de 5 de Fevereiro
As sociedades de capital de risco constituem em Portugal uma figura jurídica nova e, mesmo na Europa, representam um instrumento recente de promoção do investimento e de introdução da inovação tecnológica.No essencial, o objecto das sociedades de capital de risco consiste na procura deliberada e sistemática de oportunidades de investimento capazes de gerar valor acrescentado e de proporcionar rendimento aos investidores, justificando a aplicação de capitais, através da compra de acções e quotas de empresas com potencial de expansão e viabilidade.
Por outro lado, a criação de sociedades de capital de risco enquadra-se numa política de fomento de utilização de instrumentos de capitalização de empresas - financiamento por meio de entradas de capital - do que resultará, aliás, um contributo importante para a dinamização do mercado de capitais.
A solução institucional adoptada reveste-se de características de flexibilidade suficiente para estimular o aparecimento de sociedades de capital de risco de iniciativa privada às quais é possível associar entidades públicas interessadas na promoção do investimento, da criação de empregos e da modernização tecnológica.
Tendo em vista a salvaguarda da posição dos empresários, pretende-se garantir em certa medida o carácter temporário e minoritário das participações das sociedades de capital de risco, vedando-se a sua utilização como sociedades de controle, mas sem prejuízo da sua viabilidade, atenta a fase de incipiente desenvolvimento do nosso mercado de capitais.
Entretanto pretende-se equacionar os diferentes sistemas de incentivos fiscais já em vigor, com vista à dinamização do mercado de capitais, para estabelecer um sistema fiscal aplicável às sociedades de capital de risco compatível com os objectivos que se visa alcançar.
Assim:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
(Noção e objecto)
1 - As sociedades de capital de risco (abreviadamente designadas por SCR) têm por objecto o apoio e promoção do investimento e da inovação tecnológica em projectos ou empresas através da participação temporária no respectivo capital social.2 - Considera-se, para efeitos do presente diploma, participação no capital social a titularidade de obrigações convertíveis em capital e a efectivação de prestações suplementares de capital.
3 - Constitui objecto acessório das SCR a prestação de assistência na gestão financeira, técnica, administrativa e comercial das sociedades em cujo capital social participem, nos termos do artigo 5.º
Artigo 2.º
(Requisitos de constituição e capital mínimo)
1 - As SCR constituem-se como sociedades comerciais sob a forma de sociedade anónima de responsabilidade limitada, devendo possuir um capital social não inferior a 300000 contos.
2 - Os interessados devam apresentar no Ministério das Finanças os requerimentos para a constituição de SCR, acompanhados da indicação dos accionistas fundadores e respectivas participações no capital social, da exposição dos seus objectivos essenciais e das necessidades de ordem económico-social que visam satisfazer e do projecto de estatutos, elaborado nos termos das disposições legais aplicáveis.
3 - Verificada a existência dos pressupostos legais da sua constituição, atentas a sua contribuição para o desenvolvimento económico-social do País e as orientações das políticas monetária e financeira, o Ministro das Finanças, ouvido o Banco de Portugal, concederá, por portaria, a autorização requerida nos termos do n.º 2.
4 - As SCR só podem constituir-se depois de os subscritores fazerem prova de que uma fracção do capital social não inferior a 50% do capital mínimo exigido no n.º 1 foi realizada em dinheiro e se acha depositada na Caixa Geral de Depósitos, à ordem da respectiva administração, com expressa declaração da quantia subscrita por cada accionista.
5 - A autorização caduca se a escritura de constituição da SCR não for outorgada no prazo de 120 dias a contar da data da publicação da portaria a que se refere o n.º 3 deste artigo, podendo, todavia, tal prazo ser prorrogado por um novo prazo, até 120 dias, pelo Ministro das Finanças, em casos devidamente justificados.
6 - Com excepção dos aumentos de capital resultantes da integração de reservas, o capital social das SCR só poderá ser realizado em dinheiro.
Artigo 3.º
(Sede e forma de representação social)
1 - As SCR têm sede em território nacional.
2 - Podem as SCR dispor de formas de representação social em território nacional ou no estrangeiro mediante, neste caso, autorização a conceder nos termos da legislação em vigor.
Artigo 4.º
(Operações activas)
1 - No desenvolvimento da sua actividade, podem as SCR efectuar as seguintes operações activas:a) Adquirir, a título originário ou derivado quaisquer títulos ou participações no capital de sociedades, bem como aliená-los ou onerá-los;
b) Subscrever obrigações convertíveis em acções emitidas por entidades nacionais de direito privado;
c) Promover, em benefício de quaisquer empresas nacionais e para fins de reconhecido interesse económico, a obtenção de crédito a médio ou longo prazos junto de instituições de crédito ou estabelecimentos estrangeiros, mediante autorização a obter nos termos da legislação cambial aplicável, e a colocação de acções, obrigações e outros títulos de dívida negociáveis, emitidos por empresas nacionais, e, bem assim, intervir, por qualquer outro modo, na preparação ou na colocação de emissões de tais títulos.
2 - No prazo de 3 anos contados a partir da data da sua constituição, as SCR deverão ter um mínimo equivalente a dois terços do seu activo total aplicado em participações de capital social.
3 - Sempre que, por qualquer motivo, a soma das participações no capital social de outras sociedades baixar do limite referido no número anterior, a SCR deverá restabelecê-lo no prazo de 1 ano.
4 - O não cumprimento do disposto no presente artigo determinará a perda de quaisquer benefícios concedidos à SCR.
5 - Para além do limite fixado no número anterior, as SCR poderão realizar operações activas destinadas a manter outros recursos, designadamente nas seguintes formas:
a) Numerário ou depósitos nas instituições de crédito;
b) Subscrever obrigações e outros títulos de dívida negociáveis emitidos por entidades nacionais de direito público ou privado, desde que cotados em Bolsa.
Artigo 5.º
(Prestação de outros serviços)
As SCR poderão também, nos termos do n.º 3 do artigo 1.º, prestar os seguintes tipos de serviços:
a) A realização de estudos técnico-económicos de viabilidade de empresas ou de novos projectos de investimento, bem como das condições e modalidades do respectivo financiamento;
b) A execução de estudos ou projectos visando a reorganização, concentração ou qualquer outra forma de racionalização da actividade das empresas em que participem, incluindo a promoção de mercados, a melhoria dos processos de produção e a introdução de novas tecnologias.
Artigo 6.º
(Limites de participações)
1 - As participações das SCR noutras sociedades não podem:a) Em cada caso, exceder 20% do seu próprio capital e reservas;
b) Na sua totalidade, exceder três vezes o seu próprio capital e reservas.
2 - Em cada momento, pelo menos, 75% das participações das SCR noutras sociedades não poderão ter estado na sua titularidade, seguida ou interpoladamente, por um período superior a 12 anos.
3 - Do total de participações das SCR, as que excedam 50% do capital das sociedades participadas não poderão nunca representar mais de 50%
Artigo 7.º
(Representação nos órgãos sociais de outras empresas)
As SCR podem, directamente ou mediante representação, participar nos órgãos sociais das empresas em que participam.
Artigo 8.º
(Recursos alheios)
Para complemento do respectivo capital social e reservas, podem as SCR obter os seguintes recursos alheios:a) Financiamentos, por prazo não superior a 2 anos, junto de instituições de crédito e de outros estabelecimentos financeiros estrangeiros ou internacionais, nomeadamente sob a forma de títulos de dívida por si emitidos, mediante autorização a conceder nos termos da legislação cambial aplicável, até 50% do montante do capital social realizado, acrescido das reservas apuradas através do último balanço aprovado;
b) Emissão de obrigações, nos termos da legislação em vigor;
c) Outros recursos no mercado nacional ou no estrangeiro, através de contratos de associação em participação, nos termos da legislação em vigor.
Artigo 9.º
(Fundos consignados)
As SCR poderão ser incumbidas da gestão de fundos consignados, com vista à realização das operações previstas no artigo 4.º, de acordo com a legislação que vier a ser especificamente aplicada à constituição dos mencionados fundos.
Artigo 10.º
(Operações especialmente vedadas)
Ficam especialmente vedadas às SCR as seguintes espécies de operações:a) O exercício, ainda que por forma indirecta, de actividades abrangidas pelas sociedades de controle, criadas ao abrigo do Decreto-Lei 271/72, de 2 de Agosto, ou de legislação que o substitua;
b) O exercício directo de qualquer actividade agrícola, comercial ou industrial;
c) A aquisição de acções próprias;
d) A participação no capital social de quaisquer instituições de crédito ou parabancárias, bem como em sociedades cujo objecto compreenda a actividade de mediação sobre bens imóveis, a realização de empréstimos com garantia hipotecária ou a compra e venda, exploração ou administração de bens imóveis, exceptuada a exploração agrícola;
e) A aquisição ou posse de bens imóveis, para além dos necessários às suas instalações próprias, salvo quando lhes advenham por efeito de cessão de bens, dação em cumprimento, arrematação ou qualquer outro meio legal de cumprimento de obrigações ou destinado a assegurar esse cumprimento, devendo, em tais casos, proceder à respectiva liquidação no prazo de 2 anos, o qual poderá ser renovado, em circunstâncias excepcionais, por um novo prazo até 2 anos, a submeter a autorização do Ministro das Finanças;
f) A concessão de crédito ou a prestação de garantias sob qualquer forma ou modalidade.
Artigo 11.º
(Operações vedadas às sociedades em cujo capital participem sociedades de
capital de risco)
À sociedade em cujo capital participe uma sociedade de capital de risco é vedado, sob pena de nulidade, adquirir acções ou obrigações desta última.
Artigo 12.º
(Fundos de reserva e garantia)
1 - As SCR devem constituir um fundo de reserva geral e um fundo de reserva especial.2 - O fundo de reserva geral é formado com base na afectação obrigatória de 10% dos lucros apurados em cada exercício, até ao limite de 50% do capital social.
3 - O fundo de reserva especial é constituído por 5% dos lucros líquidos anuais, acrescidos de outras importâncias que lhe forem atribuídas pela assembleia geral, e destina-se a cobrir as depreciações do activo ou prejuízos que a conta de lucros e perdas não possa suportar.
Artigo 13.º
(Contabilidade e obrigação de prestação de informação em matéria
contabilística)
1 - A contabilidade das SCR será organizada nos termos da lei geral, devendo ser elaborado, como anexo às contas anuais, o mapa das participações financeiras, indicando para cada participada a natureza do respectivo título de propriedade, os seus valores nominal, de aquisição e de cotação oficial, se houver, bem como a respectiva percentagem de participação no capital social.2 - As contas anuais das SCR são obrigatoriamente sujeitas à revisão legal.
Artigo 14.º
(Regime fiscal)
O regime fiscal das SCR será estabelecido na lei e nele ficarão consignados os benefícios fiscais que lhes serão aplicados.
Artigo 15.º
(Regime jurídico)
As SCR regem-se pelas normas do presente diploma e, subsidiariamente, pelas disposições que regulam as sociedades de investimento, com as necessárias adaptações.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 2 de Janeiro de 1986. - Aníbal António Cavaco Silva - Miguel José Ribeiro Cadilhe.
Promulgado em 15 de Janeiro de 1986.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.
Referendado em 23 de Janeiro de 1986.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.