de 22 de Fevereiro
Uma correcta gestão dos recursos hídricos passa por uma adequada política de planeamento, assente numa abordagem integrada territorialmente e numa perspectiva qualitativa e quantitativa do meio.O apoio no planeamento reveste-se da maior importância, verificada a inexistência de abundância sustentada de água associada à enorme irregularidade espacial e temporal, o que obriga a uma gestão rigorosa, para além da realização de pesados investimentos em infra-estruturas.
O meio hídrico, como ecossistema, reveste-se de enorme sensibilidade e requer a tomada de medidas específicas de salvaguarda das suas características biofísicas.
A adopção do modelo institucional das direcções regionais do ambiente e recursos naturais, assente numa repartição administrativa do território que se reflecte na gestão da água, torna imprescindível o planeamento integrado por bacia que constitua verdadeiro instrumento orientador da gestão.
Desta forma, a Administração, com base no diagnóstico da situação e com recurso ao planeamento integrado, fica em condições de, em alternativa à gestão casuística, desenvolver uma política, no tempo e no espaço, dos recursos hídricos disponíveis.
O modelo de planeamento integrado que ora se cria, constituindo um modelo mais moderno, dinâmico e adequado à gestão das bacias hidrográficas, tem como consequência a necessidade de se fazer cessar no rio Douro a actuação do Gabinete de Navegabilidade do Douro, que, tendo cumprido os seus objectivos, se revela, face ao novo modelo, como uma forma menos abrangente de gerir a problemática do rio Douro.
Assim:
No uso da autorização legislativa concedida pelo artigo 2.° da Lei n.° 62/93, de 20 de Agosto, e nos termos das alíneas a) e b) do n.° 1 do artigo 201.° da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.°
Objecto
O presente diploma regula o processo de planeamento de recursos hídricos e a elaboração e aprovação dos planos de recursos hídricos.
Artigo 2.°
Planeamento de recursos hídricos
1 - O planeamento é concretizado mediante planos de recursos hídricos.2 - O planeamento de recursos hídricos tem por objectivos gerais a valorização, a protecção e a gestão equilibrada dos recursos hídricos nacionais, assegurando a sua harmonização com o desenvolvimento regional e sectorial através da economia do seu emprego e racionalização dos seus usos.
3 - O planeamento deve observar os seguintes requisitos:
a) Globalidade, baseando-se numa abordagem conjunta e interligada dos aspectos técnicos, económicos, ambientais e institucionais;
b) Racionalidade, visando a optimização da exploração das várias origens da água e a satisfação das várias necessidades, articulando a procura e a oferta e salvaguardando a preservação quantitativa e qualitativa dos recursos hídricos, bem como uma aplicação económica dos recursos financeiros:
c) Integração, em articulação com o planeamento dos sectores de utilização, com o planeamento regional, com o ordenamento do território e com a conservação e protecção do ambiente;
d) Participação, envolvendo agentes económicos e as populações directamente interessadas e visando o alargamento de consensos;
e) Estratégia, dando respostas imediatas face à informação disponível.
Artigo 3.°
Zonas de protecção
1 - Podem ser classificadas de protecção determinadas zonas, nomeadamente bacias ou partes de bacias, aquíferos ou massas de água que pelas suas características naturais e valor ambiental, económico ou social assumam interesse público.2 - Quando forem classificadas as zonas de protecção referidas no número anterior, os planos de recursos hídricos devem conter a sua classificação e as condições específicas para a sua protecção.
3 - As condições referidas no número anterior devem ser observadas nos instrumentos de ordenamento do território.
4 - As zonas de protecção devem incluir as áreas integradas na Reserva Ecológica Nacional, nos termos da legislação em vigor.
CAPÍTULO II
Planos de recursos hídricos
Artigo 4.°
Tipologia
1 - Os planos de recursos hídricos compreendem:a) O Plano Nacional da Água (PNA), que abrange todo o território nacional;
b) Os planos de bacia hidrográfica (PBH), que abrangem as seguintes bacias hidrográficas:
i) Bacia hidrográfica do Minho;
ii) Bacia hidrográfica do Lima;
iii) Bacia hidrográfica do Cávado;
iv) Bacia hidrográfica do Ave;
v) Bacia hidrográfica do Douro;
vi) Bacia hidrográfica do Leça;
vii) Bacia hidrográfica do Vouga;
viii) Bacia hidrográfica do Mondego;
ix) Bacia hidrográfica do Lis;
x) Bacia hidrográfica das ribeiras do Oeste;
xi) Bacia hidrográfica do Tejo;
xii) Bacia hidrográfica do Sado;
xiii) Bacia hidrográfica do Mira;
xiv) Bacia hidrográfica do Guadiana;
xv) Bacia hidrográfica das ribeiras do Algarve.
