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Acórdão 376/2005/T, de 19 de Agosto

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Texto do documento

Acórdão 376/2005/T. Const. - Processo 508/2005. - Acordam no plenário do Tribunal Constitucional:

I - Relatório. - A - Requerente e objecto do pedido. - O Ministro da República para a Região Autónoma da Madeira, invocando o disposto nos artigos 278.º, n.os 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa, 45.º, n.º 1, da Lei Constitucional 1/2004, de 24 de Julho, e 51.º, n.º 1, e 57.º, n.º 1, da Lei 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), requer a apreciação preventiva da constitucionalidade das seguintes normas constantes do decreto legislativo regional intitulado "Alteração da estrutura orgânica da Assembleia Legislativa", aprovado em sessão plenária da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira no pretérito dia 17 de Maio e recebido para promulgação no seu Gabinete no dia 9 de Junho de 2005:

"Artigo 29.º

O artigo 46.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, de 7 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto Legislativo Regional 2/93/M, de 20 de Fevereiro, pelo Decreto Legislativo Regional 11/94/M, de 28 de Abril, e pelo Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M, de 27 de Abril, passa a ter a seguinte redacção:

'Artigo 46.º

Gabinetes dos partidos e dos grupos parlamentares

1 - Os partidos com um único deputado e os grupos parlamentares dispõem, para a utilização de gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, nomeação, exoneração e qualificação, de uma verba anual calculada nos seguintes termos:

a) Deputado único/partido e grupos parlamentares, 15 x 14 SMNR (salário mínimo nacional em vigor na Madeira)/mês/número de deputados;

...

2 - ...'

Artigo 30.º

O artigo 47.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, de 7 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto Legislativo Regional 2/93/M, de 20 de Fevereiro, pelo Decreto Legislativo Regional 11/94/M, de 28 de Abril, e pelo Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M, de 27 de Abril, passa a ter a seguinte redacção:

'Artigo 47.º

Subvenção aos partidos

1 - ...

a) Representação de um só deputado e grupos parlamentares - 1 SMNR x número de deputados;

2 - ...

3 - Os partidos mantêm sempre, até final da VIII Legislatura, a subvenção mensal adquirida em 31 de Dezembro de 2004, se da aplicação do disposto na alínea a) do n.º 1 resultar a sua diminuição.'"

B - Fundamentos do pedido. - Na sua exposição, após proceder ao enquadramento histórico das normas relativas ao financiamento dos partidos políticos e grupos parlamentares, bem como das leis relativas à orgânica da Assembleia da República e da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, e dos quadros legais relativos às subvenções aos partidos políticos e aos grupos parlamentares representados quer na Assembleia da República quer na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira e após identificar os parâmetros constitucionais susceptíveis de serem convocados para a apreciação do pedido, o requerente explicita o essencial da sua fundamentação através do seguinte discurso argumentativo:

"As verbas em dinheiro atribuídas pelas normas objecto do pedido correspondem a subvenções atribuídas pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira aos partidos nela representados.

Essas subvenções têm a natureza de financiamentos públicos aos partidos por terem em vista a realização dos fins próprios destes, consubstanciados, essencialmente, no concurso, de acordo com a sua filosofia, programa e orientação política, 'para a organização e para a expressão da vontade popular, no respeito pelos princípios da independência nacional e da unidade do Estado e da democracia política', em que se compreendem, nomeadamente, de entre outros, o direito de concorrer às eleições para a Assembleia da República e para as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, não podendo aqueles objectivos programáticos ser cingidos ao âmbito regional, pelo que 'as suas estruturas regionais [...] hão-de reger-se pelo regime global que os vincula na sua inteira unidade', como afloramento do princípio da unidade do Estado e da natureza e âmbito nacional dos partidos políticos."

Do artigo 51.º, n.º 6, interpretado em conjugação com o disposto nos n.os 1 e 4 do mesmo artigo e com o disposto no artigo 10.º, n.º 2, ambos os artigos da Constituição, resulta que as verbas em causa devem entender-se como integrando o conceito de financiamentos aos partidos políticos, sendo a definição do respectivo regime remetida para a lei pelo preceito constitucional.

Esses financiamentos devem respeitar a regra da proibição de objectivos programáticos dos partidos de âmbito regional e, consequentemente, o âmbito nacional dos mesmos partidos, coerentemente com o princípio da unidade do Estado, em cujos órgãos, baseados no sufrágio universal e directo, participam (artigo 117.º, n.º 1, da CRP), e com as regras estabelecidas para a apresentação das suas contas, as quais devem abranger todas as estruturas nacionais, com inclusão, portanto, das 'estruturas regionais, distritais ou autónomas, de forma a permitir o apuramento da totalidade das suas receitas e despesas, podendo, em alternativa, apresentar contas consolidadas' (de acordo com o disposto no artigo 12.º, n.º 4, da Lei 19/2003, de 20 de Junho, que se inspirou no artigo 10.º, n.º 4, da Lei 56/98, de 18 de Agosto, e conforme foi entendido pelo Tribunal Constitucional, no seu Acórdão 647/2004, embora relativamente ao regime decorrente, ainda da Lei 72/93, de 30 de Novembro).

Como financiamentos aos partidos políticos, e na medida em que representam matéria que respeita directamente ao seu estatuto jurídico-constitucional, as verbas a que aludem as normas em causa constituem matéria que cabe na reserva absoluta de competência da Assembleia da República, apenas podendo ser regulada através de lei orgânica, de acordo com o disposto nos artigos 164.º, alínea h), e 166.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

As verbas a que aludem os preceitos em causa não correspondem aos financiamentos previstos nas alíneas a) e b) do artigo 4.º da Lei 19/2003 (subvenções para financiamento dos partidos políticos para a realização dos seus fins próprios e subvenções para as campanhas eleitorais), estando para além deles.

"É certo que a Lei 19/2003, na esteira aliás da Lei 56/98, a propósito do financiamento público para a realização dos fins próprios dos partidos políticos, prevê que este pode resultar, para além das subvenções para financiamento dos partidos e para as campanhas eleitorais, de 'outras legalmente previstas' [artigo 4.º, alínea c)]."

"Mas haverá de concluir-se que essas outras subvenções 'legalmente previstas' não poderão deixar de constar de lei da Assembleia da República, como, aliás, bem resulta de toda a economia daquele diploma, nomeadamente do disposto nos artigos 16.º e 17.º a propósito das actividades da campanha eleitoral para a Assembleia da República, o Parlamento Europeu, a Assembleia Legislativa das Regiões Autónomas e as autarquias locais."

Independentemente da acentuação que se dê à característica de os grupos parlamentares 'mediatizarem a participação [dos partidos] na Assembleia' para os ver mais como órgãos dos respectivos partidos ou mais como órgãos da Assembleia, 'a compreensão do alcance decisivo e substancial do papel dos partidos políticos no exercício do mandato dos deputados e no funcionamento dos grupos parlamentares justifica, por certo, que se recuse a neutralidade da disciplina jurídica destes grupos face aos partidos políticos que estão na sua génese e dos quais são simples reflexo e emanação, e muito em especial quando estejam em causa subvenções e suportes financeiros a cargo dos orçamentos da Assembleia da República', e, 'à luz deste entendimento, tal-qualmente pertence em exclusivo à reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República a matéria do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais, parece dever, por identidade ou similitude de razões, pertencer também em exclusivo àquela Assembleia a matéria relativa ao financiamento das actividades dos grupos parlamentares nela representados'.

Dado que, de acordo com o artigo 228.º, n.º 1, 'a autonomia legislativa das Regiões Autónomas incide sobre as matérias enunciadas no respectivo estatuto político-administrativo que não estejam reservadas aos órgãos de soberania' e que, segundo o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º, ambos os artigos da Constituição, as Regiões Autónomas têm o poder de 'legislar no âmbito regional em matérias enunciadas no respectivo estatuto político-administrativo e que não estejam reservadas aos órgãos de soberania', a definir nos respectivos estatutos, a Assembleia Legislativa da Madeira não tem poderes para legislar sobre a matéria das subvenções que as normas em causa regulam.

De qualquer modo, 'seja qual for a natureza e o destino da subsidiação a que se reportam as normas impugnadas, mas admitindo-se que com ela, directa ou indirectamente, se visa tão-somente contemplar os grupos parlamentares, parece duvidoso que se verifique a existência de particularidades ou especificidades regionais justificativas de tão grande diferenciação de tratamento entre os grupos parlamentares da Assembleia Legislativa e da Assembleia da República' que consiga afastar as exigências postuladas pelo princípio da igualdade, consagrado como critério geral também para o legislador, no artigo 13.º da Constituição - de proibição do arbítrio, de proibição de discriminação e de obrigação de diferenciação -, tendo até em conta que a sua operacionalidade se justifica pelo facto de 'o regime dos partidos políticos [...] [ser] unitário e uniforme no todo nacional, achando-se constitucionalmente vedada a existência de partidos com índole ou âmbito regional'.

Na verdade, é de questionar se 'as alterações que, pelas normas questionadas, se introduzem na subsidiação financeira dos partidos e dos grupos parlamentares da Assembleia Legislativa se apresentam com fundamentação razoável, objectiva e racional e estabelecem em relação ao regime vigente na Região e na República uma diferenciação justa e equilibrada'.

É que 'no sistema regional em vigor o montante global dos subsídios atribuídos aos gabinetes dos partidos e dos grupos parlamentares (na decorrência das eleições para a Assembleia Legislativa em Outubro de 2004, as representações parlamentares, num universo de 68 deputados, ficaram assim constituídas: PSD - 44; PS - 19; PCP - 2; CDS/PP - 2; BE - 1) é de cerca de Euro 3 000 000, passando tal montante, por força da nova redacção dada ao artigo 46.º, em apreço, para cerca de Euro 5 500 000, sendo que tal acréscimo será por inteiro atribuído ao PSD (cerca de Euro 1 900 000, cabendo-lhe um total anual de Euro 3 500 000) e ao PS (cerca de Euro 600 000, cabendo-lhe um total anual de Euro 1 500 000), mantendo os demais partidos políticos (PCP, CDS-PP e BE) os subsídios previstos na lei em vigor, respectivamente de cerca de Euro 160 000, Euro 160 000 e Euro 80 000'.

'Também, embora em grau menor, a subvenção a que se reporta a redacção concedida ao artigo 47.º, igualmente em apreço, conduz a uma nova diferenciação retributiva.'

'E o sistema que agora se pretende instituir no artigo 46.º, quando confrontado com as regras em vigor em matéria de subsidiação dos grupos parlamentares da Assembleia da República, órgão de soberania (artigo 46.º da Lei 28/2003), revela-se altamente desfavorável para estes, pois que na eventualidade de se aplicarem aos partidos representados na Assembleia Legislativa, órgão constitucional não soberano, os critérios estabelecidos na República, verificar-se-ia uma diferença para menos, superior a Euro 3 500 000.'

'Acrescentando-se a este saldo a subsidiação contemplada no artigo 47.º, no seu confronto com o normativo correspondente da Assembleia da República (artigo 47.º, n.º 4, da Lei 28/2003), a diferença global entre os dois regimes aproxima-se de Euro 4 000 000, com vantagem para os partidos com assento no parlamento regional.'

'Ora, o diploma em causa não contempla qualquer justificação material fundada e explicitada - na exposição preambular não se apresenta uma única razão justificativa desta tão substancial alteração e beneficiação do regime de financiamento - para um tratamento legislativo desigualitário com o que vigora no plano nacional e sem qualquer consideração no âmbito de uma desejável discriminação positiva para os partidos políticos com escassa representação parlamentar, como aliás se verifica no quadro normativo em vigor.'

'Por outro lado, como se extrai das normas em causa quando observadas no contexto global dos preceitos e do sistema em que se integram, não foi acrescentado qualquer acréscimo de funções, de competências, de actividades, susceptíveis de servir de suporte e fundamento ao reforço da subvenção atribuída aos partidos e aos grupos parlamentares.'"

C - Resposta do órgão autor das normas. - Notificado, nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), o Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira respondeu dizendo, em síntese, que:

Não pode ignorar-se, no tratamento da matéria em causa, a "inescapável autonomia regional no tocante ao modo como se concebe a organização e o funcionamento da [...] Assembleia Legislativa";

É certo que o núcleo central relativo aos aspectos fundamentais do regime jurídico dos partidos políticos é da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República através de produção de lei orgânica.

Dessa matéria também poderia fazer parte o aspecto fundamental do financiamento dos partidos, que, nos termos do artigo 38.º da Lei Orgânica 2/2003, é regulado em lei própria;

O regime de financiamento dos partidos estabelecido na Lei 19/2003 contém dois tipos de matérias que se distinguem: a) o regime geral do financiamento dos partidos; b) o regime especial do financiamento dos partidos políticos representados na Assembleia da República;

Nada se dizendo nesse regime especial quanto aos parlamentos regionais, não pode concluir-se que os partidos políticos aí representados não tenham direito a qualquer subvenção, mas sim que tal "omissão foi intencional na medida em que a definição do financiamento dos partidos políticos representados nos parlamentos regionais só a estes diz respeito através do seu poder legislativo";

Justifica-se a atribuição de "uma margem de competência legislativa em matéria de financiamento dos partidos, não na sua essência, mas na sua concretização, para os diversos órgãos em que os partidos políticos são representados e desde que esses órgãos disponham de poder legislativo, com o objectivo de efectuarem essa conformação normativa", havendo que distinguir: a) a competência legislativa nacional quanto à definição dos aspectos nucleares do regime dos partidos e, em particular, o regime do seu financiamento público, nas suas linhas primordiais; b) as competências legislativas nacional e regional ao nível do "regime especial de financiamento" na "concretização dos quantitativos a atribuir, não propriamente na sua consagração, que constam da lei nacional ou da lei regional, em face de cada órgão a que se aplica";

Caminho este que vem sendo seguido pela legislação nacional que separa as duas competências legislativas, ainda que na titularidade do mesmo órgão: a) "a competência legislativa nacional por lei geral, nos fundamentos do regime de financiamento"; b) "a competência legislativa nacional por lei da organização e funcionamento da Assembleia da República no tocante às subvenções que neste órgão têm lugar para os partidos nela representados";

Tais asserções são corroboradas pelo facto de a Lei da Organização e Funcionamento da Assembleia da República não ser uma lei orgânica, nunca se tendo questionado "a constitucionalidade da LOFAR que estabelece o regime das subvenções públicas para o parlamento nacional";

É infundada a pretensão de se considerar que o regime da subvenção pública outorgada pelo parlamento regional deve ser integrado no âmbito de uma reserva de lei orgânica, tanto mais que a própria Lei 19/2003 não se encontra revestida dessa categoria, o que só pode compreender-se "numa concepção equilibradamente moderada de cláusula de competência parlamentar de lei orgânica sobre associações e partidos políticos";

A natureza de garantia institucional do financiamento público "afasta essa matéria do núcleo atinente aos partidos [...] [e não] lhe faz estender o regime de reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República";

A Lei 19/2003, ao admitir que existam outras subvenções legalmente previstas, não pretende ser "o regime exclusivo nessa matéria, sendo tal entendimento compatível com o reconhecimento de uma competência legislativa regional";

E "são os próprios termos expressos da autonomia regional que implicam essa competência legislativa regional, na medida em que a organização e o funcionamento lhe diz respeito, sendo certo que, neste caso, se cruzam ainda recursos financeiros que só a Assembleia Legislativa Regional pode determinar";

O estatuto constitucional dos grupos parlamentares vigora não só para a Assembleia da República como, também, para as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas;

Cabendo à lei determinar os termos em que se concretiza o direito estabelecido no artigo 180.º, n.º 3, da CRP, a exigência das "necessárias adaptações" constante do artigo 232.º, n.º 4, da CRP implica o reconhecimento da competência da Assembleia Legislativa Regional para regular tal matéria enquanto relativa à sua autoconformação, e até por maioria de razão com o que se passa relativamente ao Governo Regional, pois, não obstante este estar politicamente dependente daquela, o artigo 231.º, n.º 6, da CRP atribui-lhe competência exclusiva para a sua organização e competência, não sendo, consequentemente, viável que fosse a Assembleia da República, no seu Regimento ou na sua lei de organização, a concretizar os direitos dos grupos parlamentares das assembleias legislativas regionais, tanto mais que "os direitos que são atribuídos aos grupos parlamentares e partidos representados no parlamento regional desempenham a função de favorecer o bom desempenho da actividade levada a cabo pelos titulares dos órgãos de governo regional";

Improcede também a alegação da violação do princípio da igualdade, nas suas várias acepções;

As diferenciações, em face do regime vigente para a Assembleia da República, são justificadas pela existência de um sistema de governo regional, de tipo parlamentar, implicando esta circunstância que se possibilite "aos gabinetes dos partidos e grupos parlamentares uma mais enérgica intervenção política na fiscalização da actividade do Governo Regional, em face dos mais amplos poderes que o parlamentarismo regional lhes dá";

Por outro lado, "os factores de atribuição das verbas são objectivos e rigorosamente iguais para todas as formações políticas", sendo estabelecidos em função da sua representatividade, "não parece[ndo] que este critério possa ser questionado, em democracia representativa [...] à luz do princípio da igualdade";

E "é, além de mais, um critério de proporcionalidade, porque permite diferenciar as verbas atribuídas em razão do número de deputados e de votos de cada partido político";

"Não tem sentido qualquer obrigação de discriminação positiva [dos partidos com menos representantes] - porque também não se enfrenta uma desigualdade de facto a superar - quando se tem despesas menores em razão de uma menor representação parlamentar", pois "obviamente que os partidos com mais representantes têm mais despesas de gabinetes" e "uma maior actividade burocrática e política."

II - Fundamentação:

D - Do pedido: sua compreensão problemática. - 1 - Afigura-se ser necessário, antes de mais, traçar um esquisso relativo aos antecedentes normativos da regulamentação em crise, na medida em que ele se revela útil à sua apreensão. E porque a regulação da matéria se mostra associada às estruturas orgânicas que a Assembleia da República e a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira tiveram no decurso do tempo, e porque a compreensão destas se revela igualmente útil à determinação da natureza dos grupos parlamentares e das subvenções que lhes são atribuídas, de uns e de outros desses aspectos se dará conta, na medida do estritamente necessário.

2 - A primeira estrutura orgânica da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira (então denominada Assembleia Regional) foi aprovada pelo Decreto Regional 4/77/M, de 19 de Abril. No que tange aos referidos aspectos, o artigo 6.º, dispondo sobre locais de trabalho e pessoal de apoio dos grupos parlamentares, prescrevia que cada grupo parlamentar, para além de locais de trabalho, seria dotado com pessoal técnico e administrativo da sua confiança, pago pelo orçamento da Assembleia (n.º 1). Os grupos parlamentares com mais de oito deputados tinham direito ao apoio de um secretário e de um escriturário-dactilógrafo, e os grupos parlamentares com menos de oito deputados dispunham apenas de um escriturário-dactilógrafo.

Visando, como consignou no seu exórdio, "criar condições para que os partidos políticos representados na Assembleia Regional [...] [pudessem] prosseguir com eficácia os seus fins próprios, designadamente de natureza parlamentar, através de apoios diversos com a nomeação de pessoal auxiliar dos grupos parlamentares e a concessão de subvenção", o Decreto Regional 19/79/M, de 15 de Setembro, deu nova redacção ao artigo 6.º do Decreto Regional 4/77/M, ao mesmo tempo que lhe aditou um novo preceito instituidor de uma subvenção anual aos partidos políticos, o artigo 6.º-A.

Por força da alteração introduzida no artigo 6.º, os grupos parlamentares com mais de 20 deputados passaram a ter direito a um secretário e dois escriturários-dactilógrafos; com menos de 20 e mais de 8 deputados, a um secretário e um dactilógrafo; e com menos de 8 deputados, a um escriturário-dactilógrafo, cabendo a nomeação de todo este pessoal à direcção dos respectivos grupos parlamentares, e sendo o mesmo pago pelo orçamento da Assembleia Regional.

