de 30 de junho
O n.º 5 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, bem como os princípios inscritos no subsistema de Ação Social, definidos na Lei 4/2007, de 16 de janeiro, alterada pela Lei 83-A/2013, de 30 de dezembro, que aprova as bases do sistema de segurança social, reconhecem a importância estratégica do setor social e solidário, bem como a necessidade de o mesmo ser apoiado pelo Estado, atendendo ao cumprimento de objetivos de solidariedade social próprios de um Estado de Direito.
A Lei de Bases da Economia Social - Lei 30/2013, de 8 de maio - veio habilitar, formalmente, as entidades da economia social com instrumentos necessários para desenvolverem um conjunto de outras iniciativas, para além das suas áreas tradicionais de atuação, fomentando a inovação e o empreendedorismo, reforçando o potencial de crescimento do País e contribuindo para o reforço da coesão social.
Com efeito, as entidades do setor social e solidário, localizadas em todo o território nacional, constituem um pilar fundamental no suporte e apoio a todos aqueles que, por vicissitudes diversas, se encontram numa situação de vulnerabilidade, assumindo-se, assim, como um instrumento mais próximo dos cidadãos na prossecução de ações destinadas a minimizar as situações de carência ou de desigualdade social.
À semelhança dos protocolos celebrados em 2011 e depois em 2013, o Compromisso de Cooperação para o biénio 2015-2016, assinado em 16 de dezembro de 2014, voltou a dar corpo ao que tem sido a política adotada por este Governo e que consiste na conceção de um Estado parceiro, cooperante e que confia nas instituições sociais e no trabalho de proximidade que desenvolvem, invertendo a política de índole tutelar e de distanciamento que até então tinha vingado.
O presente decreto-lei visa, por isso, ampliar e reforçar a visão de uma parceria público-social com as entidades do setor social e solidário, passando a abranger as diferentes áreas sociais do Estado, nomeadamente segurança social, saúde e educação, de forma a permitir o desenvolvimento de novos modelos de respostas.
Neste contexto, o presente decreto-lei pode implicar a definição dos critérios, regras e formas em que assenta cada modelo de contratualização com as instituições, tendo em conta as especificidades de cada domínio social do Estado.
Foram ouvidas a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, a União das Misericórdias Portuguesas e a União das Mutualidades Portuguesas.
Assim:
No desenvolvimento da alínea b) do artigo 9.º da Lei de Bases da Economia Social, aprovada pela Lei 30/2013, de 8 de maio, e nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
O presente decreto-lei estabelece os princípios orientadores e o enquadramento a que deve obedecer a cooperação entre o Estado e as entidades do setor social e solidário.
Artigo 2.º
Cooperação
A cooperação consiste na relação de parceria estabelecida entre o Estado e as instituições com o objetivo de desenvolver um modelo de contratualização assente na partilha de objetivos e interesses comuns, bem como de repartição de obrigações e responsabilidades.
Artigo 3.º
Âmbito de aplicação
O presente decreto-lei aplica-se às entidades do setor social e solidário, bem como às instituições sem fins lucrativos de utilidade pública cujo fim social seja a prossecução de objetivos de solidariedade social, adiante designadas por instituições.
Artigo 4.º
Definição
Para efeitos do presente decreto-lei, entende-se por «setor social e solidário» o conjunto das instituições particulares de solidariedade social, ou legalmente equiparadas, definidas no artigo 1.º do Estatuto das Instituições Particulares Solidariedade Social (IPSS), aprovado em anexo ao Decreto-Lei 119/83, de 25 de fevereiro, alterado pelos Decretos-Leis 9/85, de 9 de janeiro, 89/85, de 1 de abril, 402/85, de 11 de outubro, 29/86, de 19 de fevereiro e 172-A/2014, de 14 de novembro.
Artigo 5.º
Concretização
A cooperação concretiza-se nas seguintes áreas do domínio social do Estado:
a) Segurança Social;
b) Emprego e Formação Profissional;
c) Educação;
d) Saúde.
Artigo 6.º
Princípios orientadores
A cooperação rege-se pelos seguintes princípios orientadores:
a) Subsidiariedade - traduz-se num compromisso entre o Estado e as instituições na adoção de decisões que garantam uma proteção social mais adequada, eficaz e próxima dos cidadãos, atendendo ao respetivo nível de intervenção;
b) Proporcionalidade - implica um ajustado equilíbrio nas ações desenvolvidas, com vista a contribuir para uma melhor qualidade de vida e uma cidadania plena de todos;
c) Solidariedade - assenta na responsabilidade recíproca entre elementos de um grupo ou de uma comunidade, reforçando os laços sociais que os unem em prol do bem comum na realização das finalidades da cooperação;
d) Participação - implica o compromisso, a valorização e a responsabilização das instituições, das pessoas e da comunidade, numa perspetiva de colaboração mútua.
Artigo 7.º
Finalidades
A cooperação entre o Estado e as instituições visa:
a) Desenvolver serviços e ou equipamentos, numa lógica de proximidade, qualidade e sustentabilidade;
b) Otimizar os recursos humanos e técnicos;
c) Apoiar e estimular as iniciativas das instituições;
d) Apoiar o desenvolvimento sustentável das instituições;
e) Garantir a estabilidade das relações entre o Estado e as instituições;
f) Aprofundar o diálogo, promovendo o conhecimento mútuo e a disseminação de boas práticas;
g) Promover um sistema baseado numa colaboração multilateral reforçada.
Artigo 8.º
Pressupostos da cooperação
1 - A cooperação pressupõe:
a) A valorização, por parte do Estado, do trabalho de proximidade das instituições;
b) O reconhecimento da idoneidade das instituições, bem como da sua natureza particular e, consequentemente, do seu direito de livre atuação e da sua plena capacidade contratual, com respeito pelas normas legais aplicáveis;
c) A aceitação do princípio de que se devem privilegiar as famílias, os grupos e os indivíduos económica e socialmente desfavorecidos;
d) A corresponsabilização solidária do Estado no domínio do apoio técnico, por forma a favorecer o desenvolvimento das atividades e a prestação de serviços das instituições;
e) A colaboração das instituições com o Estado no exercício da ação social, em ordem à otimização das respostas e à rentabilização dos recursos financeiros disponíveis para o efeito.
2 - No âmbito da cooperação é ainda valorizada a atuação das instituições que desenvolvem os seus serviços em rede, tendo em vista a prossecução de objetivos comuns do território onde se inserem.
Artigo 9.º
Compromisso de cooperação
Para a determinação das prioridades a estabelecer no âmbito da cooperação, é celebrado um compromisso entre o Estado e as instituições, com vigência bienal, podendo ser celebrada adenda, sempre que se afigure necessário.
Artigo 10.º
Formas de cooperação
1 - A cooperação é estabelecida por escrito e pode assumir, nomeadamente, as seguintes formas:
a) Acordo de cooperação;
b) Acordo de gestão;
c) Protocolo;
d) Convenção.
2 - O acordo de cooperação visa o apoio para o desenvolvimento de um serviço ou equipamento.
3 - O acordo de gestão visa confiar às instituições as instalações e a gestão de um estabelecimento de apoio social, de natureza pública.
4 - O protocolo estabelece um modelo de experimentação que visa o desenvolvimento de projetos e medidas inovadoras de ação social, que concorram para a resolução de situações identificadas nos territórios.
5 - A convenção visa a realização de prestação de cuidados de saúde aos utentes do Serviço Nacional de Saúde de acordo e nos termos do regime jurídico das convenções.
6 - A cooperação pode ainda assumir outras formas específicas consoante o domínio do Estado a que respeita.
Artigo 11.º
Regulamentação específica
Os critérios, as regras e as formas em que assenta o modelo específico de contratualização com as instituições, em cada domínio social do Estado referido no artigo 5.º, constam de diplomas próprios.
Artigo 12.º
Articulação no âmbito da cooperação
1 - Em articulação com as estruturas com competências em matéria de ação social, as instituições podem desenvolver as seguintes atividades, no domínio da cooperação:
a) Execução do Serviço de Atendimento e de Acompanhamento Social, de acordo com os normativos em vigor;
b) Implementação de novos mecanismos de atuação e estratégias de ação inovadoras, em resposta às necessidades sociais.
2 - As instituições, no âmbito da sua integração nas Plataformas Supraconcelhias da Rede Social e em articulação com as entidades intermunicipais, nos termos definidos pelo Decreto-Lei 30/2015, de 12 de fevereiro, podem participar:
a) No planeamento integrado e sistemático do desenvolvimento social, potenciando os recursos existentes a nível local;
b) Na elaboração de diagnósticos sociais e na sua atualização permanente, incluindo a definição de prioridades e estratégias de intervenção para o território.
Artigo 13.º
Comissão Permanente do Setor Social e Solidário
1 - A Comissão Permanente do Setor Social e Solidário (CPSS) é o órgão nacional com competência de concertação estratégica, no âmbito da cooperação.
2 - À CPSS compete emitir pareceres e apresentar propostas e recomendações designadamente sobre:
a) Princípios e objetivos em que deve assentar a cooperação entre o Estado e as instituições;
b) Acompanhamento da execução das medidas previstas no compromisso de cooperação;
c) Avaliação da operacionalização dos instrumentos de cooperação.
3 - A CPSS tem a seguinte composição:
a) Um membro do Governo responsável pela área da segurança social;
b) Um membro do Governo responsável pela área da saúde;
c) Um membro do Governo responsável pela área da educação;
d) Um representante da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade;
e) Um representante da União das Misericórdias Portuguesas;
f) Um representante da União das Mutualidades Portuguesas.
Artigo 14.º
Funcionamento da Comissão Permanente do Setor Social e Solidário
1 - A CPSS é presidida pelo membro do Governo responsável pela área da segurança social.
2 - A CPSS reúne mensalmente e sempre que convocada por iniciativa do seu presidente, ou a pedido de metade dos seus membros.
3 - A CPSS funciona junto do ministério responsável pela área da segurança social, em plenário.
4 - Podem ser constituídas comissões especializadas, em razão das matérias.
5 - Os membros da CPSS podem, em função das matérias a tratar, fazer-se acompanhar por representantes dos serviços competentes, sendo que tais representantes não têm direito a voto.
6 - Sem prejuízo da composição prevista no n.º 3 do artigo anterior, pode ainda a CPSS integrar outras entidades, sem direito a voto, convocadas pelo presidente, por sua iniciativa ou por indicação de qualquer dos membros, de acordo com as matérias específicas a tratar.
7 - Os membros ou participantes na CPSS não são remunerados por essa função.
Artigo 15.º
Apoio financeiro às entidades representativas das instituições
No desenvolvimento de ações decorrentes da representação das suas associadas, as entidades representativas das instituições podem ser apoiadas financeiramente, nos termos a definir em diploma próprio.
Artigo 16.º
Consulta
É obrigatória a consulta às entidades representativas do setor social e solidário sempre que estejam em causa iniciativas legislativas que incidam sobre matéria de interesse na área da cooperação.
Artigo 17.º
Disposição final
Os representantes da CPSS, referidos no n.º 3 do artigo 13.º, são designados no prazo de 10 dias a contar da data da publicação do presente decreto-lei.
Artigo 18.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor no primeiro dia útil do mês seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 21 de maio de 2015. - Pedro Passos Coelho - Paulo José de Ribeiro Moita de Macedo - Nuno Paulo de Sousa Arrobas Crato - Luís Pedro Russo da Mota Soares.
Promulgado em 23 de junho de 2015.
Publique-se.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendado em 24 de junho de 2015.
O Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho.