de 26 de Setembro
LEI DE BASES DA REFORMA AGRARIA
A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164.º, alínea d), 168.º, alínea n), e 169.º, n.º 2, da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO I
Princípios gerais
Artigo 1.º
Objecto
A presente lei integra as bases da reforma agrária, nos termos da Constituição.
Artigo 2.º
ZIRA
É mantida a composição da zona de intervenção da reforma agrária (ZIRA), constante do Decreto-Lei 236-B/76, de 5 de Abril.
Artigo 3.º
Definições
Para efeitos desta lei entende-se por:1) Prédio rústico - uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica;
2) Estabelecimento agrícola - a universalidade de bens e serviços organizada distintamente com vista ao exercício da actividade agrícola por uma empresa agrícola;
3) Empresa agrícola - a entidade singular ou colectiva que coordena factores de produção para exercer, por conta própria, a exploração de um ou mais estabelecimentos agrícolas;
4) Agricultor autónomo - o titular de uma exploração do tipo familiar, quando esta empresa agrícola é constituída por uma pessoa singular que, permanente e predominantemente, utiliza a actividade própria ou de pessoas do seu agregado doméstico, sem recurso ou com recurso excepcional ao trabalho assalariado;
5) Agricultor empresário - a empresa agrícola constituída por uma pessoa singular que, permanente e predominantemente, utiliza a actividade de pessoal contratado;
6) Exploração de campanha - o contrato pelo qual uma parte, mediante retribuição, transfere para outra, chamada «companheiro» ou «seareiro», a exploração de culturas num ou mais prédios rústicos ou parte deles, por um ou mais anos, até ao máximo de um ano agrícola por cada folha de cultura;
7) Agregado doméstico - o conjunto de pessoas que vivem habitualmente em comunhão de mesa e habitação ou em economia comum, ligadas por relação familiar, jurídica ou de facto;
8) Actividade agrícola - toda a actividade agrícola, em sentido estrito, pecuária e florestal;
9) Cooperativas agrícolas - as empresas agrícolas constituídas nos termos do Código Cooperativo e legislação complementar.
Artigo 4.º
Política agrícola
A política agrícola visa prosseguir os seguintes objectivos:a) O reforço e aperfeiçoamento da ligação do homem com a terra;
b) A melhoria da situação económica, social e cultural e a garantia dos direitos dos trabalhadores e dos agricultores;
c) A optimização do aproveitamento dos recursos para aumento da produção e da produtividade;
d) A protecção dos recursos naturais e o aumento do fundo de fertilidade dos solos;
e) A adequação dos recursos existentes aos objectivos da política agrária comum.
Artigo 5.º
Princípio geral do uso da terra
O uso da terra pautar-se-á por sistemas de produção adequados às características ecológicas da respectiva região, de modo a atingir índices de produtividade consentâneos com a sua capacidade.
Artigo 6.º
Iniciativas directas
1 - O Estado, ou qualquer pessoa colectiva pública, no âmbito das suas atribuições, pode efectivar iniciativas directas de fomento agrário que, por motivo ponderoso ou pela sua natureza, não possam ser realizadas por empresas agrícolas de direito privado.2 - A actividade prevista no número anterior pode reger-se total ou parcialmente por normas de direito privado.
Artigo 7.º
Fomento agrário
O fomento agrário tem como finalidade:a) O aumento da produção e da produtividade da agricultura, pela sua intensificação, modernização e diversificação, com benefício do fundo de fertilidade dos solos e do equilíbrio ecológico;
b) A promoção do associativismo.
Artigo 8.º
Medidas incentivadoras
São medidas incentivadoras da actividade de empresas agrícolas:a) A concessão de crédito;
b) A concessão de subsídios não reembolsáveis;
c) Os seguros inerentes à actividade agrícola, nomeadamente os relativos a acidentes climatéricos e fitopatológicos;
d) As condições preferenciais e facilidades no fornecimento de sementes, propágulos, fertilizantes, pesticidas, rações para gado, maquinaria e outros materiais necessários à produção;
e) As facilidades na elaboração de projectos de investimento e de estudos económicos;
f) A concessão de uso de equipamento;
g) A celebração de contratos-programas;
h) Os incentivos fiscais;
i) O apoio na inovação tecnológica.
