de 31 de março
A Estratégia Nacional para a Energia estabelece a liberalização dos mercados da eletricidade e do gás natural como um objetivo de política energética nacional, assente em mercados livres e concorrenciais onde todos os consumidores podem proceder à livre escolha de comercializadores baseados em procedimentos transparentes e céleres.
Considerando que a abertura daqueles mercados só se efetivará quando os consumidores finais, em particular os domésticos e os de pequenos serviços, tiverem a possibilidade de escolher e mudar de comercializador, previu-se, no âmbito do Sistema Elétrico Nacional (SEN) e do Sistema Nacional de Gás Natural (SNGN), a atividade de operação logística de mudança de comercializador e a constituição de um operador logístico para o efeito.
A criação do operador logístico de mudança de comercializador constitui um objetivo já preconizado nos Decretos-Leis n.os 29/2006 e 30/2006, ambos de 15 de fevereiro, que importa concretizar, nomeadamente, tal como já previsto no Decreto-Lei 140/2006, de 26 de julho, e no Decreto-Lei 172/2006, de 23 de agosto, onde se determina que o operador logístico de mudança de comercializador deve ser comum para o SEN e para o SNGN.
Por determinação provisória da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), a atividade tem vindo a ser, transitoriamente, assegurada pelo operador da rede de distribuição de eletricidade, em média e alta tensão, e pelo operador da rede nacional de transporte de gás natural, sem que tenha sido aprovada a legislação complementar para o efeito.
O operador logístico, para além da atividade de gestão de mudança de comercializador, pode vir a desempenhar ainda as funções de leitura e de recolha dos dados de consumo, exercidas até agora pelos próprios fornecedores, podendo incluir a gestão dos equipamentos de medida, a recolha de informação local ou à distância e o fornecimento de informação sobre os agentes do mercado, prevendo-se de igual modo um dever de colaboração por parte dos intervenientes no SEN e no SNGN.
A operação de mudança de comercializador é atribuída a uma única entidade que deve observar os princípios da transparência, da objetividade e da não discriminação, assim como seguir um procedimento simples, célere e eficaz que seja apelativo, respeitando as regras de defesa e promoção da concorrência e de proteção do consumidor, sem, contudo, afetar os direitos do comercializador anterior decorrentes da lei ou de contrato válido.
No contexto de um mercado liberalizado deve ser, por um lado, simplificado o processo de mudança de fornecedor e, por outro, devem ser disponibilizadas aos consumidores, aos comercializadores, aos operadores de rede e aos operadores de mercado informações claras e comparáveis sobre consumos, tarifas, termos e condições dos contratos.
A autonomização desta atividade no âmbito dos mercados da eletricidade e do gás natural, para além de visar a salvaguarda da independência da entidade responsável por uma tarefa essencial para a efetiva liberalização do mercado, pretende também facilitar a tarefa da regulação, contribuir para a proteção dos consumidores e promover a eficiência energética, objetivo prioritário da política energética, europeia e nacional.
A operação logística de mudança de comercializador deve, assim, ser assegurada por uma entidade absolutamente independente, no plano jurídico-organizativo e no respetivo processo de análise e tomada de decisões, dos intervenientes na operação de produção, comercialização e distribuição de energia, importando garantir a operacionalidade, a imparcialidade, a transparência, a eficiência e a eficácia dos procedimentos associados a esta atividade.
Para o efeito, o operador logístico deverá dispor dos recursos, competências e da estrutura organizativa necessários à sua atividade, que se encontra sujeita à regulação da ERSE.
Foi ouvida a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos.
Foi promovida a audição do Conselho Nacional do Consumo.
Assim:
No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pelo Decreto-Lei 29/2006, de 15 de fevereiro, republicado pelo Decreto-Lei 215-A/2012, de 8 de outubro, e alterado pelo Decreto-Lei 178/2015, de 27 de agosto, pelo Decreto-Lei 30/2006, de 15 de fevereiro, republicado pelo Decreto-Lei 77/2011, de 20 de junho, alterado pelos Decretos-Leis 74/2012, de 26 de março, 112/2012, de 23 de maio e 230/2012, de 26 de outubro, do regime jurídico estabelecido pelo artigo 172.º da Lei 42/2016, de 28 de dezembro, e nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto
O presente decreto-lei estabelece o regime jurídico aplicável à atividade de operador logístico de mudança de comercializador (OLMC) no âmbito do Sistema Elétrico Nacional (SEN) e do Sistema Nacional de Gás Natural (SNGN).