Por seu lado, o referido artigo 6.º-A dispunha pelo seguinte modo:

"Artigo 6.º-A

Subvenção

1 - Será concedida, nos termos dos números seguintes, uma subvenção anual a cada um dos partidos políticos representados na Assembleia Regional que a requeiram ao Presidente, até 15 de Janeiro, para a realização dos seus fins próprios, designadamente de natureza parlamentar.

2 - A subvenção consistirá numa quantia em dinheiro equivalente à fracção 1/225 do salário mínimo nacional por cada voto obtido na mais recente eleição de deputados à Assembleia Regional.

3 - A subvenção será paga em duodécimos, por conta de uma dotação especial incluída para o efeito no orçamento da Assembleia Regional, à ordem do órgão competente de cada partido.

4 - Para o ano de 1979 o requerimento referido no n.º 1 será apresentado até 15 dias após a publicação do presente decreto no Diário da República, determinando a sua apresentação o pagamento dos duodécimos vencidos."

Entretanto, foi publicado o Decreto Regional 19/81/M, de 1 de Outubro, que, revogando os Decretos Regionais n.os 4/77/M e 19/79/M, procedeu à integral reestruturação da orgânica da Assembleia Regional.

No seu artigo 18.º, sob a epígrafe "Pessoal de apoio aos deputados", prescreveu que os partidos com um único deputado dispunham de um funcionário, os constituídos em grupos parlamentares tinham direito a dois e mais um por cada grupo de cinco deputados eleitos e em funções, sendo este pessoal de livre escolha e nomeação da direcção dos respectivos grupos parlamentares ou dos representantes dos partidos, ficando os respectivos encargos a pertencer à Assembleia Regional.

E, no artigo 20.º, epigrafado "Subvenção", dispunha-se do seguinte jeito:

"1 - Será concedida uma subvenção anual a cada um dos partidos políticos representados na Assembleia Regional para a realização dos seus fins próprios, designadamente de natureza parlamentar.

2 - A subvenção consistirá numa quantia em dinheiro equivalente à fracção 1/225 do salário mínimo nacional por cada voto obtido na mais recente eleição dos deputados à Assembleia Regional.

3 - A subvenção só é devida a partir do momento em que for requerida pelo respectivo partido ou grupo parlamentar em cada sessão legislativa.

4 - A subvenção será paga em duodécimos, por conta de uma dotação especial incluída no orçamento da Assembleia Regional, à ordem do órgão competente de cada partido."

O Decreto Regional 19/81/M foi revogado pelo Decreto Legislativo Regional 24/89/M, de 7 de Setembro, o qual passou a dispor, no artigo 46.º, sobre "gabinetes dos grupos parlamentares" e, no artigo 47.º, sobre "subvenção aos partidos".

No seu artigo 46.º, n.º 1, especificava-se qual o número de adjuntos de sua livre nomeação de que cada grupo parlamentar poderia dispor: até 2 deputados, de 2 adjuntos; com mais de 2 e até 5 deputados, de 3 adjuntos; com mais de 5 e até 10 deputados, de 5 adjuntos; com mais de 10 e até 20 deputados, de 7 adjuntos; com mais de 20 e até 30 deputados, de 9 adjuntos; com mais de 30 e até 40 deputados, de 11 adjuntos; com mais de 40 e até 50 deputados, de 13 adjuntos; com mais de 50 deputados, de 15 adjuntos.

Os grupos parlamentares, no exercício das suas funções, podiam ainda dispor de secretários auxiliares (n.º 3), elencando, os restantes números do artigo 46.º, os direitos conferidos a este pessoal.

Por seu lado, o artigo 47.º dispunha do seguinte modo:

"1 - É concedida uma subvenção anual a cada um dos partidos políticos representados na Assembleia para a realização dos seus fins próprios.

2 - A subvenção consiste numa quantia em dinheiro equivalente à fracção 1/225 do salário mínimo nacional por cada voto obtido na mais recente eleição dos deputados à Assembleia.

3 - Aos grupos parlamentares é atribuída uma subvenção para encargos de assessoria aos deputados não inferior a quatro vezes o salário mínimo nacional por cada grupo parlamentar, mais um terço do mesmo por deputado.

4 - As subvenções referidas no presente artigo são pagas em duodécimos, por conta de dotações especiais inscritas no orçamento da Assembleia Legislativa Regional."

O Decreto Legislativo Regional 2/93/M, de 20 de Fevereiro, proclamando pretender "dignificar o órgão máximo da autonomia regional, criando-se melhores condições de trabalho quer ao próprio Parlamento quer aos deputados e funcionários", deu nova redacção aos n.os 1 do artigo 46.º e 3 do artigo 47.º

O artigo 46.º, sob o epíteto "Gabinetes dos partidos e dos grupos parlamentares", passou a ter o seguinte teor:

"1 - Os partidos com um único deputado e os grupos parlamentares dispõem, para a utilização de gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, nomeação, exoneração e qualificação, de uma verba anual, resultante do quadro seguinte:

a) Deputado único/partido - 15 x 14 SMNR (salário mínimo nacional aplicável na Madeira)/ano;

b) Grupo parlamentar até 2 deputados - 15 x 14 SMNR/mês/número de deputados;

c) Grupo parlamentar de 3 a 10 deputados - 11 x 14 SMNR/mês/número de deputados;

d) Grupo parlamentar de 11 a 20 deputados - 9 x 14 SMNR/ mês/ número de deputados;

e) Grupo parlamentar de 21 a 30 deputados - 8 x 14 SMNR/ mês/número de deputados;

f) Grupo parlamentar superior a 30 deputados - 7 x 14 SMNR/ mês/ número de deputados."

Por outro lado, o n.º 3 do artigo 47.º passou a ter a seguinte redacção:

"Artigo 47.º

Subvenção aos partidos

1 - ...

2 - ...

3 - Aos grupos parlamentares é atribuída uma subvenção mensal para encargos de assessoria aos deputados não inferior a quatro vezes o salário mínimo nacional anual por grupo parlamentar, mais dois terços do mesmo por deputado.

4 - ..."

Entretanto, o Decreto Legislativo Regional 11/94/M, de 28 de Abril, veio conceder nova redacção ao artigo 47.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, já alterado pelo Decreto Legislativo Regional 2/93/M, passando a dispor do seguinte jeito:

"Artigo 47.º - 1 - Às representações parlamentares é atribuída uma subvenção mensal para encargos de assessoria, contactos com os eleitores e outras actividades correspondentes aos respectivos mandatos no valor de dois terços do salário mínimo nacional aplicável desta Região Autónoma (SMNR) por deputado, mais a ponderação dos seguintes factores:

a) Representação de um só deputado - 1 SMNR;

b) Grupo parlamentar até 2 deputados - 7,5 SMNR;

c) Grupo parlamentar de 3 a 10 deputados - 10 SMNR;

d) Grupo parlamentar de 11 a 20 deputados - 15 SMNR;

e) Grupo parlamentar de 21 a 30 deputados - 20 SMNR;

f) Grupo parlamentar com mais de 30 deputados - 30 SMNR."

No tocante ao artigo 46.º, cuja última redacção lhe foi dada pelo referido Decreto Legislativo Regional 2/93/M, este novo diploma nada alterou.

Posteriormente, foi publicado o Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M, de 27 de Abril. Porém, também ele não alterou este artigo 46.º, pelo que a sua redacção, ao tempo da emissão das normas agora sindicadas, era ainda - e ao contrário do afirmado pelo próprio legislador no artigo 29.º, cuja constitucionalidade vem impugnada - a conferida pelo Decreto Legislativo n.º 2/93/M, de 20 de Fevereiro.

Mas o mesmo não pode dizer-se relativamente ao artigo 47.º, vindo do Decreto Legislativo Regional 24/89/M e sucessivamente alterado pelos Decretos Legislativos Regionais n.os 2/94/M e 11/94/M.

Na verdade, o diploma de 2000 alterou o n.º 1, passando o artigo a ter a seguinte redacção:

"Artigo 47.º

Subvenção aos partidos

1 - Às representações parlamentares é atribuída uma subvenção mensal para encargos de assessoria, contactos com os eleitores e outras actividades correspondentes aos respectivos mandatos no valor de dois terços do salário mínimo nacional aplicável nesta Região Autónoma (SMNR) por deputado eleito, mais a ponderação dos seguintes factores:

a) ...

b) ...

c) ...

d) ...

e) ...

2 - ..."

Acentue-se que os diversos diplomas legislativos regionais referidos foram aprovados pela Assembleia Regional ou Assembleia Legislativa Regional com invocação expressa dos poderes conferidos pelo artigo 229.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, à excepção do Decreto Legislativo Regional 11/94/M, que invoca o disposto na alínea o) do n.º 1 do artigo 229.º da Constituição, e do Decreto Legislativo n.º 10-A/2000/M, que invoca a alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição.

Invocam também as seguintes normas do seu Estatuto: "artigo 22.º, alínea b), do Estatuto Provisório (Decreto-Lei 318-D/76, de 30 de Abril)" - Decreto Regional 4/77/M; "artigo 22.º, alínea b), do Estatuto Provisório - Decreto Regional 19/79"; "alínea o) do n.º 1 do artigo 29.º da Lei 13/91, de 5 de Junho" - Decreto Legislativo Regional 11/94/M; "alínea c) do n.º 1 do artigo 37.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, revisto pela Lei 130/99, de 21 de Agosto" - Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M.

Os Decretos Regionais n.os 19/81 e 24/89/M não se referem a quaisquer normas do Estatuto ao abrigo das quais editam as suas normas.

Finalmente, os artigos 29.º e 30.º do decreto legislativo cuja constitucionalidade o requerente impugna têm o seguinte teor:

"Artigo 29.º

O artigo 46.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, de 7 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto Legislativo Regional 2/93/M, de 20 de Fevereiro, pelo Decreto Legislativo Regional 11/94/M, de 28 de Abril, e pelo Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M, de 27 de Abril, passa a ter a seguinte redacção:

'Artigo 46.º

Gabinetes dos partidos e dos grupos parlamentares

1 - Os partidos com um único deputado e os grupos parlamentares dispõem, para a utilização de gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, nomeação, exoneração e qualificação, de uma verba anual calculada nos seguintes termos:

a) Deputado único/partido e grupos parlamentares - 15x14 SMNR (salário mínimo nacional em vigor na Madeira)/mês/número de deputados;

2 - ...

3 - ...

4 - ...

5 - ...

6 - ...

7 - ...

8 - ...

9 - ...

10 - ...'

Artigo 30.º

O artigo 47.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, de 7 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto Legislativo Regional 2/93/M, de 20 de Fevereiro, pelo Decreto Legislativo Regional 11/94/M, de 28 de Abril, e pelo Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M, de 27 de Abril, passa a ter a seguinte redacção:

'Artigo 47.º

Subvenção aos partidos

1 - ...

a) Representação de um só deputado e grupos parlamentares - 1 SMNR x número de deputados;

...

2 - ...

3 - Os partidos mantêm sempre, até final da VIII Legislatura, a subvenção mensal adquirida em 31 de Dezembro de 2004, se da aplicação do disposto na alínea a) do n.º 1 resultar a sua diminuição.'"

Relativamente a estes preceitos, importa ainda notar que o artigo 32.º, n.º 1, do decreto legislativo agora em causa estabelece que "as alterações à estrutura orgânica da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira introduzidas pelo presente decreto legislativo regional [sejam] [...] inscritas no lugar próprio mediante as substituições e aditamentos necessários".

3 - Consideradas essas substituições e aditamentos, os referidos preceitos passariam a ter a seguinte redacção:

"Artigo 46.º

Gabinetes dos partidos e dos grupos parlamentares

1 - Os partidos com um único deputado e os grupos parlamentares dispõem, para a utilização de gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, nomeação, exoneração e qualificação, de uma verba anual calculada nos seguintes termos:

a) Deputado único/partido e grupos parlamentares - 15x14 SMNR (salário mínimo nacional em vigor na Madeira)/mês/número de deputados;

...

2 - O Presidente da Assembleia Legislativa fixa, por despacho, o quadro de pessoal do gabinete de cada grupo parlamentar, por proposta vinculativa do respectivo grupo e desde que não ultrapasse o montante referido no número anterior.

3 - Os grupos parlamentares no exercício das suas funções podem dispor de secretários auxiliares, com vencimento fixado em 85% do vencimento dos secretários, sem prejuízo do n.º 2 do presente artigo.

4 - É aplicável aos membros do gabinete dos grupos parlamentares o disposto no artigo 11.º do presente diploma.

5 - O pessoal referido neste artigo tem direito a uma indemnização mensal equivalente a 8% da remuneração actualizável da categoria que teve nos últimos três anos ou, quando exercendo funções há menos tempo, da categoria que durante mais tempo exerceu, por cada ano completo de desempenho de funções e durante o mesmo número de meses em que esteve afecto ao grupo parlamentar.

6 - A indemnização referida no número anterior só tem lugar após a cessação de funções comprovada pela direcção do grupo parlamentar e tem como limite máximo 80% da remuneração referida.

7 - O direito à indemnização referido no n.º 5 deste artigo suspende-se quando o pessoal que a ele tem direito auferir qualquer tipo de remuneração da função pública.

8 - A aplicação do disposto neste artigo não prejudica a situação existente em cada gabinete de apoio aos grupos parlamentares, nem a fixação do quadro previsto no n.º 2 prejudica a utilização da totalidade do montante referido no n.º 1 do presente artigo.

9 - Os membros dos gabinetes dos grupos parlamentares são portadores de um cartão de identidade, conforme anexo ao presente diploma.

10 - O processamento dos vencimentos do pessoal dos gabinetes dos partidos e dos grupos parlamentares, bem como as despesas com os encargos sociais e respectivo processamento, são da responsabilidade da Assembleia Legislativa.

Artigo 47.º

Subvenção aos partidos

1 - Às representações parlamentares é atribuída uma subvenção mensal para encargos de assessoria, contactos com os eleitores e outras actividades correspondentes aos respectivos mandatos no valor de dois terços do salário mínimo nacional aplicável nesta Região Autónoma (SMNR) por deputado eleito, mais a ponderação dos seguintes factores:

a) Representação de um só deputado e grupos parlamentares - 1 SMNR x número de deputados;

...

2 - A subvenção referida no presente artigo é paga em duodécimos, por conta de dotações especiais inscritas no orçamento da Assembleia Legislativa.

3 - Os partidos mantêm sempre, até final da VIII Legislatura, a subvenção mensal adquirida em 31 de Dezembro de 2004, se da aplicação do disposto na alínea a) do n.º 1 resultar a sua diminuição."

Segundo decorre do acima exposto, verifica-se, assim, que o regime cuja constitucionalidade se impugna se caracteriza, no âmbito da legislação regional da Madeira, que se deixou explicitada, e, no que concerne à atribuição de subvenções pela Assembleia Legislativa, pela seguinte forma:

A existência de uma subvenção, atribuída ao partido com um único deputado e aos grupos parlamentares para a utilização de gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, nomeação, exoneração e qualificação, expressa em uma verba anual determinada de acordo com os factores constantes da redacção dada ao artigo 46.º pelo Decreto Legislativo Regional 2/93/M, verba essa independente das despesas atinentes aos encargos sociais relativos ao pessoal dos gabinetes dos partidos e grupos parlamentares que cabem directamente à Assembleia Legislativa Regional;

A existência de uma subvenção mensal atribuída às representações parlamentares para encargos de assessoria, contactos com os eleitores e outras actividades correspondentes aos respectivos mandatos, determinada de acordo com o critério e com os factores estabelecidos no artigo 47.º do Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M."

E - Do regime das subvenções previstas nas leis orgânicas da Assembleia da República e da estrutura orgânica relativa ao pessoal de apoio aos deputados. - 1 - Até à publicação do primeiro diploma que procedeu à definição geral do regime de financiamento dos partidos políticos e do regime de apresentação das contas decorrentes do exercício da sua actividade em geral - o que aconteceu pela mão da Lei 72/93, de 30 de Novembro -, a concessão de subvenções, seja aos partidos políticos seja aos grupos parlamentares, em diplomas emitidos da Assembleia da República, aparece feita apenas nas leis que regulam a orgânica da Assembleia da República.

Assim, o artigo 16.º da Lei 32/77, de 25 de Maio, subordinado à epígrafe "Subvenção", previa que "será concedida, nos termos dos números seguintes [onde se enunciava o respectivo critério de determinação e o modo e tempo de pagamento, mesmo relativamente ao ano de 1977], uma subvenção anual a cada um dos partidos políticos representados na Assembleia da República que a requeiram ao Presidente, até 15 de Janeiro, para a realização dos seus fins próprios, designadamente de natureza parlamentar".

Por seu lado, no artigo 15.º previa-se a existência de pessoal de apoio aos deputados, resultando do diploma que os encargos com esse pessoal eram da responsabilidade da Assembleia da República.

2 - Seguiu-se a publicação da Lei 5/83, de 27 de Julho. Mantendo, embora, a subvenção regulada nos n.os 1 a 3 do artigo 16.º da Lei 32/77, a nova lei alterou o seu n.º 4 e aditou-lhe o n.º 5, os quais passaram a dispor:

"4 - Será também concedida aos agrupamentos parlamentares constituídos, nos termos do Regimento, por deputados que se tenham apresentado ao eleitorado em listas de um determinado partido ou coligação de partidos como independentes uma subvenção anual, desde que a requeiram ao Presidente, para a realização dos seus fins parlamentares.

5 - A subvenção referida no número anterior sairá da subvenção devida ao partido ou coligação de partidos em cujas listas foram eleitos os deputados que se constituam em agrupamento parlamentar e será igual à parte desta subvenção que proporcionalmente corresponder a um deputado daquele partido ou coligação de partidos."

3 - Sucedeu-se a Lei 77/88, de 1 de Julho, que dedicou à regulação da matéria dos "gabinetes dos grupos parlamentares" o artigo 62.º, e à matéria das "subvenções aos partidos e grupos parlamentares", o artigo 63.º

Naquele preceito, o legislador limitou-se a definir os critérios de determinação do número do pessoal adstrito aos gabinetes dos grupos parlamentares, a sua categoria e os regimes da sua nomeação, exoneração e vencimentos.

Neste, o legislador manteve a atribuição "a cada um dos partidos que hajam concorrido ao acto eleitoral, ainda que em coligação, representados na Assembleia da República [...] nos termos dos números seguintes [de] uma subvenção anual para a realização dos seus fins próprios, desde que a requeiram ao Presidente da Assembleia da República" (n.º 1), e, ainda, de "uma subvenção" "aos grupos parlamentares [...] para encargos de assessoria aos deputados não inferior a quatro vezes o salário mínimo nacional anual por grupo parlamentar, mais um terço do mesmo por deputado" (n.º 4), prevendo, igualmente, nos n.os 5 e 6, o modo da sua atribuição em caso de grupos parlamentares originários de partidos que tenham concorrido em coligação ao acto eleitoral, bem como a forma do seu pagamento (duodécimos).

4 - A Lei 59/93, de 17 de Agosto, concedeu nova redacção ao artigo 62.º da Lei 77/88, modificando, nomeadamente, o quadro de pessoal dos gabinetes dos grupos parlamentares e definindo as regras a que haveria de obedecer a fixação das verbas relativas às despesas com as respectivas remunerações. Por outro lado, o diploma alterou, igualmente, o artigo 63.º, n.º 4, da referida Lei 77/88, por forma que cada grupo parlamentar passasse a dispor, anualmente, de uma subvenção para encargos de assessoria aos deputados não inferior a quatro vezes o salário mínimo anual, acrescida de metade do valor do mesmo por deputado.

5 - Entretanto, os n.os 1, 2 e 3 do artigo 63.º da Lei 77/88 (não alterados pela Lei 59/93) foram revogados pelo artigo 28.º da referida Lei 72/93, de 30 de Novembro.

Consequentemente, a Lei Orgânica da Assembleia da República passou a prever apenas a atribuição da subvenção que estava prevista no n.º 4 do artigo 63.º da Lei 77/88, na redacção dada pela Lei 59/93.

