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Relatório 8/2002, de 17 de Agosto

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Relatório 8/2002. - Relatório de actividade de 2001. - Apresentação. - Em cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 13.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, vem o Conselho da Concorrência apresentar o seu relatório de actividade de 2001 ao ministro responsável pela área do comércio.

O presente relatório de actividade é o 17.º desde que o Conselho iniciou a sua actividade e será, como os anteriores, publicado no Diário da República, 2.ª série, contendo, em anexo, as decisões proferidas pelo Conselho.

Nota introdutória

O Conselho da Concorrência criado, em 1983, pelo Decreto-Lei 422/83, veio a manter quase intocada a sua composição e competência com o Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, que constitui, ainda hoje, o diploma regulador da concorrência.

Trata-se de um órgão independente da Administração, com isso se visando a necessária certeza e segurança na aplicação das regras sobre concorrência, único meio de criar e manter a segurança por parte dos agentes económicos, elemento fundamental para o desenvolvimento económico em economia do mercado.

A sua competência é vasta indo desde a decisão de processos relativos às práticas restritivas da concorrência até à aplicação de coimas pela violação dessas normas, passando pelos pareceres pedidos pelo Ministro da Economia.

As decisões do Conselho da Concorrência são assim um elemento importante de natureza doutrinária que contribuiu para a transparência das regras a que estão submetidos os agentes económicos.

Para facilitar essa tarefa o Conselho da Concorrência é obrigado, nos termos da lei, a publicar um relatório anual onde constem essas decisões.

Tal como em relatórios anteriores temos vindo a alertar - e podíamos aqui repetir o que, então, dissemos - julgamos necessária uma intervenção nesta matéria quando já são passados, praticamente 20 anos, sobre o momento em que foi publicada a primeira lei sobre a concorrência em Portugal (efectivamente aplicada) e criado o Conselho da Concorrência.

Entretanto, foram publicadas várias leis em outros países, alterada a organização institucional encarregada da aplicação da lei e mesmo o conteúdo essencial dos seus preceitos. Por outro lado, está na ordem do dia em matéria de concorrência a utilização de medidas de clemência, como processo de luta contra os cartéis e, nesse âmbito, a criação de uma norma penal.

Julgamos, por isso, oportuno repetir aqui, aquilo que dissemos na mesa redonda sobre a concorrência e os consumidores, organizado pelo Conselho Económico e Social em Março de 2001.

Dissemos aí (pp. 65 a 70):

"Com efeito, falta entre nós, uma cultura da concorrência. Falta aos agentes económicos, que ao longo dos anos, (antes e depois do 25 de Abril) se habituaram à intervenção do Estado na fixação dos preços.

A própria Direcção-Geral encarregada da concorrência tinha também funções de fixação de preços e, por isso, se designava por Direcção-Geral da Concorrência e Preços.

Falta aos agentes políticos, que em muitos casos identificam a concorrência com o comércio, de tal modo, que não se criou até hoje uma direcção-geral encarregada só da concorrência, como acontece nos outros países que têm um modelo semelhante. A junção na mesma Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, apesar de esta possuir competência que atravessa toda a economia, para além de psicologicamente induzir a uma redução da sua acção corre o risco de defender interesses e valores que são em muitos casos conflituantes.

Falta na sociedade em geral, que em face das alterações do mercado, não exige mais concorrência, mas, ao contrário, se volta para o Estado para que este fixe os preços.

Falta finalmente nas próprias universidades e na formação daqueles que virão a aplicar o direito, onde o direito da concorrência, enquanto tal, não ganhou autonomia nos respectivos currículos.

Mas não é só no domínio da cultura de concorrência que o nosso país se diferencia dos outros, ou de alguns outros.

Também no que toca a estrutura das suas autoridades da concorrência e à articulação entre elas, o País, que foi pioneiro em relação ao modelo que designámos por francês (o Conselho da Concorrência francês foi criado por Ordonnance de 1 de Dezembro de 1986), não se foi adaptando à evolução dos outros países.

É certo que em 1993 (Decreto-Lei 371/93) houve alteração do Decreto-Lei 422/83, mas essa alteração incidiu sobre a competência do Conselho (foi-lhe retirada a competência para decidir as questões relativas às práticas restritivas individuais) e não sobre a sua composição, meios, articulação com a Direcção-Geral, etc.

Mantemos assim o sistema institucional criado em 1983 perfeitamente inalterado.

Pensamos, ao contrário do que muitas vezes acontece no nosso país, que as instituições não devem dar saltos mas evoluir por forma a manter a sua própria cultura, história e memória, mas também consideramos, ainda por cima em matérias como estas, em perfeita mutação, que as instituições não devem ser estáticas.

Julgamos, por isso, que há que introduzir algumas alterações no nosso sistema institucional por forma a poderem ser cumpridas as três missões que atrás referimos.

Assim, desde logo, no que toca ao Conselho da Concorrência a fixação de condições que garantam uma mais eficiente independência aos seus membros. Não que esta não tivesse existido ao longo dos quase 18 anos da sua história mas, formalmente, não estão criadas as condições que facilitam a sua existência. A presidência do Conselho por um magistrado não é, só por si, garante dessa independência. Os magistrados são homens como quaisquer outros e colocados em posição de subordinação, de nada lhes vale a sua cultura de independência.

Nesse sentido, parece-nos essencial que o mandato dos vogais do Conselho seja fixado por um período mais alargado, devendo ser irrenovável. A possibilidade de renovação retira independência aos seus membros, que à espera da renovação podem sentir necessidade de não desagradar a quem os nomeia. E se até hoje isso não se tem feito sentir é porque o subsídio atribuído é de tal forma pouco aliciante que ninguém pensa, para o manter, hipotecar a sua independência.

Por outro lado, no que toca à sua missão de justiça, impõe-se uma alteração do sistema de controlo judicial das suas decisões.

Não tem sentido criar-se uma autoridade independente, de resto, presidida por magistrado, que tem sido até hoje oriundo dos supremos tribunais, cujos membros têm os deveres e impedimentos dos juízes, supostamente composta de elementos altamente qualificados na matéria e depois garantir-se recurso contencioso para o tribunal de 1.ª instância (seja criminal, seja do comércio). O princípio constitucional do acesso aos tribunais não impõe tal solução e este não se compadece com o rigor e celeridade das decisões, fundamentais quando estão em jogo interesses económicos muito importantes.

Com efeito, não só os juízes não tem preparação numa matéria que participa do direito dos negócios e do direito administrativo, e, por isso, extremamente complexa, especialmente para quem começa uma carreira, como a ser assim em vez de se tornar o processo de decisão mais rápido cria-se, ao contrário, mais uma instância de recurso, o que conduzirá necessariamente a um prolongamento da decisão definitiva.

É por isso que a generalidade dos países estabeleceu o princípio de que o recurso contencioso deve ser dirigido à 2.ª instância, divergindo tão-só na adopção da jurisdição comum ou jurisdição administrativa.

Mas não é só no plano do Conselho que se impõe alterações.

Também em relação à autoridade administrativa com competência para identificar e instruir os processos as alterações são necessárias.

Desde logo, a autonomização da Direcção-Geral da Concorrência, com uma dependência governamental capaz de assegurar a horizontalidade da sua acção, dotada dos meios necessários para a prossecução de um verdadeira política de concorrência, o que lhe permitiria uma actuação independente de qualquer queixa, o que nem sempre tem ocorrido.

Depois uma ligação entre o Conselho e essa Direcção-Geral que podia ser à semelhança do sistema francês actual, com a criação do representante (comissário) da Direcção-Geral no próprio Conselho.

São alterações para as quais temos vindo a alertar nos relatórios anuais desde que assumimos a responsabilidade da presidência do Conselho.

Assim, em 1997 dizíamos:

"[...] Com efeito, com o aprofundamento do mercado único, potenciado pela adopção do euro, o progresso tecnológico (Internet, comércio electrónico, etc.) e a globalização da economia, o direito da concorrência tem um papel fundamental a desempenhar.

A garantia da liberdade no mercado vai ser cada vez mais um factor de bem-estar do consumidor na medida em que tende a obter os mesmos bens ao melhor preço, mas também uma garantia de eficiência económica.

A competitividade vai depender em larga medida da forma como seja garantida a concorrência nos mercados.

A legislação portuguesa que, no essencial, recolhe os princípios da legislação comunitária e institui autoridades nacionais com competência próxima daquela que foi atribuída a órgãos semelhantes de outros países da comunidade, não tem conseguido resultados próximos dos conseguidos por esses países.

Tal fica a dever-se, naturalmente, a alguma ineficiência, à falta de coordenação, à manifesta falta de meios à disposição do Conselho da Concorrência e da Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, mas também à forma como eles estão estruturados e articulados.

Há, com efeito, áreas fundamentais da actividade económica onde é suposto também haver violação das regras da concorrência (é o caso dos seguros, da banca e dos concursos públicos de fornecimento de bens e serviços, de empreitadas de obras públicas, etc.) onde o Conselho da Concorrência praticamente nunca foi chamado a intervir.

No relatório de 1998 renova-se o que se tenha dito no relatório anterior chamava-se a atenção para necessidade de articulação entre as autoridades da concorrência e autoridades reguladoras, com as delimitações precisas das suas competências.

De resto, o mesmo alerta fazíamos no relatório de 1999, chamando a atenção para o facto - num momento em que o Governo anunciava, de acordo com o seu programa alterações nesta área, - de que mais do que introduzir normas materiais, embora algumas sejam necessárias como vimos, importa dotar os serviços de meios técnicos e humanos necessários a essas autoridades, para que estas possam fazer cumprir a lei.

É que os números são significativos.

Em 1995 estavam pendentes no Conselho 14 processos, entraram 5, foram decididos 7, pelo que transitarem, no que toca a contra-ordenações, 12 processos, para 1997. Quanto às avaliações prévias estavam pendentes 3 processos, forem recebidos outros 3 e decidido 1 pelo que transitarem para 1996, 5 processos, em instrução na Direcção-Geral.

Em 1997, foi recebido 1 processo de contra-ordenação e outro processo de controlo prévio, tendo sido decididos 5 e 1, respectivamente; pelo que transitaram 8 e 4 outros processos para 1998.

Em 1998 foram recebidos 3 processos de contra-ordenação e decididos outros tantos, e 4 de controlo prévio e decididos igualmente 4.

Em 1999 foram recebidos 2 processos de contra-ordenação e 1 processo de controlo prévio e decididos outros tantos.

Neste momento, o Conselho tem 2 processos pendentes de contra-ordenação e 4 de controlo prévio em instrução na Direcção-Geral.

Só para mostrar algumas diferenças deixem-me citar alguns números do Conselho da Concorrência francês e da Autorità italiana.

O primeiro possui 108 pessoas, dos quais mais ou menos metade são quadros. Tem 35 relatores, e normalmente produzem 130 decisões anuais. Para o efeito tem um orçamento anual, sem contar com as despesas de pessoal, para 2001, de 18 milhões de francos.

Para além disso a Direcção-Geral tem afectados à concorrência, em exclusivo, 100 inspectores e outros 300 acumulam os casos de concorrência com a matéria de fraudes, consumo, etc.

Por sua vez a Autorità italiana possui 170 funcionários titulares e mais 50 unidades contratadas, além dos 6 membros do Conselho com competência para decidir.

Durante o ano de 1999 esta autoridade decidiu 30 casos de acordos de empresa para a fixação de preços, 15 casos de abuso de posição dominante.

O Conselho da Concorrência português para além dos membros do próprio Conselho (sete membros) tem um assessor, uma secretária e três funcionárias administrativas.

Não nos referimos propositadamente às concentrações, pois o número de processos submetidos ao Conselho da Concorrência em face do número de notificações à Direcção-Geral, são perfeitamente desproporcionadas.

Resta dizer que, na sua história, o Conselho não foi chamado a pronunciar-se em mais 10 casos de concentração, sendo que 5 deles foram durante o ano de 1999 (1 em 1995; 2 em 1996; 1 em 1998 e 1 em 2000).

Tais números não tem nada a ver com aqueles que a Direcção-Geral apresentou e que podem apresentar outras autoridades, como a Autorità italiana com 423 casos em 1999 e a Direcção-Geral da Concorrência francesa com 67 casos de concentração, dos quais seis foram submetidos a parecer do Conselho da Concorrência.

Os números acima referidos parecem-nos falar por si, sobre a dimensão aparente da concorrência em Portugal.

Pensamos no entanto que a dimensão real é diferente, mas a ela só se pode aceder com outros meios."

O Presidente, José Anselmo Dias Rodrigues, juiz conselheiro.

CAPÍTULO I

Actividade do Conselho da Concorrência

a) Sessões do Conselho

Durante o ano de 2001 o Conselho reuniu 39 vezes, perfazendo 481 sessões desde o início da sua actividade.

b) Processos de contra-ordenação

Em 2001 foram submetidos ao Conselho, após conclusão da instrução pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, sete processos de contra-ordenação.

As decisões proferidas foram cinco, sendo quatro relativas a processos pendentes em 31 de Dezembro de 2000.

QUADRO RESUMO

Pendentes em 31 de Dezembro de 2000 ... Recebidos em 2001 ... Decididos em 2001 ... Pendentes em 31 de Dezembro de 2001

4 ... 7 ... 5 ... 6(ver nota 1)

(nota 1) Um destes processos aguarda apenas a avaliação do cumprimento de injunção proferida na decisão; outro aguarda decisão final após ter dado lugar a medidas provisóricas, tendo sido concluída a instrução pela DGCC em Dezembro de 2001; outro deu entrada, após conclusão da instrução, igualmente em Dezembro de 2001.

Dos restantes, dois aguardam tão somente a análise de cumprimento de injunções constantes da decisão.

c) Processos de apreciação prévia

Em 2001 deu entrada no Conselho um requerimento de apreciação prévia, devidamente preenchido, o qual, bem como um dos pendentes em 31 de Dezembro de 2000, aguardava em 31 de Dezembro de 2001 a conclusão da instrução.

QUADRO RESUMO

Pendentes em 31 de Dezembro de 2000 ... Recebidos em 2001 ... Decididos em 2001 ... Pendentes em 31 de Dezembro de 2001

5 ... 1 ... 3(ver nota 1) ... 3(ver nota 2)

(nota 1) Uma destas decisões apenas determina o arquivamento do processo por o contrato sob análise ter sido anulado pelos interessados e, assim, estes terem desistido do pedido.

(nota 2) Dois destes processos encontram-se pendentes de conclusão da instrução pela DGC e P.

d) Processos de controlo de concentração de empresas

Durante o ano de 2001 deu entrada no Conselho um processo de concentração de empresas, tendo sido emitido parecer nos termos do artigo 33.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro.

Notificante neste processo foi Porto Editora.

e) Decisões judiciais proferidos em recurso das decisões do Conselho

No processo 4/01, em que são arguidas BRISA - Auto-estradas de Portugal, S. A., BRISER, Via Verde Portugal e outras foram oportunamente decretadas pelo Conselho, sob proposta da Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, medidas preventivas, nos termos do disposto no artigo 24.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro.

Tendo sido proposta pela DGCC a prorrogação do respectivo prazo de vigência, não foi esta decretada pelo Conselho por falta de requisitos indispensáveis.

