de 3 de Fevereiro
A escolha de profissão e o acesso à função pública são direitos constitucionalmente garantidos a todos os cidadãos, em condições de igualdade e liberdade.Os cidadãos com deficiência gozam plenamente dos direitos consignados na Constituição, com ressalva daqueles para os quais se encontrem incapacitados.
O artigo 71.º da Constituição atribui ao Estado a obrigação de realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos com deficiência e o encargo da efectiva realização dos seus direitos.
Cabe, pois, ao Estado a responsabilidade de criar e coordenar as regras e as condições que permitam dar cumprimento àquelas atribuições e sensibilizar toda a sociedade para a sua efectivação.
A deficiência acarreta muitas vezes, num registo próximo do absurdo, o peso da sua diferença e às barreiras materiais somam-se muitas vezes as barreiras imateriais, as da área relacional, das atitudes e dos comportamentos, as quais impedem sempre o acesso ao exercício pleno da cidadania.
O apoio específico ao cidadão com deficiência constitui uma preocupação de primeira linha do XIV Governo Constitucional.
Até aqui, o número de cidadãos com deficiência trabalhadores da Administração Pública é, no conjunto do universo destes trabalhadores, francamente diminuto, fazendo todo o sentido que o Estado, na sua qualidade de grande empregador, tome a seu cargo a responsabilidade de promover a qualificação laboral do cidadão com deficiência e torne possível o seu acesso a emprego qualificado.
Considerando o previsto na Lei de Bases da Prevenção, da Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência, o presente diploma dá corpo a uma medida da maior importância, que permitirá o início da recuperação de um atraso de muitos anos, no quadro do acesso ao emprego por parte do cidadão com deficiência. Por forma a favorecer a sua integração profissional no mercado de trabalho, é instituída uma quota obrigatória de 5% nos concursos externos de ingresso na função pública em que o número de lugares postos a concurso seja igual ou superior a 10, definindo-se regras específicas para os concursos em que o número de lugares a preencher seja inferior a 10.
Exceptua-se a aplicação da presente quota aos concursos de ingresso nas carreiras que pela sua natureza colocam obstáculos intransponíveis.
O acompanhamento da aplicação do presente diploma pertencerá, em conjunto, à Direcção-Geral da Administração Pública, ao Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência e ao Conselho Nacional para Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas, a Associação Nacional de Municípios Portugueses, a Associação Nacional de Freguesias e o Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência.
Foram observados os procedimentos decorrentes da Lei 23/98, de 26 de Maio.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta, para valer como lei geral da República, o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
1 - O presente diploma estabelece o sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência, com um grau de incapacidade igual ou superior a 60%, nos serviços e organismos da administração central e local, bem como nos institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados do Estado ou de fundos públicos.2 - A aplicação do presente diploma aos serviços e organismos da Administração Regional Autónoma faz-se por decreto legislativo regional.
Artigo 2.º
Âmbito pessoal de aplicação
1 - Para efeitos do presente diploma, consideram-se pessoas com deficiência aquelas que, encontrando-se em qualquer uma das circunstâncias e situações descritas no n.º 1 do artigo 2.º da Lei 9/89, de 2 de Maio, possam exercer, sem limitações funcionais, a actividade a que se candidatam ou, apresentando limitações funcionais, estas sejam superáveis através da adequação ou adaptação do posto de trabalho e ou de ajuda técnica.2 - A deficiência prevista no n.º 1 abrange as áreas de paralisia cerebral, orgânica, motora, visual, auditiva e mental.
Artigo 3.º
Quota de emprego
1 - Em todos os concursos externos de ingresso na função pública em que o número de lugares postos a concurso seja igual ou superior a 10, é obrigatoriamente fixada uma quota de 5% do total do número de lugares, com arredondamento para a unidade, a preencher por pessoas com deficiência.2 - Nos concursos em que o número de lugares a preencher seja inferior a 10 e igual ou superior a três, é garantida a reserva de um lugar para candidatos com deficiência.
