de 29 de Setembro
A regulamentação da base XIX da Lei n.° 48/90, de 24 de Agosto, fundamenta-se na necessidade de clarificar, sistematizar e unificar as disposições respeitantes à organização, nomeação e atribuições da autoridade de saúde.A relevância da figura institucional da autoridade sanitária, fortemente estribada na tradição administrativa portuguesa, está amplamente consagrada em documentação legal há quase um século.
O seu campo de intervenção alargou-se consideravelmente com o tempo. Há muito que se ultrapassou o conceito restrito médico-sanitário e ambientalista, enformado pelo padrão da patologia por longo tempo dominante, a das doenças infecto-contagiosas.
Os pontos de contacto cada vez mais frequentes da área de influência e da prática das delegações de diversos ministérios, com áreas tradicionalmente entendidas como da vocação da autoridade sanitária, não apagou o seu papel, antes faz um apelo mais forte ao estreitar da colaboração inter-institucional.
Múltiplas razões conferem-lhe um papel acrescido na saúde e dão o devido relevo à necessidade de participação do Ministério da Saúde em muitas áreas específicas, decorrente da continuidade e da abrangência dos serviços a prestar:
O limiar de desenvolvimento, com o cortejo de problemas de saúde inerente, o binómio saúde/ambiente, presente na multiplicidade de abordagens ambientais, ecológicas e ergonómicas, a fragilidade da cadeia alimentar, os novos padrões de doença e os antigos e mais recentes grupos populacionais vulneráveis ou de risco;
A progressiva exigência de qualidade nos equipamentos colectivos e nos desempenhos e procedimentos relativos a direitos fundamentais dos cidadãos, desde a prestação de serviços no âmbito da saúde, de lazer, de apoio comunitário, à habitação, qualidade de vida e dos locais de trabalho, à premência da investigação epidemiológica e à promoção da saúde.
A autoridade de saúde, órgão com autonomia, faz parte integrante das estruturas dos serviços de saúde a todos os níveis.
A figura da autoridade regional de saúde introduz unidade e pertinência na acção e dá oportunidade ao planeamento e à coordenação em áreas territoriais mais amplas.
A designação funcional de delegado de saúde nos concelhos, que o presente diploma retoma, mantém-se bem viva na terminologia do cidadão comum.
A articulação funcional intersectorial ganha sobremaneira com a manutenção da área administrativa mínima da autoridade de saúde ao nível do concelho. O que não restringe o estabelecimento de organização específica nos grandes aglomerados urbanos.
Também o trabalho de equipa pluridisciplinar no domínio da autoridade de saúde em qualquer dos graus é susceptível de maximalizar a rendibilidade organizativa. E pode substituir com vantagem a pulverização das acções autónomas em áreas menores que as do concelho.
Ao alargar-se o universo de situações passíveis de aplicação de sanções legais por parte da autoridade de saúde, reforça-se a sua capacidade de intervenção expedita em defesa da saúde pública.
Contudo, a importância e a adequação deste decreto-lei podem ainda aferir-se pelo modo como, ao alongar-se a cadeia hierárquica, não se restringem os limites para o planeamento, a intervenção autónoma e a responsabilidade na decisão da autoridade de saúde do concelho, deste modo não diluída nos vários patamares da hierarquia.
A este nível se dirimem questões muito delicadas, com a exigência de opções quotidianas firmes, responsáveis, de prestígio na acção, fortes como valores paradigmáticos.
Foram ouvidos o Conselho Económico e Social e as organizações sindicais e representativas dos trabalhadores envolvidos.
Assim:
No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela base XIX da Lei n.° 48/90, de 24 de Agosto, e nos termos da alínea c) do n.° 1 do artigo 201.° da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.°
Âmbito
O presente diploma estabelece as regras de nomeação, competência e funcionamento das entidades que exercem o poder de autoridade de saúde.
Artigo 2.°
Definição
1 - Para efeitos do presente diploma entende-se por autoridade de saúde o poder de intervenção do Estado na defesa da saúde pública, na prevenção da doença e promoção e manutenção da saúde, pela prevenção dos factores de risco e controlo de situações susceptíveis de causarem ou acentuarem prejuízos graves à saúde da pessoa ou dos aglomerados populacionais.2 - A autoridade de saúde compreende ainda os poderes relativos à sanidade internacional.
Artigo 3.°
Autoridades de saúde
1 - As autoridades de saúde situam-se a nível nacional, regional e concelhio.2 - As autoridades de saúde dependem hierarquicamente do Ministro da Saúde.
3 - A autoridade de saúde de âmbito nacional é o director-geral da Saúde.
4 - As autoridades de saúde de âmbito regional são os delegados regionais de saúde.
5 - As autoridades de saúde de âmbito concelhio são os delegados concelhios de saúde.
Artigo 4.°
Nomeação
1 - Os delegados de saúde regionais e concelhios e seus adjuntos são nomeados por despacho do Ministro da Saúde, sob proposta dos conselhos de administração das respectivas administrações regionais de saúde e parecer do director-geral da Saúde.2 - As nomeações referidas no número anterior são efectuadas, pelo período de três anos, renovável, de entre médicos da carreira médica de saúde pública ou, a não ser possível, transitoriamente, de entre médicos das outras carreiras.
Artigo 5.°
Competência
1 - Às autoridades de saúde compete a vigilância das decisões dos órgãos e serviços executivos do Estado em matéria de saúde pública, podendo suspendê-las quando as considerem prejudiciais à saúde das pessoas ou dos aglomerados populacionais.2 - Às autoridades de saúde compete, em especial:
a) Promover a investigação em saúde e a vigilância epidemiológica;
b) Vigiar o nível sanitário dos aglomerados populacionais, dos serviços, estabelecimentos e locais de utilização pública e determinar as medidas correctivas necessárias para defesa da saúde pública;
c) Ordenar a suspensão de actividade ou o encerramento dos serviços, estabelecimentos e locais referidos na alínea anterior, quando funcionem em condições de grave risco para a saúde pública;
d) Desencadear o internamento ou a prestação compulsiva de cuidados de saúde a indivíduos em situação de prejudicarem a saúde pública, nos termos da lei;
e) Exercer a vigilância sanitária das fronteiras;
f) Proceder à requisição de serviços, estabelecimentos e profissionais de saúde em caso de epidemias graves e outras situações semelhantes;
3 - Quando ocorram situações de catástrofe ou de outra grave emergência de saúde, o Ministro da Saúde toma as medidas necessárias de excepção que forem indispensáveis, coordenando a actuação dos serviços centrais do Ministério com os órgãos do Serviço Nacional de Saúde e os vários níveis de autoridades de saúde.
Artigo 6.°
Director-geral da Saúde
Ao director-geral da Saúde compete:a) Dirigir e supervisionar a actividade das autoridades de saúde, de acordo com a lei e as instruções superiormente emanadas;
b) Exercer, em situações de emergência sanitária grave, mediante simples declaração pública do Ministro da Saúde, as competências de mobilização, coordenação e utilização dos meios disponíveis, ainda que de estabelecimentos de saúde em actividade privada.
Artigo 7.°
Delegados regionais de saúde
1 - Aos delegados regionais de saúde compete:a) Orientar, coordenar e apoiar a execução dos programas das actividades dos delegados de saúde concelhios;
b) Fazer cumprir as normas que tenham por objecto a defesa da saúde pública, requerendo, quando necessário, o apoio das autoridades administrativas e policiais;
c) Prestar a colaboração que lhes seja solicitada pela respectiva administração regional de saúde dentro da sua competência;
d) Elaborar o plano de actividades e o respectivo relatório anual, que enviarão ao director-geral da Saúde, com conhecimento ao conselho de administração da respectiva administração regional de saúde;
e) Levantar autos relativos às infracções, instruir os respectivos processos e aplicar coimas de acordo com a lei, solicitando, quando necessário, o concurso das autoridades administrativas e policiais, para o bom desempenho das suas funções;
f) Exercer os demais poderes que lhes sejam atribuídos por lei, regulamento ou que lhes hajam sido delegados ou subdelegados;
2 - Os delegados regionais de saúde são coadjuvados por adjuntos em número igual ao das sub-regiões de saúde, exercendo as competências que, por aqueles, neles forem delegadas ou subdelegadas.
3 - Os delegados regionais de saúde são substituídos nas suas ausências e impedimentos pelo adjunto ou, quando tal não seja possível, por um delegado regional de saúde, a designar pelo director-geral da Saúde.
4 - Os adjuntos referidos no n.° 2 são substituídos nas suas faltas e impedimentos por outros para o efeito designados pelo delegado regional de saúde.
Artigo 8.°
Delegados concelhios de saúde
1 - Aos delegados concelhios de saúde compete:a) Elaborar o relatório anual sobre o estado sanitário do concelho e actividades desenvolvidas, que enviará à autoridade de saúde regional, conjuntamente com a programação para o ano seguinte;
b) Fazer cumprir as normas que tenham por objecto a defesa da saúde pública;
c) Levantar autos relativos às infracções, instruir os respectivos processos e aplicar coimas de acordo com a lei, solicitando, quando necessário, o concurso das autoridades administrativas e policiais, para o bom desempenho das suas funções;
d) Participar na vistoria a que se refere o artigo 27.° do Decreto-Lei n.° 445/91, de 20 de Novembro, com a redacção dada pela Lei n.° 29/92, de 5 de Setembro;
e) Dar parecer sobre os projectos de instalação ou alteração dos estabelecimentos industriais e fiscalizar a sua laboração quanto às condições de salubridade e higiene, impondo as correcções necessárias à prevenção dos riscos para a saúde dos trabalhadores e dos aglomerados populacionais;
f) Dar parecer sobre os pedidos de licenças sanitárias das casas de espectáculos, hotéis, restaurantes e similares e estabelecimentos de venda de produtos alimentares, piscinas colectivas e parques de campismo;
g) Fiscalizar os estabelecimentos susceptíveis de serem insalubres, incómodos ou perigosos, bem como as condições de funcionamento, por si ou através dos seus agentes, e, bem assim, as condições de saúde dos trabalhadores;
h) Determinar a suspensão do trabalho e o encerramento dos respectivos locais, no todo ou em parte, quando houver grave risco para a saúde dos trabalhadores ou dos aglomerados populacionais;
i) Verificar a observância das disposições legais respeitantes à higiene e saúde dos locais de trabalho e fiscalizar os serviços médicos do trabalho;
j) Desencadear acções de prevenção de acidentes e doenças profissionais;
l) Efectuar as inspecções médicas determinadas por lei ou regulamento e passar os respectivos atestados;
m) Verificar os óbitos ocorridos no concelho, de acordo com as disposições legais, emitir atestados médico-sanitários referentes às trasladações e fiscalizar a observância das leis e regulamentos sobre inumações e enxumações;
n) Fazer cumprir as normas sobre doenças transmissíveis, incluindo a evicção dos locais de trabalho e dos estabelecimentos escolares, mantendo actualizado o registo das doenças de notificação obrigatória, e coordenar as acções em caso de epidemia;
o) Dar parecer sobre o pedido de licenciamento e fiscalizar as instituições e serviços privados prestadores de cuidados de saúde, sem prejuízo das competências legalmente atribuídas a outras entidades;
p) Fazer cumprir as disposições legais de protecção e segurança contra as radiações ionizantes;
q) Dar parecer sobre pedido de licenciamento e exercer a vigilância sanitária dos estabelecimentos termais e de engarrafamento de água de consumo humano;
r) Exercer a vigilância sanitária da qualidade da água para consumo humano, das zonas balneares e das águas para utilização recreativa;
s) Exercer, por si ou em colaboração com outras entidades, a fiscalização sanitária dos géneros alimentícios;
t) Exercer os demais poderes que lhe sejam atribuídos por lei, regulamento ou que lhe hajam sido delegados ou subdelegados;
2 - Nos concelhos e aglomerados urbanos de grande dimensão os delegados concelhios de saúde são coadjuvados por adjuntos, nomeados pelo Ministro da Saúde, sob proposta do director-geral da Saúde.
3 - O número dos adjuntos referidos no número anterior é calculado em função das condições demográficas e sanitárias das freguesias ou conjuntos de freguesias.
4 - O delegado concelhio de saúde é substituído nas suas ausências e impedimentos pelo adjunto ou, quando tal não seja possível, pelo delegado de saúde do concelho limítrofe, a designar pelo delegado regional de saúde.
5 - Os adjuntos referidos no n.° 3 são substituídos nas suas faltas e impedimentos por outros para o efeito designados pelo delegado concelhio de saúde.
Artigo 9.°
Funcionamento
1 - As funções inerentes ao exercício do poder de autoridade de saúde são autónomas das de natureza operativa dos serviços de saúde;2 - No exercício do seu poder as autoridades de saúde dispõem de instalações, apoio técnico e administrativo fornecido pelos conselhos de administração das administrações regionais de saúde respectivas.
3 - Das decisões das autoridades de saúde cabe sempre recurso hierárquico e contencioso, nos termos da lei.
Artigo 10.°
Colaboração com instituições públicas e privadas
As instituições públicas e privadas devem fornecer às autoridades de saúde os elementos por estas considerados indispensáveis à avaliação dos níveis sanitários dos aglomerados populacionais.
Artigo 11.°
Remissão
As referências à autoridade sanitária constantes de outros diplomas consideram-se feitas às autoridades de saúde criadas nos termos do presente diploma.
Artigo 12.°
Disposição transitória
As autoridades sanitárias nomeadas ao abrigo do Decreto-Lei n.° 74-C/84, de 2 de Março, mantêm-se no exercício das suas funções até que se procedam às nomeações nos termos do artigo 4.°Artigo 13.°
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor 30 dias após a data da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 29 de Julho de 1993. - Aníbal António Cavaco Silva - Jorge Braga de Macedo - José Manuel Cardoso Borges Soeiro - José Martins Nunes.
Promulgado em 3 de Setembro de 1993.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 7 de Setembro de 1993.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva