de 22 de Abril
Com a assinatura e ratificação da Convenção Europeia Relativa à Protecção dos Animais nos Locais de Criação por parte dos Estados membros da União Europeia e a sua aprovação pela Decisão n.º 78/923/CEE, ficaram os Estados membros, incluindo Portugal, vinculados ao respeito pelos princípios ali estabelecidos.Tais princípios incidem no alojamento, alimentação e cuidados apropriados às necessidades fisiológicas e etológicas dos animais de interesse pecuário, de acordo com a experiência prática e os conhecimentos científicos.
Atendendo à necessidade de se estabelecerem normas mínimas comuns relativas à protecção dos animais nas explorações pecuárias, de modo a não falsear as condições de concorrência, a permitir um desenvolvimento racional da produção e a facilitar a organização do comércio de animais, tendo em conta, nomeadamente, as disposições em matéria de bem-estar já existentes na regulamentação nacional;
Havendo, ainda, necessidade de transpor para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 98/58/CE, do Conselho, de 20 de Julho, relativa à protecção dos animais nas explorações pecuárias;
Ouvidos os órgãos de governo próprios das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira;
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta, para valer como lei geral da República, o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objecto
O presente diploma transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 98/58/CE, do Conselho, de 20 de Julho, estabelecendo as normas mínimas de protecção dos animais nas explorações pecuárias.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 - Excluem-se do âmbito de aplicação deste diploma:a) Os animais em meio selvagem;
b) Os animais destinados a concursos, espectáculos e manifestações ou actividades culturais, desportivas ou outras similares;
c) Os animais utilizados para fins experimentais ou outros fins científicos;
d) Os animais invertebrados.
2 - O presente diploma é aplicável sem prejuízo das disposições específicas constantes dos Decretos-Leis n.os 406/89, de 16 de Novembro, 113/94, de 2 de Maio, e 270/93, de 4 de Agosto.
Artigo 3.º
Definições
Para efeitos do presente diploma entende-se por:a) Animal: qualquer espécimen vivo da fauna, criado ou mantido para a produção de géneros alimentícios, lã, pele com ou sem pelo, ou para outros fins agro-pecuários;
b) Proprietário ou detentor: qualquer pessoa singular ou colectiva responsável ou que tenha a seu cargo animais a título permanente ou temporário;
c) Exploração: qualquer estabelecimento, construção ou, no caso de uma exploração agrícola ao ar livre, qualquer local onde sejam alojados, criados ou manipulados os animais abrangidos pelo presente diploma;
d) Alojamento: qualquer instalação, edifício ou grupo de edifícios ou outro local, podendo incluir zona não completamente fechada ou coberta, ou instalações móveis, onde os animais se encontram mantidos;
e) Bem-estar animal: estado de equilíbrio fisiológico e etológico do animal;
f) Controlo veterinário: qualquer controlo físico ou formalidade administrativa relativa aos animais vivos e que vise, directa ou indirectamente, assegurar a protecção da saúde pública ou animal;
g) Autoridade sanitária veterinária nacional: a Direcção-Geral de Veterinária (DGV);
h) Autoridade sanitária veterinária regional: as direcções regionais de agricultura (DRA).
CAPÍTULO II
Disposições especiais
Artigo 4.º
Obrigações do proprietário ou detentor
1 - O proprietário ou detentor dos animais deve tomar todas as medidas necessárias para assegurar o bem-estar dos animais ao seu cuidado e para garantir que não lhe sejam causadas dores, lesões ou sofrimentos desnecessários.
2 - O proprietário ou detentor de animais deve salvaguardar que os mesmos não causem quaisquer danos em pessoas ou noutros animais.
3 - O proprietário ou detentor dos animais deve apresentar junto da autoridade sanitária veterinária regional da área de jurisdição da sua exploração, no prazo de 120 dias a contar da data de publicação do presente diploma, ou no início da sua actividade, declaração conforme modelo constante do anexo B ao presente diploma e que dele faz parte integrante.
4 - É obrigatória a comunicação à DRA da área de jurisdição da exploração da alteração de algum dos elementos constantes da declaração referida no n.º 3.
5 - O disposto no n.º 3 não se aplica aos proprietários ou detentores de animais abrangidos por diplomas legais que imponham a declaração de existências.
Artigo 5.º
Condições da exploração
1 - As condições em que os animais são criados e mantidos devem obedecer ao disposto no anexo A ao presente diploma, do qual faz parte integrante, tendo em conta as diferentes espécies e o seu nível de desenvolvimento, adaptação e domesticação e as suas necessidades fisiológicas e etológicas, segundo os conhecimentos científicos actuais.2 - O disposto no número anterior do presente artigo não se aplica aos peixes, répteis e anfíbios.
Artigo 6.º
Controlos
1 - A fim de garantir a observância do disposto no presente diploma, as DRA efectuam inspecções periódicas, as quais devem abranger pelo menos 10% do número de explorações existentes na sua área de jurisdição, e que podem ser efectuadas em simultâneo com controlos realizados para outros fins.2 - Das inspecções realizadas ao abrigo do disposto no número anterior, é elaborado relatório anual que é enviado à DGV até ao final de Fevereiro de cada ano.
3 - O relatório anual referido no número anterior deve ser elaborado em conformidade com o normativo a definir pela DGV.
CAPÍTULO III
Regime sancionatório
Artigo 7.º
Fiscalização
1 - Compete à DGV e às DRA assegurar a fiscalização da observância das normas constantes do presente diploma, sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades.2 - Sempre que estiverem em causa graves riscos para o bem-estar das pessoas e dos outros animais, a autoridade sanitária veterinária nacional pode determinar as medidas de natureza sanitária e de maneio adequadas para pôr termo a tais riscos, podendo inclusive determinar o abate compulsivo dos animais.
3 - Para execução das medidas previstas no número anterior, devem prestar toda a colaboração as autoridades administrativas e policiais.
Artigo 8.º
Contra-ordenações
1 - Constitui contra-ordenação, punível com coima de 50 000$00 a 750 000$00 ou 9 000 000$00, consoante o agente seja pessoa singular ou colectiva, a violação do disposto no artigo 4.º e no anexo A a que se reporta no n.º 1 do artigo 5.º 2 - A tentativa e a negligência são puníveis.3 - A coima não deverá ser inferior ao benefício económico que o agente retirou do acto ilícito, não podendo, contudo, exceder um terço do limite previsto no n.º 1.
Artigo 9.º
Sanções acessórias
Consoante a gravidade da contra-ordenação e a culpa do agente, poderão ser aplicadas simultaneamente com a coima, nos termos da lei geral, as seguintes sanções acessórias:a) Interdição do exercício de uma profissão ou actividade cujo exercício dependa de título público de autorização ou homologação da autoridade pública;
b) Privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidades ou serviços públicos;
c) Privação do direito à concessão de serviços públicos e a atribuição de licenças ou alvarás;
d) Encerramento de estabelecimento cujo funcionamento esteja sujeito à autorização ou licença de autoridade administrativa;
e) Suspensão de autorizações, licenças e alvarás.
Artigo 10.º
Instrução, aplicação e destino das coimas
1 - Compete às DRA a instrução dos processos de contra-ordenação.
2 - Compete ao director-geral de Veterinária a aplicação da coima.
3 - A afectação do produto das coimas cobradas em aplicação do artigo 8.º far-se-á da seguinte forma:
a) 10% para a entidade que levantou o auto;
b) 20% para a entidade que instruiu o processo;
c) 10% para a entidade que aplicou a coima;
d) 60% para os cofres do Estado.
Artigo 11.º
Nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, as competências previstas no presente diploma são exercidas pelo serviços competentes das respectivas administrações regionais, sem prejuízo das competências atribuídas à autoridade sanitária veterinária nacional.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 3 de Fevereiro de 2000. - António Manuel de Oliveira Guterres - Fernando Manuel dos Santos Gomes - Joaquim Augusto Nunes Pina Moura - Joaquim Augusto Nunes Pina Moura - António Luís Santos Costa - Luís Manuel Capoulas Santos.
Promulgado em 28 de Março de 2000.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 6 de Abril de 2000.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.
ANEXO A
Recursos humanos
1 - Os animais devem ser cuidados e tratados por pessoal em número suficiente e que possua as capacidades, conhecimentos e competência profissional adequados.
Inspecção
2 - Todos os animais mantidos em explorações pecuárias cujo bem-estar dependa de cuidados humanos frequentes devem ser inspeccionados pelo menos uma vez por dia e os mantidos noutros sistemas serão inspeccionados com a frequência necessária para evitar qualquer sofrimento desnecessário.3 - Deve existir a todo o momento iluminação artificial adequada (fixa ou portátil) que permita a inspecção dos animais em qualquer altura.
4 - Os animais que pareçam estar doentes ou lesionados devem receber cuidados adequados e, quando necessário, serem tratados por um médico veterinário.
5 - Sempre que se justifique, os animais doentes ou lesionados devem ser isolados em instalações adequadas e equipadas, se for caso disso, com uma cama seca e confortável.
Registos
6 - O proprietário ou detentor dos animais deve manter um registo dos tratamentos ministrados e do número de casos de mortalidade verificados em cada inspecção, podendo para tal fim ser utilizado um registo já existente para outros efeitos.7 - Aqueles registos serão mantidos por um período de, pelo menos, três anos, devendo estar à disposição das autoridades competentes durante as inspecções e sempre que sejam solicitados.
Liberdade de movimentos
8 - A liberdade de movimentos própria dos animais, tendo em conta a espécie e de acordo com a experiência prática e os conhecimentos científicos, não será restringida de forma a causar-lhes lesões ou sofrimentos desnecessários e, nomeadamente, deve permitir que os animais se levantem, deitem e virem sem quaisquer dificuldades.9 - Quando os animais estejam permanente ou habitualmente presos ou amarrados, deverão dispor do espaço adequado às necessidades fisiológicas e etológicas, de acordo com a experiência prática e os conhecimentos científicos.
Instalações e alojamento
10 - Os materiais utilizados na construção de alojamentos, em especial dos compartimentos e equipamentos com que os animais possam estar em contacto, não devem causar danos e devem poder ser limpos e desinfectados a fundo.
11 - Os alojamentos e os dispositivos necessários para prender os animais devem ser construídos e mantidos de modo que não existam arestas nem saliências aceradas susceptíveis de provocar ferimentos aos animais.
12 - O isolamento, o aquecimento e a ventilação dos edifícios devem assegurar que a circulação do ar, o teor de poeiras, a temperatura, a humidade relativa do ar e as concentrações de gases se mantenham dentro dos limites que não sejam prejudiciais aos animais.
13 - Os animais mantidos em instalações fechadas não devem estar nem em permanente escuridão, nem serem expostos à luz artificial sem que haja um período adequado de obscuridade, mas, no entanto, sempre que a luz natural disponível for insuficiente para contemplar as necessidades fisiológicas e etológicas dos animais deve ser providenciada iluminação artificial adequada.
Animais criados ao ar livre
14 - Os animais criados ao ar livre devem dispor, na medida do possível e se necessário, de protecção contra as intempéries, os predadores e os riscos sanitários.
Equipamento automático ou mecânico
15 - Todo o equipamento automático ou mecânico indispensável para a saúde e o bem-estar dos animais deve ser inspeccionado, pelo menos, uma vez ao dia e quaisquer anomalias eventualmente detectadas devem ser imediatamente corrigidas ou, quando tal não for possível, devem ser tomadas medidas para salvaguardar a saúde e o bem-estar dos animais.16 - Quando a saúde e o bem-estar dos animais depender de sistemas de ventilação artificial, devem ser tomadas providências para que exista um sistema de recurso alternativo adequado, que garanta uma renovação do ar suficiente para manter a saúde e o bem-estar dos animais na eventualidade de uma falha do sistema principal e, ainda, deve existir um sistema de alarme que advirta de qualquer avaria, o qual deve ser testado regularmente.
Alimentação, água e outras substâncias 17 - Todos os animais devem ser alimentados com uma dieta equilibrada, adequada à idade e à respectiva espécie e em quantidade suficiente para os manter em bom estado de saúde e para satisfazer as suas necessidades nutricionais, não devendo ser fornecidos aos animais alimentos sólidos ou líquidos de um modo tal, ou que contenham substâncias tais, que possam causar-lhes sofrimento ou lesões desnecessários.
18 - Todos os animais devem ter acesso à alimentação a intervalos apropriados às suas necessidades fisiológicas.
19 - Os animais devem ter acesso a uma quantidade de água suficiente e de qualidade adequada ou poder satisfazer as necessidades de abeberamento de outra forma.
20 - O equipamento de fornecimento de alimentação e de água deve ser concebido, construído e colocado de modo a minimizar os riscos de contaminação dos alimentos e da água e os efeitos lesivos que podem resultar da luta entre os animais para acesso aos mesmos.
21 - Não serão administradas aos animais quaisquer substâncias com excepção das necessárias para efeitos terapêuticos ou profilácticos ou destinadas ao tratamento zootécnico, conforme o disposto no Decreto-Lei 150/99, de 7 de Maio, a menos que estudos científicos sobre o bem-estar animal ou a experiência tenham demonstrado que os efeitos dessas substâncias não são lesivos da saúde ou do bem-estar do animal.
Mutilações
22 - Até à adopção de medidas específicas e sem prejuízo do disposto na Portaria 274/94, de 7 de Maio, são aplicáveis todas as outras disposições nacionais sobre a matéria.
Processos de reprodução
23 - São proibidos todos os processos de reprodução que causem ou sejam susceptíveis de causar sofrimento ou lesões aos animais, exceptuando-se os métodos ou processos passíveis de causar sofrimento ou ferimentos mínimos ou momentâneos ou de exigir uma intervenção que não cause lesões permanentes.24 - Os animais só podem ser mantidos em explorações pecuárias se, com base no respectivo genótipo ou fenótipo, tal não vier a ter efeitos prejudiciais para a saúde ou bem-estar dos mesmos.
(ver modelos no documento original)