6 - Seguiu-se a Lei 28/2003, de 30 de Julho - "Lei de Organização e Funcionamento dos Serviços da Assembleia da República (LOFAR)" - , que procedeu a diversas alterações à Lei 77/88, de 1 de Julho, na redacção dada pela Lei 59/93, de 17 de Agosto. Todavia, o analisado artigo 63.º não foi, aí, objecto de qualquer alteração. Porém, ao proceder à republicação da LOFAR, de acordo com o determinado no artigo 5.º, o mesmo legislador fez figurar, do seu artigo 47.º, o teor dos n.os 1, 2 e 3 do artigo 63.º da Lei 77/88, na redacção vigente ao tempo da sua revogação pela referida Lei 72/93, e os n.os 4 a 6, do mesmo artigo 63.º, estes na redacção dada pela Lei 59/93 (n.º 4) e pela Lei 77/88 (n.os 5 e 6).

F - Do regime do financiamento aos partidos. - 1 - A maior parte das democracias ocidentais conhece a existência do sistema de financiamento público dos partidos políticos. Trata-se de uma ideia que se impôs como decorrência das funções que lhes são reconhecidas quer "para a organização e para a expressão da vontade popular" (na expressão do n.º 2 do artigo 10.º da Constituição Portuguesa) quer na "participação nos órgãos baseados no sufrágio universal e directo" (artigo 114.º, n.º 1, da Constituição Portuguesa), bem como em considerações como as de que, por esse modo, se potenciava o princípio da igualdade de oportunidades dos partidos e, de alguma maneira, se arredavam as críticas da falta de transparência das suas fontes sociais de financiamento, com o cortejo de males que lhes ia normalmente associado: a corrupção dos partidos com mais evidente vocação de poder e o controlo do Estado por parte de grupos económicos (cf. Roberto L. Blanco Valdés, "Consideraciones sobre la necesaria reforma del sistema español de financiación de los partidos políticos", in La Financiación de los partidos políticos, Cuadernos y Debates, n.º 47, Madrid, 1994, pp. 45 e segs., Enrique Alvarez Conde, "Algunas propuestas sobre la financiación de los partidos políticos", in ibidem, pp. 16 e segs., Jean-Pierre Camby, Le Financement de la vie politique en France, Paris, 1995, pp. 26 e segs., J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª ed., Coimbra, 2003, pp. 321 e segs., José Manuel Meirim, O Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais - Introdução e Notas à Lei 72/93, de 30 de Novembro, Lisboa, 1994, pp. 10 e segs.).

São muito diversos os modos como esse financiamento é levado a cabo nesses países.

Sem haver de entrar-se em grandes especificações para a economia da decisão, pode dizer-se que as subvenções públicas atribuídas aos partidos giram, em tais países, directamente em torno da consideração de dois elementos essenciais: de um lado, as conexionadas com o seu concurso nos diferentes processos e actos eleitorais; do outro, as atribuídas em função dos resultados obtidos nos processos eleitorais. E, relativamente a estas, a maioria dos sistemas orienta-se no sentido de as mesmas serem atribuídas em função, essencialmente, do número de votos obtido nas eleições dos diversos órgãos (cf. Jean-Pierre Camby, Le Financement de la vie politique en France, cit., pp. 27 e segs.).

Tendo por objecto da sua análise a realidade nacional, J. J. Gomes Canotilho (Direito Constitucional e Teoria da Constituição, cit., p. 321) distingue entre o "financiamento estadual imediato (pagamento dos custos da campanha eleitoral a quem tiver uma percentagem mínima de votos)", que considera "materialmente justo" por o financiamento das campanhas eleitorais dar um "importante contributo para a formação da vontade política", e o "financiamento estadual mediato (atribuição de subsídios aos partidos representados no Parlamento)", cuja consagração afirma ser "legítima", embora tenha "merecido sérias objecções".

E, precisando o sentido destas objecções, o mesmo autor escreve (op. cit., p. 321):

"Se o financiamento dos partidos solidifica a sua posição perante influências externas (o que é mais duvidoso), nem por isso os subsídios orçamentais deixam de constituir uma inversão do próprio princípio democrático: a formação da vontade do povo para os órgãos do Estado, e não destes para o povo. Acrescente-se ainda: o subsídio dos partidos pode ser um 'prémio ao poder' e uma tentativa camuflada da redução partidária externa e do próprio espectro político."

E, de seguida, remata o seu raciocínio em termos que podem assumir-se:

"O artigo 51.º, n.º 6 (aditado pela Lei Constitucional 1/97), dá, porém, guarida a uma concepção estadualista de financiamento público, pois neste financiamento cabem não só os financiamentos de campanhas eleitorais mas também os chamados financiamentos estruturais mediatos (cf. as Leis 56/98, de 18 de Agosto, 97/98, de 17 de Agosto e 23/2000, de 23 de Agosto, relativas às contas e financiamentos dos partidos políticos)."

Dentro da mesma linha de pensamento se expressam Jorge Miranda e Rui Medeiros (Constituição Portuguesa Anotada, t. I, Coimbra, 2005, p. 492), quando escrevem sobre o mesmo artigo 51.º:

"O n.º 6, a aproximar do artigo 113.º, n.º 3, alínea d), é ainda uma exigência do método democrático.

Ele exige o financiamento público, mas sujeito a requisitos e a limites a fixar por lei (que não fica impedida de admitir outras fontes de financiamento dos partidos). É, portanto, uma norma compromissória: garantia institucional de financiamento público a par de relativa liberdade de conformação do legislador."

2 - A primeira vez que o legislador nacional procedeu autonomamente à definição de um regime geral relativo ao financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, bem como do dever de prestação das respectivas contas, aconteceu sob a Lei 72/93, de 30 de Novembro.

E cingindo-nos, por economia da decisão, à matéria da caracterização das suas fontes de financiamento que aqui relevam, regista-se que o legislador previu, de par com as modalidades de financiamento privado admitidas, o "financiamento público [dos partidos] para a realização dos seus fins próprios" (artigo 6.º). No mesmo preceito, estabeleceu-se que esses recursos eram "as subvenções para financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais previstas na presente lei" e "a subvenção atribuída pelo Parlamento Europeu, nos termos das normas comunitárias aplicáveis".

No artigo 7.º, e sob a epígrafe "Subvenção estatal ao financiamento dos partidos", o legislador previu, no n.º 1, a concessão a "cada partido que haja concorrido a acto eleitoral, ainda que em coligação, e que obtenha representação na Assembleia da República [de] uma subvenção anual, desde que a requeira ao Presidente da Assembleia da República". No n.º 2 do mesmo artigo, definia-se o critério legal da determinação do montante da subvenção, dizendo-se que esta "consiste numa quantia em dinheiro equivalente à fracção 1/225 do salário mínimo nacional mensal por cada voto obtido na mais recente eleição de deputados à Assembleia da República" e, nos números seguintes (3 e 4), o critério de distribuição em caso de coligação eleitoral e a forma de pagamento em duodécimos.

Em rectas contas, e no que ora importa acentuar, a Lei 72/93 limitou-se a assumir por inteiro o critério de financiamento dos partidos que, ao tempo, estava previsto nos n.os 1, 2 e 3 do artigo 63.º da referida Lei 77/88, cujos preceitos revogou (cf. o artigo 28.º).

A este diploma sucedeu a Lei 56/98, de 18 de Agosto.

Nesta lei, continuou-se a contemplar entre as "fontes de financiamento da actividade dos partidos" as subvenções públicas (artigo 2.º). E, explicitando a sua natureza, o artigo 6.º estabelece que estas são "as subvenções para financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais previstas na presente lei" [alínea a)] e "outras legalmente previstas" [alínea b)].

Mantendo nos seus n.os 1 a 4 o regime da subvenção estatal ao financiamento dos partidos que vinha da anterior lei, o artigo 7.º passou, porém, a prever, no seu n.º 5, que a "subvenção prevista nos números anteriores é também concedida aos partidos que, tendo concorrido à eleição para a Assembleia da República e não tendo conseguido representação parlamentar, obtenham um número de votos superior a 50 000".

O preceito veio, novamente, a ser alterado pela Lei 23/2000, de 23 de Agosto, tendo-se, porém, essa alteração, no que concerne à matéria, consubstanciado apenas no acrescento ao n.º 5 do artigo 7.º aditado pela Lei 59/98 da expressão "desde que a requeiram ao Presidente da Assembleia da República".

Por fim, a matéria do "financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais" veio a ser objecto de regulação pela Lei 19/2003, de 20 de Junho.

Este diploma, no que concerne às fontes de financiamento público, manteve, no essencial, o regime que já vinha das leis anteriores (subvenções para financiamento dos partidos políticos, subvenções para as campanhas eleitorais e outras subvenções legalmente previstas), consistindo a sua única alteração relevante, neste domínio, a que respeita ao critério de determinação do montante da subvenção, que no n.º 2 do seu artigo 5.º é feita corresponder, agora, "à fracção de 1/135 do salário mínimo nacional por cada voto obtido na mais recente eleição de deputados à Assembleia da República".

De notar, ainda, que, não obstante o artigo 4.º da nova lei conter três alíneas diferentes, estas têm o mesmo conteúdo prescritivo do artigo 6.º da Lei 56/98.

No que a Lei 19/2003 mais pormenorizou foi em uma melhor caracterização das receitas próprias dos partidos políticos (artigos 3.º e 8.º), em uma mais precisa regulação da subvenção pública para as campanhas eleitorais, nestas se incluindo as eleições para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu, para as assembleias legislativas regionais e para as autarquias locais, na fixação de limites de despesas de campanha eleitoral e na previsão de responsabilidade dos mandatários financeiros pela elaboração e apresentação das contas de campanha (artigos 15.º a 22.º) e, finalmente, em uma maior densificação do regime de prestação e de julgamento das contas dos partidos e das campanhas eleitorais (artigos 12.º a 14.º), tendo para este efeito criado a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos com a função de coadjuvar o Tribunal Constitucional, a quem essa competência está atribuída desde a legislação primitiva (Lei 72/93), na sua apreciação e fiscalização (artigos 23.º e segs.), vindo a organização e funcionamento desta Entidade a ser desenvolvida na Lei Orgânica 2/2005, de 10 de Janeiro.

G - Subvenções públicas, partidos políticos, representações parlamentares e parâmetros constitucionais. - 1 - "A Constituição de 1976 é, neste aspecto, explícita: os partidos são uma realidade constitucional e direito constitucional formal (artigos 10.º, n.º 2, 40.º, 51.º, 114.º, 151.º, 180.º, 187.º e 288.º, alínea i)" (J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional ..., cit., p. 315), procedendo a uma "incorporação constitucional dos partidos em sentido formal" (cf. Marcelo Rebelo de Sousa, Os Partidos Políticos no Direito Constitucional Português, Braga, 1983, p. 92), enquanto emanação do Estado de direito democrático baseado no pluralismo da expressão e organização política democráticas (cf. os artigos 2.º, 3.º, n.º 3, 47.º e 117.º), tendo mesmo incluído a matéria relativa ao "pluralismo de expressão e organização política, incluindo partidos políticos, e o direito de oposição democrática" entre os limites materiais de revisão constitucional [artigo 290.º, alínea i)].

E a importância jurídico-constitucional conferida a essa matéria foi acentuando-se ao longo da vida da actual Constituição, como é revelado pelo facto de, tendo sido inicialmente prevista apenas como matéria incluída na reserva de exclusiva competência da Assembleia da República, mas susceptível de ser delegada mediante lei de autorização ao Governo [artigos 167.º, alínea g) e 168.º, n.º 1], ter entretanto passado sucessivamente a ser matéria incluída na reserva absoluta, mas susceptível de ser regulada através de simples lei da Assembleia da República [artigos 167.º, alínea d), e 169.º, n.º 2 - na revisão de 1982; artigos 167.º, alínea h), e 169.º, n.º 2 - revisão de 1989; artigos 167.º, alínea h), e 169.º, n.º 3 - revisão de 1992], e, finalmente, a matéria incluída na reserva absoluta da Assembleia da República, mas sujeita ao procedimento e regime de aprovação próprios de lei orgânica [artigos 164.º, alínea h), e 166.º, n.º 2 - revisão de 1997; artigos 164.º, alínea h), e 166.º, n.º 2 - revisão de 2004].

Reflectindo o estado da questão relativamente à posição actual dos partidos no sistema político-constitucional, pode repetir-se o que, em data recente, este Tribunal Constitucional afirmou (Acórdão 304/2003, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 19 de Julho de 2003):

"[...] os partidos são associações de natureza privada de interesse constitucional e uma peça fundamental do sistema político (é o próprio Estado a estimular a sua actividade, suportando parte do respectivo financiamento), pois se lhes atribui - por vezes em exclusivo - a tarefa de concorrerem para a organização e para a expressão da vontade popular."

A asserção tem o condão de logo evidenciar, de uma forma precisa, duas das funções essenciais dos partidos cujo reconhecimento merece expressa consagração constitucional: por um lado, a de "concorre[re]m para a organização e para a expressão da vontade popular, no respeito pelos princípios da independência nacional, da unidade do Estado e da democracia política (artigo 10.º, n.º 2, da Constituição); por outro - e estando-lhe intrinsecamente ligada -, a de participarem "nos órgãos baseados no sufrágio universal e directo, de acordo com a sua representatividade" (artigo 114.º, n.º 1, da Constituição).

Quanto a esta, é de notar até que a "participação directa e activa de homens e mulheres na vida política" (cf. o artigo 109.º da Constituição), em alguns órgãos baseados na eleição apenas é possível através de listas apresentadas por partidos (cf. os artigos 21.º da Lei 14/79, de 16 de Maio - Lei Eleitoral para a Assembleia da República, 11.º do Decreto-Lei 318-E/76, de 30 de Abril - lei eleitoral para as primeiras Assembleias Regionais das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, mantida com alterações para a Região Autónoma da Madeira, e 21.º do Decreto-Lei 267/80, de 8 de Agosto - regime jurídico da eleição da Assembleia Regional dos Açores).

À altura em que a Constituição de 1976 atribuiu à exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre a matéria das "associações e partidos políticos", a questão do financiamento dos partidos políticos não correspondia ainda a problema que o nosso regime jurídico tivesse equacionado e resolvido em qualquer sentido, muito embora, ao tempo, ela fosse já um tema que era objecto de largo tratamento no regime de outros Estados democráticos.

Mas depressa o legislador ordinário se deu conta de uma tal realidade. Na verdade, tanto o legislador das sucessivas leis reguladoras da estrutura orgânica da Assembleia da República que acima se deixaram identificadas como o legislador das Regiões Autónomas (e diz-se isto porque, limitando-nos ao presente, preceito semelhante existe no regime orgânico da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores - Decreto Legislativo Regional 5/2000/A, de 2 de Março), passaram a prever a atribuição de subvenções apenas aos partidos que conseguissem representação parlamentar, consignando-se, todavia, expressamente, quase sempre, que a subvenção era atribuída "para a realização dos seus fins próprios [dos partidos], designadamente de natureza parlamentar".

Nos únicos casos em que este último fim não vem mencionado, resulta, todavia, do contexto dos diplomas e dos seus antecedentes que essa é a teleologia que os ilumina: é o que se passa relativamente aos artigos 47.º do Decreto Legislativo n.º 24/89/M e 63.º, n.º 1, da Lei 77/88, de 1 de Julho, mantido em vigor até à sua revogação pelo artigo 28.º da referida Lei 72/93.

A previsão da atribuição de tal subsídio na lei ou diploma regulador da estrutura orgânica destes órgãos e restrita aos partidos que neles tivessem deputados eleitos pelas suas listas aponta no sentido de que a subvenção atribuída aos partidos era vista, então, pelo legislador, essencialmente como um instrumento financeiro de potenciação da realização dos fins próprios dos partidos dentro da sua actividade parlamentar ou, dito de outro jeito, como modo de potenciar o trabalho parlamentar, decerto influenciado pela realização dos fins próprios de cada partido.

A completa autonomização da subvenção atribuída aos partidos em relação à obrigatoriedade de existência de representação parlamentar sua na Assembleia da República apenas vem a acontecer pela mão da Lei 56/98 (artigo 7.º, n.º 5), sendo mantida na legislação posterior.

Todavia, no que concerne à Região Autónoma da Madeira, verifica-se - a partir do Decreto Legislativo Regional 11/94/M, mediante a alteração introduzida ao artigo 47.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, e cujo sentido se mantém nas normas posteriores, com inclusão, nestas, do impugnado artigo 30.º - não só uma acentuação dos fins parlamentares da atribuição da subvenção como também uma modificação do titular a quem essa subvenção é atribuída, passando este a ser não os partidos representados na Assembleia Legislativa mas as representações parlamentares, em termos correspondentes, aliás, aos que ocorrem relativamente à subvenção prevista no referido do artigo 46.º, n.º 1, na redacção vigente na legislação regional que o questionado artigo 29.º altera.

Assim, enquanto, neste caso, a subvenção é atribuída aos grupos parlamentares para ocorrer às despesas com a utilização dos gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, onde será possível descortinar um variado leque de despesas, como os gastos administrativos, naquele outro caso estão incluídas as despesas dos deputados com "encargos de assessoria, contactos com os eleitores e outras actividades correspondentes aos respectivos mandatos", ou seja, as despesas que perfunctoriamente poderão designar-se como despesas com a actividade parlamentar de ligação entre o eleito e o eleitor.

A circunstância de a falta de grupo parlamentar conduzir à atribuição da verba ao partido, como acontece na situação regulada no artigo 46.º, em nada altera a natureza das coisas, porquanto o partido surge aqui como mero centro de imputação da despesa, dado que o deputado único não inserido em grupo parlamentar acaba por externar os fins parlamentares do partido em cuja lista foi eleito.

Do que vem dito, pode considerar-se adquirido que apenas a partir da edição da referida Lei 72/93 é que as subvenções aos partidos não respeitantes às campanhas eleitorais, que antes estavam previstas dentro da estrutura orgânica da Assembleia da República, passaram a ser vistas como um modo de financiamento mediato aos partidos para a realização dos seus fins próprios, desligadamente do exercício de actividade parlamentar, mas ainda aí supondo-a, enquanto a representação parlamentar era ainda elemento constituinte do critério.

Só a partir da Lei 56/98 é que tais subvenções adquiriram uma natureza de financiamento aos partidos, qua tale, ou seja, na perspectiva exclusiva de constituir um modo de financiamento da sua actividade e, consequentemente, do desempenho de todas as suas funções sócio-políticas.

2 - Recortado o quadro legislativo, ficam desenhados os traços que permitem, numa primeira consideração, adivinhar já uma destrinça entre as subvenções em causa no presente pedido de constitucionalidade e as que são outorgadas aos partidos políticos independentemente do desenvolvimento de uma concreta actividade de natureza parlamentar.

Importa, agora, para uma mais adequada compreensão do nódulo problemático sub judicio, atender às especificidades orgânico-materiais e teleológico-funcionais que relevam no âmbito da densificação normativa da figura dos grupos ou representações parlamentares, procurando perscrutar, a partir dessa via, se a realidade normativa das subvenções em apreciação não colherá aí fundamento relevante.

Na verdade, não só a modelação dogmática da natureza jurídica dos grupos e representações parlamentares se apresenta como adequada a poder emprestar ao tratamento da matéria em crise uma perspectiva que, num plano da extensão das suas funções, pode permitir compreender a sua destrinça - ou, pelo menos, as nuances distintivas - perante os partidos políticos qua tale, como, também, ela poderá evidenciar, melhor, o relevo que tais figuras assumem enquanto dimensões constitutivas da organização parlamentar e da actividade aí desenvolvida. Este é, aliás, como referem Lenk e Neumann (Teoría y sociología criticas de los partidos políticos, Barcelona, 1980, p. 38), um dos "problemas centrais da democracia parlamentar e de partidos".

Bem se compreende, assim, que uma tal reflexão não possa deixar de ser considerada para a solução da questão jurídico-constitucional.