Desta decisão foi interposto recurso para o Tribunal do Comércio o qual, por sentença datada de 21 de Dezembro de 2001, declarou a inutilidade superveniente da lide.

A Decisão do Conselho no processo 2/2000, na qual é arguida a Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, foi objecto de recurso tendo o tribunal do comércio reduzido o montante da coima por sentença comunicada ao Conselho em 13 de Março de 2001. Da sentença foi interposto, pela arguida, recurso para o Tribunal da Relação.

Por sentença datada de 27 de Março de 2001, o Tribunal do Comércio manteve a decisão proferida pelo conselho no processo 1/99, em que é arguida ADN - Associação dos Dietéticos Nacionais tendo, no entanto, reduzido o montante da coima aplicada.

Interposto, pela arguida, recurso para o Tribunal da Relação, foi considerado extinto por prescrição o procedimento contra-ordenacional por acórdão de 4 de Outubro de 2001.

f) Relações com outras entidades

1 - Nacionais

Em cumprimento do disposto no artigo 27.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, o Conselho enviou ao ministro da Economia e à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, cópia das decisões proferidas.

2 - Comunitárias e de países comunitários

O Conselho fez-se representar em reuniões de directores-gerais, para as quais foram igualmente convidados os presidentes dos conselhos da concorrência, bem como na reunião informal de peritos governamentais em matéria de acordo, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes que, na sequência daquelas, teve igualmente lugar em Bruxelas. Ainda no âmbito da EU realizou-se em Amesterdão uma reunião informal das autoridades da concorrência visando, tal como a realizada em Roma no ano transacto, a cooperação entre as autoridades nacionais com vista à aplicação das normas comunitárias, tendo sido informalmente constituída uma Associação das Autoridades Nacionais (ECA).

Nessa reunião esteve presente, além do presidente, o vogal deste Conselho Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete, o mesmo se tendo verificado na reunião.

Não já no âmbito da UE mas num país comunitário - o Reino Unido - teve lugar uma reunião organizada em Londres pelo Department of trade and Industry cuja temática abrangeu a experiência recente do novo regime da concorrência no Reino Unido e o resultados das propostas de modernização apresentada pela UE.

Nesta reunião o Conselho foi representado pelo vogal Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete.

Também no âmbito da OCDE o Conselho se fez representar dado o grande interesse da matéria versadas para a actividade do Conselho.

Foi o caso de duas reuniões dos grupos de trabalho e Comité Plenário de Política e Direito da Concorrência, à última das quais compareceu além do Presidente, a vogal Carolina de Castro Nunes Vicente e Cunha.

3 - De Países Não Comunitários

Deve, finalmente referir-se o seminário realizado pelas autoridades brasileiras da concorrência - Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência - CADE - subordinado ao tema "Concorrência e Ordem Económica" no qual o presidente participou como orador.

4 - Reunião com o FMI

Finalmente, impõe-se referir a visita a Portugal, verificada de 29 de Novembro a 10 de Dezembro, de uma missão do FMI.

Na reunião realizada em 5 de Dezembro, estiveram presentes o presidente, o vogal Dr. Miguel Moura e Silva e o assessor jurídico Dr. José Guerreiro Joaquim, tendo sido tratado, entre outros temas o da "concorrência e política antitrust".

CAPÍTULO I

I - Índice de textos de carácter doutrinário incluídos nos relatórios de actividade do Conselho

A

Abuso de dependência económica - RA93, p. 18.

Abuso de posição dominante - nexo de causalidade - RA96, p. 13.

Agente económico (conceito de) - RA84/85, p. 13.

Âmbito de aplicação do Decreto-Lei 422/83:

Contrato de agência e regras de concorrência - RA87, p. 12.

Os transportes - RA87, p. 13.

A administração central face ao diploma - RA88, p. 13.

Associações patronais como associações de empresas - RA88, p. 14.

O regime das antigas coligações - RA88, p. 15.

Âmbito material de aplicação do Decreto-Lei 422/83 - RA89, p. 11.

Aplicação do Decreto-Lei 422/83 aos diversos sectores da actividade económica - RA84/85, p. 12.

(O) artigo 36.º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei 422/83 e o conceito de administração central, regional e local - RA91, p. 12.

Associações de empresas (O direito da concorrência e as) - RA92, p. 15.

Atribuições e competências do Conselho - RA84/85, p. 13.

B

Balanço económico e ónus da prova - RA88, p. 21.

C

Coligações (O regime das antigas) - RA 88, p. 15.

Competências (atribuições e competências do conselho) - RA84/85, p. 13.

Comportamentos considerados restritivos da concorrência - RA84/85, p. 16.

Conceito de agente económico - RA90, p. 11.

Constitucionalidade das normas que atribuem ao conselho da concorrência competência para decidir os processos relativos a práticas restritivas da concorrência e aplicar coimas e à direcção-geral de concorrência e preços competência instrutória - Acórdão 158/92 do Tribunal Constitucional - RA92, p. 14.

Contratos de distribuição (requisitos formais dos) - RA92, p. 18.

(O) controle prévio previsto na Portaria 820/84 - RA87, p. 15.

Culpa (ilicitude e culpa na aplicação do Decreto-Lei 422/83) - RA84/85, p. 15.

D

(A) declaração provisória de validade - RA96, p. 13.

(A) delimitação do mercado relevante - RA87, p. 16.

Denunciante (a posição do denunciante no processo de contra-ordenação) - RA89, p. 16.

Dependência económica (abuso de) - RA93, p. 18.

(O) direito da concorrência e as associações de empresas - RA92, p. 15.

(O) direito da concorrência e o direito das obrigações - RA92, p. 16.

Distribuição (Sistemas de) - RA88, p. 17.

Distribuição exclusiva e dependência económica - RA92, p. 17.

Distribuição selectiva (Evolução em matéria de) - RA97, p. 12.

E

(A) estrutura das infracções anticoncorrenciais - RA88, p. 19.

Empresa (A noção de empresa e aplicação do Decreto-Lei 422/83 aos institutos públicos - RA91, p. 11.

Evolução em matéria de distribuição selectiva - RA97, p. 12.

F

Factos delituais (A qualificação jurídica dos) - RA88, p. 18.

Factos supervenientes - RA88, p. 20.

Futebol, Televisão e Concorrência - RA97, p. 12.

H

(A) harmonização das políticas da concorrência nacional e comunitária - RA86, p. 27.

I

Ilicitude e culpa na aplicação do Decreto-Lei 422/83 - RA84/85, p. 15.

Imagem (Marca e imagem comercial) - RA89, p. 18.

Infracções (A estrutura das infracções anti concorrenciais) - RA88, p. 19.

Institutos públicos (A noção de empresa e a aplicação do Decreto-Lei 422/83 aos institutos públicos) - RA91, p. 11.

Intervenção do Conselho em operações de concentração - RA95.

Isenção (Requisitos da isenção prevista no artigo 15.º n.º 1 e ónus da prova) - RA92, p. 18.

M

Marca e imagem comercial - RA89, p. 18.

Mercado relevante (A delimitação do) - RA87, p. 15.

N

(A) nacionalidade das empresas e o território em que é praticada a infracção e no qual produz efeito - RA91, p. 13.

(A) noção de empresa e a aplicação do Decreto-Lei 422/83 aos institutos públicos - RA91, p. 11.

Noção de prática concertada - RA89, p. 20.

O

Objectivos do Decreto-Lei 422/83 - RA87, p. 11.

Objectivos da lei de defesa da concorrência - RA84/85, p. 11.

Ónus da prova (Balanço económico e) - RA88, p. 21.

Ónus da prova (Requisitos da isenção do artigo 15.º n.º 1 e) - RA92, p. 18.

P

Políticas da concorrência (A harmonização das políticas da concorrência nacional e comunitária - RA86, p. 27.

(A) posição do denunciante no processo de contra-ordenação - RA89, p. 16.

Práticas comerciais restritivas (O sistema de controle de) - RA84/85, p. 14.

Prática concertada (Noção de) - RA89, p. 20.

Práticas proibidas (Suspensão de) - RA93, p. 14.

Preços (Recomendação colectiva de) - RA93, p. 19.

(A) prescrição do procedimento nas contra-ordenações anticoncorrenciais - RA92, p. 11.

Princípios basilares do processo de contra-ordenação - RA93, p. 11.

Proibição de práticas concertadas e a questão da prova - RA90, p. 13.

Prova (Proibição de práticas concertadas e a questão da) - RA90, p. 13.

Q

(A) qualificação jurídica dos factos delituais - RA88, p. 18.

R

Recomendação colectiva de preços - RA93, p. 19.

Reenvio prejudicial (Utilização do mecanismo do reenvio prejudicial previsto no artigo 177.º do Tratado CEE) - RA86, p. 27.

Relações entre o Decreto-Lei 422/83 e outros diplomas legislativos - RA84/85, p. 12 e RA89, p. 14.

Relações entre o direito comunitário e o direito nacional - RA88, p. 16.

Relações entre o direito nacional e o direito comunitário da concorrência - RA86, p. 25.

Requisitos da isenção prevista no artigo 15.º n.º 1 e ónus da prova - RA92, p. 18.

Requisitos formais dos contratos de distribuição - RA92, p. 18.

S

Sanções pecuniárias (a utilização de) - RA88, p. 22.

(O) sistema de controle de práticas comerciais restritivas - RA84/85, p. 14.

Sistemas de distribuição - RA88, p. 17.

Suspensão de práticas proibidas - RA93, p. 14.

Suspensão preventiva das práticas restritivas da concorrência - RA96, p. 11.

T

Território (a nacionalidade das empresas e o território em que é praticada a infracção e no qual produz efeito) - RA91, p. 13.

U

(A) utilização de sanções pecuniárias - RA88, p. 22.

Utilização do mecanismo do reenvio prejudicial previsto no artigo 177.º do Tratado CEE - RA86, p. 27.

ANEXO A

Composição do Conselho da Concorrência em 31 de Dezembro de 2001

Presidente - Juiz conselheiro José Anselmo Dias Rodrigues.

Vogais:

Engenheiro José Álvaro Ubach Chaves Rosa.

Engenheiro Fernando Ivo Gonçalves.

Dr. Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete.

Dr. Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva.

Dr.ª Carolina de Castro Nunes Vicente e Cunha.

Secretária - Dr.ª Maria Beatriz dos Santos Ferreira Giesteira.

Assessor jurídico - Dr. José Guerreiro Joaquim.

ANEXO B

Quadros sinópticos das decisões proferidas pelo Conselho em processos de contra-ordenação

I - Entre 1996 e 2000.

II - Em 2001.

Decisões proferidas pelo Conselho em Processos de Contra-ordenação

I - 1996-2000

(ver documento original)

Decisões proferidas pelo Conselho em processos de contra-ordenação

II - 2001

(ver documento original)

ANEXO C1

Processo 1/2000 - Práticas anticoncorrenciais no mercado da informação bolsista

O Conselho da Concorrência, no uso da competência que lhe é atribuída pela alínea a) do n.º 1 do artigo 13.º do Decreto-Lei 371/93, de 23 de Outubro, e visto o processo de contra-ordenação registado sob o n.º 1/2000, em 17 de Janeiro de 2000, em que é arguida a Associação da Bolsa de Valores de Lisboa, tem a ponderar os seguintes elementos de facto e de direito:

1 - Origem do processo

A instrução do presente processo de contra-ordenação foi iniciada por despacho do Director Geral do Comércio e da Concorrência de 30 de Dezembro de 1998 com base numa queixa, apresentada em 6 de Agosto de 1998 pela Reuters Portugal - Agência Noticiosa, Lda (adiante Reuters), contra a Associação da Bolsa de Valores de Lisboa (adiante ABVL), por alegadas práticas restritivas da concorrência.

2 - Identificação das partes

2.1 - A queixosa

A Reuters é uma sociedade por quotas, com sede em Lisboa, na Rua Loureiro Alves, 12, 5.º, que tem por objecto social a comercialização de material noticioso através de sistemas adequados à transmissão e comercialização de dados bem como a importação, comercialização e instalação do equipamento necessário para o funcionamento dos referidos sistemas e a prestação de serviços e realização de actividades com eles relacionados. Desenvolve a sua actividade a nível nacional e internacional integrada no grupo Reuters (ver nota 1), estando especialmente vocacionada para a redifusão de informações económicas e financeiras, com destaque para a informação bolsista.

2.2 - A arguida

((alfa)) Nos termos do relatório final da Direcção-Geral do Comércio e Concorrência de 17 de Janeiro de 2000, a Associação de Bolsa de Valoras (adiante ABVL) era uma associação de direito privado sem fins lucrativos, com sede no edifício da Bolsa de Lisboa, Rua Soeiro Pereira Gomes, sujeita ao regime jurídico do Código de Mercado de Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei 142-A/91, de 10 de Abril, ao Regulamento da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (adiante CMVM), ao Regulamento da Bolsa de Valores de Lisboa e aos seus Estatutos. Nos termos dos artigos 198.º e seguintes do referido Código as "associações de bolsa" eram associações civis sem fins lucrativos tendo por objecto exclusivo "criar, administrar e manter bolsas de valores" tendo o início da actividade da ABVL sido autorizado pela Portaria 407/91, do Ministro das Finanças (Diário da República, 2.ª série, de 12 de Dezembro de 1991).

((beta)) Embora a isso não faça referência o relatório final da entidade instrutora, o Decreto-Lei n.º394/99, de 13 de Outubro, veio reconhecer, no seu Preâmbulo, que "A organização jurídica [das entidades gestoras de mercados de valores mobiliários] como associações civis sem fins lucrativos começa a revelar alguns entraves ao adequado desenvolvimento das entidades gestoras de mercados e, consequentemente, dos próprios mercados existentes e serviços com estes relacionados." Em resultado, o seu artigo 1.º determinou que as sociedades gestoras de mercado regulamentado passassem a ser sociedades anónimas, admitindo o seu artigo 37.º a transformação da Associação da Bolsa de Valores de Lisboa (e da Associação da Bolsa de Derivados do Porto) em sociedade(s) gestora(s) de mercados regulamentados, sendo estes definidos no artigo 200.º do Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei 486/99, de 13 de Novembro, como "aqueles que:

a) Funcionem regularmente;

b) Obedeçam a requisitos iguais ou similares aos fixados no capítulo II do presente título [capítulo epigrafado "Bolsas" e cujo primeiro artigo (213.º) dá a noção de mercados de bolsa: "os mercados regulamentados em que a emissão das ofertas e a conclusão das operações são centralizadas num só espaço ou sistema de negociação"] quanto à prestação de informação, à admissão dos membros do mercado e dos valores mobiliários à negociação e ao funcionamento do mercado;

c) Sejam como tal autorizados, a pedido da entidade gestora, por portaria do Ministro das Finanças, ouvida a CMVM."

((gama)) Nos termos do n.º 1 do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º394/99, a sociedade gestora dos mercados regulamentados de Lisboa e Porto, BVLP - Bolsa de Valores de Lisboa e Porto, AS, sucedeu automática e globalmente às anteriores ABVL e Associação da Bolsa de Derivados do Porto, continuando a personalidade jurídica destas e conservando a universalidade dos direitos e obrigações que constituíam o património das mesmas à data da transformação, por se ter verificado a previsão do artigo 37.º do mesmo diploma.

Assim, qualquer incidência do presente processo sobre a arguida, ABVL, projectar-se-á na actual entidade gestora de mercados regulamentados BVLP, AS.

3 - Queixa

3.1 - Em 6 Agosto de 1998, a Reuters dirigiu uma carta à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência na qual dava conhecimento, para efeitos de instrução, "de uma prática proibida pelo artigo 3.º e 4.º do Decreto-Lei n.º371/93, de 29 de Outubro, levada a cabo pela Associação da Bolsa de Valores de Lisboa". Depois de descrever a ligação contratual com a Bolsa e de dar conta do início de uma actividade de carácter empresarial desta, com a comercialização da informação bolsista através de um serviço próprio (INFOBOLSA), escrevia a Reuters:

"... a posição da BVL pode ser caracterizada como abusiva da posição privilegiada e absolutamente dominante que detém no mercado nacional, através das seguintes práticas:

a) Discriminação de tratamento, relativamente à demora na transmissão da informação;

b) Recusa de prestação de determinado tipo de informação (profundidade de mercado);"

Referia-se a Reuters à demora na recepção da informação contratada com a ABVL para posterior redifusão, que lhe chegaria "com atraso significativo (cerca de 20 a 30 segundos)" e ao facto de tal informação chegar mais depressa ao serviço INFOBOLSA, que disponibilizava, ainda, a informação sobre "a profundidade de mercado" ["divulgação dos (normalmente 5) melhores preços de compra e venda, e respectivas quantidades, a que os investidores estão dispostos a efectuar os seus negócios de bolsa"], não acessível à Reuters.

3.2 - Na pendência das diligências complementares de instrução solicitadas por este Conselho à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, a Reuters dirigiu nova carta àquela entidade, com data de 19 de Setembro de 2000, na qual dava conta de que "na sequência das negociações encetadas há dois anos" a Reuters e a actual Bolsa de Valores de Lisboa e Porto "assinaram, no passado dia 23 de Agosto, um contrato de prestação de serviços de transmissão de informação" no qual "a BVLP garante que a informação será disponibilizada nas melhores condições de tempo em que é tecnicamente possível fazê-lo e com a profundidade de mercado requerida por esta empresa, pelo que se consideram ultrapassadas as razões que levaram esta empresa a apresentar a referida queixa à DGCC."

4 - Nota de ilicitude

Na nota de ilicitude (como no Relatório final da entidade instrutora, adiante-se) foi imputado à arguida um atraso "em tempo real na informação por sua via difundida [...] de cerca de 12 a 14 segundos" (artigo 16.º da Nota de Ilicitude - cfr. também artigo 28.º), o que configuraria "uma prática discriminatória em relação a prestações equivalentes, designadamente, a divulgação da informação prosseguida directamente pela ABVL/INFOBOLSA, em condições de tempo real, significativamente mais céleres que aquela que utiliza na divulgação da informação à Reuters" (artigo 29.º).

Foi-lhe igualmente imputada, como "comportamento abusivo da sua posição dominante com efeitos negativos no mercado" (artigo 29.º da Nota de Ilicitude) "enquanto gestora do monopólio de informação que detém", a recusa de fornecer à Reuters "a informação sobre a profundidade do mercado" (artigo 28.º). [Como se disse, a "profundidade do mercado" pode ser definida como a informação sobre as cinco melhores ofertas relativas à compra ou à venda de cada valor mobiliário admitido à negociação ainda antes da respectiva satisfação.]

E acrescentava a mesma Nota de Ilicitude (na parte final do seu artigo 29.º e no seu artigo 30.º):

"É que a ABVL ao impedir a Reuters de redifundir aos seus clientes, em tempo real idêntico ao prosseguido directamente pela própria ABVL, uma informação rápida e a profundidade do mercado, coloca aquela numa posição de desvantagem competitiva, procurando retirar para si um melhor resultado da actividade comercial paralelamente desenvolvida, como concorrente da Reuters, no mercado da divulgação bolsista.

30.º

Face ao exposto, detendo a ABVL o exclusivo da informação gerada na Bolsa de Valores de Lisboa, considera-se que o seu comportamento constitui um abuso da sua posição dominante, designadamente pela aplicação de condições discriminatórias em termos de tempo real de divulgação e de recusa da informação sobre a profundidade do mercado, o que, traduzindo-se em práticas restritivas da concorrência, infringem o disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, em conjugação com as alíneas e) e f) do artigo 2.º do mesmo diploma".

5 - Resposta da arguida

5.1 - Na sua resposta, a arguida confirmava o vínculo contratual com a Reuters que, entre o mais, a obrigava a fornecer-lhe "toda a informação sobre ofertas, preços e quantidades dos negócios executados, disponibilizada em tempo real", mas recordava que "Nos termos da cláusula 2.ª , alínea i), do contrato, "Tempo Real" é definido como a transmissão da informação com um atraso inferior a 5 (cinco) minutos".

5.2 - Acrescentava que "à data da queixa havia [...] mais três empresas que tinham contratado o acesso à informação em causa, a Bloomberg, o Banco Pinto & Sotto Mayor e a Telerate", e que "a Reuters, a Bloomberg e a Telerate [podiam] redifundir a informação contra pagamento", sendo "o contrato celebrado com a Reuters, e as prestações a que a ABVL nele se obrigou a efectuar, [...] idêntico aos restantes contratos celebrados na mesma altura com as restantes entidades redifusoras de informação acima identificadas" e que "Nenhum dos outros clientes da ABVL, nomeadamente redifusores, seja a Bloomberg, cuja importância em termos de mercado é semelhante à da queixosa, seja a Telerate, protestou contra um pretenso atraso."

5.3 - Considerava ambas as acusações constantes da Nota de Ilicitude "factualmente infundadas", notando desde logo que em relação ao atraso de "12 a 14 segundos" "a DGCC não produz qualquer elemento de prova desta afirmação", não tendo procedido a quaisquer "diligências de instrução susceptíveis de lhe permitir observar as condições concretas em que o dito serviço é facultado". Quanto à ligação de tais atrasos à introdução do serviço INFOBOLSA, no último trimestre de 1997, reconheceu que foi obrigada "por imperativos técnicos, a introduzir programas adicionais de recepção de fluxos de informação que, durante uma fase de transição, podem ter resultado, ocasionalmente, num maior atraso", mas que se dispôs "imediatamente a envidar todos os esforços para solucionar os problemas que a Reuters então afirmou constatar", sendo certo que "só uma peritagem poderá demonstrar que não estamos perante um problema do sistema Reuters ou da sua ligação com o da ABVL" - problema que, aliás, já antes se manifestara e de que a Reuters se teria queixado desde 1993 (como o comprovava uma carta da Reuters de 27 de Setembro desse ano, que juntaram - fl. 185 dos autos). Quanto ao acesso à profundidade do mercado, igualmente não coberto contratualmente, embora reclamado pela Reuters desde 1995, só teria sido tecnicamente possível a partir do "final de 1997", tratando-se, "A partir desse momento, [...] apenas de uma questão de negociação dos preços e das cláusulas contratuais" já que a ABVL "aceitou o princípio de que, a partir do momento em que tal se tornou tecnicamente possível [...] a informação sobre profundidade de mercado deveria ser disponibilizada a terceiros", do que resultou a "apresentação à Reuters de uma primeira minuta de contrato em Outubro de 1988", ao mesmo tempo que "a ABVL iniciou negociações com outras entidades para lhes facultar o acesso à mesma informação", reafirmando que a ABVL "não nega aos redifusores de informação o acesso à profundidade de mercado e dispôs-se a concedê-la logo que tal foi tecnicamente possível."

5.4 - Terminava requerendo o arquivamento dos autos ou, no caso do seu prosseguimento, "a realização de uma peritagem ou inspecção ao sistema informático da ABVL com vista a avaliar a existência do alegado atraso".

6 - Relatório final da entidade instrutora

6.1 - Embora não se tendo realizado a peritagem ou inspecção requerida, nem constando do processo qualquer elemento de prova -nem sequer qualquer outra alegação- sobre os atrasos na divulgação de informação bolsista à Reuters -excepto o quadro com "uma amostra significativa da presente situação" enviado pela queixosa à arguida em 30 de Junho de 1997, e que representa 20 das "59 recolhas de informação" "ao longo de 8 dias" (sem identificação de data), de que resultava um "atraso sistemático de 20 a 30 segundos" em relação a um terminal SIIB" (cfr. fls. 64 e 65 dos autos)- o relatório final da Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência concluiu que a ABVL estava a "prestar informação bolsista à Reuters através de um processamento intermédio, actualmente com um atraso, em tempo real, de 12 a 14 segundos relativamente à divulgada aos clientes directos do seu serviço INFOBOLSA" (cfr. fls. 216/217 a 217/218 dos autos).

6.2 - Acrescenta a Direcção-Geral que tal facto, "acrescido ainda da recusa da ABVL de fornecer [à Reuters] a informação sobre a profundidade do mercado, consubstanciam efectivamente, comportamentos abusivos por parte da ABVL que, enquanto gestora do monopólio de informação que detém, coloca os seus clientes directos numa situação de evidente vantagem competitiva face à Reuters" (fl. 216/217).

6.3 - E conclui que "Tais comportamentos, adoptados pela arguida em frontal oposição às cláusulas 5.ª (n.º1, parte final) e 11.º (n.º2) do citado acordo [i. e.: do Contrato de Prestação de Serviços de Difusão de Informação celebrado em 1 de Janeiro de 1992 entre a ABVL e a Reuters e sucessivamente prorrogado], são, aliás, sintomáticos da preponderância assumida pela ABVL relativamente à sua concorrente Reuters" (fl. 216/217).

6.4 - Daí resultaria, como consequência, que "sendo o INFOBOLSA um serviço de difusão nacional, os investidores internacionais dependem exclusivamente dos redifusores de informação, nomeadamente da Reuters, para terem acesso à informação gerada nas sessões da Bolsa de Valores de Lisboa, pelo que a situação de desvantagem em que a Reuters se encontra face aos clientes directos do serviço INFOBOLSA, retira àqueles mesmos investidores eficácia e competitividade para investir no mercado da Bolsa de Valores de Lisboa".

6.5 - O juízo final da entidade instrutória é o de que "detendo a ABVL o exclusivo da informação gerada na Bolsa de Valores de Lisboa, considera-se que o seu comportamento constitui exploração abusiva da sua posição dominante, designadamente pela adopção de condições discriminatórias em termos de tempo real de divulgação e de conteúdo da informação, entre a divulgada directamente através do sistema INFOBOLSA aos seus clientes e a divulgada aos redifusores como a Reuters o que, traduzindo-se em práticas restritivas da concorrência, infringem o disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, em conjugação com as alíneas e) e f) do artigo 2.º do mesmo diploma.

7 - Intervenção de outras entidades

7.1 - Por deliberação de 3 de Fevereiro de 2000, o Conselho resolveu solicitar ao Banco de Portugal e à comissão do mercado de valores mobiliários os pareceres a que se refere o artigo 88.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 26.º do Decreto-Lei 371/93, que determina tal solicitação " se as empresas arguidas forem instituições de crédito e sociedades financeiras ou suas associações empresariais". Uma vez que a ABVL era uma associação civil sem fins lucrativos de que faziam parte sociedades corretoras, sociedades financeiras de corretagem (ambas tidas por sociedades financeiras nos termos do n.º1 do artigo 6.º do referido Regime Geral, aprovado pelo Decreto-Lei 298/92, de 31 de Dezembro) e instituições de crédito, entendeu-se que ainda podia ser incluída na previsão da norma, ou pelo menos, que era preferível discutir-se um excesso interpretativo, para efeitos de audição do Banco de Portugal, do que uma sua insuficiência.

A opinião do Banco de Portugal foi no sentido de inexistirem "razões de ordem substancial que justifiquem a emissão do parecer previsto no artigo 88.º [...] porquanto a actividade em causa sempre foi materialmente estranha ao âmbito de supervisão exercida pelo Banco de Portugal". Assim, o nosso banco central interpretou tal norma como definindo a sua intervenção em razão de matéria, muito embora a pudesse ter alternativamente entendido em razão dos sujeitos.

7.2 - Nos termos do referido artigo 88.º, o parecer da comissão do mercado de valores mobiliários deveria ser solicitado se estivesse "em causa o exercício de actividades de intermediação de valores mobiliários". Adoptando, também aqui, uma interpretação declarativa lata, o Conselho admitiu que, no que se discutia nos autos, ainda podia estar "em causa" o exercício dessa actividade de intermediação, mas o entendimento da Comissão de Valores Mobiliários -só aparentemente divergente, como se verá- foi o de que "não estando em causa uma actividade de intermediação financeira, não está verificado o pressuposto de que o artigo 88.º faz depender a necessidade de tal parecer, necessidade que se justificaria em razão do especial conhecimento que a CMVM tem sobre o mercado" optando, em consequência "por não se pronunciar concretamente sobre a questão da eventual violação das normas de concorrência entre empresas difusoras de informação".

Como se verá adiante (infra, 9.3 e 9.4..) a questão de concorrência não se colocava no plano das relações entre empresas difusoras de informação, como se poderia depreender da delimitação do mercado relevante feita pela entidade instrutora e foi entendido pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, mas não à regionalização! no plano das relações da ABVL com as entidades redifusoras de informação - em que, no exercício das suas competências, a dita Comissão teve efectivamente uma intervenção que, nas suas palavras "não se prende directamente com questões de concorrência mas com a necessidade de ser garantida a transparência informativa, instrumento privilegiado da defesa do mercado, facto que conduziu a que se alertasse a ABVL para a obrigatoriedade constante do Regulamento da CMVM n.º 99/1 de difusão de informação em tempo real e bem assim para o dever de esta se reger, ao nível da divulgação da informação, por princípios de celeridade, eficácia e acesso em condições de igualdade". Tal intervenção, documentada em anexo à resposta à solicitação do Conselho e que é dita ter motivado "a resolução do problema", teve a seguinte sequência, nos próprios termos da resposta da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários:

"Em 12 de Janeiro de 1998 deu entrada nesta Comissão uma carta da Reuters Portugal - Agência Noticiosa, Lda., a dar conhecimento do assunto sobre que incide a nota de ilicitude de 28 de Setembro de 1999 [...] Na sequência dessa carta, levou a efeito esta Comissão contactos, quer com a Reuters, quer com a ABVL, destinados a encontrar uma solução para o litígio que envolvia ambas as entidades.

Como resultado das diligências levadas a efeito, foi-nos comunicado pela ABVL, em 29 de Outubro de 1999, que o problema se encontrava solucionado, facto que oportunamente comunicámos à Reuters, não tendo esta Comissão recebido qualquer comunicação por parte daquela agência noticiosa de que não era também esse o seu entendimento."

8 - Realização de diligências complementares de instrução

8.1 - Nos termos da parte final do n.º 2 do artigo 26.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, o Conselho da Concorrência realizou, em 23 de Março de 2000, audiências com representantes da queixosa e da arguida, bem como com representantes da Telerate. A outra empresa presente no mercado português de difusão de informação das Bolsas nacionais, a Bloomberg, foi inquirida por escrito, face à impossibilidade de comparência do seu representante.

