de 28 de Fevereiro
Considerando que, para além de alguns aspectos parcelares, regulados, em termos conjunturais, pelo Decreto-Lei 292/75, de 16 de Junho, o regime jurídico das relações colectivas de trabalho continua a ser contido no Decreto-Lei 49212, de 28 de Agosto de 1969, hoje, obviamente, inoperante;Considerando que, sem prejuízo da liberdade e autenticidade das relações colectivas, é conveniente estruturar-se um corpo de normas básicas que constituam pontos de referência para o comportamento das partes interessadas, nomeadamente no que toca aos mecanismos disponíveis para a solução dos conflitos de trabalho;
Considerando, por outro lado, a necessidade de harmonizar uma atitude geral não intervencionista do Estado com a existência e a problemática própria de importantes sectores e empresas públicos ou nacionalizados;
Considerando, enfim, as vantagens de que este corpo de normas constitua um suporte relativamente estável perante as variações que resultam da dinâmica das forças sociais e da evolução das condições económicas do País;
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pelo artigo 3.º, n.º 1, alínea 3), da Lei Constitucional 6/75, de 26 de Março, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
ARTIGO 1.º
(Âmbito de aplicação) 1. O presente diploma regulamenta as relações colectivas de trabalho que se estabeleçam entre trabalhadores e entidades patronais através das respectivas associações ou entre associações sindicais e entidades patronais.2. O regime previsto neste diploma aplica-se às empresas públicas, salvo o disposto no número seguinte.
3. O estatuto jurídico e a disciplina da relação de trabalho dos trabalhadores das empresas públicas e nacionalizadas do sector estatizado da comunicação social que constem ou venham a constar dos respectivos estatutos prevalecem sobre o disposto neste diploma.
4. As instituições da previdência social ficarão submetidas às normas deste diploma, sem prejuízo das alterações que lhe vierem a ser introduzidas em decretos regulamentares a publicar pelos Ministérios do Trabalho e dos Assuntos Sociais.
5. O regime jurídico da regulamentação colectiva de trabalho para os trabalhadores do Estado, das autarquias locais, institutos de direito público e pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública será objecto de diploma específico dos Ministérios das Finanças, da Administração Interna e do Trabalho.
ARTIGO 2.º
(Modos de regulamentação) 1. A regulamentação das relações colectivas de trabalho é feita por convenção colectiva ou, nos termos do artigo 15.º, por decisão arbitral.2. A regulamentação das relações colectivas de trabalho pode também ser feita por via administrativa, nos termos dos artigos 20.º e 21.º
ARTIGO 3.º
(Objecto) Os instrumentos a que se refere o artigo anterior regulamentam as condições de trabalho e as garantias dos trabalhadores.
ARTIGO 4.º
(Limites) Os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho não podem:a) Limitar o exercício dos direitos fundamentais constitucionalmente garantidos;
b) Contrariar normas legais imperativas;
c) Incluir qualquer disposição que importe para os trabalhadores tratamento menos favorável do que o legalmente estabelecido;
d) Estabelecer regulamentação das actividades económicas.
ARTIGO 5.º
(Efeitos jurídicos) 1. A regulamentação estabelecida por qualquer dos modos referidos no artigo 2.º não pode ser afastada pelos contratos individuais de trabalho, salvo para estabelecer condições mais favoráveis para os trabalhadores.2. Sempre que numa empresa se verifique concorrência de convenções colectivas potencialmente aplicáveis a todo o seu pessoal, prevalecerá aquela que for considerada, no seu conjunto, mais favorável pelo sindicato ou sindicatos representativos da maioria dos trabalhadores abrangidos.
3. A partir da entrada em vigor da convenção colectiva, o sindicato ou sindicatos, nas condições estabelecidas no número anterior, deverão, no prazo de sessenta dias, declarar por escrito à outra parte qual a convenção colectiva que consideram mais favorável para os efeitos do n.º 2.
4. Caso os sindicatos não escolham a convenção mais favorável nos termos e no prazo indicados nos números anteriores, cabe ao Ministro do Trabalho emitir despacho que determine a prevalência pretendida pelo n.º 2.
ARTIGO 6.º
(Sujeitos) 1. Podem celebrar convenções colectivas de trabalho:a) As associações sindicais;
b) As entidades patronais ou as associações patronais.
2. Nos sectores em que existam empresas públicas ou nacionalizadas, poderá ser determinada, por despacho conjunto do Ministro do Trabalho e do Ministro de Tutela, a autonomização do processo de negociação quanto a elas.
3. Só as associações sindicais e patronais devidamente registadas nos termos do respectivo regime jurídico podem celebrar convenções colectivas de trabalho.
ARTIGO 7.º
(Forma e capacidade)
1. Sob pena de nulidade, as convenções colectivas serão celebradas por escrito e assinadas pelos representantes das associações sindicais e, conforme os casos, pelos representantes das associações patronais ou das entidades patronais interessadas.2. Para efeitos do disposto no número anterior, só se consideram como representantes legítimos:
a) Os membros das direcções das associações sindicais e patronais, com poderes bastantes para contratar;
b) Os titulares de mandato escrito, conferido pelas direcções das associações acima referidas, em que expressamente se delegue o poder de contratar;
c) Os administradores, gerentes, funcionários ou representantes das entidades patronais, titulares de mandato escrito, conferido pelos órgãos estatutariamente competentes, em quem expressamente se delegue o poder de contratar;
d) No caso das empresas nacionalizadas, os membros dos conselhos de gerência ou órgãos equiparados.
3. Com vista às negociações, os representantes legítimos das associações sindicais e patronais deverão oportunamente fazer as necessárias consultas aos trabalhadores e às entidades patronais interessados, não podendo, no entanto, invocar tal necessidade para obter a interrupção do curso do processo.
ARTIGO 8.º
(Conteúdo obrigatório) 1. As convenções colectivas deverão referir obrigatoriamente:a) A designação das entidades celebrantes;
b) A área e âmbito de aplicação;
c) O prazo de vigência e o processo de denúncia;
d) A data da celebração.
2. O disposto no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, às decisões arbitrais e às portarias de regulamentação e extensão.
ARTIGO 9.º
(Âmbito de aplicação) 1. As convenções colectivas de trabalho obrigam as entidades patronais que as subscrevem e as inscritas nas associações patronais signatárias, bem como os trabalhadores ao seu serviço, que sejam membros das associações sindicais celebrantes.2. As entidades patronais, filiadas em associações patronais no momento do início de um processo de contratação colectiva, ficam vinculadas à convenção colectiva ou à decisão arbitral que vier a resultar daquele processo até ao termo do respectivo período de vigência, mesmo que deixem de ser membros da associação.
3. Em caso de cessão total ou parcial de uma empresa, a entidade patronal cessionária ficará obrigada a observar, até ao termo do respectivo prazo de vigência, o instrumento de regulamentação colectiva que vincula a entidade patronal cedente.
ARTIGO 10.º
(Obrigações das partes) Os sindicatos e associações patronais devem fazer executar e observar, por parte dos seus associados, as convenções colectivas que tenham celebrado ou que tenham sido celebradas pelas federações, uniões e confederações em que se integram e são responsáveis pelas violações que tenham promovido.
ARTIGO 11.º
(Processo) 1. A proposta de celebração de uma convenção colectiva deve ser apresentada por escrito à entidade com quem se pretende negociar.2. A resposta deverá ser enviada por escrito até um mês após a apresentação da proposta, salvo se houver sido convencionado prazo menor.
3. Quando se trata de revisão de uma convenção colectiva, a proposta deve ser apresentada até ao termo do prazo para o efeito fixado na convenção ou, na sua falta, até dois meses antes do termo do período de vigência da convenção.
4. Das propostas e respostas serão enviadas cópias ao Ministério do Trabalho.
ARTIGO 12.º
(Fixação prévia do acréscimo global de encargos) 1. As partes deverão, sempre que possível, atribuir prioridade às negociações referentes à matéria da retribuição de trabalho através do ajuste do acréscimo global de encargos.2. O Ministério do Trabalho e o Ministério responsável pelo sector de actividade fornecerão às partes todo o apoio técnico que por elas seja requerido.
ARTIGO 13.º
(Conciliação) 1. Os conflitos colectivos de trabalho que resultem da celebração ou revisão de uma convenção colectiva poderão ser solucionados por conciliação nos termos dos números seguintes.2. A conciliação pode ser promovida em qualquer altura:
a) Por acordo das partes;
b) Por uma das partes, no caso de falta de resposta à proposta de celebração ou de revisão, ou, fora desse caso, mediante pré-aviso de oito dias por escrito à outra parte.
3. Na falta de processo convencional de conciliação ou de acordo escrito dos interessados, expressamente firmado para o efeito, aquela será efectuada pelos serviços de conciliação do Ministério do Trabalho, assessorados, sempre que necessário, pelos serviços competentes de qualquer outro Ministério que tenha interesse directo na resolução do diferendo.
4. Os conflitos colectivos de trabalho que resultem da celebração ou revisão de uma convenção colectiva aplicável a empresas públicas ou nacionalizadas podem ser obrigatoriamente submetidos a conciliação por despacho conjunto dos Ministros interessados.