2.2 - Apesar de não existir consenso doutrinal em torno de uma noção definidora dos grupos parlamentares, susceptível de concretizar adequadamente a sua natureza jurídica, contextualizada pelo centro de imputação funcional que lhes é reservado pelo ordenamento jurídico, não há dúvida de que não nos encontramos perante "objectos - recte, sujeitos - jurídicos não identificados" que prossigam objectivos político-juridicamente assépticos ou amorfos.

Tal constatação foi já operada por este Tribunal, que, no Acórdão 63/91 (publicado no Diário da República, 1.ª série, de 3 de Julho de 1991), reflectindo uma posição doutrinal, considerou que:

"[Os grupos parlamentares] configuram[-se] como um específico sujeito da actividade, organização e funcionamento do órgão parlamentar.

Tais grupos são, como se sabe, constituídos por deputados eleitos por cada partido ou coligação de partidos, enquanto tais, a eles se deferindo pela Constituição uma expressa importância. O que se compreende, já que, assim, se alcança a conferência de expressão no Parlamento às forças políticas que se apresentaram, como tal, ao eleitorado, com os respectivos programas e objectivos políticos.

Perante esta postura da Constituição, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira [...] sublinham que os grupos parlamentares não são simples formas de organização dos deputados, sem poderes parlamentares autónomos, mas, antes, 'verdadeiras entidades parlamentares, com poderes parlamentares próprios, os quais, mesmo quando paralelos aos dos deputados, são exercidos cumulativa e independentemente', funcionando a Assembleia da República, na prática parlamentar, 'muito mais como um conjunto de GP do que como conjunto de deputados', integrando, homogeneizando e unificando 'as posições dos deputados que os integram, substituindo às múltiplas posições individuais uma posição de grupo unificado', pelo que os deputados, 'ao intervirem na actividade parlamentar', funcionam, em geral, 'como simples transmissores ou porta-vozes da posição do grupo.'"

É, aliás, comum reconhecer-se hodiernamente a relevância jurídico-política da figura dos grupos parlamentares que, pelas suas funções, se converteram, "nas modernas assembleias legislativas, [em] instrumentos imprescindíveis para o correcto funcionamento das mesmas, [dado que] todo o trabalho, legislativo ou de outro tipo, que se leva a cabo nos parlamentos está concebido em função da sua existência" (cf. Alejandro Saiz Arnaiz, Los grupos parlamentarios, Madrid, 1989, p. 291), sendo, por isso, inteiramente justificadas as considerações tecidas por J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira referidas no acórdão acabado de citar e que também encontram reflexo no direito "comparado" - cf., inter alia, José Luis García Guerrero, Democracia representativa de partidos y grupos parlamentarios, Madrid, 1996, p. 411.

E essa específica relevância tem sido destacada doutrinariamente em face do jogo das semelhanças e das diferenças perante a realidade dos partidos políticos.

De facto, mesmo que se entenda, a propósito da desvelação da natureza jurídica dos grupos parlamentares, que estes podem ser vistos como "órgãos dos partidos políticos" (cf. Pietro Rescigno, "L'attività di diritto privato dei Gruppi parlamentari", in Giurisprudenza Costituzionale, 1961, pp. 295 e segs.), e que se assuma a existência de um "nexo jurídico entre o grupo parlamentar órgão do partido e o grupo parlamentar órgão do Estado" [cf. Biscaretti di Ruffia, "Il partiti politici nell'ordinamento costituzionale", in Il Politico, 1950, p. 16, referido por José Luis García Guerrero, Democracia representativa de partidos y grupos parlamentarios, cit, p. 253, e, entre nós, Jorge Miranda, "Grupo parlamentar", in AA. VV., Polis, Lisboa, pp. 136 e 137, que, depois de afirmar que são órgãos dos partidos "por mediatizarem a participação destes na Assembleia", reconhece que eles se assumem como "sujeitos da acção parlamentar [...] elementos que dinamizam a competência da Assembleia"], sempre se deverá reconhecer que dessa "visão de Janus", desse nexo, já decorre uma diferenciada actuação funcional que implica, no plano do financiamento público, para além da afectação dos meios indispensáveis à prossecução da generalidade das actividades partidárias, que, também por essa via, se permita o desenvolvimento da específica - formal, material e juridicamente distinta - actuação parlamentar.

Anote-se, de resto, que a generalidade da doutrina que reconhece aos grupos parlamentares a natureza de órgãos dos partidos políticos não deixa de mitigar essa posição, compatibilizando tal natureza com as funções específicas exercidas pelos grupos, reconhecendo-lhes, de um lado, no seio das assembleias legislativas, a natureza de órgãos destas que intervêm com "uma actividade própria no procedimento de formação do acto estatal" e que "esgotam a sua actividade na esfera jurídica do ente" que integram, e, do outro, igualmente, a natureza de "órgão externo" que, assumindo a sua "plena autonomia", "tem competência para formar ou manifestar a vontade de um ente ou, em geral, de estabelecer relações jurídicas com outros sujeitos", acabando por concluir que "não existem problemas dogmáticos para configurar o grupo parlamentar típico como órgão externo do partido e interno do Parlamento" (cf., neste sentido, Costantino Mortati, Istituzioni di diritto pubblico, Pádua, 1976, p. 880, onde escreve: "os grupos parlamentares são parte da organização interna dos partidos de quem são expressão, ainda que, ao mesmo tempo, sejam considerados órgãos internos das assembleias, com uma função que é preparatória das decisões que correspondem propriamente àquelas; assumindo assim uma duplicidade de competências e de responsabilidades face às entidades de que são parte [integrante]"; e José Luis García Guerrero, Democracia representativa de partidos y grupos parlamentarios, cit., pp. 252 e segs., depois de acolher a distinção entre "órgão interno" e "órgão externo").

E tal asserção não deixa de ser potenciada no domínio de uma concepção que, concretizando a ideia de que "os grupos não são meros elementos facultativos e acessórios dos parlamentos, mas sim centrais e determinantes de toda a actividade aí desenvolvida" (cf. Alejandro Saiz Arnaiz, Los grupos parlamentarios, cit., pp. 293 e 294), perspective os grupos parlamentares como órgãos das assembleias legislativas (cf., com mais indicações, Alejandro Saiz Arnaiz, Los grupos parlamentarios, cit., pp. 293, n. 7, 29, 30 e 35, Yves Guchet, Droit parlementaire, Paris, 1996, p. 37, e Wolfgang Demmler, Der Abgeordnete im Parlament der Fraktionen, 1994, pp. 197 e segs.).

De entre os autores que matizam esta natureza dos grupos parlamentares, conjugando-a com outras dimensões constitutivas, cf. Alejandro Saiz Arnaiz, Los grupos parlamentarios, cit., p. 348 - para quem os grupos são "partes de um órgão constitucional (o parlamento) integradas por um número mais ou menos amplo de membros deste (elemento pessoal), dotadas de uma certa continuidade (normalmente uma legislatura) e organização (no exercício da sua própria autonomia e dada a sua estrutura associativa) que expressam o pluralismo político (emanação dos partidos) e exercem funções de relevância pública no seio desse órgão".

Em todo o caso, qualquer reflexão sobre a natureza dos grupos parlamentares - e, para além das posições já denunciadas, podem referir-se as concepções que os entendem como "entes públicos independentes" (cf. A. Manzella, Il Parlamento, Bolonha, 1977, pp. 31 e segs.), como "associações de direito público" (cf. H. J. Moecke, "Die parlamentarischen Fraktionen als Vereine des öffentlichen Rechts", in Neue Juristische Wochenschrift, 1965, pp. 565 e segs.), ou mesmo como "associações de direito privado investidas em funções públicas (cf. Tesauro, "I gruppi parlamentari", in Rassegna di Diritto pubblico, 1967, p. 201) põe em destaque que a actividade dos grupos parlamentares no seio de uma Assembleia Legislativa contribui decisivamente para tornar possível e efectiva a realização das funções do próprio parlamento (cf. Alejandro Saiz Arnaiz, Los grupos parlamentarios, cit., p. 306).

Mesmo que se afirme existir algum nexo de dependência política dos grupos e representações parlamentares em face dos partidos, nexo este que pode até ser visto na circunstância de alguns dos estatutos dos partidos poderem tê-los como seus órgãos estatutários, é indefectível reconhecer-lhes, sempre, uma autonomia funcional no seio da instituição parlamentar assente em poderes parlamentares próprios, funcionalmente preordenados à realização das tarefas de natureza parlamentar.

2.3 - Ora, esta autonomia funcional - ou, pelo menos, a particular relevância que os grupos parlamentares assumem enquanto elementos constitutivos da vida parlamentar - tem manifestos reflexos ao nível da compreensão das subvenções outorgadas para a prossecução e o cumprimento das tarefas parlamentares, enquanto conditio sine qua non da realização da função parlamentar - e, bem assim, da efectiva actuação do complexo orgânico de soberania legislativa do Estado -, havendo que reconhecer as necessárias diferenciações de qualidade perante o problema do financiamento da actividade partidária realizada sem aquela conexão orgânica fundamental.

Tal constatação torna-se, de resto, bem patente ao nível da discussão global sobre o(s) financiamento(s) dos partidos, porquanto, independentemente do modelo que aí seja adoptado - com o "fiel da balança" a pender para o financiamento público ou para o financiamento privado, com os fundamentos e as consequências aí inerentes (cf. Hans Peter Schneider, Democracia y constitución, Madrid, 1991, pp. 273 e segs.) - , as subvenções "de âmbito parlamentar" são, em todo o caso, reconhecidas como instrumentos de actuação no seio das assembleias legislativas.

Nesta medida, como condição operacional que caberá aos parlamentos efectivar no âmbito do seu complexo de autonomia organizacional, essa matéria presta-se a ser menos sensível às tensões político-jurídicas latentes no debate comummente traçado em torno do financiamento da actividade partidária tout court (cf. Martin Morlok, "Finanziamento della politica e corruzione: il caso Tedesco", in Quaderni costituzionali, 1999, fasc. 2, p. 263).

Anote-se que, na Alemanha, onde a origem do financiamento dos partidos tem sido deveras debatida - muito em torno do pressuposto, firmado pelo tribunal constitucional alemão, de que o financiamento predominantemente público não é compatível com o princípio de independência dos partidos relativamente ao Estado [cf. o Acórdão de 14 de Julho de 1986, in Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts - BverfGE, vol. 20, p. 56 (97), citado por Christine Landfried, Parteifinanzen und politische Macht - Eine vergleichende Studie zur Bundesrepublik Deutschland, zu Italien und den USA, 2.ª ed., Heidelberg, 1994, p. 79; cf., também, Hans Peter Schneider, Democracia y constitución, cit., p. 274] - , se aceita, como linha de princípio, que o financiamento público dos grupos parlamentares "não deve ser criticado, porquanto tais grupos [...] constituem sujeitos necessários para a actividade parlamentar", estando inseridos na "estrutura orgânica estadual" [cf. BverfGE, vol. 20, p. 56 (104)].

E, mesmo quando se assuma, quanto à natureza dos grupos e representações parlamentares, que estes, para além da realidade parlamentar, possam também ser vistos como "órgãos de um partido político", são, na essência, diferenciáveis os conceitos - ou pelo menos os fundamentos e as finalidades - subvencionais, pois o "financiamento" dos grupos parlamentares apenas se compreende quando outorgado a entidades actuantes no órgão parlamentar, para a realização das funções que cumprem no seio desse mesmo órgão. Nesta mesma linha se coloca a Sentencia n.º 214/1990, de 20 de Dezembro, do tribunal constitucional espanhol, que considerou ser "evidente que a finalidade das diversas classes de subvenções, estabelecidas em benefício dos grupos parlamentares, não é outra que facilitar a participação dos seus membros no exercício das funções institucionais da câmara a que pertencem, para isso se dotando os grupos em que os deputados [...] e hão-de integrar, dos recursos económicos necessários", "de natureza pessoal e material" - concretizou-se, recentemente, na decisão de 26 de Maio de 2004 (auto n.º 200/2004), onde se cita anterior jurisprudência do Tribunal, tratando-se deste modo de garantir "o funcionamento regular dos grupos parlamentares" (cf. José Luis García Guerrero, Democracia representativa de partidos y grupos parlamentarios, cit., p. 490) e, em decorrência, o próprio funcionamento regular das instituições parlamentares.

Assim sendo, compreender-se-á, pela referência ao fundamento subvencional, que o financiamento dos grupos parlamentares constitua - ou possa ser visto como - um financiamento do próprio Parlamento, para a realização dos objectivos que lhe são constitucionalmente adstritos, sendo certo que se pode considerar como traduzindo a realidade parlamentar que "em última instância, qualquer câmara é inseparável dos grupos nos quais ela se divide, os grupos são o esqueleto e a alma da câmara" (cf. Rescigno, "Gruppi parlamentari", in Enciclopedia del diritto, vol. XIX, Milão, 1970, p. 795).

2.4 - Daí resulta que as subvenções conexionadas com a vida do Parlamento, contendendo, na sua essência, com "as condições formais e materiais de exercício" dessa actividade e por respeitarem a um domínio de natureza orgânico-funcional, têm um diferente fundamento material das que se inserem num quadro geral de financiamento da vida dos partidos. Se estas podem ser outorgadas independentemente da representação parlamentar dos partidos, sendo causadas pelo especial papel político que estes desempenham enquanto elementos vitais do pluralismo democrático, já aquelas, sendo causadas pelo desempenho da função parlamentar, "respondem seguramente também a exigências 'internas' da instituição parlamentar, conexionadas com a sua funcionalidade, com particular referência à tentativa de conciliar, por um lado, a quantidade de produção normativa com a qualidade da mesma e de, por outro lado, tornar mais eficaz o processo de decisão política [e com acrescida validade democrática]" (a expressão é de Giancarlo Rolla, "Riforma dei regolamenti parlamentari ed evoluzione della forma di governo in Italia", in Rivista trimestrale di diritto pubblico, 2000, fasc. 3, p. 603; são "fundos que são utilizados pelas câmaras para o seu próprio funcionamento" - pode ler-se num texto dos Servicios Jurídicos de la Secretaría General del Congresso, mencionado por Alejandro Saiz Arnaiz, Los grupos parlamentarios, cit., pp. 183 e 184).

Partindo desta dualização e reportando as subvenções a um domínio orgânico-funcional, a experiência jurídica além fronteiras concretiza e enquadra o problema das subvenções relativas à actividade parlamentar no seio de uma autoconformação e autodisposição dos recursos orgânicos afectos ao trabalho de produção legiferante, sendo que tais subvenções não se reportam apenas a um hardware ou a uma logística física - estática - de apoio à actividade prosseguida nos parlamentos (as "subvenções indirectas" a que se refere José Luis García Guerrero, Democracia representativa de partidos y grupos parlamentarios, cit., p. 489).

Assim, no artigo 16.º do Regolamento del Senato italiano dispõe-se que "aos grupos parlamentares, para a realização das suas funções, é assegurada a disponibilidade de local e equipamento e serão realizados contributos, a cargo do Senado, diferenciados em razão da consistência numérica dos mesmos grupos", assumindo-se aqui que "não é evidentemente aos partidos enquanto membros da Câmara que os contributos são atribuídos, mas a esses enquanto 'sujeitos primários' do agir político" [ou seja], "não é o partido mas o grupo parlamentar que releva como destinatário do contributo" (Luigi Cozzolino, "Sulla sindacabilità degli atti parlamentari erogativi del contributo statale al finanziamento dei partiti politici", in Giurisprudenza costituzionale, 1991, fasc. 6, pp. 4176 e segs., especialmente a p. 4182).

Também em Espanha se reconhece a especificidade das subvenções preordenadas à realização das actividades de natureza parlamentar, pelo que os "Grupos Parlamentares das Câmaras das Cortes Gerais, nos termos previstos nos Regulamentos do Congresso dos Deputados e do Senado e das subvenções aos Grupos Parlamentares das Assembleias Autonómicas, segundo se encontra estabelecido nas normas respectivas", têm direito a tal financiamento público independentemente do que é atribuído para a realização das demais finalidades partidárias [cf. o artigo 2.º, alínea b), da Ley Orgánica n.º 3/1987, de 2 de Julho, sobre financiación de los partidos políticos). Nesta linha, o Reglamento del Senado, no seu artigo 34.º, prevê que "o Senado atribuirá aos Grupos Parlamentares uma subvenção cuja quantia se fixará em função do número dos seus componentes e, além disso, um complemento fixo igual para todos". Por seu turno, no artigo 28.º do Reglamento del Congreso de los Diputados afirma-se que "o Congresso porá à disposição dos Grupos Parlamentares locais e meios materiais suficientes e outorgará, a cargo do seu orçamento, uma subvenção fixa idêntica para todos e uma outra variável em função do número de deputados de cada um dos grupos".

Na Alemanha, a "Gesetz über die Rechtsverhältnisse der Mitglieder des Deutschen Bundestages (Abgeordnetengesetz)", no seu § 50, sob a epígrafe "prestações financeiras e materiais", dispõe que aos grupos parlamentares (Fraktionen) são atribuídos, a cargo do orçamento federal, contributos em dinheiro e em espécie para o cumprimento das suas funções. Também aqui se atribui, além de uma quantia fixa, uma outra variável em função do número de membros que integra o grupo parlamentar. Além disso, no seio de cada Estado, é possível encontrar análoga regulamentação da posição jurídica e do financiamento dos grupos parlamentares ("Rechtsstellung und Finanzierung der Fraktionen"), importando notar que estas contribuições aos [membros dos] grupos parlamentares ("Beiträge der Fraktionensmitglieder") não se confundem com as subvenções públicas aos partidos previstas na "Gesetz über die politischen Parteien (Parteiengesetz)", designadamente no § 18, onde se estabelecem os princípios e o alcance do financiamento público ("Grundsätze und Umfang der staatlichen Finanzierung") - cf. Christine Landfried, Parteifinanzen und politische Macht ..., cit., pp. 91 e segs., e Herbert von Arnim, "Die neue Parteienfinanzierung", in Deutsches Verwaltungsblatt, n.º 16, 2002, pp. 1065 e segs.

2.5 - Pressuposto este "pano de fundo" clarificador dos fundamentos e finalidades subvencionais que perpassam o thema decidendum, cumpre agora projectar essa luz distintiva sobre as normas questionadas no presente pedido de fiscalização preventiva de constitucionalidade.

Ora, para a realização de tal objectivo - e num plano crítico-reflexivo -, não podem deixar, aqui, de confrontar-se as considerações que subjazem à produção legiferante relativa ao financiamento dos partidos com as que concernem à disciplina jurídica da orgânica parlamentar, estas enquanto manifestação de um poder de autoconformação normativa.

Nesta linha de pensamento, não pode desconsiderar-se o facto de o regime aplicável ao financiamento dos partidos políticos qua tale assumir como fundamento subvencional do financiamento público a realização dos seus fins próprios, independentemente da afectação de recursos relativos à prossecução de uma actividade parlamentar.

Na verdade, ainda que a representatividade na Assembleia da República seja assumida como critério do montante subvencional a atribuir pelo Estado, é manifesto que a ratio, subjacente a tal financiamento, não tem a natureza instrumental da subvenção que é concedida para a realização de fins estritamente parlamentares e que a estes está funcionalmente condicionada.

Tal especificidade não deixou de ser assumida pelo legislador ordinário que, na Lei 19/2003, de 20 de Junho, prevê que a subvenção pública para financiamento dos partidos políticos seja concedida, também, aos que, "tendo concorrido à eleição para a Assembleia da República e não tendo conseguido representação parlamentar, obtenham um número de votos superior a 50 000, desde que a requeiram ao Presidente da Assembleia da República".

No fundo, trata-se, aqui, de acolher a particular relevância político-jurídica dos partidos ao nível da "representação política global da colectividade", como veículos de "formação e expressão da vontade popular", "projectada para o povo como elemento do Estado colectividade" (cf. Marcelo Rebelo de Sousa, Os Partidos Políticos no Direito Constitucional Português, cit., pp. 444 e segs.).

Contudo, é igualmente inegável que o sistema constitucional reserva aos partidos políticos um importante papel ao nível da "participação no funcionamento do sistema de governo constitucionalmente instituído" - aí se integrando a "que se efectua através dos órgãos de soberania, a que se exerce noutros órgãos do Estado e ainda a que respeita aos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas" (cf. Marcelo Rebelo de Sousa, Os Partidos Políticos no Direito Constitucional Português, cit., p. 446). E nessa participação vai assumido um conjunto de "diferenças sensíveis" que demarcam a actuação dos partidos solus ipse da que é institucionalmente enquadrada como dimensão componente - e constitutiva - do funcionamento dos próprios órgãos do Estado.

Por outro lado, acentuando agora a especificidade da representação de cariz parlamentar, não deixa de resultar dos pertinentes dados constitucionais que a intervenção dos partidos nesta sede é, em boa medida, mediatizada pelos grupos parlamentares, que assim se configuram como específicos sujeitos da actividade, organização e funcionamento do órgão parlamentar - como se entendeu no já referido Acórdão 63/91. E dessa estruturação da orgânica - e da dinâmica - parlamentar (por alguns entendida como uma "estruturação grupocrática" - cf. José Luis García Guerrero, Democracia representativa de partidos y grupos parlamentarios, cit., p. 411), mesmo reconhecendo-se que os grupos parlamentares são "uma [ideo]lógica emanação dos partidos" (cf. a Sentencia n.º 36/90 do tribunal constitucional espanhol, onde, apesar disso, se reconhece ser "indubitável a relativa dissociação conceptual" e a "independência de vontades presente em ambos") e um interface na realização do fim supra-referido, decorrerá, também entre nós, uma forçosa ponderação diferenciadora entre as condições de funcionamento dos partidos - a que concernem as subvenções outorgadas no seio do artigo 5.º da Lei 19/2003 - e as condições de funcionamento dos órgãos de natureza parlamentar, norteadas pelo quid specificum de estarem instrumentalizadas, vinculadas e predispostas ao funcionamento desse complexo orgânico.

E, assim, enquanto as primeiras são compreendidas no âmbito de uma escolha opção legiferante na composição de um modelo de financiamento da actividade partidária, as segundas não podem deixar de ser reclamadas pela própria natureza das coisas, não só em função do exercício da função parlamentar mas igualmente atendendo às exigências materiais que aí vão assumidas e que são vistas como condição de dignidade desse exercício e dos seus resultados.

2.6 - É neste contexto que devem ser compreendidas as subvenções previstas no diploma em crise.

Relembrando os antecedentes históricos, supra-referidos, que precederam a concreta regulamentação que o Ministro da República questiona no seu pedido de fiscalização preventiva de constitucionalidade - e donde resulta, ainda que não uniformemente, um nexo das subvenções previstas na sucessiva regulamentação regional com a realização de actividades de natureza parlamentar -, impõe-se atender, sobretudo, ao teor normativo dos preceitos que alteram a estrutura orgânica da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.

A redacção actual do artigo 46.º, relativo aos gabinetes dos partidos e dos grupos parlamentares, resultante do Decreto Legislativo Regional 2/93/M, de 20 de Fevereiro, e que se manteve inalterada, dispõe que "os partidos com um único deputado e os grupos parlamentares dispõem, para a utilização de gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, nomeação, exoneração e qualificação, de uma verba anual, resultante do quadro seguinte [...]". O objectivo subjacente a tal norma mostra-se concretizado expressis verbis nesse diploma, aí se referindo ser necessário "dignificar o órgão máximo da autonomia regional, criando-se melhores condições de trabalho quer ao próprio Parlamento quer aos deputados e funcionários".

Ora, é indubitável que esta subvenção assume a natureza de um típico financiamento relativo ao exercício da actividade parlamentar destinando-se a fazer face aos encargos decorrentes da utilização dos gabinetes das representações parlamentares.

Na verdade, tal norma não pode deixar de traduzir a imperiosa necessidade de assegurar, num plano imediato, a actividade dos grupos parlamentares, dotando-os de uma estrutura humana e material operativa que seja funcionalmente adequada à participação nos trabalhos da Assembleia Legislativa, traduzindo-se deste modo, num plano mediato, numa conditio de manutenção dos trabalhos desse órgão legislativo regional: garantir aos grupos parlamentares condições de funcionamento interno ao nível do acesso a recursos humanos e materiais indispensáveis para a actividade dos gabinetes não redunda num financiamento do partido mas, antes, na sua essência, na concretização de um instrumentarium finalisticamente ordenado à realização da vida parlamentar e que assim haverá de consumir-se no interior de cada gabinete em prol do funcionamento do próprio parlamento regional.

E esta natureza das subvenções não muda, ainda que se considere o disposto no n.º 8 deste artigo 46.º, nos termos do qual "a aplicação do disposto neste artigo não prejudica a situação existente em cada gabinete de apoio aos grupos parlamentares, nem a fixação do quadro previsto no n.º 2 [quadro de pessoal do gabinete da cada grupo parlamentar, por proposta vinculativa do respectivo grupo, e desde que não ultrapasse o montante da subvenção referida no número anterior] prejudica a utilização da totalidade do montante referido no n.º 1 do presente artigo".

Na verdade, o preceito limita-se simplesmente a conferir aos grupos ou representações parlamentares liberdade na gestão do montante das subvenções que lhes são atribuídas, liberdade essa a exercer com estrito respeito pela finalidade a que estão expressamente consignadas na lei - "para a utilização de gabinetes constituídos por pessoal da sua livre escolha, nomeação, exoneração e qualificação".

Dito de outro jeito, o que o legislador faz é conceder aos grupos ou representações parlamentares a possibilidade de elegerem o que consideram ser o melhor sistema organizativo, tanto do ponto de vista da sua componente e qualificação humanas como do ponto de vista da eleição dos meios materiais, para o desempenho das funções administrativas ou técnicas que entendam ser cometidas aos respectivos gabinetes. Poderão ter, por exemplo, menos pessoal, mas pessoas mais qualificadas do ponto de vista que considerem relevante para esse efeito (técnico, científico, político, etc.). Poderão ter menos pessoal, mas melhor equipamento de apoio físico ao gabinete. O que, decerto, a norma em causa não consente é que o saldo do montante da subvenção atribuída não absorvido pelo pagamento ao quadro de pessoal dos gabinetes dos grupos ou representações parlamentares possa ser legitimamente gasto em despesas estranhas a esses gabinetes, como sejam, por exemplo, o pagamento de cartazes anunciando comícios partidários, o pagamento a funcionários do partido, ofertas a quem participe ou compareça a comícios ou festas partidárias, etc.

E, de todo o modo, a possibilidade de existência de uma tal violação da lei não afecta a validade da mesma, sendo dela independente.

Por fim, e no que diz respeito ao âmbito da alteração que introduz no preceito, importa notar que o sindicando artigo 29.º do decreto legislativo em apreço apenas altera o cálculo do montante a forfait estabelecido para o "deputado único/partido e grupos parlamentares" previsto na alínea a) do artigo 46.º

E, mutatis mutandis, a mesma conclusão deve impor-se quanto ao disposto no artigo 47.º, ultrapassadas que sejam a expressão "subvenção aos partidos", constante da sua epígrafe, e o termo "partidos", constante do seu n.º 3.

A redacção em vigor dessa norma, saída do Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M, de 27 de Abril, preceitua que "às representações parlamentares é atribuída uma subvenção mensal para encargos de assessoria, contactos com os eleitores e outras actividades correspondentes aos respectivos mandatos no valor de dois terços do salário mínimo nacional aplicável nesta Região Autónoma (SMNR) por deputado eleito, mais a ponderação dos seguintes factores" - e também aqui o artigo 30.º do diploma sindicando apenas altera a ponderação do montante a atribuir à "representação de um só deputado e grupos parlamentares", prevista na alínea a).

É manifesto estar também aqui em causa um fundamento subvencional conexionado com o estrito exercício da função parlamentar, numa clara relação de instrumentalidade para com esta.

O modo como se define normativamente a vinculação-afectação dos valores aí disponibilizados às representações parlamentares apenas pode conduzir à conclusão de que se trata aqui, na esteira das considerações supratecidas, de um financiamento em prol da actividade da Assembleia Legislativa, que ao assumir os encargos de assessoria, contactos com os eleitores e outras actividades correspondentes aos respectivos mandatos parlamentares está a disciplinar as condições materiais do seu funcionamento, e não, tout court, a subvencionar os partidos qua tale.

Na verdade, estas contribuições visam possibilitar uma maior qualidade técnica da produção legiferante - aspecto particularmente sensível quando estão em causa matérias cuja complexidade pode não dispensar uma tarefa de assessoria qualificada (cf. Giancarlo Rolla, "Riforma dei regolamenti parlamentari ed evoluzione della forma di governo in Italia", cit., p. 603) ou quando importa conhecer, com profundidade, uma concreta realidade social a regular -, concorrendo, em geral, para um melhor funcionamento da instituição parlamentar.

São, pois, no fundo, subvenções dirigidas ao financiamento da actividade parlamentar, porquanto se traduzem na mobilização de recursos que, por natureza, no seio da organização e do funcionamento dos serviços da Assembleia, devem ser tidos como conditio sine qua non da actuação parlamentar, aqui encontrando a sua causa e aqui esgotando os seus efeitos.

Para terminar o ponto, importa notar, ainda, que o artigo 47.º, n.os 4, 5 e 6, da referida Lei 28/2003 prevê, também, a atribuição a cada grupo parlamentar da Assembleia da República de uma subvenção, paga em duodécimos, constatando-se que esta se encontra legalmente consignada ao cumprimento das mesmas exactas finalidades que justificam a norma regional que está agora sob exame e que acabam de apontar-se - "subvenção para encargos de assessoria aos deputados e outras despesas de funcionamento".

3 - A validade constitucional das normas impugnadas implica agora o seu confronto com o quadro constitucional definidor do regime de autonomia político-administrativa, nomeadamente, ao nível dos poderes legislativos que foram atribuídos às Regiões Autónomas pela Constituição da República Portuguesa, na versão aprovada pela Lei Constitucional 1/2004, de 24 de Julho.

Na verdade, o exercício do poder legislativo a coberto do qual as normas impugnadas foram decretadas ocorreu já sob a vigência desta lei constitucional.

Quanto a esta matéria, a primeira nota que importa acentuar, e cingindo-nos ao relevante para a economia da decisão, é a de que os poderes legislativos das Regiões Autónomas foram profundamente alterados, de entre outros preceitos, através da nova redacção dada pelo artigo 30.º daquela Lei Constitucional 1/2004 à alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição, podendo estas, agora, "legislar no âmbito regional em matérias enunciadas no respectivo Estatuto Político-Administrativo e que não estejam reservadas aos órgãos de soberania", em consonância, de resto, com o sentido constitucional conferido à autonomia legislativa pelo artigo 228.º (na redacção dada pela mesma lei constitucional), nos termos do qual a "autonomia legislativa das Regiões Autónomas incide sobre as matérias enunciadas no respectivo Estatuto Político-Administrativo que não estejam reservadas aos órgãos de soberania" (n.º 1).

E, porque entre os pressupostos assumidos pelo legislador constitucional para a atribuição às Regiões Autónomas do referido poder de legislar figuram as "matérias enunciadas no respectivo estatuto político administrativo [...] que não estejam reservadas aos órgãos de soberania", não deixou o mesmo de resolver as questões de direito transitório que um tal novo quadro constitucional era susceptível de acarretar.

É este o sentido do artigo 46.º da referida Lei Constitucional 1/2004, que assim dispõe:

"Até à eventual alteração das disposições dos estatutos político-administrativos das Regiões Autónomas, prevista na alínea f) do artigo 168.º, o âmbito material da competência legislativa das respectivas Regiões é o constante do artigo 8.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores e do artigo 40.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira."

Ora, a matéria regulada pelas normas sindicandas não consta do artigo 40.º deste último Estatuto. Todavia, não será por isso que poderá concluir-se, sem mais, pela falta de poderes legislativos da Região para a regular.

É que tanto esta norma como a constante da referida alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição não podem ser interpretadas de modo isolado ou desligado do disposto em outras normas da Constituição, antes se impondo fazer uma interpretação de acordo com o princípio da unidade da Constituição (cf. J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional ..., cit., pp. 1223 e segs.).

Ao definir a competência da Assembleia Legislativa da Região Autónoma (epígrafe do próprio artigo), os n.os 3 e 4 do artigo 232.º da Constituição dispõem, respectivamente, que:

"3 - Compete à Assembleia Legislativa da Região Autónoma elaborar e aprovar o seu regimento, nos termos da Constituição e do respectivo estatuto político-administrativo.

4 - Aplica-se à Assembleia Legislativa da Região Autónoma e respectivos grupos parlamentares, com as necessárias adaptações, o disposto na alínea c) do artigo 175.º, nos n.os 1 a 6 do artigo 178.º e no artigo 179.º, com excepção do disposto nas alíneas e) e f) do n.º 3 e no n.º 4, bem como no artigo 180.º"

E, por seu lado, reza assim o artigo 180.º da Constituição, convocado no anterior preceito:

"Artigo 180.º

Grupos parlamentares

1 - Os deputados eleitos por cada partido ou coligação de partidos podem constituir-se em grupo parlamentar.

2 - Constituem direitos de cada grupo parlamentar:

a) Participar nas comissões da Assembleia em função do número dos seus membros, indicando os seus representantes nelas;

b) Ser ouvido na fixação da ordem do dia e interpor recurso para o Plenário da ordem do dia fixado;

c) Provocar, com a presença do Governo, o debate de questões de interesse público actual e urgente;

d) Provocar, por meio de interpelação ao Governo, a abertura de dois debates em cada sessão legislativa sobre assunto de política geral ou sectorial;

e) Solicitar à Comissão Permanente que promova a convocação da Assembleia;

f) Requerer a constituição de comissões parlamentares de inquérito;

g) Exercer iniciativa legislativa;

h) Apresentar moções de censura ao Governo;

i) Ser informado, regular e directamente, pelo Governo sobre o andamento dos principais assuntos de interesse público.

3 - Cada grupo parlamentar tem direito a dispor de locais de trabalho, na sede da Assembleia, bem como de pessoal técnico e administrativo da sua confiança, nos termos que a lei determinar.

4 - Aos deputados não integrados em grupos parlamentares são assegurados direitos e garantias mínimos, nos termos do Regimento."

Ao prever, nos transcritos n.os 3 e 4 do artigo 232.º, a competência da Assembleia Legislativa da Região Autónoma para "elaborar e aprovar o seu Regimento, nos termos da Constituição e do respectivo Estatuto Político-Administrativo", e a aplicação à Assembleia Legislativa da Região Autónoma deste artigo 180.º, a Constituição reconhece, nesses termos, de forma clara, a competência de autoconformação ou de auto-regulação da Assembleia Legislativa, máxime de poderes de modelação da sua estrutura orgânica, nesta se incluindo os grupos parlamentares, dentro do "quadro da Constituição" em que a autonomia político-administrativa regional deve ser exercida (cf. o artigo 225.º, n.º 3, da Constituição).

E, assim, admitindo a Constituição a possibilidade de os deputados de cada partido ou coligação de partidos eleitos para a Assembleia Legislativa se constituírem em grupos parlamentares, tal como acontece relativamente à Assembleia da República, não poderá deixar de ver-se implicitamente contida em uma tal norma constitucional a faculdade de a Assembleia Legislativa prover à existência dos meios humanos e materiais por ela considerados necessários para o cabal exercício dos mandatos parlamentares, máxime através da intervenção dos grupos parlamentares.

Este poder de autoconformação orgânica da Assembleia Legislativa postula, assim, a faculdade de esta eleger, no plano normativo, quer as necessidades jurídico-políticas e respectivo grau de intensidade a satisfazer, no que concerne ao funcionamento da Assembleia e intervenção dos grupos parlamentares, quer os meios humanos e materiais que a sua satisfação demanda.

Nesta linha, o legislador regional goza de discricionariedade normativo-constitutiva, "nos termos da Constituição" e "com as necessárias adaptações" no que respeita à aplicação à Assembleia Legislativa da Região Autónoma do regime estabelecido no artigo 180.º da Constituição para os grupos parlamentares. Pode, assim, o legislador regional optar pelos critérios normativos que entenda constituírem as melhores respostas a dar à satisfação das necessidades consubstanciadas na utilização de gabinetes pelos grupos parlamentares, ao nível do apoio técnico, científico, logístico e material - e da respectiva qualidade - tendo em vista o desempenho da função parlamentar que há-de atender às especificidades em que o regime político administrativo próprio das Regiões se fundamenta - as suas "características geográficas, económicas, sociais e culturais e históricas aspirações autonomistas das populações insulares" (artigo 225.º, n.º 1, da Constituição).

Ora, como a determinação e a satisfação das necessidades humanas e materiais, no domínio da "utilização dos gabinetes parlamentares", de "assessoria, contactos com os eleitores e outras actividades correspondentes aos mandatos dos deputados", demandam, necessariamente, a previsão de verbas para o seu pagamento, há-de ver-se implicada na faculdade de regulação interna a possibilidade da previsão de tais verbas.

De resto, uma tal solução é ainda reforçada por duas outras circunstâncias: de um lado, pelo facto de o poder orçamental ser constitucionalmente reconhecido como constituindo competência exclusiva da Assembleia Legislativa da Região Autónoma [artigo 227.º, n.º 1, alínea p), e 232.º, n.º 1, da Constituição]; do outro, pelo princípio da autonomia político-administrativa, entendido, aqui, na acepção de reconhecimento às Regiões Autónomas de um poder de eleição das despesas a suportar na compreensão do que elas entendam como corresponder à promoção e defesa dos interesses regionais, despesas essas que hão-de ser necessariamente expressas em tal orçamento (cf. o artigo 225.º, n.º 2, da Constituição).

E, assim sendo, quer se considere que as normas constantes dos n.os 3 e 4 do artigo 232.º da Constituição, enquanto relativas, segundo o epíteto do artigo, à "competência da Assembleia Legislativa da Região Autónoma", compreendem, de modo indistinto, a atribuição da competência neles referida e dos poderes (à Região Autónoma) de legislar sobre esta, quer se entenda que a alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição não pode deixar de abarcar o poder de legislar sobre tal matéria na medida em que esta se mostra constitucionalmente atribuída à Região Autónoma e não está reservada aos órgãos de soberania, há que assentar que a Assembleia Legislativa da Região Autónoma pode sobre ela legislar.

Por outro lado, não tendo as subvenções, cuja concessão os preceitos impugnados prevêem, a natureza de financiamentos directos ou mediatos aos partidos representados na Assembleia Regional, é de concluir, igualmente, que as normas sindicadas não integram o regime de financiamento dos partidos políticos para os efeitos dos artigos 164.º, alínea h), e 51.º, n.º 6, da Constituição, mesmo que entendidos de forma conjugada.

Dentro da concepção, aqui assumida, da natureza e das finalidades das subvenções em causa e da extensão normativa dos poderes das Regiões Autónomas, tal como se deixaram caracterizados, perde sentido a convocação que o requerente faz quer do princípio da unidade do Estado quer da proibição constitucional da constituição de partidos que, pela sua designação ou pelos seus objectivos programáticos, tenham índole ou âmbito regional.

4 - Constatado que as normas em causa não violam os artigos 164.º, alínea h), 51.º, n.º 6, 227.º, n.º 1, alínea a), e 228.º, n.º 1, todos da Constituição, importa agora indagar se as mesmas atentam contra o princípio da igualdade, como subsidiariamente sustenta o recorrente.