2 - Podem existir planos que abranjam pequenos cursos de água relativamente aos quais se justifique o mencionado plano por razões ambientais.
Artigo 5.°
Competência
1 - A elaboração do PNA e dos PBH do Minho, Douro, Tejo e Guadiana compete ao Instituto da Água (INAG).2 - A elaboração dos restantes PBH compete às direcções regionais do ambiente e recursos naturais (DRARN), respectivamente:
a) À DRARN do Norte, os PBH do Lima, Cávado, Ave e Leça:
b) À DRARN do Centro, os PBH do Vouga, Mondego e Lis;
c) À DRARN de Lisboa e Vale do Tejo, o PBH das ribeiras do Oeste;
d) À DRARN do Alentejo, os PBH do Sado e do Mira;
e) À DRARN do Algarve, o PBH das ribeiras do Algarve.
3 - O PNA é aprovado por decreto-lei e os PBH são aprovados por decreto regulamentar.
4 - Após a aprovação do PNA, devem os PBH, nomeadamente aqueles em que há transferência de água de ou para outras bacias, ser alterados em conformidade com aquele.
Artigo 6.°
Conteúdo dos planos
1 - Os planos de recursos hídricos são constituídos por peças gráficas e escritas e contêm obrigatoriamente:a) Diagnóstico, incluindo inventários e análises da situação;
b) Definição dos objectivos ambientais de curto, médio e longo prazos:
c) Proposta de medidas e acções, com análise de cenários alternativos e com definição de prioridades;
d) Programação física, financeira e institucional da implantação das medidas e acções seleccionadas.
2 - Os PBH devem conter:
a) Um diagnóstico que inclui obrigatoriamente:
i) O inventário das disponibilidades de recursos hídricos superficiais e subterrâneos, incluindo o caudal sólido, com sua caracterização quantitativa e qualitativa;
ii) O inventário e análise dos usos de recursos hídricos, actuais e futuros, incluindo as fontes poluidoras, com a sua caracterização quantitativa e qualitativa;
iii) O inventário dos ecossistemas aquáticos e zonas húmidas
relevantes;
iv) O inventário das infra-estruturas hidráulicas e de saneamento básico existentes e projectadas;v) O inventário dos sítios de interesse patrimonial e arqueológico;
vi) O balanço das disponibilidades e necessidades actuais e futuras, identificando as zonas e situações de carência;
vii) A identificação de zonas e situações de risco, nomeadamente cheias, erosão e contaminação;
viii) A avaliação das situações de cheia e de seca;
b) Uma proposta de medidas e acções que inclui obrigatoriamente:
i) A classificação das linhas de água em função dos usos:
ii) A classificação dos cursos de água, lagos ou lagoas navegáveis ou flutuáveis, e não navegáveis nem flutuáveis;
iii) As acções de protecção e valorização da rede hidrográfica;
iv) As acções de protecção e valorização das águas subterrâneas;
v) A previsão dos rios e ou troços de rios onde se aplica a taxa de regularização;
vi) A definição de zonas a sujeitar a um ordenamento específico, nomeadamente albufeiras e orla costeira;
vii) A proposta de classificação de zonas de protecção, nos termos definidos no artigo 3.°;
viii) A identificação e selecção de projectos de infra-estruturas hidráulicas e de saneamento básico multimunicipais a executar;
ix) As acções de regularização e controlo de cheias;
x) Os balanços sedimentológicos;
c) A programação física, financeira e institucional que inclui obrigatoriamente:
i) A calendarização das acções;
ii) O investimento previsto e fontes de financiamento;
iii) As entidades responsáveis pela execução das medidas e pelo seu acompanhamento e controlo;
iv) A elaboração de uma rede de monitorização.
3 - O PNA deve conter:
a) Um diagnóstico que inclui obrigatoriamente:
i) A síntese dos diagnósticos efectuados pelo PBH;
ii) A hierarquização dos problemas e potencialidades identificados;
b) Uma definição de objectivos que inclui obrigatoriamente:
i) A síntese, articulação e hierarquização dos objectivos definidos pelos
PBH;
ii) As formas de convergência entre os objectivos da política de recursos hídricos e os objectivos globais da política económica e social;c) Uma proposta de medidas e acções que inclui obrigatoriamente:
i) As medidas necessárias para a coordenação dos diferentes PBH e a selecção das alternativas aí apresentadas, em articulação com os diferentes planos sectoriais e de ordenamento do território;
ii) A definição de zonas e de vertentes de intervenção prioritária a nível nacional e de medidas e acções correspondentes;
iii) A definição de programas e projectos de escala nacional, nomeadamente a previsão e condições de transferência de água entre bacias hidrográficas;
iv) As medidas necessárias à articulação com Espanha do planeamento e gestão dos cursos de água internacionais;
d) A programação física, financeira e institucional que inclui obrigatoriamente:
i) A calendarização das acções de escala nacional;
ii) Os critérios de financiamento dos programas e projectos nacionais e regionais;
iii) A definição de procedimentos administrativos e legais necessários à execução dos planos;
iv) As entidades responsáveis pela execução das medidas e pelo seu acompanhamento e controlo.
Artigo 7.°
Prazos
1 - O PNA deve estar concluído no prazo máximo de três anos.2 - Os PBH devem estar concluídos no prazo máximo de dois anos.
Artigo 8.°
Validade dos planos
1 - O PNA tem a duração máxima de 10 anos e deve ser obrigatoriamente revisto no prazo máximo de 8 anos.2 - Os PBH têm a duração máxima de 8 anos e devem ser obrigatoriamente revistos no prazo máximo de 6 anos.
CAPÍTULO III
Órgãos
Artigo 9.°
Conselho Nacional da Água
1 - É criado, como órgão consultivo de planeamento nacional, o Conselho Nacional da Água (CNA), em que estão representadas a Administração Pública e as organizações profissionais e económicas mais representativas, de âmbito nacional, relacionadas com os distintos usos da água.2 - O CNA é constituído por 1 presidente, 1 vice-presidente, 1 secretário-geral e 39 vogais.
3 - É presidente do CNA o Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.
4 - O vice-presidente e o secretário-geral são nomeados pelo Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.
5 - São vogais do Conselho Nacional da Água:
a) O presidente do INAG;
b) O director-geral do Ambiente;
c) O director-geral do Desenvolvimento Regional;
d) O director-geral do Ordenamento do Território;
e) O director-geral da Energia;
f) O director-geral da Indústria;
g) O presidente do Instituto de Estruturas Agrárias e Desenvolvimento Rural;
h) O director-geral da Saúde;
i) O director-geral do Turismo;
j) O presidente do Instituto Português de Investigação Marítima;
l) O presidente do Instituto Florestal;
m) O presidente do Instituto da Conservação da Natureza;
n) Um representante do Ministério da Defesa Nacional;
o) Um representante do Ministério do Mar;
p) 12 representantes da Associação Nacional de Municípios Portugueses, 6 de organismos não governamentais da área do ambiente e 6 de entidades científicas e de investigação, por eles nomeados;
q) Um representante da Electricidade de Portugal, S. A.
6 - O presidente do CNA pode constituir grupos de trabalho e de apoio ao funcionamento do conselho com funcionários ou agentes da Administração Pública ou outras pessoas de reconhecido prestígio e experiência em matéria de águas.
7 - O Conselho reúne, ordinariamente, duas vezes por ano e, extraordinariamente, sempre que convocado pelo seu presidente, por sua iniciativa ou a pedido da maioria dos seus membros.
8 - As deliberações são tomadas por maioria, tendo o presidente voto de qualidade.
9 - Os vogais referidos nas alíneas a) a o) do n.° 5 podem designar um substituto, no caso de impossibilidade de presença devidamente justificada.
Artigo 10.°
Competências do CNA
1 - Compete ao CNA:a) Acompanhar a elaboração do PNA e informar a proposta do Plano antes da sua aprovação pelo Ministro do Ambiente e Recursos Naturais;
b) Informar os planos e projectos de interesse geral que afectem substancialmente o planeamento dos recursos hídricos ou os usos da água;
c) Informar as questões comuns a duas ou mais DRARN em relação ao aproveitamento dos recursos hídricos;
d) Emitir informações sobre todas as questões relacionadas com os recursos hídricos que lhe sejam submetidas pelo Ministro do Ambiente e Recursos Naturais;
e) Propor linhas de estudo e investigação para o desenvolvimento de inovações técnicas no que se refere à disponibilização, utilização, conservação, recuperação, tratamento integral e economia da água.
2 - Para efeitos de aplicação da alínea b) do número anterior, entende-se que os planos e projectos de interesse geral afectam substancialmente o planeamento dos recursos hídricos ou os usos da água se a sua execução implicar a revisão dos PBH.
3 - Compete ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, por iniciativa própria ou sob proposta do ministério interessado, em cada caso, remeter ao CNA os planos e projectos referidos no número anterior.
Artigo 11.°
Conselho de bacia
1 - É criado, como órgão consultivo de planeamento regional, o conselho de bacia (CB), em que estão representados os organismos do Estado relacionados com o uso da água e os utilizadores.2 - Existe um conselho de bacia para cada um dos PBH.
Artigo 12.°
Competências do CB
1 - Compete ao CB:a) Acompanhar a elaboração do PBH e informar o projecto do PBH antes da sua aprovação e suas posteriores revisões;
b) Estabelecer o montante da taxa de regularização;
c) Informar e formular propostas de interesse geral para a bacia;
d) Propor objectivos de qualidade da água na bacia hidrográfica de acordo com os diversos usos actuais e futuros;
e) Propor a realização de estudos hidrológicos relevantes para a bacia:
f) Dar parecer sobre esquemas e obras de aproveitamentos hidráulicos;
g) Dar parecer sobre todas as questões relativas à repartição das águas e às medidas a tomar contra a poluição;
h) Elaborar e aprovar o seu orçamento e o relatório de contas:
i) Elaborar o plano de actividades.
2 - O CB é constituído por 1 presidente, 1 vice-presidente, 1 secretário e 34 vogais.
3 - É presidente do CB o respectivo director regional do Ambiente e Recursos Naturais e, no caso dos CB do Minho, Douro, Tejo e Guadiana, o presidente do INAG, com faculdade de nomear substituto.
4 - O vice-presidente e o secretário são nomeados pelo MARN.
5 - São vogais do CB:
a) 3 representantes dos Ministério da Agricultura;
b) 3 representantes do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais;
c) 2 representantes do Ministério do Planeamento e da Administração do Território;
d) 2 representantes do Ministério da Indústria e Energia;
e) 2 representantes do Ministério da Saúde:
f) 2 representantes do Ministério do Comércio e Turismo;
g) 2 representantes do Ministério do Mar;
h) 16 representantes dos utilizadores que assegurem a representatividade dos distintos sectores em relação aos interesses pelo uso da água, 8 dos quais nomeados pela Associação Nacional de Municípios Portugueses;
i) 2 representantes de organizações não governamentais no domínio do ambiente.
6 - Cada conselho de bacia elabora o seu regimento interno, que é submetido a homologação do Ministro do Ambiente e Recursos Naturais, devendo ter um funcionamento periódico, no mínimo trimestral.
CAPÍTULO IV
Disposições finais
Artigo 13.°
Articulação com outros planos
As acções e medidas definidas nos planos de recursos hídricos devem ser previstas em todos os instrumentos de planeamento que definam ou determinem a ocupação física do solo, designadamente planos regionais e municipais de ordenamento do território.
Artigo 14.°
Gabinete de Navegabilidade do Douro
1 - É extinto o Gabinete de Navegabilidade do Douro (GND), criado pelo Decreto-Lei n.° 127/85, de 26 de Abril.2 - Os funcionários que estavam afectos ao GND em regime de comissão de serviço, requisição ou destacamento regressam aos lugares de origem.
3 - Os funcionários do quadro do GND são considerados disponíveis, nos termos da lei geral.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 7 de Outubro de 1993. - Aníbal António Cavaco Silva - Joaquim Fernando Nogueira - Luís Francisco Valente de Oliveira - Arlindo Marques da Cunha - Luís Fernando Mira Amaral - Joaquim Martins Ferreira do Amaral - Arlindo Gomes de Carvalho - António José Fernandes de Sousa - Maria Teresa Pinto Basto Gouveia - Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Promulgado em 21 de Janeiro de 1994.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 25 de Janeiro de 1994.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva