjuges, todos desde que aufiram pensões ou rendimentos similares em moeda estrangeira;
e) O cônjuge sobrevivo de emigrante falecido há menos de seis meses;
f) Os portugueses trabalhadores do mar em serviço em barcos estrangeiros.
Artigo 3.º
(Prova)
A qualidade de emigrante ou equiparado será sempre comprovada, perante a instituição de crédito respectiva, nos termos a estabelecer em portaria do Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal.
CAPÍTULO II
Sistema poupança-emigrante
Artigo 4.º
(Conta poupança-emigrante)
1 - A conta especial denominada «conta poupança-emigrante» é expressa em escudos e vigora pelos seguintes prazos, renováveis:a) De mais de 180 dias até 1 ano;
b) De mais de 1 ano até 2 anos.
2 - A abertura da conta poupança-emigrante depende da comprovação, perante a instituição de crédito respectiva, de que o interessado é emigrante ou equiparado, ou deixou de o ser há menos de seis meses, dependendo também dessa comprovação, a fazer anualmente, as renovações da mesma conta.
3 - Os valores a creditar na referida conta, assim como as taxas de juro desta, serão determinados em portaria do Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal.
4 - Sem prejuízo do disposto no presente diploma, cada emigrante ou equiparado pode ser titular de várias contas poupança-emigrante, podendo também utilizá-las simultânea ou sucessivamente.
Artigo 5.º
(Finalidades)
O sistema de poupança-emigrante visa financiar:a) A construção, aquisição ou benfeitorias de prédios urbanos, destinem-se ou não a habitação própria, assim como a aquisição ou benfeitorias de prédios rústicos, quer se destinem a habitação própria quer a rendimento;
b) A instalação ou desenvolvimento de actividades industriais, agro-pecuárias ou piscatórias, inclusivamente através da realização, aquisição ou aumento de partes de capital social.
Artigo 6.º
(Instituições intervenientes)
1 - Podem receber depósitos e conceder empréstimos ao abrigo do sistema de poupança-emigrante os bancos comerciais e de investimento, a Caixa Geral de Depósitos e o Crédito Predial Português.2 - Podem ainda praticar as operações referidas no número anterior as caixas económicas que, mostrando-se para tanto habilitadas, obtenham a respectiva autorização do Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal.
Artigo 7.º
(Empréstimos de poupança-emigrante)
1 - A concessão do empréstimo de poupança-emigrante depende da comprovação, perante a instituição respectiva, de que o interessado é emigrante ou deixou de o ser há menos de seis meses.2 - Os empréstimos concedidos a cada emigrante ou equiparado, nos termos do presente diploma, não podem exceder, no seu conjunto, um montante a fixar em portaria do Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal.
3 - São considerados, para os efeitos do número anterior, os empréstimos de poupança-crédito já outorgados à data da entrada em vigor do presente diploma.
4 - Sem prejuízo do limite global fixado nos termos do n.º 2, o montante de cada empréstimo não pode exceder o dobro do saldo ou dos saldos das contas de poupança-emigrante do mesmo titular.
5 - A formalização de qualquer empréstimo deve ser comunicada pelas instituições mutuantes ao Banco de Portugal no prazo de cinco dias, para efeitos de fiscalização do cumprimento do estabelecido no anterior n.º 2, aplicando-se o disposto no n.º 7 deste artigo relativamente a quaisquer empréstimos que ultrapassem os limites estabelecidos no mesmo n.º 2.
6 - Mediante portaria do Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal, dispor-se-á quanto ao prazo máximo dos empréstimos, sem dependência do estabelecido na lei geral, quanto às garantias a prestar às instituições mutuantes e quanto às taxas de juro efectivas e demais condições a praticar pelas mesmas instituições, assim como relativamente ao reembolso do diferencial da taxa de juro.
7 - Sem prejuízo de outras sanções legalmente aplicáveis, a utilização da quantia mutuada por forma ou para fins diversos dos legal e contratualmente previstos determina o vencimento imediato do empréstimo e bem assim a perda e a restituição dos benefícios auferidos pelo mutuário.
Artigo 8.º
(Utilização obrigatória do saldo)
1 - Uma parte do saldo da conta poupança-emigrante, correspondente a, pelo menos, metade do empréstimo que for concedido, será obrigatoriamente utilizada na aquisição ou investimento.2 - Não podem ser concedidos empréstimos com utilização de saldo ou saldos com permanência nas respectivas contas inferior a seis meses.
3 - A partir de 1 de Janeiro de 1987 o prazo referido no número anterior será aumentado para um ano.
Artigo 9.º
(Sucessão «mortis causa»)
No prazo de um ano a contar da abertura da herança, os herdeiros legitimários do emigrante ou equiparado são admitidos a exercer os direitos e faculdades a que se reporta o presente capítulo, beneficiando igualmente do regime do capítulo VI.
CAPÍTULO III
Contas em moeda estrangeira
Artigo 10.º
(Caracterização da conta)
1 - A conta especial denominada «conta de emigrantes em moeda estrangeira» é expressa em qualquer das moedas definidas por aviso do Banco de Portugal e vigora pelos prazos de seis meses ou de um ano, renováveis.2 - A abertura da conta em moeda estrangeira depende da comprovação, perante a instituição de crédito respectiva, de que o interessado é emigrante ou equiparado ou deixou de o ser há menos de seis meses, dependendo também dessa comprovação, a fazer anualmente, as renovações da mesma conta.
3 - Os valores com que a referida conta pode ser aberta e creditada, a sua movimentação e bem assim as respectivas taxas de juro serão determinados em portaria do Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal.
CAPÍTULO IV
Contas acessíveis a residentes
Artigo 11.º
(Caracterização da conta)
1 - Os emigrantes ou equiparados podem também abrir qualquer conta, expressa em escudos, nas demais condições das contas de residentes.2 - A mencionada conta pode ser creditada com quaisquer fundos.
CAPÍTULO V
Disposições comuns
Artigo 12.º
(Movimentação)
1 - Não são permitidos quaisquer movimentos entre contas especiais de titulares diferentes, excepto entre as contas a que se refere o artigo anterior.2 - Mediante portaria do Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal, poderá ser definido o regime da movimentação de fundos entre as contas especiais reguladas neste diploma e pertencentes ao mesmo titular, quer as existentes numa só instituição depositária quer em diversas instituições.
Artigo 13.º
(Titularidade e movimentação)
1 - As contas especiais reguladas neste diploma podem ser contituladas apenas pelo cônjuge do emigrante ou equiparado.2 - Os titulares das contas especiais reguladas neste decreto-lei podem autorizar pessoas residentes em território nacional a movimentá-las, mas apenas a débito.
Artigo 14.º
(Mudança da qualidade de emigrante ou equiparado)
1 - A mudança de qualidade do titular de contas reguladas neste diploma que de emigrante passe a equiparado a emigrante, ou vice-versa, não determina a extinção das mesmas contas, desde que a aquisição da nova qualidade se verifique menos de seis meses após a perda efectiva da qualidade anterior.
2 - Existindo já na mesma instituição de crédito prova da qualidade de emigrante ou equiparado, produzida há menos de seis meses, dispensa-se o cumprimento do que estabelecem os artigos 4.º, n.º 2, 7.º, n.º 1, e 10.º, n.º 2.
CAPÍTULO VI
Regime cambial
Artigo 15.º
(Abertura de contas)
1 - Não carece de prévia autorização do Banco de Portugal a abertura de qualquer das contas de depósito reguladas neste diploma.2 - Às instituições depositárias incumbe a certificação do cumprimento de cada um dos requisitos da abertura e da renovação das mencionadas contas, sem prejuízo da responsabilidade, criminal ou outra, dos depositantes conexa com erróneas informações prestadas para o efeito.
Artigo 16.º
(Movimentação das contas)
1 - A movimentação, a crédito, de cada uma das contas especiais reguladas no presente decreto-lei não depende de qualquer autorização prévia, desde que sejam observados os atinentes condicionalismos previstos neste diploma.2 - A movimentação, a débito, das mesmas contas rege-se em função do disposto no artigo seguinte.
Artigo 17.º
(Operações realizadas por débito das contas)
1 - A aquisição e construção de imóveis ou a realização de benfeitorias comprovadamente feitas por débito de qualquer das contas especiais reguladas neste diploma, bem como os movimentos a que se reporta o artigo 13.º, não carecem de qualquer autorização do Banco de Portugal.
2 - São igualmente livres os movimentos a débito das contas reguladas neste diploma, para realização de despesas no País, bem como a transferência para o exterior da totalidade ou de parte do saldo das contas em moeda estrangeira, das contas poupança-emigrante, devendo, neste último caso, efectuar-se a conversão em moeda estrangeira ao câmbio do dia da transferência.
3 - As transferências para o exterior, a que alude o número anterior, deixam de ser livres quando o titular da conta seja residente em território nacional ou tenha perdido a qualidade de emigrante ou equiparado.
Artigo 18.º
(Operações feitas com outros recursos)
Quando, além da utilização do saldo das contas, as operações a que aludem os n.os 1 e 2 do artigo precedente sejam financiadas com recurso ao crédito bancário, devidamente comprovado, não é exigida qualquer autorização prévia do Banco de Portugal e podem celebrar-se os respectivos actos notariais ou de registo sem a transcrição dos instrumentos de autorização que de outro modo fossem exigíveis.
CAPÍTULO VII
Disposições finais
Artigo 19.º
(Âmbito de aplicação)
O regime da abertura de contas especiais de depósito, bem como o da concessão de empréstimos estabelecidos pelo presente diploma, só se aplica relativamente às operações de depósito ou de crédito efectuadas depois da data da entrada em vigor deste decreto-lei.
Artigo 20.º
(Regime transitório)
As contas poupança-crédito já abertas à data da entrada em vigor deste diploma, logo que se verifique qualquer levantamento ou, o mais tardar, no próximo vencimento do respectivo prémio, devem ser convertidas em contas poupança-emigrante nos termos do artigo 4.º, n.º 1, entendendo-se, na falta de outra manifestação de vontade do titular, que este opta pelo prazo de 181 dias.
Artigo 21.º
(Revogações)
Ficam revogados:a) O Decreto-Lei 540/76, de 9 de Julho, excepto quanto ao disposto no seu artigo 7.º, na redacção que lhe foi dada pela Lei 21-B/77, de 9 de Abril;
b) O Decreto-Lei 729-H/75, de 22 de Dezembro;
c) O Decreto-Lei 75-C/77, de 28 de Fevereiro.
Artigo 22.º
(Entrada em vigor)
Este diploma entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 15 de Maio de 1986. - Aníbal António Cavaco Silva - Miguel José Ribeiro Cadilhe - Pedro José Rodrigues Pires de Miranda.
Promulgado em 9 de Junho de 1986.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 12 de Junho de 1986.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.