Considera-se no pedido que, "seja qual for a natureza e o destino da subsidiação a que se reportam as normas impugnadas, mas admitindo-se que com ela, directa ou indirectamente, se visa tão somente contemplar os grupos parlamentares, parece duvidoso que se verifique a existência de particularidades ou especificidades regionais justificativas de tão grande diferenciação de tratamento entre os grupos parlamentares da Assembleia Legislativa e da Assembleia da República" que consiga afastar as exigências postuladas pelo princípio da igualdade, consagrado como critério geral, também para o legislador, no artigo 13.º da Constituição, tendo até em conta que a sua operacionalidade se justifica pelo facto de "o regime dos partidos políticos [...] [ser] unitário e uniforme no todo nacional, achando-se constitucionalmente vedada a existência de partidos com índole ou âmbito regional", além de que "não se apresenta uma única razão justificativa desta tão substancial alteração e beneficiação do regime de financiamento - para um tratamento legislativo desigualitário com o que vigora no plano nacional e sem qualquer consideração no âmbito de uma desejável discriminação positiva para os partidos políticos com escassa representação parlamentar".

Apreciemos a questão.

Reflectindo o estado actual da substancialidade do problema recortado, tanto na jurisprudência nacional e estrangeira como na doutrina, afirmou-se no Acórdão, do Tribunal Constitucional, n.º 232/2003 (publicado no Diário da República 1.ª série-A, de 17 de Junho de 2003), assumindo em diversos dos seus passos abundante argumentação de jurisprudência anterior:

"Princípio estruturante do Estado de direito democrático e do sistema constitucional global (cf., neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., Coimbra, 1993, p. 125), o princípio da igualdade vincula directamente os poderes públicos, tenham eles competência legislativa, administrativa ou jurisdicional (cf. ob. cit., p. 129), o que resulta, por um lado, da sua consagração como direito fundamental dos cidadãos e, por outro lado, da 'atribuição aos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias de uma força jurídica própria, traduzida na sua aplicabilidade directa, sem necessidade de qualquer lei regulamentadora, e da sua vinculatividade imediata para todas as entidades públicas, tenham elas competência legislativa, administrativa ou jurisdicional (artigo 18.º, n.º 1, da Constituição)' (cf. o Acórdão, do Tri bunal Constitucional, n.º 186/90, publicado no Diário da República 2.ª série, de 12 de Setembro de 1990).

[...]

1.2 - O princípio não impede que, tendo em conta a liberdade de conformação do legislador, possam (devam) estabelecer-se diferenciações de tratamento, 'razoável, racional e objectivamente fundadas', sob pena de, assim não sucedendo, 'estar o legislador a incorrer em arbítrio, por preterição do acatamento de soluções objectivamente justificadas por valores constitucionalmente relevantes', no ponderar do citado Acórdão 335/94. Ponto é que haja fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada (o que importa é que não se discrimine para discriminar, diz-nos J. C. Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976,Coimbra, 1987, p. 299).

Perfila-se, deste modo, o princípio da igualdade como 'princípio negativo de controlo' ao limite externo de conformação da iniciativa do legislador - cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., p. 127, e, por exemplo, o Acórdão 157/88, publicado no Diário da República, 1.ª série, de 26 de Julho de 1988, e os já citados Acórdãos n.os 330/93 e 335/94 - sem que lhe retire, no entanto, a plasticidade necessária para, em confronto com dois (ou mais) grupos de destinatários da norma, avalizar diferenças justificativas de tratamento jurídico diverso, na comparação das concretas situações fácticas e jurídicas postadas face a um determinado referencial (tertium comparationis). A diferença pode, na verdade, justificar o tratamento desigual, eliminado o arbítrio (cf., a este propósito, Gomes Canotilho, in Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 124.º, p. 327, Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade,Coimbra, 1989, p. 425, e o Acórdão 330/93).

Ora, o princípio da igualdade não funciona apenas na vertente formal e redutora da igualdade perante a lei; implica, do mesmo passo, a aplicação igual de direito igual (cf. Gomes Canotilho, Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, Coimbra, 1982, p. 381, e Alves Correia, op. cit., p. 402), o que pressupõe averiguação e valoração casuísticas da 'diferença', de modo que recebam tratamento semelhante os que se encontrem em situações semelhantes e diferenciado os que se achem em situações legitimadoras da diferenciação.

[...]

'[...] O Tribunal Constitucional tem considerado que o princípio da igualdade impõe que situações da mesma categoria essencial sejam tratadas da mesma maneira e que situações pertencentes a categorias essencialmente diferentes tenham tratamento também diferente. Admitem-se, por conseguinte, diferenciações de tratamento, desde que fundamentadas à luz dos próprios critérios axiológicos constitucionais. A igualdade só proíbe discriminações quando estas se afiguram destituídas de fundamento racional [cf., nomeadamente, os Acórdãos n.os 39/88, 186/90, 187/90 e 188/90, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11.º vol. (1988), pp. 233 e segs., e 16.º vol. (1990), pp. 383 e segs., 395 e segs. e 411 e segs., respectivamente; cf., igualmente, na doutrina, Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, t. IV, 2.ª ed., 1993, pp. 213 e segs., Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 6.ª ed., 1993, pp. 564 e 565, e Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, pp. 125 e segs.].'

[...]

Assente a possibilidade de estabelecimento de diferenciações, tornar-se-á depois necessário proceder ao controlo das normas sub judicio, feito a partir do fim que visam alcançar, à luz do princípio da proibição do arbítrio (Willkürverbot) e, bem assim, de um critério de razoabilidade.

Com efeito, é a partir da descoberta da ratio da disposição em causa que se poderá avaliar se a mesma possui uma 'fundamentação razoável' (vernünftiger Grund), tal como sustentou o 'inventor' do princípio da proibição do arbítrio, Gerhard Leibholz (cf. F. Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Coimbra, 1989, pp. 419 e segs.). Essa ideia é reiterada entre nós por Maria da Glória Ferreira Pinto: 'Estando em causa [...] um determinado tratamento jurídico de situações, o critério que irá presidir à qualificação de tais situações como iguais ou desiguais é determinado directamente pela ratio do tratamento jurídico que se lhes pretende dar, isto é, funcionalizado pelo fim a atingir com o referido tratamento jurídico. A ratio do tratamento jurídico é, pois, o ponto de referência último da valoração e da escolha do critério' (cf. 'Princípio da igualdade: fórmula vazia ou fórmula carregada de sentido?', in separata do Boletim do Ministério da Justiça, n.º 358, Lisboa, 1987, p. 27). E, mais adiante, opina a mesma autora: 'O critério valorativo que permite o juízo de qualificação da igualdade está, assim, por força da estrutura do princípio da igualdade, indissoluvelmente ligado à ratio do tratamento jurídico que o determinou. Isto não quer, contudo, dizer que a ratio do tratamento jurídico exija que seja este critério o critério concreto a adoptar, e não aquele outro, para efeitos de qualificação da igualdade. O que, no fundo, exige é uma conexão entre o critério adoptado e a ratio do tratamento jurídico. Assim, se se pretender criar uma isenção ao imposto profissional, haverá obediência ao princípio da igualdade se o critério de determinação das situações que vão ficar isentas consistir na escolha de um conjunto de profissionais que se encontram menosprezados no contexto social, bem como haverá obediência ao princípio se o critério consistir na escolha de um rendimento mínimo, considerado indispensável à subsistência familiar numa determinada sociedade (ob. cit., pp. 31 e 32).'"

A sujeição do legislador regional ao princípio da igualdade, nas suas diferenciadas dimensões constitutivas, na medida em que corresponde a um princípio estruturante da Constituição, surge, neste domínio, como um limite ao exercício da autonomia político-administrativa regional (n.º 3 do artigo 225.º da Constituição).

Como se diz no referido Acórdão 400/91, o "reconhecimento constitucional da igualdade [que a] converte em critério geral que modela o ordenamento jurídico no seu conjunto e releva como elemento de interpretação e integração desse mesmo ordenamento, logo, por isso, também da própria Constituição".

Não é de afastar, liminarmente e em geral, a possibilidade de comparação entre a disciplina estabelecida por um diploma regional e a consagrada sobre a mesma matéria pelo legislador da Assembleia da República ou até pelo Governo da República.

Só que as realidades normativas que se pretende comparar são substancialmente diferentes, não podendo convocar-se como tertium comparationis os critérios adoptados pela Assembleia da República no exercício do seu poder de autoconformação normativa dos gabinetes dos grupos parlamentares, nos artigos 46.º e 47.º, n.os 4, 5 e 6, da Lei 28/2003 - quer no que tange, inter alia, ao número e às categorias de pessoal que são atribuídos a cada grupo parlamentar em função do número de deputados que o constituem (n.º 1), à previsão de um tecto para as despesas com as remunerações do quadro de pessoal de apoio (fixado dentro das regras indicadas no número anterior por cada grupo parlamentar e com as horas extraordinárias a processar a esses funcionários (n.os 2 e 3), tecto este apurado com base na ponderação de diversos factores, entre os quais figura o valor do salário mínimo nacional, conforme se trate de deputado único representante de um partido, deputado independente ou grupo parlamentar de 2 deputados, de 3 a 5 deputados ou com mais de 15 deputados (n.os 4 e 9, todos os números acabados de referir do artigo 46.º), quer no que concerne aos elementos considerados como factores de determinação da subvenção atribuída anualmente a cada grupo parlamentar "para encargos de assessoria aos deputados e outras despesas de funcionamento" (n.os 4, 5 e 6 do artigo 47.º).

E trata-se de diferentes realidades, porque a Assembleia da República e a Assembleia Legislativa da Região Autónoma têm diferentes atribuições e poderes legislativos constitucionalmente reconhecidos e desenvolvem a sua actividade legislativa dentro de um quadro jurídico e de facto diferentes. Na verdade, enquanto nas Regiões Autónomas o poder legislativo está atribuído apenas à Assembleia Legislativa, já no que importa ao âmbito nacional verifica-se, fora do domínio da reserva absoluta ou relativa da Assembleia da República, uma concorrência de poderes legislativos entre o Parlamento e o Governo, demonstrando a prática que a maior parte da legislação é produzida por este.

Fundamentando-se, de acordo com o disposto no artigo 225.º, n.os 1 e 2, da Constituição, o regime político-administrativo próprio das Regiões Autónomas, igualmente, "nas suas características [...] económicas, sociais e culturais e nas históricas aspirações autonomistas das populações insulares" e visando a autonomia das Regiões "a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses regionais, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses", pode a prossecução da tutela dos interesses regionais por banda do órgão legislativo regional, e na leitura que destes faça o mesmo legislador, justificar a presença junto dos grupos parlamentares de pessoas, consultores, técnicos e meios materiais que, respectivamente, propiciem o conhecimento desses interesses regionais e uma adequada informação sobre os mesmos junto dos deputados, numa expressão diferente daquela que a Assembleia da República considere como sendo a adequada para os seus grupos parlamentares cumprirem semelhante tarefa no plano da consideração dos interesses nacionais.

Isto sendo certo que tais tarefas têm de ser exercidas num quadro de específicas características geográficas de descontinuidade territorial, mais ou menos acentuada, e de esta poder demandar especiais meios de transporte e de comunicação entre os eleitos e as comunidades locais.

Deste modo, e independentemente de o salário mínimo nacional e o salário mínimo regional, adoptados como um dos factores de determinação do valor das subvenções nas normas impugnadas e nos artigos 46.º e 47.º, n.os 4, 5 e 6, da referida Lei 28/2003, não serem do mesmo valor, sempre a diferença nos montantes de verbas, apontada pelo requerente, poderá encontrar justificação nas neces sidades específicas de utilização de diferentes meios humanos e materiais.

Nesta perspectiva, o sistema de organização e de funcionamento dos grupos parlamentares e a subsidiação que o mesmo implica e o modo como esta é feita pela Assembleia da República apenas podem ser vistos como um simples referencial que poderá ser acolhido pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma, no domínio da matéria correspondente, nos termos precisamente estabelecidos pelo transcrito n.º 4 do artigo 232.º da Constituição, ao prever a aplicação dos preceitos aí referidos, entre eles se contando o artigo 180.º, "com as necessárias adaptações".

Pode, assim, concluir-se não se verificar a violação do princípio da igualdade.

5 - Mas, independentemente do que vai dito, importa afirmar que não pode dizer-se que não existam quaisquer limites à discricionariedade normativo-constitutiva do legislador regional no tocante à conformação da estrutura orgânica da Assembleia Legislativa e dos seus grupos parlamentares e à previsão dos meios de apoio, humanos e materiais que essa estrutura demanda e que subjazem à atribuição das subvenções.

Na verdade, conquanto expressamente afirmado pela Constituição apenas a propósito do âmbito dos limites aos direitos fundamentais (artigo 18.º, n.º 2) e à utilização das medidas de polícia (artigo 272.º, n.º 2), por constituírem o domínio material em que a sua operacionalidade tende a ser mais frequente e intensamente convocável, por razões associadas à defesa da dignidade humana, como a do respeito pela sua liberdade e autonomia, é seguro, hoje, que o princípio da proibição do excesso, nomeadamente na sua dimensão de princípio da proporcionalidade, constitui um princípio geral estruturante do Estado de direito democrático e social, consagrado no artigo 2.º da Constituição.

Nesta medida, o princípio, embora com mais intensiva aplicação na ponderação constitucional das restrições à liberdade e à autonomia individuais, cumpre uma função de parâmetro de controlo da actuação dos poderes públicos em Estado de direito democrático e social nos vários domínios em que estes se desenvolvem (cf. Jorge Reis Novais, Os Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa, 2004, pp. 161 e segs.).

Todavia, numa situação em que o legislador constitucional entendeu atribuir à Assembleia Legislativa das Regiões Autónomas o poder de autoconformação do órgão legislativo e dos grupos parlamentares que o integram, previsto constitucionalmente para a Assembleia da República, "com as necessárias adaptações", demandadas, naturalmente, pelo estatuto político-administrativo de autonomia que lhes reconheceu, não poderá deixar de aceitar-se a existência de uma margem de discricionariedade normativo-constitutiva do legislador das Regiões Autónomas.

Ora, convenhamos que, estando a regulação dessas matérias dependente, essencialmente, das opções políticas que o legislador constitucionalmente competente tome no domínio da fixação dos montantes das subvenções, fundadas na sua avaliação da possibilidade de arrecadar receitas e assumir despesas públicas e da conveniência de recurso ao crédito, não pode o controlo do Tribunal Constitucional, sob o prisma da proporcionalidade, deixar de limitar-se a um controlo de mera evidência no que concerne àquelas matérias (cf., no mesmo sentido, no domínio da regulamentação económica, Jorge Reis Novais, Os Princípios Constitucionais ..., cit., p. 184).

Cabe aqui recordar o que, a propósito do limite de endividamento, se afirmou no Acórdão 532/2000, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 48.º vol., pp. 59 e segs., e se assumiu, novamente, no recente Acórdão 567/2004, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 23 de Novembro de 2004, agora a respeito da apreciação da constitucionalidade de medidas de estabilidade orçamental introduzidas nas Leis 91/2001, de 20 de Agosto e 13/98, de 24 de Fevereiro, pela Lei Orgânica 2/2002, de 28 de Agosto:

"Seja como for, sempre a extensão do controlo jurisdicional de constitucionalidade, em situações ou relativamente a normas como as sub judicio, terá de confrontar-se com inevitáveis limitações: é que se está (ser-se-ia tentado a dizer assim) perante uma norma jurídica em mero sentido 'formal', e em que se verte, sim, uma decisão, não só de carácter radical e essencialmente técnico-político (no sentido de que é e não pode deixar de ser confiada ao saber técnico, à opção e ao critério de escolha e à responsabilidade do órgão e da maioria legislativa) como de política conjuntural.

Dir-se-á, pois, que, sob pena de o Tribunal agir ultra vires, só lhe cabe, para julgar aqui do respeito pelo princípio da proporcionalidade, controlar se o legislador excedeu a margem de discricionariedade que lhe está, nesta matéria, reservada."

as, situando-nos neste plano, e sem entrar na apreciação do mérito dos critérios normativos impugnados, não se torna possível, à face do que vem sendo dito, sustentar que os níveis de despesa pública que o funcionamento dos grupos parlamentares da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira acarreta por força das normas impugnadas possam haver-se como ofensivos do princípio da proporcionalidade.

À mesma solução chegaria, ainda, quem defenda que o princípio da proporcionalidade não releva para controlar a relação entre as finalidades visadas e os montantes das verbas aprovadas pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, mas apenas como indício de uma eventual diferente qualificação dessas verbas. É que não existem elementos que cabalmente fundamentem tal diversa qualificação, mesmo considerando os montantes envolvidos.

6 - Resta-nos abordar a questão da não consideração, na legislação impugnada, de "uma desejável discriminação positiva para os partidos políticos com escassa representação parlamentar".

Como se vê, o próprio requerente coloca a questão não no puro plano da constitucionalidade da opção legislativa mas no da bondade do critério normativo elegido.

Não cabe ao Tribunal Constitucional conhecer da questão de saber se a opção legislativa corresponde ao melhor direito, mas tão-só da de saber se ela é ou não direito válido perante a lei fundamental. Daí que não tenha de se pronunciar sobre o mérito da opção feita.

Situando a questão no plano da constitucionalidade, há que reconhecer que, mesmo na perspectiva do princípio da igualdade (ou na do princípio da proporcionalidade), não existe na Constituição norma ou princípio constitucional dos quais decorra existir uma obrigação constitucional de privilegiar os partidos mais pequenos, os deputados únicos ou deputados independentes, desde que lhes sejam garantidos, no regimento, "direitos e garantias mínimas", como expressamente é exigido pelos artigos 114.º, n.os 2 e 3, e 180.º, n.º 4, da Constituição, sendo certo que a existência destas não vem posta em causa.

III - Decisão. - Destarte, atento tudo o exposto, o plenário do Tribunal Constitucional decide não se pronunciar pela inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 29.º e 30.º do decreto legislativo regional intitulado "Alteração da estrutura orgânica da Assembleia Legislativa", aprovado em sessão plenária da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira no dia 17 de Maio de 2005.

Lisboa, 8 de Julho de 2005. - Benjamim Rodrigues (relator) - Rui Manuel Moura Ramos - Bravo Serra - Maria dos Prazeres Pizarro Beleza - Paulo Mota Pinto - Carlos Pamplona de Oliveira (com declaração anexa) - Maria João Antunes - Vítor Gomes (com declaração anexa) - Gil Galvão (vencido, em parte, conforme declaração junta) - Maria Helena Brito (vencida, nos termos da declaração de voto junta) - Maria Fernanda Palma (vencida, nos termos da declaração de voto junta) - Mário José de Araújo Torres (vencido, nos termos da declaração de voto junta) - Artur Maurício.

Declaração de voto

O problema essencial que o Tribunal enfrenta na presente questão, face ao pedido formulado, consiste em saber se a Região Autónoma da Madeira - ou, mais propriamente, a sua Assembleia Legislativa - tem competência para editar as normas em causa. Depois, competirá saber se as normas ofendem materialmente a Constituição.

Acontece que a regra constitucional que, no entender do Tribunal, atribui competência à Região para, através da Assembleia Legislativa, disciplinar a matéria não se alterou desde a 2.ª revisão constitucional (Lei Constitucional 1/89, de 8 de Julho), conferindo à Assembleia Legislativa competência para elaborar e aprovar o seu regimento, nos termos da Constituição e do estatuto próprio. Ora, se desde o início a Assembleia da República, na tarefa de criar o seu próprio regimento, nele incluiu a atribuição de uma subvenção anual aos partidos nela representados (Lei 32/77, de 25 de Maio, artigo 16.º) e se igualmente o parlamento regional da Madeira, ao estabelecer o próprio regimento, nele incluiu desde 1979 a atribuição de subvenções aos partidos nele representados (Decreto Regional 19/79/M, de 15 de Setembro), deveria partir-se da ideia de que a prática parlamentar regional fazia incluir - e com expressa autorização constitucional - , no Regimento da Assembleia Legislativa a atribuição de subvenções aos partidos e que as sucessivas revisões constitucionais mantiveram intacta tal competência, pelo que se afigura desnecessário analisar a natureza das subvenções em causa, em comparação com a questão do financiamento público dos partidos políticos, para concluir pela competência da Assembleia Legislativa para editar aquelas normas.

No acórdão discorre-se sobre a aplicação do princípio da igualdade ao presente caso, sem, no entanto, fazer notar que o apelo ao referido princípio deste domínio deve começar por respeitar as especificidades regionais, ou melhor dito, as especificidades de cada uma das Regiões, pois é bem certo que a constituição incumbe as Assembleias Legislativas de estabelecer o seu próprio regimento, assim admitindo que em cada Região vigore um regime próprio, onde dificilmente se concebe a análise das soluções legislativas consagradas à luz de um tal princípio. - Pamplona de Oliveira.

Declaração de voto

Embora tenha acompanhado - admitido que seja o seu pressuposto e, nesta medida, para mim, a título subsidiário - a fundamentação a este propósito aduzida no n.º 4 do acórdão, deixo expresso, sem desenvolvimentos que a solução do caso não exige, o entendimento de que o princípio constitucional da igualdade, considerado o seu radical subjectivo ("todos os cidadãos"), não é o adequado como parâmetro de validade constitucional para o confronto de soluções organizativas de entes públicos quanto aos efeitos meramente internos, como sucede quando se pretende submeter a comparação - para os efeitos do artigo 13.º da Constituição - de um lado as normas que são objecto do presente processo e de outro as normas correspondentes da LOFAR sobre o apoio aos grupos parlamentares na Assembleia da República.

Esta objecção não abrange a vertente tratada no n.º 6 do acórdão, em que, atendendo à dupla natureza dos grupos parlamentares, o que está em comparação já não são aspectos ou efeitos que se esgotem interna corporis. - Vítor Gomes.

Declaração de voto

1 - Embora com dúvidas, não votei contra o conhecimento do pedido, quanto à questão da inconstitucionalidade orgânica. Na verdade, não obstante se me afigurar que o mecanismo da fiscalização preventiva da constitucionalidade das leis é inteiramente desadequado para a apreciação de uma eventual inconstitucionalidade orgânica de uma alteração legislativa, quando tal alteração, a ser julgada inconstitucional, deixaria em vigor uma legislação que enfermaria, ela própria, rigorosamente, do mesmo vício, não encontrei apoio claro e expresso na legislação em vigor para defender uma solução de não conhecimento.

2 - Votei, todavia, vencido quanto à decisão de não julgar inconstitucional o disposto no artigo 29.º do decreto legislativo regional intitulado "Alteração da estrutura orgânica da Assembleia Legislativa", no essencial, pelas razões que passo a enunciar.

Ainda que se admita a tese do acórdão de que os subsídios atribuídos pela Assembleia Legislativa previstos nos artigos 46.º e 47.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, de 7 de Setembro, embora apareçam contabilizados nas contas dos partidos como receitas (sem que me tenha sido possível, numa primeira análise e no contexto temporal de um processo de fiscalização preventiva, encontrar a sua contrapartida nas despesas), são financiamento da actividade parlamentar e não financiamento dos partidos qua tale, entendo que, mesmo assim, nenhuma justificação razoável pode encontrar-se para a modificação concretamente introduzida naquele financiamento pelo referido artigo 29.º E, ainda que se aceite, como se afirma no acórdão, que o sistema de subsídio aos grupos parlamentares na Assembleia da República apenas possa ser visto como um "simples referencial" para as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas, que existe "uma margem de discricionariedade normativo-constitutiva do legislador das Regiões Autónomas", que, em determinadas matérias, "não pode o Tribunal Constitucional, sob o prisma da proporcionalidade, deixar de limitar-se a um controlo de mera evidência" e que ao Tribunal só cabe, "para julgar aqui do respeito pelo princípio da proporcionalidade, controlar se o legislador excedeu a margem de discricionariedade que lhe está, nesta matéria, reservada", penso que não pode deixar de formular-se, em relação ao mencionado artigo 29.º, um juízo de inconstitucionalidade.

Com efeito, tendo em atenção os valores atribuíveis com base na legislação ainda em vigor, o dito artigo 29.º opera um aumento nos montantes dos subsídios para utilização de gabinetes dos grupos parlamentares na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira de cerca de 85%, passando de uma verba de pouco menos de 3 milhões de euros para uma verba próxima de 5,5 milhões de euros. Ao fazê-lo, num ambiente de défice orçamental e de contenção de despesa pública, coloca os montantes atribuíveis ao abrigo do artigo 46.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, de 7 de Setembro, para uma Assembleia de 68 deputados, correspondente a cerca de 230 mil eleitores inscritos, praticamente ao nível dos valores disponibilizados pela Assembleia da República para o mesmo fim (a diferença será, se as contas estão correctas, de menos de Euro 80 000, num volume da ordem de 5,5 milhões - cerca de 1,5%), sendo certo que esta última tem 230 deputados, corresponde a mais de 8,9 milhões de eleitores inscritos, incluindo os residentes nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, na Europa e fora da Europa, e não tem, seguramente, problemas menos complexos para resolver.

Ora, sendo certo que o legislador deve ponderar adequadamente o seu poder de gastar, entendo que uma tal modificação legislativa, implicando a quase duplicação dos custos, sem que seja dada qualquer justificação, não passa o teste do princípio da proporcionalidade, ínsito no artigo 2.º da Constituição, tudo apontando para que, tendo também em conta os limites imanentes a um poder público regional e o princípio da unidade do Estado, o legislador tenha, no caso, excedido "a margem de discricionariedade que lhe está, nesta matéria, reservada". - Gil Galvão.

Declaração de voto

Votei vencida e pronunciei-me no sentido da inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 29.º e 30.º do decreto legislativo regional de "alteração da estrutura orgânica da Assembleia Legislativa" da Madeira, nos termos e pelas razões que a seguir sumariamente enuncio.

1 - A decisão de não inconstitucionalidade orgânica constante do acórdão assenta fundamentalmente numa certa qualificação dos "grupos parlamentares": a que os caracteriza como "órgãos internos das assembleias legislativas". Daí se retira que as subvenções previstas nas normas em apreciação se destinam à realização das actividades de natureza parlamentar e que a competência para a sua aprovação cabe à Assembleia Legislativa da Madeira.

A verdade é que - independentemente da qualificação dos grupos parlamentares e ainda que seja possível e adequado ver neles "órgãos internos das assembleias legislativas" - os grupos parlamentares são igualmente "emanação" dos partidos políticos que representam. Numa ordem constitucional em que se reconhece que os partidos políticos concorrem democraticamente para a expressão e a formação da vontade popular e para a organização do poder político (artigos 10.º, n.º 2, e 51.º, n.º 1, da Constituição) e em que se afirma que "os partidos políticos participam nos órgãos baseados no sufrágio universal e directo, de acordo com a sua representatividade eleitoral" (artigo 114.º, n.º 1, da Constituição), não pode prescindir-se, na análise do problema que nos ocupa, da consideração desta dupla natureza dos grupos parlamentares. E é tanto mais assim quanto, relativamente a certos actos eleitorais - como é precisamente o caso da eleição para a Assembleia Legislativa da Madeira -, "só podem apresentar candidaturas os partidos políticos" (artigo 11.º, n.º 1, da "Lei Eleitoral para a Assembleia Regional da Região Autónoma da Madeira").

Nesta visão das coisas, o financiamento público dos grupos parlamentares é também - directa ou indirectamente - financiamento público dos partidos políticos que tais grupos parlamentares representam.

É certo que a Constituição garante a cada um dos grupos parlamentares, e ao deputado não integrado em grupos parlamentares, o "direito a dispor de locais de trabalho na sede da Assembleia, bem como de pessoal técnico e administrativo da sua confiança" (artigo 180.º, n.os 3 e 4, aplicável aos deputados das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas por força do artigo 232.º, n.º 4).

Só que, a meu ver, as subvenções atribuídas pelas normas constantes dos artigos 46.º e 47.º do Decreto Legislativo Regional 24/89/M, de 7 de Setembro (com diversas alterações posteriores), e cuja redacção é mais uma vez modificada pelos artigos 29.º e 30.º do decreto legislativo regional agora em apreciação, vão, pelo menos em parte, para além da concretização do direito garantido pelo artigo 180.º, n.os 3 e 4, da Constituição. É o que claramente resulta do disposto no n.º 8 do artigo 46.º e do teor do artigo 47.º (transcritos no n.º II, ponto D, n.º 3, do acórdão).

Entendo portanto que tais normas - na parte em que, e na medida em que, vão para além da concretização do direito constitucionalmente garantido a cada um dos grupos parlamentares e aos deputados não integrados em grupos parlamentares a disporem "de locais de trabalho na sede da Assembleia, bem como de pessoal técnico e administrativo da sua confiança" -, não obstante se encontrarem inseridas no diploma que aprova o Regimento da Assembleia Legislativa, devem caracterizar-se, pelo seu conteúdo e pela sua função, como normas relativas ao financiamento dos partidos políticos.

Consequentemente, as subvenções estabelecidas em tais normas devem ser consideradas receitas próprias dos partidos políticos representados na Assembleia Legislativa da Madeira, nos termos do artigo 3.º, alínea c), da Lei 19/2003 (lei de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais). Assim mesmo aliás o têm entendido os partidos políticos com representação nas Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas, que, segundo pude verificar, nas contas anuais que apresentaram neste Tribunal nos últimos anos, inscreveram como receitas próprias as subvenções recebidas dessas Assembleias Legislativas.

Não pode por isso a competência para a aprovação das regras impugnadas residir na norma do artigo 232.º, n.º 3, da Constituição. Este preceito constitucional confere às Assembleias Legislativas competência para elaborarem e aprovarem o seu regimento, "nos termos da Constituição e do respectivo estatuto político-administrativo"; em si mesmo, tal preceito não atribui poder legislativo às Regiões Autónomas. De todo o modo, o artigo 232.º, n.º 3, respeita apenas à competência para a elaboração e aprovação do Regimento da Assembleia Legislativa, isto é, abrange tão-somente as regras que efectivamente respeitem à organização dessa Assembleia e não outras regras, como as agora questionadas, relativas ao financiamento dos partidos políticos.

Também não pode obviamente encontrar-se no artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da Constituição o fundamento para o poder legislativo da Região Autónoma neste domínio, uma vez que a matéria - o financiamento dos partidos políticos - se encontra "reservada aos órgãos de soberania".

Estando em causa regras de financiamento dos partidos políticos, só a lei pode estabelecê-las (artigo 51.º, n.º 6, da Constituição); tratando-se de matéria incluída no núcleo essencial da disciplina relativa aos partidos políticos, a competência para a sua aprovação pertence à Assembleia da República [artigo 164.º, alínea h), da Constituição].

Concluo, assim, que, na parte em que, e na medida em que, vão para além da concretização do direito constitucionalmente garantido a cada um dos grupos parlamentares e aos deputados não integrados em grupos parlamentares de disporem de locais de trabalho na sede da Assembleia, bem como de pessoal técnico e administrativo da sua confiança - e porque estabelecem limites do financiamento público dos partidos políticos -, os preceitos em análise violam o disposto nos artigos 51.º, n.º 6, 164.º, alínea h), e 227.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa.

2 - Considero também que pelo menos o artigo 29.º acima referido não passa o "teste do princípio da proporcionalidade", como explica o Exmo. Conselheiro Gil Galvão no n.º 2 da sua declaração de voto, para a qual remeto. - Maria Helena Brito.

Declaração de voto

Votei vencida a decisão de pronúncia pela não inconstitucionalidade do presente acórdão, por concordar, no essencial, com a análise constante do pedido de fiscalização preventiva formulado pelo Ministro da República para a Região Autónoma da Madeira.

Duas questões fundamentam o referido pedido e a alegada inconstitucionalidade dos artigos 29.º e 30.º do decreto legislativo regional intitulado "Alteração da estrutura orgânica da Assembleia Legislativa", aprovado em sessão plenária da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira em 17 de Maio de 2005: no plano orgânico, a eventual violação dos artigos 164.º, alínea h), 227.º, n.º 1, alínea a), e 228.º, n.º 1, da Constituição; ao nível material, a possível violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição.

Quanto à primeira questão, discordo do acórdão porque entendo que ele dissocia indevidamente os grupos parlamentares da matéria geral do financiamento dos partidos políticos. Ao mesmo tempo, sustenta uma duvidosa prevalência da norma do artigo 232.º, n.º 3, da Constituição, enquanto norma de competência da Assembleia Legislativa da Região Autónoma, sobre a que atribui competência à Assembleia da República em matéria de financiamento dos partidos políticos [artigos 51.º, n.º 6, e 164.º, alínea h), da Constituição].

A exclusão dos grupos parlamentares da matéria de financiamento dos partidos políticos é, a meu ver, incorrecta. Na verdade, ela remete para o domínio do mero regimento sobre a organização e o funcionamento da Assembleia Legislativa uma realidade que, pela sua dimensão, respeita às condições de funcionamento da democracia partidária e parlamentar do Estado de direito no seu todo, como Estado unitário, no cumprimento das suas tarefas nacionais [artigo 6.º, n.os 1 e 3, alíneas b) e c), da Constituição].

No plano da eventual inconstitucionalidade orgânica, o acórdão parte de dois pressupostos correctos em abstracto, mas que se revelam inadequados à presente iniciativa legislativa.

O primeiro pressuposto aceita uma distinção de natureza e de funções entre o grupo parlamentar e o partido político que aquele representa na Assembleia Legislativa. A exposição doutrinária do acórdão oferece uma perspectiva de autonomização que foi concebida para sustentar que os deputados estão sujeitos, na sua actividade parlamentar, a uma lógica de representatividade do eleitorado prevalecente, em termos ético-políticos, sobre a estrita lógica partidária. Em nome dessa perspectiva de autonomização, o acórdão subtrai o financiamento dos grupos parlamentares à disciplina geral do financiamento dos partidos políticos.

Não se duvida de que existe uma especificidade de funções dos grupos parlamentares relativamente às funções gerais dos partidos para variados efeitos - nomeadamente para assegurar a genuinidade da representação dos cidadãos e assegurar o exercício do poder legislativo. De facto, aquelas entidades constituem instrumentos privilegiados de uma democracia que, sendo de partidos, é também parlamentar. Mas retirar da referida especificidade ilações que desvinculem, em absoluto, o financiamento dos grupos parlamentares do financiamento dos partidos políticos corresponde a uma conclusão que excede as respectivas premissas.

Com efeito, não deixando a actividade dos grupos parlamentares de ser expressão da acção político-partidária, o seu financiamento tem de participar dos requisitos e limites de financiamento dos partidos. Isto é, não deixam de se transmitir ao financiamento dos grupos parlamentares as exigências de controlo (em função da equidade, da proporcionalidade e da determinabilidade das despesas) de que dependem o financiamento transparente da democracia partidária e, em última instância, a própria legitimidade do Estado de direito democrático. Os grupos parlamentares não se tornam, pela participação num órgão de soberania, meras estruturas do Parlamento, absolutamente independentes da sua origem partidária. Em todo o caso, pelo menos certos requisitos e limites de equidade, proporcionalidade e determinabilidade hão-de estabelecer as fronteiras entre o financiamento da mera organização de actividades do grupo parlamentar e um financiamento que porventura a exceda.

O segundo pressuposto também não conduz as normas em crise a passarem incólumes o teste de constitucionalidade. Esse outro pressuposto assenta na tese de que a autonomia regional, tal como foi modelada pela 6.ª revisão constitucional (Lei Constitucional 1/2004, de 24 de Julho), fundamentaria a desvinculação do financiamento dos grupos parlamentares das assembleias legislativas regionais da legislação nacional e de critérios racionalmente vinculativos. Assim, ao contrário do que o Ministro da República sustentou, o Tribunal Constitucional entendeu que a aplicação dos artigos 227.º, n.º 1, alínea a), e 228.º, n.º 1, da Constituição, filtrada pelo artigo 46.º da Lei Constitucional 1/2004, redundaria numa prevalência do artigo 232.º, n.º 3, da Constituição. Segundo a argumentação do acórdão, não derivando do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira uma autorização legislativa expressa quanto à matéria em causa, as normas de competência previstas no artigo 232.º, n.os 3 e 4, da Constituição tornar-se-iam, elas próprias, as normas de autorização das soluções previstas no decreto legislativo regional em crise.

Este entendimento admite uma "paralisia interpretativa" do sentido constitucional do âmbito da autonomia regional, concluindo que o financiamento dos grupos parlamentares é matéria de regimento, independentemente até da insuficiente determinação das despesas que visa prover. Esta perspectiva, no entanto, é defensável para despesas de pessoal e congéneres, interpretando-se desse modo (ou com essa restrição) o artigo 46.º, n.º 8, do diploma a que o decreto legislativo se refere, mas já se afigura insustentável quando parece admitir que as normas sub judicio não sejam suficientemente determinadas quanto às despesas que prevêem.

Assim, também não parece suficientemente fundamentada nos próprios critérios normativos acolhidos pelo decreto legislativo regional em crise a conclusão de que se está perante matéria de regimento e no âmbito da autonomia de funcionamento da Assembleia Legislativa, ao apreciar normas que aumentam de modo significativo o financiamento dos grupos parlamentares da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, sem determinação suficiente das despesas que visam assegurar.

Em fiscalização preventiva, e quanto a uma matéria que sempre seria, pelo menos, contígua com uma área de reserva exclusiva da Assembleia da República, a determinabilidade das normas em causa não pode deixar de constituir critério interpretativo. O Tribunal Constitucional não deveria, assim, ter reduzido o alcance possível das normas (sobretudo do artigo 46.º, n.º 8, mantido através das alterações introduzidas pelo decreto legislativo regional mas funcionando com os novos valores aprovados) para considerar não inconstitucionais as alterações. Deveria, sim, ter ponderado a ausência de critérios suficientes para uma interpretação restritiva.

De qualquer modo, independentemente destas últimas considerações, entendo que o aumento significativo de receitas para financiamento dos grupos parlamentares é, em si mesmo, expressão de uma alteração qualitativa desse financiamento. Por isso, ele teria de ser abordado à escala nacional e colocado no plano das relações entre o Estado central e as Regiões Autónomas, envolvendo a ponderação dos limites da autonomia.

Esta perspectiva conduz-me ao outro parâmetro de constitucionalidade que o Ministro da República entendeu ter sido violado - o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição.

O Tribunal Constitucional partiu, neste ponto, de uma premissa que não considero correcta: a inviabilidade da comparação entre o financiamento dos grupos parlamentares integrantes da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira e o financiamento dos grupos parlamentares com assento na Assembleia da República. , na verdade, não só que a autonomia regional impede uma comparação das duas realidades mas também que o financiamento dos grupos parlamentares da Assembleia da República não pode ser o ponto de referência para qualquer comparação. A conclusão pela não violação da igualdade construiu-se, pois, através da conjugação da diversidade das realidades em confronto com a acentuação da autonomia regional.

Discordo, todavia, de tal premissa por três razões:

1) Apesar da autonomia regional, a Assembleia Legislativa cumpre funções semelhantes, no essencial, às da Assembleia da República, embora com um âmbito territorial mais restrito;

2) O facto de Portugal ser um Estado unitário torna exigível que certas matérias, embora seja reconhecida a autonomia quanto à respectiva regulamentação, estejam subordinadas a critérios nacionais e sejam, por isso, tratadas segundo critérios idênticos;

3) Num Estado nacional, é razoável que seja a Assembleia da República - órgão de soberania representativo de todo o território nacional que exerce em primeira linha o poder legislativo - o modelo de funcionamento das Assembleias Legislativas.

Importa observar que a própria autonomia funcional da Assembleia Legislativa é ilustrada de forma contraditória no acórdão, mediante a comparação com a autonomia da Assembleia da República. Em suma, o afastamento puro e simples da comparabilidade, que parece resultar do acórdão, não me parece pertinente. Aliás, as novas realidades derivadas da inserção de Portugal na União Europeia têm feito desenvolver um princípio da igualdade que prenuncia um relacionamento entre Estados soberanos oposto ao que o acórdão reconhece nas relações entre o Estado central e as Regiões Autónomas.

Admitido o parâmetro constitucional da igualdade para a análise das normas cuja fiscalização preventiva é solicitada, a conclusão a que chego é, inevitavelmente, a da violação daquele princípio. Com efeito, entendo que não se divisam razões justificativas de um tão significativo aumento, em "progressão geométrica", do financiamento dos grupos parlamentares da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira. Entre realidades funcionalmente comparáveis (cf. os artigos 232.º, n.º 4, e 180.º da Constituição), uma diferenciação tão sensível, sem factores de especificação que a sustentem, torna-se arbitrária e discriminatória.

Nestes termos, concluo que o Ministro da República fez a análise correcta do problema e que a conclusão de que o artigo 13.º da Constituição foi violado é procedente.

Num último plano relevante, considero que também é violado de modo autónomo o princípio da proporcionalidade, ínsito no artigo 2.º da Constituição. Na verdade, o montante das verbas em causa, várias vezes superior ao das concedidas aos grupos parlamentares da Assembleia da República (que se destinam a satisfazer despesas idênticas, mesmo sem esquecer eventuais especificidades regionais), ultrapassa o que seria admissível à luz de quaisquer critérios de razoabilidade.

São estas as razões que, em consciência, me levam a votar vencida o presente acórdão do Tribunal Constitucional. - Maria Fernanda Palma.

Declaração de voto

Votei vencido por entender que as normas questionadas padecem dos vícios de inconstitucionalidade orgânica e material que lhes foram imputados pelo requerente. A urgência na apresentação desta declaração de voto impede que à exposição das razões da discordância seja dado o desenvolvimento que a matéria justifica. Muito sinteticamente, são elas as seguintes:

1 - Do artigo 51.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa (CRP) resulta que constitui reserva de lei o estabelecimento das "regras de financiamento dos partidos políticos, nomeadamente quanto aos requisitos e limites do financiamento público". Trata-se de matéria que não pode deixar de ser considerada como integrada na reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República. O artigo 164.º, alínea h), da CRP, ao reservar em absoluto à Assembleia da República legislar sobre a matéria dos partidos políticos (no nível mais exigente dessa reserva, já que não se limita às "bases" ou ao "regime geral"), não pode deixar de englobar a matéria do financiamento dos partidos. Aliás, seria impraticável estabelecer limites (obviamente, limites máximos) ao financiamento público dos partidos políticos - que não podem ter âmbito regional (n.º 4 do artigo 51.º da CRP) - se fossem diversos os órgãos legislativos a intervir na matéria. Trata-se, pois, de matéria que não pode deixar de pertencer, e de pertencer em regime de reserva absoluta, à Assembleia da República.

Dando de barato a dupla natureza dos agrupamentos parlamentares, simultaneamente formas de organização das assembleias legislativas e dos órgãos dos partidos, tenho, porém, por evidente que as subvenções em causa têm por objectivo indesmentível financiar a actividade dos partidos na sua vertente parlamentar. A actuação parlamentar dos partidos políticos não esgota seguramente a sua actividade, mas é uma das formas mais relevantes do desenvolvimento dos seus propósitos.

Desde logo, a formulação literal dos artigos 46.º e 47.º do diploma a alterar refere-se aos partidos como beneficiários das verbas e subvenções em causa (cf. o n.º 1 do artigo 46.º e a epígrafe e o n.º 3 do artigo 47.º). Por outro lado, do n.º 8 do artigo 46.º resulta, a meu ver, que, mesmo que o quadro de pessoal fixado no n.º 2 não esgote a verba que lhe foi destinada, continua o partido (ou grupo parlamentar) a poder utilizar a totalidade do montante referido no n.º 1.

Depois, diversos partidos políticos qualificam expressamente, nos respectivos estatutos, os grupos parlamentares como órgãos do partido (cf., a título de exemplo, os artigos 13.º, alínea f), e 30.º dos Estatutos do Partido Social-Democrata e os artigos 87.º a 90.º dos Estatutos do Partido Socialista).

Nas respectivas contas apresentadas no Tribunal Constitucional, os partidos incluem entre as respectivas receitas subvenções do tipo das ora em causa. A título meramente exemplificativo, nas contas relativas a 2001 e 2002, o PS incluiu nas receitas, respectivamente, as verbas de Euro 400 847,78 e de Euro 432 142,10, de "Subvenção estatal - Madeira" (cf. Diário da República, 2.ª série, n.os 74, de 27 de Março de 2004, pp. 4835-4884, em especial p. 4840, e 17, de 25 de Janeiro de 2005, pp. 1178-1228, em especial p. 1184), e o PSD, nas contas de 2000, inseriu a verba de 12 589 888$, sob a epígrafe "Grupo Parlamentar do PSD" (cf. Diário da República, 2.ª série, n.º 259, de 9 de Novembro de 2002, pp. 18 604-18 647, em especial p. 18 613).

Finalmente, como no ponto seguinte melhor se explanará, a exorbitância dos aumentos de verbas propostos e o seu valor absoluto demonstram inequivocamente que não se destinam apenas ao suporte financeiro da actividade estritamente parlamentar.

Estando em causa o financiamento dos partidos políticos (a meu ver, financiamento directo; mas a solução não seria diferente mesmo que se tratasse de financiamento indirecto), da conjugação dos artigos 51.º, n.º 6, e 164.º, alínea h), da CRP resulta a inconstitucionalidade orgânica das normas questionadas. Neste contexto, surge como claramente imprestável a invocação do artigo 232.º, n.os 3 e 4 (este enquanto remete para o artigo 180.º), da CRP: não está em causa a aprovação do regimento (interno) do órgão regional, mas o exercício de uma função legislativa; e a atribuição das verbas e subvenções em causa ultrapassa o direito dos grupos parlamentares a disporem de locais de trabalho e de pessoal técnico e administrativo da sua confiança. Como também é manifestamente improcedente a invocação dos artigos 227.º, n.º 1, alínea p), 232.º, n.º 1, e 225.º, n.º 2, da CRP: do poder de aprovação do orçamento regional e do princípio da autonomia não é lícito extrair a competência para aprovar todas e quaisquer normas que gerem despesa. O que está em causa é a determinação do órgão constitucionalmente competente para legislar sobre a matéria em causa: apurado que, por se tratar de financiamento dos partidos políticos, esse órgão é a Assembleia da República, fica desde logo afastada a aplicabilidade do artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da CRP.

2 - Mas também ocorre, a meu ver, a inconstitucionalidade material aventada pelo requerente.

Aceitando, como o faz o precedente acórdão, tomar como referencial o regime vigente na Assembleia da República, e mesmo limitando a possibilidade de controlo pelo Tribunal Constitucional ao nível da evidência, a situação em presença permite concluir, sem hesitações, pela violação da dimensão da proporcionalidade que se encontra associada ao princípio da igualdade.

As diferenças referidas pelo acórdão como justificadoras da diversidade de regimes limitam-se, em rigor, a duas: i) ser a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira o único órgão legislativo da Região, enquanto a Assembleia da República partilha o poder legislativo com o Governo, sendo este, na prática, o autor da maior parte da legislação; e ii) exercer aquela a sua actividade "num quadro de específicas características geográficas de descontinuidade territorial, mais ou menos acentuada, e de esta poder demandar especiais meios de transporte e de comunicação entre os eleitos e as comunidades locais". Nenhum destes argumentos resiste a uns breves momentos de ponderação.

Para aquilatar da maior onerosidade ou dispendiosidade das actividades parlamentares regional e nacional, não interessa tanto saber qual o órgão legislativo "normal", mas antes qual a extensão e intensidade da actividade desenvolvida por um e outro dos órgãos, o que é fácil de determinar pela análise dos respectivos relatórios de actividade. E aí é indesmentível que, quer em quantidade de diplomas aprovados, quer em complexidade das matérias neles tratadas, quer quanto ao número de reuniões plenárias e das diversas comissões parlamentares, quer quanto à intensidade da função de fiscalização da actividade governamental e do relacionamento com o exterior, a actividade desenvolvida pelos deputados da Assembleia da República é claramente superior à dos deputados à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.

Tal como é incomparavelmente mais onerosa aquela actividade do ponto de vista do quadro geográfico em que se desenvolve. Os deputados à Assembleia da República representam eleitores de todo o território nacional, incluindo Açores e Madeira, e ainda os dos círculos da emigração (Europa e fora da Europa), tendo obviamente a área geográfica envolvidas muito mais "descontinuidades" e dificuldades de comunicação.

Neste contexto, não pode deixar de considerar-se evidentemente desproporcionada uma solução que, como se evidencia na declaração de voto do conselheiro Gil Galvão, praticamente equipara, só no que concerne às verbas do artigo 46.º, uma assembleia com 68 deputados, correspondentes a cerca de 230 000 eleitores, à Assembleia da República, com 230 deputados, correspondentes a mais de 8 900 000 eleitores inscritos. Ou, de acordo com dados constantes do pedido, uma solução cuja injustificação resulta da mera consideração de que se fossem aplicados na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira os critérios da Assembleia da República a verba global que aquela deveria fixar seria inferior à prevista nas normas questionadas em mais de Euro 3 500 000.

Ao que acresce o brutal aumento que se projecta, em relação aos valores actualmente vigentes, e que passará de menos de Euro 3 000 000 para cerca de Euro 5 500 000, sem que se vislumbre qualquer alteração significativa na actividade a desenvolver pelos deputados regionais ou aumento dos respectivos custos.

Esta quase duplicação dos custos e a gritante desconformidade com os critérios seguidos no parlamento nacional tornam, a meu ver, mais do que evidente a desproporcionalidade, o que conduz a que a solução aventada não passe o teste da conformidade material com a Constituição.

3 - Por último, sendo sabido que os custos fixos dos serviços de apoio às representações parlamentares são inversamente proporcionais às dimensões destas representações, também é uma exigência do princípio da igualdade que a verba disponível para um deputado isolado não corresponda a 1/44 da verba destinada a um grupo parlamentar com 44 deputados. Mais do que uma imposição de "discriminação positiva", é mera decorrência do princípio da igualdade a continuação da diferenciação que os regimes precedentes contemplavam. - Mário José de Araújo Torres.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2334540.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1976-04-30 - Decreto-Lei 318-D/76 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Administração Interna

    Aprova o Estatuto Provisório da Região Autónoma do Arquipélago da Madeira.

  • Tem documento Em vigor 1976-04-30 - Decreto-Lei 318-E/76 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Administração Interna

    Aprova a Lei Eleitoral para a Assembleia Regional da Região Autónoma da Madeira.

  • Tem documento Em vigor 1977-04-19 - Decreto Regional 4/77/M - Região Autónoma da Madeira - Assembleia Regional

    Estabelece a orgânica dos serviços da Assembleia Regional da Madeira, respectivas competências, regime do pessoal e gestão financeira.

  • Tem documento Em vigor 1977-05-25 - Lei 32/77 - Assembleia da República

    Aprova a Lei Orgânica da Assembleia da República, publicando em anexo o respectivo quadro de pessoal.

  • Tem documento Em vigor 1979-05-16 - Lei 14/79 - Assembleia da República

    Aprova a lei eleitoral para a Assembleia da República.

  • Tem documento Em vigor 1979-09-15 - Decreto Regional 19/79/M - Região Autónoma da Madeira - Assembleia Regional

    Altera o Decreto Regional n.º 4/77/M, de 19 de Abril (Estrutura Orgânica da Assembleia Regional).

  • Tem documento Em vigor 1980-08-08 - Decreto-Lei 267/80 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Administração Interna

    Aprova a Lei Eleitoral para a Assembleia Regional dos Açores.

  • Tem documento Em vigor 1981-10-01 - Decreto Regional 19/81/M - Região Autónoma da Madeira - Assembleia Regional

    Reestrutura os serviços da Assembleia Regional.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1983-07-27 - Lei 5/83 - Assembleia da República

    Altera a Lei n.º 32/77, de 25 de Maio (Lei Orgânica da Assembleia da República).

  • Tem documento Em vigor 1988-07-01 - Lei 77/88 - Assembleia da República

    Aprova a lei orgânica da Assembleia da República.

  • Tem documento Em vigor 1988-07-26 - Acórdão 157/88 - Tribunal Constitucional

    DECLARA A INCONSTITUCIONALIDADE, COM FORÇA OBRIGATÓRIA GERAL, DA NORMA DO ARTIGO 5 DO DECRETO LEI NUMERO 336/84, DE 18 DE OUTUBRO (CRIOU A PORTLINE E A TRANSISULAR E APROVOU OS RESPECTIVOS ESTATUTOS), TAL COMO INTERPRETADO PELA ALÍNEA A) DO ARTIGO ÚNICO DO DECRETO LEI NUMERO 45/85, DE 21 DE FEVEREIRO (FIXOU O ALCANCE DO ARTIGO 5 DO DECRETO LEI NUMERO 336/84, NA PARTE EM QUE SE REFERE A 'PORTARIA DE REGULAMENTAÇÃO DO TRABALHO', POR VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 57, NUMERO 2 ALÍNEA A) DA CONSTITUICAO DA REPÚ (...)

  • Tem documento Em vigor 1989-07-08 - Lei Constitucional 1/89 - Assembleia da República

    Segunda revisão da Constituição.

  • Tem documento Em vigor 1989-09-07 - Decreto Legislativo Regional 24/89/M - Região Autónoma da Madeira - Assembleia Regional

    Estabelece a estrutura orgânica da Assembleia Legislativa Regional da Madeira.

  • Tem documento Em vigor 1991-06-05 - Lei 13/91 - Assembleia da República

    Aprova o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira.

  • Tem documento Em vigor 1991-11-15 - Acórdão 400/91 - Tribunal Constitucional

    Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do n.º 4 da base V da Lei n.º 7/70, de 9 de Junho, na medida em que proíbe a concessão de assistência judiciária aos ofendidos que queiram constituir-se assistentes no exercício da acção penal por crimes públicos, por violação do disposto no artigo 13.º da Constituição

  • Tem documento Em vigor 1993-02-20 - Decreto Legislativo Regional 2/93/M - Região Autónoma da Madeira - Assembleia Legislativa Regional

    Altera o Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, de 7 de Setembro que estabelece a estrutura orgânica da Assembleia Legislativa Regional da Madeira.

  • Tem documento Em vigor 1993-08-17 - Lei 59/93 - Assembleia da República

    Altera a Lei Orgânica da Assembleia da República, aprovada pela Lei n.º 77/88, de 1 de Julho.

  • Tem documento Em vigor 1993-11-30 - Lei 72/93 - Assembleia da República

    Regula o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 1994-04-28 - Decreto Legislativo Regional 11/94/M - Região Autónoma da Madeira - Assembleia Legislativa Regional

    APROVA O ORÇAMENTO DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA PARA O ANO DE 1994. ESTE DIPLOMA ENTRA EM VIGOR A DATA DA PUBLICAÇÃO, INTEGRANDO O ORÇAMENTO POR ELE APROVADO, A PARTE DO ORÇAMENTO QUE TENHA SIDO EXECUTADA NOS TERMOS DO ARTIGO 15 DA LEI NUMERO 28/92, DE 1 DE SETEMBRO (LEI DE ENQUADRAMENTO DO ORDENAMENTO DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA). O ARTIGO 38 DESTE DIPLOMA PRODUZ EFEITOS A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI NUMERO 72/93, DE 30 DE NOVEMBRO.

  • Tem documento Em vigor 1997-09-20 - Lei Constitucional 1/97 - Assembleia da República

    Aprova a quarta revisão da Constituição da República Portuguesa, de 2 de Abril de 1976, e fixa normas para aplicação no tempo de alguns dos preceitos revistos. Publica, em anexo, o novo texto constitucional.

  • Tem documento Em vigor 1998-02-24 - Lei 13/98 - Assembleia da República

    Dispõe sobre as finanças das Regiões Autónomas, definindo os meios de que as mesmas dispõem para a concretização da autonomia financeira. Prevê que a articulação entre as finanças das Regiões Autónomas e do Estado seja assegurada por um Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeiras, remetendo para despacho conjunto posterior a sua composição e funcionamento.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-18 - Lei 56/98 - Assembleia da República

    Regula o regime aplicável aos recursos financeiros dos partidos políticos e das companhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-25 - Lei 59/98 - Assembleia da República

    Altera o Código do Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei 78/87 de 17 de Fevereiro, na redacção introduzida pelos Decretos-Leis 387-E/87, de 29 de Dezembro, 212/89, de 30 de Junho e 317/95, de 28 de Novembro. Republicado na integra, o referido código, com as alterações resultantes deste diploma.

  • Tem documento Em vigor 1999-08-21 - Lei 130/99 - Assembleia da República

    Revê o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, e procede à sua republicação.

  • Tem documento Em vigor 2000-03-02 - Decreto Legislativo Regional 5/2000/A - Região Autónoma dos Açores - Assembleia Legislativa Regional

    Aprova a orgânica dos serviços da Assembleia Legislativa Regional dos Açores.

  • Tem documento Em vigor 2000-04-27 - Decreto Legislativo Regional 10-A/2000/M - Região Autónoma da Madeira - Assembleia Legislativa Regional

    Altera a estrutura orgânica da Assembleia Legislativa Regional da Madeira.

  • Tem documento Em vigor 2000-08-23 - Lei 23/2000 - Assembleia da República

    Primeira alteração às Leis 56/98, de 18 de Agosto (financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais), e 97/88, de 17 de Agosto (afixação e inscrição de mensagens de publicidade e propaganda).

  • Tem documento Em vigor 2000-12-27 - Acórdão 532/2000 - Tribunal Constitucional

    Declara a ilegalidade da norma do artigo 6º do Decreto Legislativo Regional n.º 4-A/2000/M, de 9 de Fevereiro, que aprova o orçamento da Região Autónoma da Madeira para 2000.

  • Tem documento Em vigor 2001-08-20 - Lei 91/2001 - Assembleia da República

    Estabelece as disposições gerais e comuns de enquadramento dos orçamentos e contas de todo o sector público administrativo - Lei de enquadramento orçamental.

  • Tem documento Em vigor 2002-08-28 - Lei Orgânica 2/2002 - Assembleia da República

    Aprova a lei da Estabilidade orçamental. Altera a Lei de Enquadramento Orçamental, a Lei de Finanças Locais e a Lei de Finanças das Regiões Autónomas. Republica em anexo a Lei 91/2001 de 20 de Agosto.

  • Tem documento Em vigor 2003-06-20 - Lei 19/2003 - Assembleia da República

    Regula o regime aplicável ao financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 2003-07-19 - Acórdão 304/2003 - Tribunal Constitucional

    Pronuncia-se pela inconstitucionalidade das normas do artigo 18º, n.º 1, alínea c), e do artigo 32º, n.º 1, do decreto da Assembleia da República n.º 50/IX, que aprova a Lei dos Partidos Políticos. (Processo nº 381/2003).

  • Tem documento Em vigor 2003-07-30 - Lei 28/2003 - Assembleia da República

    Altera a Lei n.º 77/88, de 1 de Julho, que aprova a Lei Orgânica da Assembleia da República, e procede à sua republicação publicando em anexo o texto consolidado com novo título - Lei de Organização e Funcionamento dos Serviços da Assembleia da República (LOFAR).

  • Tem documento Em vigor 2003-08-22 - Lei Orgânica 2/2003 - Assembleia da República

    Aprova a lei dos Partidos Políticos.

  • Tem documento Em vigor 2004-07-24 - Lei Constitucional 1/2004 - Assembleia da República

    Altera a Constituição da República Portuguesa (Sexta revisão constitucional). Publica, em anexo, o novo texto constitucional.

  • Tem documento Em vigor 2004-12-15 - Acórdão 647/2004 - Tribunal Constitucional

    Aprecia a regularidade e a legalidade das contas dos partidos políticos relativas ao ano de 2002.

  • Tem documento Em vigor 2005-01-10 - Lei Orgânica 2/2005 - Assembleia da República

    Regula a organização e funcionamento da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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