3 - Nos concursos em que o número de lugares a preencher seja de um ou dois, o candidato com deficiência tem preferência em igualdade de classificação, a qual prevalece sobre qualquer outra preferência legal.
4 - O disposto no presente artigo não se aplica aos concursos de ingresso nas carreiras com funções de natureza policial das forças e serviços de segurança e do Corpo da Guarda Prisional.
Artigo 4.º
Aviso de abertura do concurso
1 - O aviso de abertura dos concursos externos de ingresso na função pública deve mencionar o número de lugares a preencher por pessoas com deficiência.2 - De acordo com a descrição do conteúdo funcional constante do aviso de abertura, o júri do concurso verifica a capacidade de o candidato exercer a função, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º 3 - Em caso de dúvida, por parte do júri do concurso ou em situação em que o candidato alegue discordância face à verificação a que se refere o número anterior, há possibilidade de recurso técnico específico para a entidade a que se refere o artigo 5.º
Artigo 5.º
Entidade de recurso técnico específico
Para efeitos do disposto do n.º 3 do artigo anterior a entidade competente para recurso técnico específico é definida no prazo de 90 dias, a partir da data da publicação do presente diploma, por despacho conjunto dos Ministros do Trabalho e da Solidariedade, da Saúde, da Reforma do Estado e da Administração Pública e do membro do Governo que tutela a administração local.
Artigo 6.º
1 - Para efeitos de admissão a concurso, os candidatos com deficiência devem declarar, no requerimento de admissão, sob compromisso de honra, o respectivo grau de incapacidade e tipo de deficiência, sendo dispensada a apresentação imediata de documento comprovativo.2 - Os candidatos devem, ainda, mencionar no requerimento de admissão todos os elementos necessários ao cumprimento do disposto no artigo seguinte.
Artigo 7.º
Processo de selecção
1 - O processo de selecção dos candidatos com deficiência deve ser adequado, nas suas diferentes vertentes, às capacidades de comunicação/expressão.2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência é a entidade competente para prestar o apoio técnico que se revele necessário.
Artigo 8.º
Provimento
1 - O provimento faz-se em duas fases, sendo primeiro preenchidos os lugares não reservados, pela ordem da lista de classificação final, seguindo-se-lhe o preenchimento dos lugares reservados, de entre candidatos com deficiência que não tenham obtido provimento na primeira fase, de acordo com a respectiva graduação.2 - No caso de não haver candidatos com deficiência admitidos ou aprovados em número suficiente, os lugares reservados a que se referem os n.os 1 e 2 do artigo 3.º podem ser preenchidos nos termos da primeira parte do número anterior.
Artigo 9.º
Aplicação a outras formas de recrutamento
O disposto nos artigos anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, aos processos de selecção de pessoal que se destinem à celebração de contratos administrativos de provimento e contratos de trabalho a termo certo.
Artigo 10.º
Avaliação e acompanhamento
1 - Os serviços e organismos referidos no n.º 1 do artigo 1.º comunicam anualmente à Direcção-Geral da Administração Pública a abertura dos concursos previstos no artigo 3.º, informando o número de lugares preenchidos por candidatos com deficiência.2 - A Direcção-Geral da Administração Pública informa, até 15 de Abril de cada ano, o Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência sobre a evolução da aplicação do presente diploma.
3 - O Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência acompanha, conjuntamente com o Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência, a aplicação do presente diploma e promove a integração e adaptação das pessoas com deficiência nos serviços e organismos referidos no n.º 1.
Artigo 11.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor 90 dias após a sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 6 de Dezembro de 2000. - António Manuel de Oliveira Guterres - Rui António Ferreira Cunha - Maria Manuela de Brito Arcanjo Marques da Costa - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - Alberto de Sousa Martins.
Promulgado em 18 de Janeiro de 2001.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 25 de Janeiro de 2001.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.