Artigo 9.º
Medidas e iniciativas integradoras
São medidas e iniciativas integradoras da actividade agrícola:a) O aperfeiçoamento de infra-estruturas de transporte, comunicações, armazenagem, conservação e distribuição;
b) As benfeitorias de interesse colectivo não compreendidas na alínea anterior;
c) A regulação dos circuitos de distribuição;
d) O apoio à industrialização complementar dos produtos agrícolas ou com a sua participação;
e) A generalização da extensão rural e desenvolvimento do ensino e da formação profissional agrícola;
f) O desenvolvimento da investigação científica e da experimentação aplicada ao serviço da produção agrícola;
g) O desenvolvimento do sistema da segurança social dos trabalhadores rurais e dos agricultores;
h) O desenvolvimento de instituições, estruturas e actividades destinadas a elevar o nível social e cultural das populações rurais.
Artigo 10.º
Zonas de maior potencialidade produtiva
As zonas de solos de maior potencialidade produtiva devem ser preservadas contra a expansão urbana e a degradação do ambiente.
CAPÍTULO II
Reestruturação fundiária
Artigo 11.º
Âmbito das expropriações
Ficam sujeitos a expropriação o prédio ou o conjunto de prédios rústicos localizados na zona de intervenção da reforma agrária que correspondam a pontuação superior à estabelecida para o direito de reserva e sejam propriedade de:a) Pessoa singular ou colectiva privada;
b) Duas ou mais pessoas em contitularidade, comunhão ou herança indivisa;
c) Duas ou mais sociedades quando em todas elas haja directa ou indirectamente sócios comuns em posição dominante ou quando essas sociedades forem coligadas ou participantes no mesmo grupo económico;
d) Uma pessoa singular e uma ou mais sociedades de que aquela seja sócia em posição dominante.
Artigo 12.º
Prédios não expropriáveis
1 - Não são expropriáveis, qualquer que seja a sua pontuação, os prédios rústicos que sejam propriedade de:a) Agricultores autónomos;
b) Cooperativas agrícolas, constituídas nos termos do Código Cooperativo;
c) Instituições particulares de reconhecida utilidade pública.
2 - Não são expropriáveis, qualquer que seja a sua pontuação, os prédios referidos no artigo anterior que, no seu conjunto, tenham área inferior a 60 ha.
3 - Se a parte do prédio, ou prédios rústicos, excedente à área da reserva por si só ou em conjunto com áreas de prédios anexos for inferior à dimensão mínima indispensável ao estabelecimento de uma exploração agrícola do tipo familiar, acrescerá à respectiva reserva, deixando de ser expropriada.
Artigo 13.º
Direito de reserva
Aos proprietários dos prédios expropriados é atribuído o direito de reserva de propriedade de uma área determinada nos termos desta lei.
Artigo 14.º
Conteúdo do direito de reserva
1 - A concessão do direito de reserva determina o reestabelecimento do respectivo direito de propriedade, tal como existia à data da expropriação ou da ocupação, quando esta tenha ocorrido em primeiro lugar.2 - A execução da decisão final proferida nos processos de reserva regulados pela presente lei é considerada prioritária e de grave urgência para a realização do interesse público.
3 - O despacho de atribuição do direito de reserva tem força probatória plena, nomeadamente para efeitos de inscrição no registo predial.
Artigo 15.º
Pontuação da reserva
1 - O direito de reserva é equivalente a 91000 pontos, sem prejuízo do disposto no artigo 17.º 2 - A pontuação é fixada tendo em atenção o rendimento fundiário, com base no cadastro oficialmente em vigor em 19 de Setembro de 1977 e de acordo com as tabelas anexas ao Decreto-Lei 406-A/75, com a excepção prevista no n.º 5 deste artigo.3 - No cálculo da pontuação não serão consideradas as benfeitorias existentes nos prédios rústicos bem como plantações agrícolas e povoamentos florestais, exceptuando as realizadas pelo Estado ou outra pessoa colectiva pública.
4 - Ao sobcoberto das plantações agrícolas e povoamentos florestais referidos no número anterior será atribuída, com base na classificação da respectiva carta de capacidade de uso do solo, uma pontuação de 90 pontos por hectare das classes D e E, de 130 pontos por hectare da classe C, de 200 pontos por hectare da classe B e de 300 pontos por hectare da classe A.
5 - A pontuação de áreas de reserva, desde que calculadas em conformidade com este artigo, não será alterada depois da sua demarcação.
Artigo 16.º
Localização da reserva
1 - As áreas de reserva localizam-se nos prédios expropriados ou sujeitos a expropriação.2 - Sempre que possível e mediante a anuência do reservatário, a área de reserva localiza-se em zona onde o proprietário do prédio haja realizado recentes investimentos.
3 - Quando, no prédio expropriado ou sujeito a expropriação, exista um prédio urbano onde o reservatário tenha residência ou onde esteja instalada a sede de lavoura, a área de reserva deve ser contígua ou circundante ou o mais próximo possível deste, salvo vontade em contrário manifestada pelo reservatário.
Artigo 17.º
Contitularidades e heranças indivisas
1 - Nas contitularidades e heranças indivisas, cada uma das partes ou quinhões hereditários, existentes à data da expropriação, tem direito a uma reserva, cuja pontuação é a correspondente à respectiva percentagem sobre a pontuação total dos prédios expropriados ou expropriáveis nos termos da lei anterior.2 - Para cada contitular ou herdeiro, a soma da pontuação correspondente à percentagem da respectiva parte ou quinhão e da pontuação de outras áreas de que seja ou tenha sido reservatário, ao abrigo da lei anterior, não pode, porém, exceder a pontuação estabelecida para o direito de reserva.
3 - Os contitulares ou herdeiros podem agrupar as respectivas partes ou quinhões hereditários, mediante a assinatura em conjunto do requerimento de reserva não podendo a reserva atribuída a cada grupo de contitulares ou herdeiros exceder a pontuação estabelecida para o direito de reserva.
4 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, os cônjuges são considerados um só titular quanto aos bens comuns.
5 - São nulos os actos jurídicos que conduzam à reunificação das reservas atribuídas nos termos deste artigo.
Artigo 18.º
Sociedades
Às sociedades cujo património foi expropriado ou nacionalizado cabe mais que uma reserva, nas condições seguintes:a) As reservas são tantas quantas as quotas ou participações no capital social, existentes à data da expropriação, de cuja percentagem sobre o total da pontuação do prédio resulte área ou pontuação superior a 60 ha ou 91000 pontos, podendo os sócios agrupar-se para efeitos de atingirem essa percentagem, mediante assinatura em conjunto do requerimento de reserva;
b) Para cada sócio, a soma da pontuação correspondente à percentagem da respectiva quota ou participação no capital social, de uma ou mais sociedades, e da pontuação de outras áreas de que seja ou tenha sido reservatário, ao abrigo da lei anterior, não pode, porém, exceder a pontuação estabelecida para o direito de reserva;
c) Excepto quanto às sociedades por quotas, o número de reservas atribuídas, nos termos das alíneas anteriores, não pode ser superior a quatro;
d) A produção de efeitos de atribuição das reservas que excedam uma, nos casos previstos na alínea a), fica sujeita à condição de elas serem juridicamente separadas, com liquidação da sociedade, no prazo de um ano a contar da data do despacho atributivo, findo o qual, e em caso contrário, o referido despacho é nulo;
e) São nulos os actos jurídicos que conduzam à reunificação das reservas atribuídas nos termos das alíneas anteriores.
Artigo 19.º
Alternativa dos reservatários
Aos reservatários é conferido o direito de optarem entre a área equivalente à pontuação da respectiva reserva e uma área até 60 ha, independentemente da pontuação.
Artigo 20.º
Titulares de direitos reais e rendeiros
1 - O direito de reserva cabe ao titular do direito de propriedade, sem prejuízo da posição jurídica dos titulares de outros direitos reais ou dos arrendatários à data da expropriação ou da ocupação, quando esta tenha ocorrido em primeiro lugar, relativamente à área da reserva.
2 - São respeitados os direitos dos que, à data da ocupação ou da expropriação, exploravam uma área dos prédios expropriados, sem prejuízo do estabelecido no artigo 22.º 3 - O disposto nos números anteriores não se aplica aos contratos de exploração «de campanha», «de seara», de parceria pecuária e de parceria agrícola.
4 - Aos titulares dos direitos referidos no n.º 1 aplicam-se, com as necessárias adaptações, as disposições deste capítulo.
Artigo 21.º
Actos ineficazes
1 - Para efeitos da presente lei são ineficazes os actos ou contratos, relativos a prédios já expropriados, praticados depois do início do processo de expropriação dos quais resulte diminuição de área expropriável.2 - Para efeitos do disposto no número anterior considera-se iniciado o processo de expropriação com a verificação da primeira das seguintes formalidades:
a) Publicação da portaria que opere a expropriação;
b) Publicação de declaração de utilidade pública para expropriação;
c) Comunicação ao interessado para demarcação da reserva a atribuir no âmbito da presente lei.