Artigo 2.º
Entidade incumbida do exercício da atividade de operador logístico de mudança de comercializador
Fica a Agência para a Energia (ADENE), criada pelo Decreto-Lei 223/2000, de 9 de setembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei 47/2015, de 9 de abril, incumbida de exercer a atividade de OLMC.
Artigo 3.º
Atividade de operador logístico de mudança de comercializador
1 - A atividade de OLMC é exercida por uma única entidade, adiante designada por Operador Logístico de Mudança de Comercializador ou OLMC, com a incumbência de garantir que a mudança de comercializador de eletricidade e gás natural pelo consumidor final seja efetuada de forma célere, baseada em regras e procedimentos simples, transparentes, padronizados e desmaterializados, assim como assegurar a efetivação do direito à informação dos consumidores.
2 - A atividade de OLMC compreende as funções necessárias à mudança de comercializador de eletricidade e de gás natural pelo consumidor final, a seu pedido, bem como a de colaborar na transparência dos mercados de eletricidade e de gás natural, disponibilizando aos consumidores finais o acesso fácil à informação a que têm direito, destacando-se, nomeadamente, as seguintes funções:
a) Operacionalização das mudanças de comercializador nos mercados de eletricidade e de gás natural;
b) Gestão e manutenção da plataforma eletrónica de logística de mudança de comercializador e prestação de informação;
c) Prestação de informação personalizada aos consumidores de energia, nomeadamente nos seguintes âmbitos:
i) Procedimento para a contratação de um serviço de fornecimento de gás e/ou de eletricidade;
ii) Tarifas adequadas a cada perfil de consumo, determinadas com base na informação detida por este operador e a pedido do consumidor;
iii) Tarifa(s) social(ais) existente(s) e aplicáveis;
iv) Informação sobre procedimentos e prazos para os restabelecimentos de ligações;
v) Informações sobre utilização eficiente da energia, destinados a promover a eficiência energética e a utilização racional dos recursos;
vi) Outras informações relevantes para o consumidor de eletricidade e gás natural;
d) Elaboração de relatórios semestrais relativos aos processos de mudança de comercializador, incluindo a análise e avaliação do nível da qualidade de serviço de mudança de comercializador e transmissão e divulgação dos resultados;
e) Recolha, armazenamento, tratamento e validação dos dados de consumo de eletricidade e gás natural e gestão da plataforma informática para este efeito;
f) Transmissão dos elementos de informação necessários aos intervenientes nos SEN e SNGN, incluindo aos comercializadores sempre que solicitado e justificada a necessidade de transmissão dos mesmos.
3 - O tratamento de dados pessoais relativos ao consumidor final, bem como a sua disponibilização aos demais operadores do setor, apenas é possível mediante a prévia e inequívoca autorização do respetivo titular.
4 - A atividade de OLMC pode incluir outras atividades que visem reforçar a concorrência e desenvolvimento do mercado, a transparência, a eficácia e a confiança dos diversos intervenientes no mercado e dos consumidores, sendo estas definidas pelo membro do Governo responsável pela área da energia.
Artigo 4.º
Princípios gerais
1 - O exercício da atividade de OLMC deve processar-se com observância dos princípios gerais da atividade administrativa, nomeadamente os princípios da utilização racional dos recursos, das regras de mercado, da livre concorrência e das obrigações de serviço público e de proteção dos consumidores, de acordo com a legislação em vigor.
2 - Os agentes e trabalhadores que assegurem a atividade de OLMC estão sujeitos às garantias de imparcialidade e incompatibilidades aplicáveis aos trabalhadores da Administração Pública.
3 - A entidade incumbida do exercício do OLMC deve elaborar um Plano de Prevenção de Riscos de Corrupção e Infrações Conexas, bem como dispor de mecanismos de acompanhamento e de gestão e conflitos de interesse devidamente publicitados, sendo para o efeito aplicável o disposto na Lei 54/2008, de 4 de setembro.
CAPÍTULO II
Regulação e remuneração
Artigo 5.º
Regulação
A atividade de OLMC está sujeita à regulação pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), sem prejuízo das competências atribuídas a outras entidades administrativas, no domínio específico das suas atribuições.
Artigo 6.º
Financiamento da atividade de operador logístico de mudança de comercializador
1 - O financiamento da atividade de OLMC é assegurado por:
a) Aplicação de receitas próprias da ADENE;
b) Taxa paga pelo comercializador cessionário, fixada por portaria do membro do Governo responsável pela área da energia, sob proposta da ERSE;
c) Tarifas de eletricidade e de gás natural, desde que não constituam um agravamento de custos para os respetivos clientes finais.
2 - A remuneração dos serviços prestados pelo OLMC é homologada por despacho do membro do Governo responsável pela área da energia, sob proposta apresentada pela ADENE, até 15 de setembro do ano anterior a que se reporta e após consulta à ERSE.
CAPÍTULO III
Mudança de comercializador
Artigo 7.º
Regime
1 - Cabe ao consumidor final a escolha do comercializador para cada instalação de consumo de eletricidade ou de gás natural, seja através da contratação em mercado organizado, seja através de contrato bilateral, nos termos da legislação aplicável.
2 - Devem admitir-se diversas possibilidades de contratação, escrita e eletrónica, sempre com a salvaguarda da confirmação do consumidor, prévia à efetiva mudança de comercializador, nos termos do disposto no Decreto-Lei 24/2014, de 14 de fevereiro, alterado pela Lei 47/2014, de 28 de julho.
3 - Compete ao OLMC a verificação prevista no número anterior e a garantia em todos os casos da celeridade e transparência na mudança comercializador.
4 - Cabe aos operadores do SEN e SNGN a comunicação de questões relevantes sobre a elegibilidade do consumidor final competindo ao OLMC a verificação e a pronúncia sobre a elegibilidade do consumidor final com base na aferição no cumprimento do contrato em curso com o comercializador que deseja substituir.
5 - A prestação dos serviços de mudança de comercializador é gratuita para o consumidor.
Artigo 8.º
Procedimentos
1 - Compete à ERSE elaborar e aprovar mecanismos e procedimentos de mudança de comercializador, bem como a sua monitorização e supervisão de aplicação.
2 - Os documentos referidos no número anterior são aprovados no prazo de 60 dias após a publicação do presente diploma e disponibilizados no sítio da Internet do OLMC.
Artigo 9.º
Atendimento
A entidade incumbida do OLMC deve garantir o atendimento telefónico e digital dos seus serviços, através da Internet, sem prejuízo do atendimento digital assistido, através da Rede Espaços do Cidadão, nos termos do Decreto-Lei 74/2014, de 13 de maio.
Artigo 10.º
Auditoria
1 - Os procedimentos de mudança de comercializador praticados pelos operadores do SEN e SNGN devem ser objeto de auditoria a realizar por entidades independentes com a periodicidade de, pelo menos, dois anos, ou sempre que a entidade incumbida do OLMC ou a ERSE o solicitem fundamentadamente.
2 - Os relatórios das auditorias devem ser publicados no sítio na Internet do OLMC.
CAPÍTULO IV
Disposições finais
Artigo 11.º
Deveres dos titulares provisórios das atribuições do operador logístico de mudança de comercializador
Os titulares provisórios das respetivas atribuições de gestor de processo de mudança de comercializador na eletricidade e no gás natural devem, no prazo de 60 dias a contar da respetiva solicitação:
a) Transferir para o OLMC a titularidade dos sistemas de informação de suporte imputados ao desenvolvimento da atividade de mudança de comercializador, nos termos e condições aprovadas pelo membro do Governo responsável pela área da energia, sob proposta da ERSE;
b) Entregar ao OLMC, a título gratuito, os dados recolhidos e armazenados, incluindo os dados pessoais dos consumidores, relativos às atividades que vinham desempenhando enquanto gestoras da mudança de fornecedor;
c) Informar o OLMC do perfil e identificação dos trabalhadores que se encontrem afetos às atividades de gestão dos processos de mudança de fornecedores e autorizar cedência daqueles que forem solicitados pelo OLMC, desde que o trabalhador dê o seu consentimento.
Artigo 12.º
Norma revogatória
São revogados:
a) O artigo 44.º do Decreto-Lei 140/2006, de 26 de julho, alterado pelo Decreto-Lei 231/2012, de 26 de outubro;
b) O artigo 58.º do Decreto-Lei 172/2006, de 23 de agosto, alterado pela Lei 7-A/2016, de 30 de março.
Artigo 13.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 26 de janeiro de 2017. - António Luís Santos da Costa - Manuel de Herédia Caldeira Cabral.
Promulgado em 20 de fevereiro de 2017.
Publique-se.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Referendado em 14 de março de 2017.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.