ARTIGO 14.º
(Mediação)
1. A todo o tempo as partes podem acordar em submeter a mediação nos termos que definirem ou, na falta dessa definição, nos termos dos números seguintes, os conflitos colectivos que resultem da celebração ou revisão de uma convenção colectiva.2. O mediador será escolhido pelas partes e deverá remeter a estas a sua proposta por carta registada no prazo de vinte dias, a contar da sua nomeação.
3. A proposta do mediador considerar-se-á recusada se não houver comunicação escrita de ambas as partes a aceitá-la, no prazo de dez dias a contar da sua recepção.
4. O mediador comunicará às partes a aceitação ou a recusa da contraparte até cinco dias após o termo do prazo referido no número anterior.
5. Até ao termo do prazo fixado no número anterior, o mediador poderá realizar todos os contactos, com cada uma das partes em separado, que considere convenientes e viáveis no sentido da obtenção de um acordo.
ARTIGO 15.º
(Arbitragem) 1. A todo o tempo as partes podem acordar em submeter a arbitragem nos termos que definirem ou, na falta de definição, segundo o disposto nos números seguintes, os conflitos colectivos que resultem da celebração ou revisão de uma convenção colectiva.2. A arbitragem será realizada por três árbitros, um nomeado por cada uma das partes e o terceiro escolhido pelos árbitros de parte.
3. Não podem ser árbitros os gerentes, administradores, representantes, empregados, consultores e todos aqueles que tenham interesse financeiro directo nas entidades interessadas na arbitragem ou nas empresas das entidades patronais interessadas ou dos associados das organizações interessadas e ainda os cônjuges, parentes e afins em linha recta ou até ao 2.º grau da linha colateral, adoptantes e adoptados das pessoas indicadas.
4. Os árbitros poderão ser assistidos por peritos e têm direito a obter das associações sindicais e patronais e das empresas interessadas, por parte do Ministério do Trabalho e dos Ministérios interessados, todos os elementos de informação de que necessitem.
5. A decisão arbitral será tomada por maioria.
6. As decisões arbitrais não podem diminuir direitos ou garantias consagrados em convenções colectivas de trabalho anteriores.
7. Os árbitros enviarão o texto da decisão às partes e ao Ministério do Trabalho no prazo de quinze dias.
8. A decisão arbitral tem os mesmos efeitos jurídicos da convenção colectiva.
ARTIGO 16.º
(Arbitragem obrigatória) 1. Nos conflitos colectivos inerentes à celebração ou revisão de uma convenção colectiva aplicável a empresas públicas ou nacionalizadas poderá ser tornada obrigatória a realização de arbitragem por despacho do Ministro do Trabalho e do Ministro de Tutela.2. No caso previsto no número anterior, o eventual desacordo entre as partes quanto à nomeação do terceiro árbitro poderá ser suprido por despacho do Ministro de Tutela.
ARTIGO 17.º
(Adesão) As associações sindicais e as associações patronais ou as entidades patronais podem acordar em aderir às convenções colectivas de trabalho.
ARTIGO 18.º
(Comissões paritárias) 1. As convenções colectivas podem prever a constituição de comissões formadas por igual número de representantes de entidades signatárias com competência para interpretar e integrar as suas lacunas.2. O funcionamento das comissões referidas no número anterior reger-se-á pelo disposto nas convenções colectivas.
3. As comissões paritárias só podem deliberar desde que esteja presente metade dos membros efectivos representantes de cada parte.
4. As deliberações tomadas por unanimidade consideram-se para todos os efeitos como regulamentação do instrumento a que respeitem e serão depositadas e publicadas nos mesmos termos das convenções colectivas.
5. As deliberações tomadas por unanimidade são automaticamente aplicáveis às entidades patronais e aos trabalhadores abrangidos pelas portarias de extensão das convenções que forem interpretadas ou integradas.
6. A pedido da comissão poderá participar nas reuniões, sem direito a voto, um representante do Ministério do Trabalho.
ARTIGO 19.º
(Depósito) 1. As convenções colectivas de trabalho, as decisões arbitrais e os acordos de adesão deverão ser depositados no Ministério do Trabalho.2. O depósito será recusado se os referidos instrumentos de regulamentação não obedecerem ao disposto no artigo 8.º deste diploma.
ARTIGO 20.º
(Portarias de extensão) 1. O Ministro do Trabalho, ouvido o Ministro de Tutela, pode, por portaria, mandar aplicar, no todo ou em parte, convenções colectivas de trabalho e decisões arbitrais a entidades patronais do mesmo sector económico e a trabalhadores da mesma profissão ou de profissão análoga, desde que exerçam a sua actividade na área e âmbito naquelas fixado.2. O Ministro do Trabalho pode, por portaria, mandar aplicar, no todo ou em parte, convenções colectivas de trabalho e decisões arbitrais a entidades patronais e a trabalhadores do sector económico e profissional regulado que exerçam a sua actividade em área diversa da do instrumento que se pretende alargar, quando não existam associações sindicais ou patronais e se verifique identidade ou semelhança económicas e sociais.
3. Para efeito do disposto nos números anteriores, o Ministro do Trabalho mandará publicar um aviso no Boletim do Ministério do Trabalho definindo o âmbito e a área da portaria a emitir.
4. Nos quinze dias seguintes ao da publicação do aviso, podem os interessados no processo de extensão deduzir oposição fundamentada.
ARTIGO 21.º
(Portarias de regulamentação) 1. Nos casos em que se mostre absolutamente impossível a celebração de uma convenção colectiva por inexistência de entidades legitimadas ou por falta de iniciativa negocial, sendo também inviável o recurso à extensão de uma convenção ou decisão arbitral existente, poderá ser emitida uma portaria de regulamentação colectiva de trabalho, depois de ouvida a Comissão Nacional de Preços e Rendimentos, pelos Ministros do Trabalho, de Tutela e pelo Secretário de Estado do Planeamento, os quais poderão delegar as suas funções.2. Para os efeitos do disposto no número anterior será constituída, por despacho do Ministro do Trabalho, ouvidos os Ministros interessados, uma comissão, à qual competirá a elaboração dos estudos preparatórios da portaria.
3. Na comissão referida no número anterior serão incluídos, sempre que possível, representantes das partes.
4. Da portaria cabe recurso para o Conselho de Ministros.
ARTIGO 22.º
(Publicação e entrada em vigor) 1. Os instrumentos de regulamentação colectiva serão publicados no Boletim do Ministério do Trabalho nos quinze dias seguintes ao depósito a que se refere o artigo 19.º, sendo caso disso.2. Os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho entrarão em vigor após a sua publicação, nos mesmos termos das leis.
ARTIGO 23.º
(Prazo de vigência) 1. O prazo de vigência das convenções colectivas e decisões arbitrais não poderá ser inferior a um ano.2. As convenções colectivas e as decisões arbitrais mantêm-se, porém, em vigor até serem substituídas por novos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.
3. O disposto no número anterior aplica-se igualmente às portarias de regulamentação e de extensão.
ARTIGO 24.º
(Anulação de cláusulas ilegais) As associações sindicais e patronais, bem como os trabalhadores e entidades patronais interessados, podem propor acção de anulação, perante os tribunais de trabalho, das cláusulas dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.
ARTIGO 25.º
(Sanções)
1. Sem prejuízo das sanções especialmente previstas na lei, as entidades patronais que infringirem os preceitos dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho serão punidas com multa de 200$00 a 1000$00 por cada trabalhador em relação ao qual se verificar infracção.2. Quando a infracção respeitar a uma generalidade de trabalhadores, a multa aplicável será de 5000$00 a 50000$00.
3. As infracções aos preceitos que estipulam retribuições serão punidas com multa que poderá ir até ao dobro do montante das importâncias em dívida.
4. Conjuntamente com as multas, serão sempre cobradas as indemnizações que forem devidas aos trabalhadores prejudicados, as quais reverterão a favor dos referidos trabalhadores.
5. Salvo se pena mais grave for prevista pela lei penal geral, sempre que a infracção for acompanhada de coacção, falsificação, simulação ou qualquer meio fraudulento, será punida com multa de 5000$00 a 50000$00, e a tentativa com multa de 1000$00 a 10000$00.
6. No caso de reincidência, as multas serão elevadas ao dobro.
7. A infracção do disposto no n.º 4 do artigo 11.º será punida com multa de 1000$00 a 10000$00.
8. O produto das multas reverterá para o Fundo de Desemprego.
ARTIGO 26.º
(Entrada em vigor) Este diploma entra imediatamente em vigor e revoga o Decreto-Lei 49212, de 28 de Agosto de 1969, na redacção dada pelo Decreto-Lei 492/70, de 22 de Outubro; o artigo 14.º do Decreto-Lei 196/72, de 12 de Junho; o Decreto-Lei 377/73, de 24 de Julho; o Decreto-Lei 698/73, de 27 de Dezembro, e o capítulo II do Decreto-Lei 292/75, de 16 de Junho.Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - José Baptista Pinheiro de Azevedo - João de Deus Pinheiro Farinha - João Pedro Tomás Rosa.
Promulgado em 28 de Fevereiro de 1976.
Publique-se.
O Presidente da República, FRANCISCO DA COSTA GOMES.