Artigo 22.º
Limite máximo de exploração e extinção de direitos reais e do
arrendamento
1 - Ficam sujeitos a extinção os direitos de usufruto, de superfície, de uso e de arrendamento incidentes sobre áreas dos prédios rústicos a que corresponda pontuação superior à estabelecida para o direito de reserva, cabendo ao respectivo usufrutuário, superficiário, usuário ou rendeiro o direito de ser indemnizado pelo beneficiário dessa extinção.2 - À extinção prevista no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto neste capítulo.
Artigo 23.º
Frutos pendentes
1 - Os frutos dos prédios expropriados, percebidos ou pendentes à data da posse administrativa pertencem aos que nessa data sejam ou fossem seus legítimos possuidores.2 - A empresa agrícola explorante afectada por demarcação da reserva tem direito aos frutos pendentes resultantes da exploração extinta.
Artigo 24.º
Domínio privado do Estado
Os prédios expropriados passam para o domínio privado indisponível do Estado.
Artigo 25.º
Processo das expropriações
O Código das Expropriações rege as expropriações previstas nesta lei, incluindo a matéria relativa às indemnizações das que de futuro venham a efectuar-se, em tudo quanto nela não esteja especificamente regulado.
Artigo 26.º
Declaração de utilidade pública
1 - Compete ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação declarar a utilidade pública das expropriações previstas nesta lei.2 - A declaração de utilidade pública é obrigatoriamente precedida de demarcação da reserva.
Artigo 27.º
Natureza urgente
As expropriações previstas nesta lei são consideradas urgentes.
Artigo 28.º
Demarcação da reserva
1 - Compete ao Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação aprovar a demarcação das reservas previstas nesta lei.2 - A demarcação da reserva ou a reversão do prédio rústico é obrigatoriamente precedida da audiência dos titulares de outros direitos, referidos no n.º 1 do artigo 20.º, sobre os prédios em causa, dos beneficiários da entrega para exploração, referidos no n.º 1 do artigo 29.º, de áreas da respectiva reserva e ainda dos trabalhadores permanentes efectivos ao serviço dos prédios expropriados.
3 - A audiência prevista no número anterior pode ser efectuada por edital publicado, ainda que sem identificação pessoal dos interessados, em pelo menos dois números de um jornal diário de grande tiragem nacional e afixado na sede da junta de freguesia da localização do respectivo prédio.
Reservas em áreas entregues para exploração
1 - Os beneficiários do direito de exploração de áreas de prédios rústicos entregues ao abrigo do Decreto-Lei 111/78 e legislação complementar, desde que regularmente investidos nele por acto administrativo expresso, mantêm a plenitude do seu direito de exploração.
2 - Não podem ser atribuídas reservas nem reverter prédios nas áreas referidas no n.º 1, salvo se:
a) Os beneficiários concordarem na transferência da sua área de exploração para outros terrenos do Estado;
b) Os beneficiários e os titulares do direito de reserva celebrarem entre si contrato pelo qual aqueles mantenham a posse útil da área de exploração;
c) A pontuação da parte sobrante dos prédios expropriados, ou expropriáveis nos termos da lei anterior, não exceder a pontuação de uma reserva, calculada nos termos deste diploma, e apenas até demarcação de uma área não superior à correspondente à pontuação de uma reserva.
3 - No caso previsto na alínea c) do número anterior, a eficácia do despacho atributivo da reserva fica condicionada ao prévio realojamento de beneficiário noutra área de igual pontuação, localizada na mesma zona e sobre a qual não existam direitos pendentes, e ao pagamento antecipado, pelo reservatário ao beneficiário, da indemnização correspondente às benfeitorias necessárias e úteis efectuadas por este na sua área de exploração.
4 - O montante das indemnizações previstas no número anterior será determinado segundo o regime legal das expropriações por utilidade pública, com as necessárias adaptações, ou por acordo dos interessados, reduzido a escrito.
5 - São salvaguardados os direitos de domínio resultantes de desanexações operadas ao abrigo do n.º 2 do artigo 50.º da Lei 77/77.
6 - Com a atribuição da reserva são extintos quaisquer outros direitos de exploração constituídos sobre as novas áreas de reserva.
Artigo 30.º
Reversão
Por portaria conjunta do Primeiro-Ministro e do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação pode ser determinada a reversão dos prédios rústicos expropriados, quando se comprove que:a) Permaneceram na posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou na dos respectivos herdeiros;
b) Antes de 24 de Fevereiro de 1988 e independentemente de acto administrativo com esse objectivo, regressaram à posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou às dos respectivos herdeiros.
Artigo 31.º
Derrogação do acto expropriativo
O preceituado neste capítulo aplica-se, com as devidas adaptações, aos casos em que da instrução do processo de atribuição de reserva se conclua pela não expropriabilidade do prédio ou prédios rústicos ou sempre que haja lugar a derrogação do acto expropriativo.
Artigo 32.º
Indemnizações
As indemnizações devidas pelas expropriações e requisições já efectuadas continuam a reger-se por lei especial.
Artigo 33.º
Aplicação a reservas já demarcadas
A aplicação das disposições do presente capítulo aos casos em que as reservas não tenham sido requeridas ou cujo requerimento haja sido extemporâneo, e as já demarcadas, no âmbito da lei anterior, depende de requerimento dos interessados, apresentado até 90 dias após a entrada em vigor da presente lei.
Artigo 34.º
Prédios nacionalizados
O disposto no presente capítulo aplica-se aos prédios rústicos nacionalizados nos termos do Decreto-Lei 407-A/75, de 30 de Julho, salvo o disposto no artigo 30.ºCAPÍTULO III
Uso e mau uso dos solos agrícolas
Artigo 35.º
Do uso da terra
1 - A terra, como suporte físico fundamental da comunidade, é valor eminentemente nacional, qualquer que seja a forma da sua apropriação.2 - No uso dos solos agrícolas devem ser respeitadas as suas potencialidades e capacidade de regeneração, as técnicas mais adequadas e a função social da terra, no quadro dos condicionalismos ecológicos, sociais e económicos do País.
3 - O regime do uso da terra é imperativo relativamente a todos os prédios rústicos.
Artigo 36.º
Regime do uso da terra
Os prédios rústicos declarados por portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação em situação de abandono ou mau uso podem ser objecto de arrendamento forçado ou expropriação, nos termos a regulamentar por decreto-lei.
CAPÍTULO IV
Destino das áreas expropriadas e nacionalizadas
Artigo 37.º
Beneficiários da entrega para exploração
1 - Os prédios expropriados ou nacionalizados são entregues para exploração a beneficiários constitucionalmente susceptíveis de recebê-los e aptos a contribuírem para os objectivos da política agrícola.
2 - O Estado, ou qualquer pessoa colectiva pública, pode, sem se constituir na obrigação de indemnizar, resolver unilateralmente o contrato ou rescindir a relação jurídica pela qual qualquer entidade com a exploração de um prédio expropriado ou nacionalizado infringe o regime imperativo do uso da terra e inexecuta os planos de exploração aprovados.
3 - O disposto no número anterior é aplicável aos casos em que as entidades que as exploram tenham abandonado total ou parcialmente, ou cedido a outrem a sua exploração, os respectivos estabelecimentos agrícolas ou se achem em situação de inviabilidade ou insolvência económica.
Artigo 38.º
Casos especiais
Os prédios expropriados ou nacionalizados podem igualmente ser geridos pelo próprio Estado ou por outra pessoa colectiva pública, desde que para fins de investigação agrária, de extensão rural ou de formação profissional agrária.
Artigo 39.º
Competência
Compete ao Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, ouvidos os trabalhadores permanentes e efectivos em serviço nos prédios expropriados ou nacionalizados, determinar, para efeitos da entrega para exploração:a) A área dos prédios que serão afectos a cada estabelecimento agrícola;
b) O tipo de empresa agrícola beneficiária;
c) A empresa agrícola à qual será entregue o estabelecimento agrícola;
d) O tipo de contrato, as condições e os termos em que deve ser efectuada a exploração.
Artigo 40.º
Tipos de contrato para entrega de exploração
1 - A entrega para exploração dos prédios expropriados ou nacionalizados pode ser efectuada mediante:
a) Concessão de exploração;
b) Licença de uso privativo;
c) Arrendamento rural;
d) Exploração de campanha.
2 - Todos os contratos para entrega de exploração obrigam o beneficiário ao pagamento de uma contrapartida ao Estado.
3 - Os contratos de arrendamento rural referidos na alínea c) do n.º 1 regulam-se pela legislação de arrendamento rural.
4 - Os contratos referidos nas alíneas a) e b) do n.º 1 só excepcionalmente podem ser utilizados, devendo, preferencialmente, celebrar-se o contrato de arrendamento rural.
Artigo 41.º
Limites
A área dos prédios afectos a cada estabelecimento agrícola resultante da entrega para exploração a entidades singulares e colectivas, independentemente da pontuação, terá como base uma racional articulação entre a dimensão e o rendimento fundiário e respeitará determinados limites máximos e mínimos.
CAPÍTULO V
Fomento hidroagrícola
Artigo 42.º
Fomento hidroagrícola
O Estado promoverá o estudo e a realização de obras de fomento hidroagrícola que, pelo seu interesse económico e social, se mostrem úteis ao desenvolvimento e reconversão agrários.
Artigo 43.º
Obras de fomento hidroagrícola
1 - São consideradas de fomento hidroagrícola as obras de aproveitamento de águas do domínio público para rega, enateiramento ou colmatagem, drenagem, enxugo e defesa dos terrenos para fins agrícolas, adaptação ao regadio das terras beneficiadas, melhoria de regadios existentes e a conveniente estruturação agrária.2 - As águas particulares ou por qualquer título sujeitas ao seu regime podem também, mediante indemnização prévia, ser aproveitadas para obras de fomento hidroagrícola.
Artigo 44.º
Audição dos agricultores
É obrigatória a audição prévia dos agricultores abrangidos por obras de fomento hidroagrícola de interesse nacional ou regional e a aprovação maioritária dos agricultores abrangidos por obras de interesse local ou particular.
Artigo 45.º
Expropriação por utilidade pública
Para a realização de obras de interesse nacional ou regional e subsidiárias destas, nomeadamente para efeitos de reestruturação agrária, podem ser expropriados por utilidade pública, nos termos gerais, os prédios rústicos e urbanos, as águas particulares, os direitos que lhes sejam inerentes, num e noutro caso, e os direitos adquiridos sobre águas públicas.
Artigo 46.º
Regime financeiro
Os beneficiários de cada obra de fomento hidroagrícola suportarão integralmente as despesas de conservação e ficam obrigados ao reembolso de, pelo menos, parte do custo da obra.
CAPÍTULO VI
Disposições finais
Artigo 47.º
Regulamentação
1 - Os limites e directivas do uso da terra, o cumprimento da função social da propriedade e o exercício das competências atribuídas ao Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação pelos artigos 39.º, 40.º e 41.º serão definidos pelo Governo mediante decreto-lei, no prazo de 90 dias.2 - O Governo regulamentará a presente lei no que se torne necessário à sua execução.
Artigo 48.º
Delegação de competência
A competência atribuída pela presente lei ao Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação pode por este ser delegada nos termos da lei geral.
Artigo 49.º
Arrendamentos restabelecidos
Aos arrendamentos restabelecidos, nos termos do artigo 20.º deste diploma, é concedido um prazo mínimo de vigência de seis anos, contados a partir da data da demarcação da reserva.
Artigo 50.º
Pressupostos da suspensão da eficácia
1 - A suspensão da eficácia de actos administrativos que, no âmbito da reforma agrária, determinem a entrega de reservas ou reconheçam não ter sido expropriado ou nacionalizado determinado prédio rústico só pode ser decretada judicialmente se, estando preenchidos os requisitos da lei, o requerente explorar o prédio abrangido mediante concessão de exploração, licença de uso privativo, arrendamento rural ou exploração de campanha e, à data desse acto administrativo, a pontuação da área na posse do requerente da suspensão for inferior à pontuação da reserva atribuída ao interessado na execução do acto.
2 - A entidade ou entidades que beneficiem da execução dos actos referidos no número anterior serão notificadas, simultaneamente com o seu autor, para, no mesmo prazo, invocarem e demonstrarem, se quiserem obstar a que a suspensão seja decretada, que ela lhes causa um prejuízo de mais difícil reparação do que aquele que da execução do acto adviria para o requerente.
3 - Para efeitos do número anterior, será indicada no requerimento de suspensão a entidade a quem a suspensão da eficácia do acto pode directamente prejudicar.
Artigo 51.º
Disposição revogatória
É revogada a Lei 77/77, de 29 de Setembro, bem como toda a legislação que a regulamentou ou que se mostrar incompatível com as normas da presente lei, mantendo-se, porém, em vigor as tabelas de pontuação aprovadas no domínio do Decreto-Lei 406-A/75, de 29 de Julho, salvo no que contrariar este diploma.
Aprovada em 21 de Julho de 1988.
O Presidente da Assembleia da República, Vítor Pereira Crespo.
Promulgada em 7 de Setembro de 1988.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendada em 12 de Setembro de 1988.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.