Ouvida a queixosa, foi pelos seus representantes dito que o atraso registado na recepção de informação tinha sido reduzido e que o diferendo com a ABVL se encontrava em vias de resolução. Mais referiram que não tinham accionado o mecanismo de arbitragem previsto no contrato por admitirem que, dos seus termos, não resultava incumprimento contratual. Questionados sobre a singularidade da sua posição em relação à de outros redifusores, admitiram que tal se devesse ao facto de os seus concorrentes privilegiarem os clientes institucionais, que dispunham de meios alternativos de acesso à informação sobre a profundidade do mercado (por participarem no sistema de negociação ou, e, subscreverem o serviço INFOBOLSA) e, também, de ultrapassarem eventuais atrasos no recebimento da informação.

Ouvida a arguida sobre os motivos de não disponibilização imediata a todos os interessados da informação sobre profundidade do mercado, a ABVL alegou que tal fornecimento quintuplicava o débito de informação e que as conexões com os redifusores (vendors), então feitas com linhas X-25, impossibilitavam o fornecimento dessa informação. Só quando tais linhas foram substituídas por outra via com muito maior potencial (TCP/IP), por conta dos clientes (sujeitos às espe cificações estabelecidas pela ABVL), passou a ser possível disponibilizar-lhes tal informação. Além de tal constrangimento técnico, invocaram um outro, circunstancial: a principal afectação de recursos técnicos e humanos antes do ano 2000 dirigiu-se ao diagnóstico e prevenção do chamado "bug" do milénio.

Ouvida a Telerate sobre as questões do processo, o seu representante referiu que durante muito tempo por razões diversas, a Telerate não teve necessidade de informação sobre a profundidade do mercado, embora isso se repercutisse negativamente na comercialização dos seus serviços a investidores particulares a partir da introdução do INFOBOLSA. Sobre atrasos na recepção do sinal referiu não ter tido reclamação alguma e que, ainda que a tivesse, não teria possibilidade de imputar seguramente a origem do atraso à fonte ou ao seu próprio sistema.

8.2 - Por deliberação de 15 de Março de 2000, o Conselho da Concorrência solicitou à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência a realização de diligências complementares de instrução no que diz respeito aos seguintes pontos (fls. 268-269):

"a) Há, ou não, razões técnicas -ou carências humanas- que expliquem que os dados sobre a profundidade de mercado pudessem ser enviados para Madrid (onde começou a ser configurado o serviço INFOBOLSA) consideravelmente antes de poderem ser disponibilizados aos vendors sediados em Lisboa?

b) Durante o período em que os clientes do serviço INFOBOLSA tinham acesso à profundidade de mercado sem que tal informação fosse disponibilizada pelos outros fornecedores de informação sobre o mercado bolsista nacional, qual era a quota de mercado (institucional e privado) de cada um dos intervenientes nesse mercado (Reuters, Bloomberg, Telerate e INFOBOLSA)?

c) No mesmo período, qual era o nível de preços praticado por cada um desses intervenientes em relação aos seus clientes? (No caso de não ser possível segmentar o serviço prestado no que respeita a informação da(s) bolsa(s) nacionais, para permitir uma comparação de serviços semelhantes, indicar os valores globais do serviço prestado e uma síntese do seu conteúdo)."

8.3 - No cumprimento desta solicitação do Conselho, a Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência limitou-se a dirigir a cada uma das empresas fornecedoras de informação sobre o mercado bolsista nacional comunicação do seguinte teor:

"a) Durante o período em que os clientes do serviço INFOBOLSA tinham acesso à profundidade de mercado sem que tal informação fosse disponibilizada pelos outros fornecedores de informação sobre o mercado bolsista nacional, qual era a quota de mercado (institucional e privado) dessa empresa no mercado" - anos de 1997, 1998 e 1999;

b) No mesmo período, qual era o nível de preços praticado por essa empresa em relação aos seus clientes.(No caso de não ser possível segmentar o serviço prestado no que respeita a informação da(s) bolsa(s) nacional(ais), para permitir uma comparação de serviços semelhantes, indicar os valores globais do serviço prestado e uma síntese do seu conteúdo)".

8.4 - Em resultado das diferenças de redacção, as empresas tenderam a responder, não sobre si, como se pretendia, mas sobre o INFOBOLSA, à excepção da Telerate, que foi exemplar na colaboração prestada. Por causa disso, só foi possível apurar que:

a) Para um total de acessos, no mercado português, calculado em 1255, 1647 e 1723 ( nos anos de 1997,1998 e 1999, respectivamente) o número de acessos INFOBOLSA rondaria os 100, 200 e 400, respectivamente (com um crescimento muito moderado de terminais da rede privada de comunicação da ABVL, depois da instalação inicial - "terminais acessíveis exclusivamente para os Corretores na rede privada de comunicações da então ABVL, como complemento do sistema de negociações LIST") e uma progressão muito significativa de "terminais instalados em clientes externos"; ou seja, mesmo na sua expressão máxima uma quota de mercado próxima da Telerate, o menor dos 3 redifusores de informação bolsista;

b) "O nível de preços praticado para o INFOBOLSA, mantém-se inalterado desde o seu início e é de 80 000$ de subscrição acrescido de uma prestação mensal de 70 000$", ao passo que serviços semelhantes, em termos de conteúdo (exceptuando o acesso à profundidade de mercado), disponibilizados pela Telerate e pela Reuters rondariam os 130 000$/mês e os 75 000$/mês, respectivamente.

8.5 - Também no cumprimento da mesma solicitação do Conselho, a Direcção-Geral do Comércio e Concorrência dirigiu às entidades sugeridas pelo Conselho (Portugal Telecom, Fundação para a Computação Científica Nacional e Instituto de Comunicações de Portugal) uma missiva dando "alguns esclarecimentos sobre a matéria em questão" e solicitando resposta à primeira pergunta formulada pelo Conselho (supra 8.2a). Nessa missiva se escrevia, designadamente, o seguinte:

"Segundo a ABVL, as conexões, inicialmente, eram estabelecidas através de linhas X-25, o que impossibilitava o fornecimento da informação sobre profundidade de mercado aos vendors, motivo que determinou a substituição dessas linhas por uma outra via com muito maior potencial (TCP/IN), passando, então, a partir daí, a ser possível disponibilizar tal informação."

A Portugal Telecom respondeu, embora não propriamente ao que se lhe tinha solicitado, afirmando que:

"Relativamente ao serviço INFOBOLSA, disponibilizado pela ABVL aos seus Clientes, podemos informar que, infelizmente, a solução técnica que o suporta não foi fornecida pelo Grupo Portugal Telecom.

Desta forma, e dado que somos alheios à solução implementada pela ABVL não temos condições técnicas para emitir qualquer opinião sobre o assunto em causa."

Tanto a Fundação para a Computação Científica Nacional como o Instituto de Comunicações de Portugal consideraram não haver, a priori, razões de natureza técnica ou económica justificativas do envio antecipado da informação para Madrid, em relação à que era disponibilizada aos vendors sediados em Lisboa. Porém, a Fundação para a Computação Científica Nacional entendeu essa dilação temporal como referida a uma mesma transmissão de informação (referindo que "sendo a comunicação entre sistemas que usam a tecnologia windows efectuada através da pilha protocolar TCP/IP a comunicação deveria ser virtualmente instantânea (à parte atrasos de propagação que são de ordem de grandeza de fracções de Segundo") - sendo certo que a alegação da ABVL era a de que só a introdução dessa tecnologia veio permitir a disponibilização da informação sobre a profundidade do mercado, antes inviabilizada pela ligação aos redifusores de informação através de linhas X-25, e o Instituto de Comunicações de Portugal, não sendo claro quanto ao entendimento que fez da pergunta que lhe foi dirigida, pareceu impressionar-se com a possibilidade de que "o serviço de informação ao mercado seja disponibilizado à praça de Madrid" [o que não é, em rigor, o caso] "antes de poder ser disponibilizado aos vendors sediados em Lisboa". De todo o modo, não deixa de admitir que, "por razões de ordem técnica ou relacionadas com eventuais carências de recursos humanos qualificados, [...] algumas empresas possam preferir utilizar recursos situados fora do território nacional. Na situação apresentada, esta opção poderá eventualmente ser justificada por razões de custo ou de competência Técnica, nomeadamente com incidência nas componentes recursos humanos, telecomunicações e sistemas de informação".

8.6 - Tendo em conta que as diligências complementares efectuadas acabaram por não esclarecer as questões suscitadas pelo Conselho, mas que a sua renovação, num contexto de ultrapassagem definitiva de quaisquer eventuais infracções pretéritas, se afigurava praticamente inútil (por não desempenhar qualquer função correctiva do mercado e porque, datando a instauração do processo de contra-ordenação de 30 de Dezembro de 1998 e a comunicação da nota de ilicitude de 10 de Outubro de 1999, nova dilação instrutória tornaria uma eventual decisão condenatória praticamente inexequível), e considerando que a própria arguida manifestou, por escrito, entender "não existir, actualmente, motivo para o prosseguimento da referida queixa" tendo expressamente solicitado "uma actuação em conformidade" (na carta referida supra, 3.2.), o Conselho decidiu, por maioria, não continuar a promover diligências instrutórias, decidindo com base no acervo de elementos recolhido, ainda que insuficiente.

9 - Mercado relevante

A) Mercado de produto (serviço)

9.1 - Sendo um mercado um lugar de encontro entre uma oferta e uma procura, podemos distinguir dois mercados potencialmente relevantes, verticalmente distintos: um primeiro mercado em que o produto é a informação bolsista "bruta" (ou "crua") - cuja oferta é constituída pelas entidades gestoras dos mercados bolsistas e a procura é essencialmente constituída pelos redifusores dessa informação ("configurada" ou "tratada"); e um segundo mercado, em que o produto é a informação bolsista "configurada" - cuja oferta é constituída pelos redifusores dessa informação e a procura é constituída pelos agentes económicos que actuam nos, ou acompanham os, mercados bolsistas. (ver nota 2)

9.2 - Enquanto entidade proprietária e gestora da Bolsa de Valores de Lisboa a ABVL tinha - e a sua sucessora tem - uma posição dominante em relação à informação nela gerada - em relação, digamos, a esta matéria prima. Enquanto entidade, idealmente distinta, redifusora de informação (vejam-se as recomendações do Office of Fair Trading Britânico, no seu relatório de 1990 sobre International Stock Exchange Dissemination of Company News - que constitui uma parte substancial dos autos, a fls. 95-150 -, designadamente quanto à "separação clara das actividades reguladora e comercial desenvolvidas por uma mesma entidade, quer relativamente à[s] suas estruturas orgânicas quer quanto ao pessoal, equipamento, receitas, etc"; e quanto à "proibição de contabilidade cruzada respeitante às duas actividades"), a ABVL não teve - nem a sua sucessora tem - qualquer posição dominante no mercado de redifusão de informação bolsista "configurada", ou seja, no mercado do produto final - ainda que tal produto por ela fornecido (via INFOBOLSA) tivesse algumas vantagens para um certo tipo de utilizadores em relação aos dos seus concorrentes (uma das quais seria o preço mais baixo). Naturalmente, os produtos informativos dos outros "vendors" apresentariam outro tipo de vantagens (como é normal: a concorrência não se faz geralmente entre produtos homogéneos, mas entre produtos diferenciados).

9.3 - O relatório final da entidade instrutora definia o mercado relevante para efeitos do presente processo como o da "prestação/divulgação, a nível nacional, da informação gerada nas sessões da Bolsa de Valores de Lisboa, designadamente, ofertas, preços, quantidades transacionadas, profundidade do mercado, índices e outras informações sobre o mercado da bolsa." E, justificando o seu entendimento (a fls. 208 a 209 e segs.), que já fora manifestado na nota de ilicitude (artigo 19.º, a fls. 164 e 165), escrevia:

Com efeito, ainda que este mercado se integre num mercado mais vasto que é o da prestação da informação bolsista, compreendendo, como tal, a divulgação de informação sobre os mercados de bolsa de valores mobiliários, nacionais e internacionais, as questões suscitadas pela Reuters na queixa apresentada, respeitam directa e exclusivamente ao mercado da Bolsa de Valores de Lisboa;

Sendo a ABVL a entidade responsável pela gestão e administração da Bolsa de Valores de Lisboa, detém, consequentemente, a mesma o exclusivo da informação bolsista no mercado em causa;

A oferta deste serviço é assegurada pela própria ABVL, quer comercializando-o directamente a terceiros, quer pelos redifusores de informação que o adquirem à ABVL, para depois o redifundirem aos seus clientes.

Adiante (fls. 217 a 218) referia, porém, que "só com a introdução do novo sistema Infobolsa, a ABVL passa, ela própria, a ter uma actividade comercial no mercado da prestação/divulgação bolsista, em concorrência directa com os demais redifusores, entre eles a Reuters." Tal passagem, reforçada, aliás, com a que consta de fls. 212 e 213 dos autos ("Com a introdução do novo sistema, a ABVL passa a assumir, simultaneamente, uma função de carácter empresarial, agindo, ela própria, directamente no mercado de prestação da informação gerada nas sessões da Bolsa de Valores de Lisboa, através da comercialização a terceiros da informação bolsista, em concorrência com os demais redifusores a quem já fornecia informação, de entre os quais a Reuters.") pode indiciar que o mercado considerado relevante pela entidade instrutora fica a jusante da produção/recolha da informação em causa, integrando-se, como se viu "num mercado mais vasto que é o da prestação de informação bolsista, compreendendo, como tal, a divulgação de informação sobre os mercados de bolsa de valores mobiliários, nacionais e internacionais". Nesse sentido foi, aliás o já citado entendimento da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (supra, 7.2.).

9.4 - A ser assim, não só seria difícil conceber a existência de uma posição dominante (o serviço INFOBOLSA não é dominante em relação aos seus concorrentes), como seria impossível identificar uma situação de abuso, porquanto qualquer abuso que pudesse eventualmente existir teria de se localizar a montante da prestação desse serviço e, portanto, fora do mercado relevante. O que é dizer que o mercado verdadeiramente relevante não é o da informação "configurada", onde a ABVL, via INFOBOLSA, aparece do lado da oferta, perante os agentes económicos que querem acompanhar o mercado bolsista (e que constituem a procura), e que, consequentemente, constitui um sub-mercado do, e que se integra no, mercado de procura de informação sobre os mercados de bolsa de valores mobiliários, nacionais e internacionais, - sub-mercado este em que num segundo momento, se hão-de repercutir, de forma ampliada ou atenuada, as consequências do que ocorre no mercado relevante. O mercado verdadeiramente relevante será, não à regionalização!, o da informação por tratar ("crua" ou "bruta"), em que a ABVL tem um exclusivo sobre a que é gerada na bolsa de valores de Lisboa (tal como outras entidades gestoras de bolsas têm exclusivos sobre a que nelas é gerada) e em que a procura é constituída por entidades que coligem essas informações das diferentes bolsas, ou só em uma, ou algumas, para configuração e divulgação aos agentes económicos. (Trata-se, pois, de uma procura de intermediação dirigida a uma oferta resultante da produção de informação bolsista). Porque este sentido ainda cabe na definição de mercado relevante da entidade instrutora, não se torna necessário adoptar outra, ainda que se chame a atenção para a alteração de ênfase.

Ou seja: muito embora a ABVL apareça, desde a criação do serviço INFOBOLSA, também no mercado do "produto final", assumindo ela própria a função de "intermediação", importa ter em conta que o comportamento alegadamente abusivo tem de ter lugar no mercado da "matéria prima". No mercado do "produto final" a ABVL/INFOBOLSA não é dominante [os dados que foram juntos ao processo, em resultado das diligências instrutórias complementares solicitadas pelo Conselho, permitiram estabelecê-lo: cfr. supra, 8.4.a)], surgindo o seu volume de negócios como uma fracção diminuta do da queixosa (7663, 96 470 e 185 530 contos nos anos de 1997, 1998 e 1999 respectivamente - fl. 297 dos autos - contra 2 815 264 contos e 3 107 450 contos, em 1996 e 1997, respectivamente, só em prestações de serviços, por parte da Reuters fl. 88 dos autos. O que tem de se apurar é se a ABVL é dominante no mercado de informação por tratar ("crua" ou "bruta") - sendo certo que o é em relação à informação gerada na Bolsa de Valores de Lisboa - mas de tal questão se cuidará a seguir. Por ora, podemos bastar-nos com a conclusão, algo paradoxal, de que a Reuters, Bloomberg e Telerate, multinacionais da redifusão de informação económica e, designadamente, bolsista, enfrentam, em cada um dos mercados nacionais em que estão presentes, uma posição dominante das entidades gestoras das bolsas que lhes fornecem informações, sendo a posição dominante da ABVL em relação à informação gerada na Bolsa de Valores de Lisboa qualitativamente idêntica à das restantes entidades gestoras das Bolsas de Valores em relação à informação nelas gerada - e, supostamente, adicionável às restantes, já que a mera hipótese da rivalidade de oferta da informação gerada em cada uma seria suficiente para pulverizar a posição dominante da ABVL. Desse somatório de posições dominantes dir-se-ia resultar a inexorável dependência económica daquelas multinacionais em relação a todas e cada uma das Bolsas de Valores - mas é seguro que, fora casos contados, a realidade dos factos é outra.

B) Mercado geográfico

9.6 - Definido o mercado de produto (serviço) relevante como o da informação "crua" - o que confina os intervenientes nele aos fornecedores de tal informação (do lado da oferta) e aos redifusores de informação (do lado da procura) - a questão é a de saber se havia especificidade suficiente na que era gerada na Bolsa de Valores de Lisboa para se configurar um mercado à volta dela. Ora, ainda que haja uma certa substituibilidade da parte da procura quanto à informação a adquirir para veicular, tão logo se firme um contrato de prestação de serviços de transmissão de informação bolsista, tal substituibilidade desaparece. Por outro lado, da parte da oferta a substituibilidade era inexistente, não havendo qualquer outra entidade que pudesse disponibilizar a informação cedida pela ABVL (ao menos na primeira modalidade contratada, que é a que importa ao presente processo: informação em tempo real), nem podendo surgir no mercado quem o pudesse fazer. Nestes termos, o mercado geográfico é confinado ao da aquisição da informação "crua" gerada na Bolsa de Valores de Lisboa ( o que é algo diferente de limitar o mercado em função das questões suscitadas pela queixosa cfr. a transcrição do relatório final da entidade instrutora ao ponto 9.1).

10 - Posição dominante

Nos termos da alínea a) do n.º do artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, entende-se que dispõe de posição dominante relativamente ao mercado de determinado bem ou serviço a empresa que nele actua não sofrendo concorrência significativa. No mercado relevante anteriormente configurado é seguramente o caso da ABVL (em relação à informação "crua"), uma vez que é a única entidade a poder disponibilizá-la.

No direito comunitário, o facto de a ausência de concorrência ser resultado de disposições legislativas e regulamentares dos Estados-Membros não impede a aplicação do direito da concorrência, e uma empresa que beneficia de um monopólio legal pode ser considerada em posição dominante (cfr. vg, o Acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Junho de 1991 no processo C-260/89, ERT, Colectânea da Jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal de 1.ª instância, 1991-6, I, p. 2961, ponto 31).

No direito nacional (onde, de resto, o abuso de posição dominante tem sido entendido, em diversos pontos do regime, de forma distinta da do direito comunitário), excluem-se do âmbito de aplicação do Decreto-Lei 371/93 "as restrições da concorrência decorrentes de lei especial" (n.º 3 do seu artigo 1.º) e, no caso de serviços públicos, estão excluídas da aplicação de tal diploma "as empresas concessionadas pelo Estado por diploma próprio, no âmbito e na vigência do respectivo contrato de concessão" (n.º 2 do artigo 41.º).

Ora, como se refere numa passagem da queixa apresentada pela Reuters, citando um relatório do Senado americano de 1975, "Qualquer operador exclusivo de informação é de facto de utilidade pública e como tal deve operar de forma absolutamente neutral, com respeito pelos centros de mercado [?], regras de mercado e empresas privadas". O que, até atendendo ao fenómeno de privatização das bolsas de valores nacionais em 1991, permite assimilar o seu funcionamento a uma concessão de um serviço público, operada através do Código de Mercado de Valores Mobiliários (cfr. artigos 201.º e 202.º) do referido diploma, aprovado pelo Decreto-Lei 142-A/91, de 10 de Abril) e da Portaria 407/91, publicada no Diário da República, 2.ª série, de 12 de Dezembro de 1991. Tal não obsta, porém, a que a ABVL seja tida como detentora de uma posição dominante de que pode, eventualmente, abusar, já que, como também referido na queixa que deu origem ao presente processo, "há que diferenciar o duplo papel de registo passivo de toda a informação e dados das sessões da Bolsa de Valores de Lisboa (função de registo supervisionada e sob tutela da CMVM) [que poderia ficar a coberto da ressalva do n.º 2 do referido artigo 41.º, por se enquadrar no "âmbito" da concessão"], e simultaneamente o papel que prossegue do ponto de vista empresarial ao comercializar a referida informação a terceiros" - embora já não se possa subscrever a passagem seguinte ("através da INFOBOLSA") uma vez que, como se viu, a actividade da ABVL enquanto prestadora de tal serviço se situa a jusante do mercado relevante e a actividade "empresarial" que se liga à introdução do serviço INFOBOLSA já existia antes (como noutros passos da mesma queixa se refere: cfr. fl. 12 dos autos, ponto 8), na cedência remunerada da informação gerada nas sessões da bolsa de Lisboa a redifusores de informação (Reuters, Bloomberg, Telerate) e a não redifusores (Banco Pinto & Sotto Mayor) - de facto, a quem quer que a pretendesse adquirir em condições de não-exclusividade.

Porque essa actividade empresarial se pode, razoavelmente, ter por exterior ao âmbito da "concessão", entende o Conselho que a actividade de cedência remunerada a terceiros da informação gerada nas bolsas de valores não está excluída da aplicação das leis de defesa da concorrência.

11 - Abuso de posição dominante

Para que uma posição dominante se torne abusiva é necessário, nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, que seja explorada tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência.

Antes de se imputar à ABVL um qualquer intuito anticoncorrencial cabe apurar se os comportamentos alegadamente abusivos de que foi acusada são aptos a impedir, falsear ou restringir a concorrência tanto no mercado relevante supra indentificado como em quaisquer outros. Que a não impediram, prova-o o facto de as anteriores empresas de redifusão de informação continuarem a operar no mercado relevante. Que a não restringiram, resulta do facto de o próprio serviço INFOBOLSA se ter intrometido no mercado relevante, aumentando o número de agentes económicos em concorrência pela obtenção de informação "crua" e, em consequência, pela sua difusão. A questão é saber se a falsearam por, temporariamente, tal serviço ter tido acesso vamos admiti-lo, por agora a um conteúdo informativo distinto (em tempo e conteúdo) do proporcionado aos outros redifusores de informação. Ora, uma vez que no mercado relevante não foram projectadas consequências de tal discriminação (pela retirada de um ou mais agentes económicos do mercado), importa tentar localizá-las no segundo mercado identificado supra (9.1.): o crescimento do serviço INFOBOLSA (ver 8.4. a) resultou de uma concorrência falseada pela vantagem informativa proporcionada? O Conselho considera não poder ajuizá-lo com base nos elementos disponíveis: por um lado, os únicos elementos sobre o número total de acessos à informação em tempo real sobre a informação da bolsa de valores de Lisboa - que foram estimados por um dos intervenientes no processo, sem qualquer confirmação objectiva - mostram que (segundo as mesmas estimativas), no primeiro ano de funcionamento integral do serviço INFOBOLSA (1998), este absorveu pouco mais de 25% do aumento da procura de acessos, só no segundo ano de funcionamento tendo crescido mais do que cresceu a procura (embora muito mais: 263%); por outro lado, tendo em conta que o preço do serviço INFOBOLSA era mais baixo do que o dos seus concorrentes, não é possível imputar tal crescimento (de zero para cerca de 23% do mercado de acessos, entre 1997 e 1999) ao diferente conteúdo informativo veiculado; por fim, como se verá adiante, os próprios comportamentos supostamente abusivos dificilmente podem configurar, ao menos na forma em que estão documentados nos autos, expressão de um abuso de posição dominante.

Porém, se não é possível estabelecer que tais comportamentos tenham tido como efeito um impedimento, uma restrição ou um falseamento da concorrência, menos é possível estabelecer que tenham tido por objecto esse impedimento, restrição ou falseamento, já que não há quaisquer elementos de prova que suportem uma intenção nesse sentido. Bem ao contrário: sendo a ABVL uma associação de direito privado sem fins lucrativos, formada pelas sociedades corretoras e financeiras de corretagem como associados membros (e pelas instituições financeiras autorizadas a receber valores mobiliários e ordens de bolsa como associados não membros), teria mais a ganhar em abrir o mercado do que em fechá-lo: segundo a queixa inicial da Reuters, o facto de os seus clientes internacionais (impossibilitados de aceder ao serviço INFOBOLSA, que é de âmbito nacional) não terem acesso à profundidade de mercado implicaria, para eles, uma perda de "eficácia e competitividade para intervir no mercado bolsista português". O que corresponderia, afinal, sendo intencional a actuação da ABVL, a uma actuação contra os seus interesses e aos dos seus associados membros, já que - só estes podendo intermediar directamente na Bolsa - permitir aos agentes económicos situados fora da economia nacional condições de "eficácia e competitividade para intervir no mercado bolsista português" implicaria para esses seus associados maior volume de negócios e mais comissões (e mais taxas para a ABVL que, conservando apenas 65% do seu produto, arrecadou, por essa via, 914 140 contos em 1996 e 2 068 094 contos em 1997 - únicos anos em relação aos quais há dados no processo. Por outro lado, a implantação do serviço INFOBOLSA implicou, segundo a ABVL, "um importante acréscimo de custos, na medida em que é necessário disponibilizar material de comunicação específico, instalado em instalações próprias", e implica ainda um pagamento de 50% da receita ao detentor da tecnologia - conforme alegou a ABVL, mas colocando "à disposição [da Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência] todos os elementos de escrituração que suportam esta afirmação" - tendo gerado receitas acumuladas de 289 663 contos (entre 1997 e 1999) e custos acumulados de 318 882 contos (no mesmo período). Tendo em conta que a mera alteração dos preços de fornecimento da informação "crua" aos redifusores (perfeitamente justificável com a disponibilização da informação sobre a profundidade de mercado) já garantiria à ABVL melhores resultados a curto prazo (além dos benefícios de uma maior atracção do investimento internacional a fazer fé na imputação do relatório final da entidade instrutora, supra 6.4.) e, portanto, de maiores ganhos para si e para os seus associados, não se vê como imputar uma intenção anti-concorrencial a uma decisão de fornecer ao público uma informação mais detalhada do que a até então veiculada pelas empresas redifusoras, a um preço mais baixo. (Sobre o alegado atraso na difusão da informação, confrontar o ponto seguinte).

Excluída a possibilidade de, com os elementos constantes do processo, se estabelecer um objectivo ou um efeito anti-concorrencial nos alegados comportamentos abusivos, cabe ainda referir, ex abundante, que também o nexo de casualidade entre posição dominante e comportamentos tidos por abusivos se não verifica, nos termos que têm vindo a ser admitidos pelo Conselho (cfr. o texto sobre Abuso de Posição Dominante - Nexo de Causalidade, no Relatório de Actividade do Conselho de 1996, pp. 14-16, e as decisões aí citadas e, mais recentemente, a decisão proferida no Processo 5/96, publicada em anexo ao Relatório de Actividade do Conselho de 1997, pp. 91-92).

E naturalmente, menos se verificaria "a existência de um juízo de reprovação moral da conduta do agente" que uma parte do conselho já admitiu necessária, citando Focsanéanu:

"L'exploitation abusive d'une position dominante est le fai pour une enterprise de faire un usage répréhensible de la domination du marché pour réaliser des profits ou s'assurer des avantages excessifs aux depens de ses clients ou de ses fournisseurs."

Na mesma decisão (do Processo 3/95, publicada em anexo ao Relatório de Actividade do Conselho de 1995, p. 74) concluía-se "numa condenação por abuso de posição dominante, terá de haver um julgamento de reprovação [do abuso] dessa posição e a convicção sobre o exagero na obtenção de vantagens comerciais à custa de outrem."

Ora, como melhor se vai ver de seguida, nada disso está em causa no caso dos autos: nem as situações de abuso foram confirmáveis tais quais, nem se pode formular qualquer juízo de censura em relação a actuação da ABVL (supondo que era necessário), nem há quaisquer vantagens comerciais exageradas (supondo que também isso era necessário).

12 - A imputação de um atraso na transmissão da informação

Como se referiu supra (6.1.) a alegação de um "atraso sistemático de 20 a 30 segundos" em relação a um terminal SIIB (ver nota 3), documentado unilateralmente pela queixosa, volveu-se, na acusação à ABVL e no relatório final da entidade instrutora, num alegado atraso de 12 a 14 segundos em relação a um terminal INFOBOLSA (ver nota 4), presumivelmente por o segundo ter tomado o lugar do primeiro (cf., v.g., f. 89 dos autos) sem ter em conta que se trata de diferentes soluções técnicas e que a prova (ainda que tivesse sido) feita para um, não valeria para o outro.

Já anteriormente se chamou a atenção para a total ausência de suporte dessa alteração (quanto às diferenças de tempo de atraso e termo de comparação), cabendo agora chamar a atenção para um outro facto que descredibiliza a existência de uma qualquer intenção "conspirativa" nesses atrasos: a fl. 80 dos autos, entre os documentos que a Reuters fez chegar ao processo, encontra-se uma missiva da FUTOP - Gestão de Patrimónios onde se escrevia o seguinte: "Como o vosso serviço de futuros tem um atraso de 15 a 20 segundos, torna-se ineficaz para quem, como a FUTOP, transacciona muito neste mercado". O que é dizer que o "defeito" que a missiva em questão julgava também existir na informação referente à bolsa de valores de Lisboa ("Ao nível das acções parece-me que o vosso serviço tem também este "defeito (...)") existia igualmente na informação referente à bolsa de derivados do Porto, entidade então diversa da ABVL e não empenhada no mercado de redifusão da informação bolsista e, portanto, presumivelmente isenta da intenção de distorcer o mercado em benefício do serviço INFOBOLSA. (O mesmo resulta da cópia do fax da MP Portfólio, SGPS, SA à Reuters, a fl. 78 dos autos).

É certo que, numa missiva da administração da ABVL para a Reuters, datada de 8 de Agosto de 1997, se admitia que "durante o corrente ano entraram em funcionamento programas adicionais de recepção de fluxos de informação cujo tratamento surge a montante do envio do fluxo informativo para a Reuters. Este, ao contrário do que acontece com o sistema SIIB, exige um processamento intermédio que estará provavelmente na origem do assincronismo que referem".

Porém, nessa mesma carta se referia que a ABVL tinha tomado "a decisão de substituir o sistema de negociação da Bolsa de Valores de Lisboa por um novo sistema que inclui um "ticker plant" "mais eficiente", tal como o sistema SIIB estava "em processo de renovação sendo substituído pelo moderno Infobolsa", nada constando do processo sobre as consequências - destas ou de outras - alterações no hardware e software nos atrasos relativos de recepção da informação por parte da Reuters e só sendo relevante a que ocorresse em relação ao terminal INFOBOLSA por ter sido a única que foi levada à acusação e em relação à qual, portanto, a arguida se pôde pronunciar.

Entende o Conselho que, sobretudo em processos de contra-ordenação se não pode prescindir dos actos de investigação e instrução necessários ao cabal apuramento dos factos (sem pôr em causa que, em função de diferentes enquadramentos jurídicos estes tenham de ser mais ou menos rigorosos) - para isso, aliás, se equiparando a Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência a orgão de polícia criminal, com largas competências (artigo 23.º do Decreto-Lei 371/93). Designadamente, não se pode aceitar como prova a mera alegação de um dos intervenientes no processo - como no caso da amostragem sobre os atrasos na recepção de informação fornecido pela Reuters - sem ao menos tentar reproduzi-la (ver nota 5). E muito menos se pode passar dos resultados assim documentados (...) para outros que não têm qualquer expressão documental ou testemunhal, como no caso. Como é evidente "Quem pretende aplicar uma sanção deve certificar-se previamente de que estão reunidas as provas concludentes da culpabilidade do agente e não impor a este o ónus de demonstrar o contrário" (ver nota 4). Ora o que as diligências complementares de instrução, realizadas por iniciativa do Conselho, vieram demonstrar foi que: a) Outros redifusores de informação que operavam no mercado não notaram qualquer atraso, muito menos um "atraso sistemático"; b) Ainda que o tivessem diagnosticado não teriam possibilidade de o imputar à ABVL. Apesar dos esforços do Conselho, e por causa das vicissitudes relatadas, não foi possível esclarecer definitivamente o assunto. Assim, qualquer que fosse o entendimento prevalente em matéria de verificação dos requisitos do abuso de posição dominante, sempre este alegado comportamento seria desconsiderado, por se não poder ter como verificado nos termos referidos nem, muito menos, como imputável à ABVL, ainda que verificado.

13 - A imputação de uma recusa de fornecimento de informação

Se o atraso na difusão da informação há-de ter-se, em termos processuais, como não verificado, a recusa de fornecimento da informação sobre a profundidade do mercado constitui uma interpretação de uma situação de facto - mais propriamente a subsunção de uma realidade a uma previsão legal.

Ora, tal situação de facto é susceptível de entendimento diverso. E se o enquadramento jurídico é legalmente cometido ao Conselho, é sobre a Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência que recai a obrigação do estabelecimento dos factos - e o mínimo que se pode dizer é que a alegada recusa não é um facto. O que se pode estabelecer é apenas o seguinte:

No último trimestre de 1997 foi introduzido o serviço INFOBOLSA, marca registada pela Bolsa de Valores de Lisboa, com a difusão de informação sobre a profundidade de mercado, anteriormente já solicitada pela Reuters e pela Bloomberg;

A partir de Março de 1999 tal informação foi facultada a empresas de redifusão dessa informação, no quadro de negociação dos respectivos contratos (cuja primeira minuta, segundo a ABVL, data de Setembro de 1998);

A Reuters teve acesso a essas transmissões a partir de 22 de Julho de 1999;

O primeiro contacto celebrado com uma empresa de redifusão da informação da Bolsa foi assinado em Fevereiro de 2000 com a Bloomberg;

As negociações com a Reuters prolongaram-se, só tendo esta assinado um novo contrato de prestação de serviços de transmissão de informação em 23 de Agosto de 2000.

Tendo em conta que o atraso nas negociações não pode ser imputado à questão do acesso à informação sobre a profundidade do mercado (ver nota 7) - até porque desde Fevereiro de 2000 já havia uma outra empresa a poder disponibilizá-la e porque, pelo menos desde 22 de Julho de 1999, a própria queixosa já podia ter acesso a ela - o que está em causa é um período de menos de dois anos (de Outubro de 1997 a Julho de 1999 ou, mesmo, a Março de 1999), durante os quais a informação sobre profundidade do mercado disponível no serviço INFOBOLSA não esteve disponível de direito. (De facto, embora por razões diversas, não esteve disponível até cada uma das entidades redifusoras de informação bolsista concluir os respectivos contratos com a ABVL).

A questão que não ficou esclarecida em resultado da inicial instrução do processo, nem foi possível clarificar com as diligências complementares de instrução, foi a da razão de ser de tal dilação. A queixosa e a entidade instrutora entenderam tal demora como uma recusa. A ABVL, como já se deixou dito, invocou diversas razões para o hiato no fornecimento da informação sobre profundidade de mercado aos redifusores de informação:

A disponibilização da informação sobre a profundidade de mercado quintuplicava o débito de informação;

As linhas de ligação (X-25) não comportavam tal fluxo, razão pela qual tiveram que ser substituídas por circuitos de dados com protocolos de comunicação suportados pela pilha TCP/IP;

Tal não constituiu óbice à configuração do sistema INFOBOLSA, uma vez que esta era efectuada em Madrid e a comunicação de dados era feita por satélite;

A prioridade na afectação dos recursos humanos e técnicos esteve na prevenção do chamado "bug" do ano 2000.

Como se referiu supra (8.5.), não foi possível apurar da consistência destas razões, não se tendo pronunciado sobre a insuficiência das linhas de ligação X-25 nenhuma das entidades inquiridas pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência. Em todo o caso, é seguro que se recusa houve, ela foi passiva e não activa, já que numa comunicação da Reuters à ABVL datada de 16 de Dezembro de 1997, trazida ao processo pela queixosa, se escrevia o seguinte sobre uma anterior reunião entre aquelas entidades:

"foi-nos ainda referido que caso de facto a profundidade viesse a fazer parte do Infobolsa, essa informação seria decerto disponibilizada para os diferentes fornecedores de informação, verificando-se desta forma uma situação de igualdade no conteúdo de informação disponível."

E numa carta da administração da ABVL à Reuters, datada de 8 de Agosto de 1997, escrevia-se:

"Estamos certos que, com estes novos sistemas e com as necessárias optimizações que faremos, estaremos em condições de não só de melhorar as condições de transmissão do feed da Reuters como potenciar o alargamento do seu conteúdo".

Reconhecido, desde o primeiro momento, o princípio da igualdade de tratamento das diferentes entidades redifusoras da informação bolsista (ver nota 8) e não postas em causa as explicações para a demora da passagem de tal princípio à prática, não restam dúvidas ao Conselho sobre a inverificação das condições que permitiriam recortar tais omissões como comportamentos abusivos. Nem a isso obsta o facto de tais demoras poderem servir, objectivamente, a melhor implantação do serviço INFOBOLSA no mercado e ser possível, portanto, encontrar nelas um segundo sentido: é que nas particulares circunstâncias do caso, em que tal serviço foi disponibilizado a um preço mais baixo do que o anteriormente praticado pelos outros redifusores de informação bolsista, e em que, no período de "fecho", se não geraram quaisquer lucros, funcionaria como causa justificativa um argumento de industria nascente, relevante em sede do balanço económico previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei 371/93, como se verá a seguir.

14 - Balanço económico

Embora no caso isso seja totalmente dispiciendo, uma vez que os comportamentos - rectius as omissões de fornecimento das informações sobre profundidade do mercado, já que não houve recusa activa - identificadas como abusivos pela entidade instrutora não preenchem os requisitos para assim serem considerados por este Conselho, ainda se poderiam eventualmente justificar através de um balanço económico positivo: mesmo que pudessem ser tidos como práticas restritivas, tais omissões de equiparação dos conteúdos cedidos aos redifusores de informação bolsista (em relação aos disponibilizados ao serviço INFOBOLSA) tiveram por efeito uma melhoria na distribuição de bens (traduzida na presença, de um novo agente económico no mercado de fornecimento dessa informação e na prática de preços mais baixos) reservaram aos utilizadores uma parte equitativa do benefício (resultante de acederem a uma maior/melhor informação a um preço mais baixo) e não deram à nova "empresa" (INFOBOLSA) a possibilidade de eliminar a concorrência. E embora não seja possível considerar tais restrições como indispensáveis para o objectivo de melhorar a distribuição de bens, podia até ser esse o caso (ver nota 9).

Ou seja: mesmo que a acusação à ABVL não soçobrasse por deficiente enquadramento jurídico (cfr. supra 11), ou por inverificação processualmente adequada das circunstâncias de facto subjacentes (cfr. supra 12 e 13), ainda - no que diz respeito à omissão de equiparação imediata entre todos os redifusores da informação gerada na bolsa de valores de Lisboa - se poderia ter por ultrapassada qualquer infracção por verificação (eventual, para que nos importa agora) dos pressupostos do balanço económico previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei 371/93.

15 - Considerações finais

Entende o Conselho formular ainda três observações:

A primeira tem a ver com uma das possíveis raízes do juízo de abuso de posição dominante formulado pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, supra transcrita (6.3.), já que esta entidade entendeu que os comportamentos da arguida se encontravam "em frontal oposição às cláusulas 5.ª (n.º 1, parte final) e 11.º (n.º 2)" do acordo entre a ABVL e a Reuters. Ora, a mais de não ser esse, sequer, o entendimento da queixosa (cfr. o ponto 31 da sua queixa e supra, 8.1., 2.º §), não é ao Conselho, nem à entidade instrutória, que cabe fazer a interpretação do contrato celebrado entre as partes e dos deveres contratuais dele resultantes (excepto onde seja das próprias cláusulas contratuais que decorre a infracção às regras da concorrência);

A segunda tem a ver com o pedido, dirigido pela Reuters à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, para fundamentar uma proposta ao Conselho no sentido de ordenar preventivamente à ABVL a imediata suspensão ou modificação das práticas impugnadas, tal como previsto no n.º 1 do artigo 24.º do Decreto-Lei 371/93. Tal pedido - que aliás mereceu uma comunicação à queixosa indicando que seria feita - veio a ser substituído pela remessa ao Conselho do relatório final. Ora, onde este relatório se pronuncie no sentido da existência de um abuso de posição dominante, parece estar preenchida - ao menos - uma das hipóteses de que tal normativo faz depender a formulação do pedido de suspensão das práticas proibidas. E, assim, considera o Conselho que a conclusão da instrução, com remessa do processo para decisão, não desempenha as mesmas funções, nem permite - por falta de um pressuposto legal - que o Conselho venha a decretar a medida de suspensão provisória da prática em causa. Embora, face à posição do Conselho, tal providência não tivesse sido decretada no caso, pretende-se, com esta chamada de atenção, evitar a criação de um precedente;

A terceira tem a ver com a implícita importância deste processo, reflectida, designadamente, nas sucessivas diligências do Conselho, nas demoradas discussões que suscitou e na presente decisão de arquivamento. Não pela relevância das alegadas infracções que os autos documentaram - rectius: não documentaram -, mas porque, como é reconhecido, elas se situavam na "thorniest area for competition policy in the information economy: the nature of the limits to be placed on conduct by dominant firms" (ver nota 10).

16 - Decisão

Tudo visto e ponderado, o Conselho da concorrência, considerando não ter feito prova suficiente de que tenham ocorrido ou sejam delituosos face à legislação da concorrência os comportamentos de que a arguida veio acusada, decide o seguinte:

1.º Mandar arquivar o processo, nos termos da alínea a) do n.º 1 artigo 27.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro;

2.º Dar conhecimento da presente decisão à arguida e à entidade queixosa.

(nota 1) A Reuters Portugal é detida pela Reuters SA e pela Reuters Group Nominees Lda., cabendo 99,54% do seu capital à primeira e o restante à segunda.

(nota 2) Esta distinção, sendo operacional, é, em grande medida, ficcional: é que o primeiro "tratamento" da informação "bruta" ( ou "crua") incumbe à própria entidade gestora da Bolsa, que é quem adopta uma "chave" de apresentação de tal informação e a fornece às entidades redifusoras para que estas possam decifrá-la e configurá-la ao seu modo. Ao contrário do que acontece num processo de produção "tradicional" não é na transformação do bem (de matéria prima em produto acabado) que está a separação dos mercados (embora isso não seja irrelevante: para o poder fazer adequadamente a ABVL teve de recorrer à Bolsa de Madrid, pagando a esta metade das suas receitas), mas nas diferentes funcionalidades dos operadores em cada mercado. O que a ABVL obtém das redifusoras da sua informação é menos a transformação desta de matéria prima em produto final (embora também seja esse o caso), do que o alargamento do seu mercado (no caso, dos seus mercados, já que tal não de verifica só no mercado de venda da sua informação "One of the great things about information is that you can sell it over and over again" mas também no mercado subjacente, ou seja, no próprio mercado bolsista, na medida em que tal informação é crucial para se poderem tomar decisões autónomas de investimento ou desinvestimento).

Porque tal separação de funcionalidades entre agentes económicos que produzem este tipo de informação (entidades gestoras de mercados regulamentados, na termologia do Código dos Valores Mobiliários) e agentes económicos que a adquirem para redifusão é adequadamente retratada pela transformação do que circula entre terminais informáticos (da informação codificada dita "bruta", ou "crua" até - à informação codificada para ser descodificada - dita "configurada" ou "tratada"), seguiu-se no texto a distinção dos mercados a partir do produto, sem perder a noção de que o releva são os diferentes serviços que tais produtos, afinal, representam.

(nota 3) O sistema interactivo de Informação de Bolsa é definido como um produto informático da propriedade da Bolsa de Valores de Lisboa e por ela desenvolvido e explorado que recolhe informações das sessões de bolsa em tempo real e permite a sua difusão para a rede de clientes directos da bolsa.

(nota 4) O sistema infobolsa é um serviço de informação económico-financeira e de Bolsa em tempo real pertença da ABVL, construído e difundido com base em software pertencentes à Sociedade de Difusão e Informação da Bolsa de Madrid.

(nota 5) Um exemplo dos riscos de aceitar credulamente as alegações das partes num processo é dado no ponto 17 do Relatório final da entidade instrutora: "Igual reclamação (sobre atrasos e acesso à profundidade do mercado( apresentou a Reuters perante a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, entidade responsável pela supervisão e fiscalização dos mercados de valores mobiliários, sem que, até à data, tivesse sido dado conhecimento à mesma de que aquela entidade tenha iniciado, eventualmente, qualquer procedimento". Confronte-se o que já se expôs supra (7.2. in fine) para se perceber que, podendo dizer-se que tal afirmação era verdadeira, não era verdadeiramente exacta.

(nota 6) M.Lopes Rocha, "O processo de contra-ordenação e o Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro", in M.Lopes Rocha/M.Gomes Dias/M.C.Ataíde Ferreira, Contra-Ordenações, Lisboa, 1985, p. 112. Naturalmente, o mesmo vale para os casos em que o nexo de imputação do facto ao agente dispensa a culpa.

(nota 7) Nos termos de um fax enviado à ABVL em 21 de Março de 2000, ainda a Reuters dava conta do atraso nos procedimentos de transição negocial dos seus clientes para o novo serviço, escrevendo a dado passo: "dada a morosidade das negociações, não foi possível até à data comunicar aos clientes, que o acesso à informação da BVLP deixará de ser gratuito e passará a estar sujeito a um custo mensal por terminal. Estas alterações carecem de pré-aviso e só podem ser feitas trimestralmente, pelo que as mesmas poderão ser aplicáveis no dia 1 de Julho de 2000, se definidas de imediato". No mesmo documento propunham-se alterações a várias cláusulas contratuais e solicitava-se "uma versão completa do contrato a assinar entre ambas as partes em português para que possamos proceder à sua tradução". Naturalmente, as análises das implicações técnicas e jurídicas dos contratos de prestação de serviços de informação, reponderadas necessariamente pelos diversos intervenientes após cada alteração proposta e introduzida, implicam um lapso de tempo considerável.

(nota 8) Não só pela ABVL, como acaba de se ver, mas também pela sua entidade fiscalizadora e supervisora, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários: cfr. supra 7.2 in fine.

(nota 9) Sê-lo-ia se a adopção dos meios técnicos de fornecimento da informação sobre a profundidade de mercado não tivesse lugar no caso de a ABVL não conseguir cobrir os seus custos. A ser assim, a criação de um serviço autónomo seria uma forma de obter receitas para custear essa inovação e uma eventual discriminação em relação aos seus concorrentes já estabelecidos no mercado uma forma de assegurar a implantação de tal serviço (com a consequente arrecadação das receitas necessárias à cobertura dos custos de introdução da nova solução informática e, ou, tecnológica).

Note-se que, por insuficiência de dados e irrelevância da questão, tal constitui uma mera hipótese, que se figura por ser tradicional o conselho considerar a possibilidade de efectuar um juízo de balanço económico.

(nota 10) Carl Shapiro, "Competition policy in the information economy", in Einar Hope, ed., Competition Policy Analysys, Routledge, London/New York, 2000, p. 122.

Lisboa, 22 de Fevereiro de 2001. - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete (Relator) - José Álvaro Ubach Chaves Rosa, com a declaração anexa Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva, vencido nos termos da declaração de voto anexa - Carolina de Castro Nunes Vicente e Cunha, vencida nos termos da declaração de voto anexa do vogal anterior - José Anselmo Dias Rodrigues, Presidente.

Declaração de voto

Concordo inteiramente com a decisão e seus fundamentos; reafirmo porém, em conformidade com minhas anteriores tomadas de posição, considerar que quando estejam em causa casos qualificados como de abuso de posição dominante não deve aplicar-se o balanço económico. De facto, ou há abuso ou não há, não faz sentido poder fazer-se um balanço económico positivo (ver caso Tabaqueira, processo 5/96, publicado no Relatório de Actividade do Conselho de 1997, p. 95 ). - José Álvaro Ubach Chaves Rosa.

Declaração de voto

Embora concorde com o resultado a que chegou o conselho quanto à imputação de um atraso na transmissão da informação (ponto 12 da Decisão), votei vencido por discordar da decisão de arquivamento quanto à imputação da recusa de fornecimento de informação sobre a profundidade do mercado, bem como de alguns aspectos da fundamentação que passo, sumariamente, a indicar:

1 - Em primeiro lugar, é indiscutível a existência de uma posição dominante da ABVL no mercado considerado relevante o da informação relativa às transacções efectuadas na Bolsa de Valores de Lisboa por tratar.

2 - Identificada a existência de uma posição dominante, torna-se seguidamente necessário qualificar a conduta imputada à arguida como constituindo uma exploração abusiva dessa posição. Alguns incluem aqui um outro requisito: o do nexo de causalidade entre a própria posição dominante e o comportamento adoptado. Sem me querer alongar neste momento, pela minha parte, julgo que tal contraria as finalidades da lei de defesa da concorrência, constituindo um branqueamento inaceitável de um conjunto de comportamentos que, se adoptados por uma empresa que não dispõe de tal posição são lícitos mas que, quando postos em prática por uma empresa em posição dominante, devem ser considerados abusivos. Por um lado, da posição dominante resultam especiais deveres de conduta, o que aliás está de acordo com a lição do direito alemão que inspirou, directa e indirectamente, a nossa lei neste domínio e constitui também jurisprudência constante do Tribunal de Justiça: "a existência de uma posição dominante significa que incumbe à empresa dominante ou às empresas dominantes, independentemente das causas de tal posição, uma responsabilidade particular de não lesar pelo seu comportamento uma concorrência efectiva e não falseada no mercado comum".(ver nota 1) Por outro, seria absurdo que uma lei tendente a proteger o mercado reservasse um tratamento formalmente igual para comportamentos que têm consequências, actuais ou potenciais, completamente diferentes em função da posição do seu autor. Basta pensarmos nos casos da discriminação de preços ou da prática de descontos de lealdade que, quando adoptados por empresas que não detêm uma posição de relevo no mercado podem ser considerados inócuos do ponto de vista da defesa da concorrência (independentemente do juízo que sobre eles se possa formular ao abrigo das regras sobre práticas individuais) mas que podem entravar, falsear ou mesmo eliminar a concorrência quando adoptadas por empresas que detêm um poder de mercado significativo. A exigência de um alegado nexo de causalidade (não entre o comportamento e o resultado ou o perigo que a lei pretende evitar esse não à regionalização! um verdadeiro problema de nexo de causalidade) constitui, ao abrigo de uma igualdade formal, uma forma de beneficiar as empresas dominantes que julgo inaceitável, independentemente das cautelas com que devamos proceder em matéria de qualificação de um comportamento como sendo abusivo.(ver nota 2)

3 - No cerne desta decisão está uma questão difícil: a da qualificação do comportamento da arguida no período durante o qual comercializou o INFOBOLSA, sem que a informação relativa à profundidade do mercado fosse disponibilizada aos "vendors", assim tornados simultaneamente clientes da ABVL quanto à informação "bruta" e seus concorrentes a jusante. A indisponibilidade dessa informação durante um período de quase dois anos é um facto. Como é também um facto que as alegadas dificuldades técnicas não impediram a ABVL de enviar a informação sobre a profundidade de mercado para Madrid, onde era tratada e reenviada para Portugal por satélite como o serviço INFOBOLSA.

Importaria, contudo, qualificar a conduta da arguida como um abuso da sua posição dominante no mercado da informação "bruta", matéria prima do serviço prestado a jusante pelos "vendors" que comercializam informação relativa à BVL.

Um abuso de posição dominante pode ocorrer quando uma empresa que detém tal posição de poder de mercado viola os especiais deveres de conduta que decorrem dessa situação de facto em que se encontra. A questão que então se coloca é a de saber se existe ou não um dever de, nas circunstâncias do caso, facultar o acesso em condições de igualdade às informações sobre a profundidade de mercado (relativamente às quais detém um monopólio de facto). Tal dever pode encontrar fundamento na jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias em sede do actual artigo 82.º do Tratado de Roma.

Apesar disso, tratando-se de um caso de aplicação das regras de concorrência a um produto que tem características especiais, a informação, seria necessário avançar com alguma cautela de modo a não criar obstáculos ao desenvolvimento da inovação.(ver nota 3) Ao contrário do que sucedia com o caso Magill, a ABVL não detém qualquer exclusivo legal sobre a informação em causa, já que esta escapa ao âmbito de protecção pelos diferentes direitos de propriedade intelectual. Mais, sendo a informação sobre a profundidade do mercado "produzida" pelo e para o mercado de valores onde actuam os então membros da ABVL, não me parece existir o risco de a imposição deste dever impedir a produção e difusão dessa informação. Ou seja, enquanto que noutros casos a imposição de um tal dever poderia retirar o próprio incentivo à inovação (o que se pode presumir, pelo menos nos casos em que a lei protege em abstracto determinados tipos de inovação, e.g. um novo princípio activo para o fabrico de um medicamento), na presente situação não existe nenhum esforço específico de inovação, actual ou potencial, que mereça ser protegido. Com efeito, tal como no caso Magill, a informação cujo acesso foi reservado em condições de discriminação face às empresas de redifusão é um subproduto necessário da actividade (no caso, a partir da introdução de um novo sistema de negociação que permite obter informação sobre a profundidade do mercado). Ao contrário, porém, daquele caso, a informação não recebeu uma discutível tutela pelos direitos de propriedade intelectual. Quer a ABVL pudesse ou não prever a imposição de um dever de dar acesso à informação em condições de igualdade (que ela, aliás, parece ter sempre antecipado em abstracto, como resulta da decisão), tal em nada influenciaria a decisão de adoptar um sistema de negociação que teria como subproduto necessário a informação sobre a profundidade do mercado.

Perante os elementos de facto deste caso, considero que, em termos objectivos, houve uma desconformidade entre o comportamento da arguida, pelo menos até ao momento em que encetou negociações para o fornecimento da informação sobre a profundidade do mercado, e aquele dever de conduta.

Note-se ainda que a imposição do dever especial de conduta não teria necessariamente impedido o surgimento de um novo serviço, apenas imporia à ABVL que criasse uma plataforma de difusão da informação que não servisse apenas os seus próprios interesses via INFOBOLSA, mas também os dos restantes "vendors", seus clientes e dela dependentes para a transmissão de informação sobre a BVL.

4 - Sucede, no entanto, que o não cumprimento dos especiais deveres de conduta das empresas em posição dominante pode ser objecto de uma justificação objectiva a demonstrar pela arguida, em moldes análogos aos do balanço económico. Mas, "se a existência de uma posição dominante não priva uma empresa colocada nessa posição do direito de salvaguardar os seus próprios interesses comerciais, quando estes estiverem ameaçados, e se essa empresa tem a faculdade, dentro dos limites do razoável, de praticar os actos que considerar apropriados para proteger os seus interesses, não podem, no entanto, admitir-se tais comportamentos quando tenham por objectivo reforçar essa posição dominante e abusar dela".(ver nota 4)

A arguida invocou razões de índole técnica para justificar a não disponibilização da informação sobre a profundidade de mercado. No entanto, não conseguiu demonstrar porque motivo essas razões técnicas que impediam o fornecimento da informação "bruta" a "vendors" estabelecidos na mesma cidade não entravaram o envio da mesma informação para Madrid (já que só o envio desses dados de Madrid para os clientes INFOBOLSA se processava por satélite). É verdade que as diligências instrutórias não terão sido conduzidas de uma forma que permitisse apurar com certeza bastante da existência ou não dessas dificuldades. Contudo, o ónus da prova sobre a justificação objectiva tal como no direito penal quanto às causas de justificação (tal como sobre o balanço económico, quando aplicável)(ver nota 5) incumbe à arguida e não às autoridades da concorrência. Acresce ainda que algumas das justificações avançadas nunca poderiam colher pois, a comprovarem-se, elas seriam uma consequência directa da conduta abusiva da arguida: a carência de meios técnicos que, por terem sido dirigidos ao INFOBOLSA, não puderam ser utilizados na disponibilização da informação em condições de igualdade aos "vendors" que dela dependem para disponibilizar informação adequada aos respectivos clientes sobre a BVL.

Há, assim, um conjunto de questões a que a decisão do conselho não responde: como foi possível fornecer a informação a Madrid para configuração do INFOBOLSA sem que tal fosse possível dentro da própria capital? Teria a INFOBOLSA conseguido a quota de mercado que detém se não fornecesse um produto mais completo a que os concorrentes ao nível da divulgação "a retalho" não puderam ter acesso pela recusa da ABVL durante um período de quase dois anos? Caso a informação sobre a profundidade do mercado tivesse sido disponibilizada aos "vendors", ou seja, sendo obrigada a concorrer pelo mérito do seu serviço e não com uma vantagem decorrente da sua posição de monopólio de facto na criação e distribuição da informação "bruta" teria a ABVL tido qualquer incentivo para lançar o INFOBOLSA?

E por fim, uma questão que em meu entender mostra bem a fragilidade desta decisão à luz dos princípios do direito da concorrência: se esta prática não tivesse durado "apenas" dois anos mas tivesse continuado até ao presente, poderia o conselho tomar uma decisão de arquivamento?

Julgo que se perdeu uma excelente oportunidade para esclarecer a forma como as regras da concorrência são aplicáveis na chamada "Sociedade da Informação". E, talvez pior, penso que se deu (desnecessariamente) razão ao cepticismo do Professor e Juiz Richard Posner nesta matéria: "Concern has been expressed recently that U.S. antiturst law may not be well suited to regulating the 'new economy'. (...) The real problem lies on the institutional side: the enforcement agencies and the courts do not have adequate technical resources, and do not move fast enough, to cope effectively with a very complex business sector that changes very rapidly. This problem will be extremely difficult to solve; indeed, I cannot even glimpse the solution".(ver nota 6)

(nota 1) Acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Março de 2000, Procs. Apensos C-395/96P e C-396/96P, considerando 85, Compagnie Maritime Belge Transports c. Comissão, citando o acórdão Michelin, considerando 57.

(nota 2) Aliás, a jurisprudência do TJCE rejeitou este alegado requisito logo no primeiro acórdão sobre uma decisão da Comissão em aplicação do então artigo 86.º do Tratado de Roma (Ac. Continental Can).

(nota 3) Razão que me levou, noutras sedes, a defender uma aplicação particularmente cuidada das regras de concorrência a sectores caracterizados por um elevado nível de inovação e ou onde a legislação confere direitos exclusivos de propriedade intelectual (v. Protecção de programas de computador na Comunidade Europeia - em busca de um equilíbrio entre...", Revista Direito e Justiça, Vol. VII, 1993, p. 253; Inovação, transferência de tecnologia e concorrência. Estudo comparado do direito da concorrência dos E. U. A. e da União Europeia, Dissertação de Mestrado, Faculdade de Direito da Universidade Católica, Lisboa, 1997).

A própria Comissão parece ter uma leitura restritiva do Acórdão Magill, pelo menos a fazer fé nas palavras de um antigo Director-Geral da Concorrência: "My view has been 'Let's not exploit this judgment to the full; and the Commission probably will not", Claus-Dieter Ehlermann, "A Competition Approach to Global Intellectual Property and Telecommunications Market Integration", in Frederick M. Abbott, David J. Gerber, Public Policy and Global Technological Integration, Kluwer Law International, Haia, 1997, p. 175, a p. 176.

(nota 4) Acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Outubro de 1996 nos Procs. Apensos n.os T-24/93 a T-26/93 e T-28/93, Compagnie Maritime Belge Transports e o. c. Comissão, Colect., 1996, p. II-1201, considerando 146).

(nota 5) O que não considero ser o caso numa situação de abuso de posição dominante. Ainda a este respeito, não tendo embora a arguida aduzido argumentos pertinentes a este respeito, o conselho decidiu que qualquer eventual abuso ligado à criação do INFOBOLSA mereceria parcialmente um balanço económico positivo devido ao baixo custo do serviço. Tal não apaga o facto de a posição de mercado do INFOBOLSA depender de uma vantagem negada aos restantes "vendors" e, em todo o caso, as diferenças de custo podem fundamentar-se nos diferentes conteúdos fornecidos pelo INFOBOLSA e pelos serviços concorrentes (sendo o primeiro dirigido sobretudo aos pequenos e médios investidores mais interessados na BVL do que noutros mercados internacionais). Também não reconheço pertinência nesta sede a um argumento retirado das teses proteccionistas no comércio internacional que aqui é aplicado para defender não o aparecimento de um novo produto (já que este é derivado da existência de um subproduto da negociação de valores mobiliários na BVL a informação sobre a profundidade do mercado, logo susceptível de chegar a tantos mais interessados quanto mais depressa os "vendors" internacionais possam redifundir essa informação) mas sim a obtenção de uma vantagem por métodos que não os da concorrência pelo mérito. Acresce que, de qualquer forma, não detendo o INFOBOLSA a mesma projecção a nível internacional ou mesmo nacional que os grandes "vendors" de informação bolsista, não se antevê que tal recusa de venda se pudesse considerar indispensável (como se reconhece na decisão) ou sequer que contribua, de facto, para melhorar a distribuição de informação, já que não há qualquer indício de que a entrada do INFOBOLSA tenha melhorado a situação concorrencial, uma vez que a concorrência só foi reposta condições não discriminatórias após ter cessado a prática abusiva imputada à arguida nesta matéria.

(nota 6) Richard ª POSNER, "Antitrust in the New Economy", John M. Olin Law & Economics Working Paper n.º 106, 2.ª série, University of Chicago Law School, 2000.

Lisboa, 22 de Fevereiro de 2001. - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva.

ANEXO C2

Processo 4/01 - Práticas anticoncorrenciais no mercado dos serviços para pagamento de portagens rodoviárias (medidas provisórias).

O Conselho da Concorrência, no uso da competência atribuída pelo artigo 24.º, n.º 1, do Decreto-Lei 471/93, de 29 de Outubro;

Visto o processo de contra-ordenação registado sob o n.º 4/2001, autuado em 22 de Maio de 2001, e, em particular, a proposta fundamentada da Direcção-Geral do Comércio e Concorrência nos termos da qual se requer, primeiro, que a BRISA/BRISER não suspenda o funcionamento do sistema Via Verde nas portagens das Pontes 25 de Abril e Vasco da Gama, e que, directamente ou através da VVP, continue a prestar à LUSOPONTE os serviços de processamento de dados da Via Verde de forma a permitir o seu envio à SIBS em que são arguidas a BRISA/VVP e a SIBS; segundo, que a SIBS continue a prestar o serviço de processamento das transacções nos termos acordados no contrato assinado com a LUSOPONTE em 1 de Janeiro de 1996; e, terceiro, que a BRISA/BRISER/VVP procedam à discriminação de preços dos serviços - essenciais e não essenciais - de forma clara, transparente e objectiva, com vista ao desenvolvimento das negociações entre as partes envolvidas, tem a ponderar os seguintes elementos de facto e de direito:

I - Os factos

A) A origem do processo

1 - O presente processo teve origem numa queixa apresentada, em 4 de Maio de 2001, junto da Direcção-Geral do Comércio e Concorrência pela LUSOPONTE - Concessionária para a Travessia do Tejo, S. A. (adiante designada LUSOPONTE), através da qual a empresa denuncia ser alvo de comportamentos abusivos por parte da BRISA - Auto-Estradas de Portugal, S. A. (adiante designada BRISA) e da SIBS - Sociedade Interbancária de Serviços, S.A. (adiante designada SIBS), com violação do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro.

2 - Em cumprimento do disposto no artigo 22.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, por despacho da senhora directora-geral do Comércio e da Concorrência, de 22 de Maio de 2001, foi determinada a abertura da instrução do processo de contra-ordenação por existirem indícios sérios de práticas restritivas da concorrência.

3 - Foi entretanto submetida ao Conselho proposta fundamentada para a suspensão de determinadas práticas objecto do presente processo, por entender a Direcção-Geral do Comércio e Concorrência que se encontram reunidos os pressupostos do n.º 1 do artigo 24.º do Decreto-Lei 371/93, proposta essa, datada de 12 de Junho de 2001, sobre a qual o Conselho da Concorrência é agora chamado a decidir.

B) Identificação das empresas

1) A Queixosa: LUSOPONTE

4 - A LUSOPONTE, com sede na Praça da Portagem, Vale Salgueiro, Penas, 2870-392 Montijo, com capital social de 5 000 000 000$, matriculada na Conservatória do Registo Comercial do Montijo sob o número 02430, pessoa colectiva n.º 503174688.

A LUSOPONTE é a empresa à qual foi atribuída a concessão da exploração e manutenção das travessias rodoviárias sobre o Rio Tejo, em Lisboa, a jusante da Ponte de Vila Franca de Xira, vindo a explorar, nessa qualidade, desde 1 de Janeiro de 1996, a Ponte 25 de Abril e, desde 29 de Março de 1998, a Ponte Vasco da Gama. Anteriormente a essa data, a exploração da Ponte 25 de Abril competia à então Junta Autónoma das Estradas (JAE), actual Instituto de Estradas de Portugal (IEP).

2) As arguidas

2.1 - BRISA - Auto-Estradas de Portugal, S. A.

5 - A BRISA - Auto-Estradas de Portugal, S. A. (adiante designada BRISA) tem a sua sede na Quinta da Torre da Aguilha, Edifício Brisa, S. Domingos de Rana, Cascais, com capital social de 300 000 000 de euros, está matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Cascais sob o n.º 10 583, pessoa colectiva n.º 500048177.

Até Dezembro de 1998, a BRISA foi a única empresa concessionária de infra-estruturas rodoviárias com portagem do País, tendo o respectivo capital pertencido maioritariamente ao Estado desde 1976 até ao final do processo de privatização em Maio de 1999. Actualmente a maioria do seu capital está disperso em bolsa, detendo o Estado, através da Partest 4,59%, da Caixa Geral de Depósitos 5,02% e do IPE 5,02%.

O artigo 41.º, n.º 2, do Decreto-Lei 371/93 excepciona do campo de aplicação do diploma, no caso de serviços públicos, as empresas "concessionadas pelo Estado por diploma próprio, no âmbito e na vigência do respectivo contrato de concessão". Não obstante se tratar de uma empresa concessionária do Estado, a BRISA está sujeita à legislação da concorrência no âmbito do presente processo, porquanto actua aqui fora dos contornos de qualquer contrato de concessão.

Com efeito, no caso em apreço, a BRISA é uma simples prestadora de serviços que possibilita à LUSOPONTE e a outras concessionárias da exploração de infra-estruturas rodoviárias (Auto-Estradas do Atlântico, S. A. e AENOR - Auto-Estradas do Norte, S. A.) a utilização do sistema Via Verde. Na sua actividade de concessionária, a BRISA é também utilizadora dos serviços Via Verde. O Conselho da Concorrência partilha o entendimento da Direcção-Geral do Comércio e Concorrência, segundo o qual essa actividade nada tem que ver com o contrato de concessão da Brisa, nos termos do qual é adjudicado a essa empresa a concessão de certas auto-estradas em Portugal. A queixosa alega que tal entendimento é, de resto, confirmado pelo Estado Português, através do GATTEL, ainda que a carta desse serviço incluída no processo, por fazer referência a uma carta da LUSOPONTE que não foi junta ao processo, não permita uma conclusão definitiva quanto à posição daquele Gabinete a este respeito (fl. 181 do processo).

Associadas à BRISA encontramos duas outras empresas nas quais ela detém a totalidade ou a maioria do capital social e que são igualmente identificadas como arguidas pela Direcção-Geral do Comércio e Concorrência por estarem ou terem estado ligadas à prestação do serviço Via Verde.

2.1.1 - BRISER

6 - A BRISER - Serviços Viários, S. A., (adiante designada BRISER) empresa cujo capital social de 5 000 000$ é detido a 100% pela BRISA, tem sede na Rua Castilho, 50, 5.º, registada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, sob o n.º 4759, pessoa colectiva n.º 503272507.

Esta empresa, que fornece bens e serviços a terceiros, participou nas negociações iniciais tendentes à contratação do sistema Via Verde para as pontes concessionadas à LUSOPONTE (v. carta e proposta de protocolo a fls. 46 e ss. do processo). Com a criação de uma nova empresa, a VIA VERDE PORTUGAL, a BRISER deixou de prestar serviços no âmbito do sistema Via Verde, segundo carta da própria constante do processo (fl. 277).

2.1.2 - VIA VERDE PORTUGAL - Gestão de Sistemas

Electrónicos de Cobrança, S. A.

7 - A VIA VERDE PORTUGAL - Gestão de Sistemas Electrónicos de Cobrança, S. A. (adiante designada VVP), com sede na Quinta da Torre da Aguilha, apartado n.º 272 EC Carcavelos, 2785-599 São Domingos de Rana, registada na Conservatória do Registo Comercial de Cascais sob o n.º 12 795, pessoa colectiva n.º 504656767. O seu capital social de Euro 500 000 é detido pela BRISA em 75% e pela SIBS em 25%.

Segundo esta arguida, "numa perspectiva de reduzir os custos e de melhorar a qualidade do serviço prestado (...) a BRISA decidiu subcontratar a exploração [do sistema Via Verde] a uma outra sociedade para o efeito constituída a VIA VERDE PORTUGAL (...)" (fl. 237 do processo).

2.2 - SIBS - Sociedade Interbancária de Serviços, S. A.

8 - A SIBS - Sociedade Interbancária de Serviços, S. A. (adiante designada SIBS) com sede na Rua do Centro Cultural n.º 2, 1700 Lisboa, com o capital social de Euro 24 583 054,84, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o n.º 58 688, pessoa colectiva n.º 501408819, é uma empresa comum cujo controlo é efectuado pelo conjunto das instituições de crédito, suas accionistas, tornando-se o veículo instrumental destas para a prossecução de estratégia uniforme na área da implementação e gestão dos meios de pagamento automático "MULTIBANCO".

C) O Sistema Via Verde

9 - A Via Verde é um sistema que foi desenvolvido pela Brisa, com a participação da Micro Design (empresa Norueguesa) e introduzido em Portugal em 1991, ainda na época em que detinha o monopólio da exploração da rede nacional de auto-estradas. Inicialmente, implementado apenas em algumas barreiras de portagem onde a taxa era fixa - sistema aberto - mais tarde, o sistema Via Verde, graças à adopção de uma nova tecnologia, pôde ser generalizado a toda a rede de Auto-Estradas, incluindo o sistema fechado que implica a existência de uma praça de portagem de entrada e outra de saída. O processo de implantação da Via Verde foi concluído no Verão de 1995, altura em que todas as portagens das Auto-Estradas concessionadas à Brisa passaram a dispor de Via Verde. Portugal, com este sistema completamente inovador implantado, tornou-se o primeiro país europeu com uma rede integrada de portagem "non stop" electrónica.

10 - Através deste sistema, os utentes das infra-estruturas rodoviárias com portagem, podem efectuar o pagamento automático da respectiva tarifa de portagem, por transferência electrónica, mediante a instalação de um dispositivo electrónico (o identificador) no pára-brisas das viaturas, sem necessidade de pararem nas praças das portagens. Este sistema implica a assinatura de um "contrato de adesão à via verde" de cada um dos utilizadores, com a BRISA. Nos termos da cláusula I desse contrato de adesão, o sistema Via Verde oferece ao aderente "a possibilidade de efectuar a operação de pagamento da taxa de portagem por meio electrónico, mantendo a viatura em movimento" (cl. 1.2.). Para o efeito, o cliente deve, ao adquirir o identificador (ao preço actual de 3300$00) proceder à respectiva validação, "associando-o a um cartão válido no sistema MULTIBANCO, só produzindo o contrato efeitos depois da referida associação" (cl. 2.3.).

A transacção da Via Verde é iniciada com a leitura do número de identificador do utilizador (ou cliente da Via Verde) pelo equipamento instalado nas praças de portagem localizadas, no caso da queixosa, na ponte 25 de Abril e na ponte Vasco da Gama.

A LUSOPONTE processa informaticamente a transacção (número de identificador e número de passagens) e remete os dados electronicamente à BRISA.

A BRISA faz então o processamento dos dados e a associação do número do identificador via verde com a identificação do utilizador (cliente) e do cartão multibanco do utilizador.

Essa associação implica o conhecimento da identidade do utilizador/cliente, matrícula do veículo, morada e referência do cartão multibanco.

Seguidamente, a BRISA envia electronicamente as transacções para a SIBS, que transfere o valor de cada transacção da conta bancária do utilizador (cliente), associado ao identificador para a conta da concessionária.

A SIBS efectua o processamento do pagamento, o qual envolve a recepção electrónica dos ficheiros de transacções processados pela BRISA e, para cada transacção, a respectiva transferência bancária da conta do cliente para a conta da concessionária, relativa à quantia cobrada na portagem.

As transacções não processadas pela SIBS, por falta de fundos na conta do utilizador ou por qualquer outra razão, são devolvidas à BRISA através de um outro ficheiro electrónico, a qual volta a remeter as referidas transacções à SIBS, semanalmente, durante doze meses a contar da data inicial da transacção.

Do ponto de vista das concessionárias de infra-estruturas rodoviárias com portagem, o serviço Via Verde surge como um input para a prestação do serviço concessionado, a utilização das respectivas infra-estruturas, a par de outros serviços de pagamento electrónico como o sistema Multibanco. Como se verá, as características do sistema Via Verde diferenciam-no em diversos aspectos desses outros serviços relativos a meios de pagamento.

Do ponto de vista do cliente do serviço Via Verde, este oferece-lhe um meio alternativo de pagamento em infra-estruturas rodoviárias com portagem equipadas com esse serviço, não se confundido, todavia, com a relação contratual estabelecida entre esse cliente e a concessionária de cada infra-estrutura utilizada. Com efeito, é a essa concessionária que a portagem é devida, sendo o serviço Via Verde um dos meios de pagamento à disposição do utilizador dessas infra-estruturas, ainda que com especiais vantagens.

11 - O sistema Via Verde pode funcionar em sistema aberto ou em sistema fechado.

O sistema aberto significa que o valor da portagem é fixo e "pago" no momento em que o cliente/utilizador passa por uma única praça de portagem existente num determinado lanço de auto-estrada ou ponte com portagem.

O sistema fechado implica a existência de uma praça de portagem de entrada na auto-estrada e outra de saída, sendo o processamento das transacções efectuado com base no cálculo do valor da portagem dependente do número de quilómetros percorridos.

Assim, enquanto que no sistema fechado, nos casos em que os pontos de entrada e de saída pertencem a concessionárias diferentes, o processamento implica ainda um outro cálculo que é o da proporção do valor de portagem a atribuir a cada concessionária envolvida, para além dum conjunto de transmissões seguidas entre a BRISA e as concessionárias, no sistema aberto aquele processamento limita-se apenas a uma transmissão diária por parte da BRISA e a concessionária. Tal indicia que o custo por transacção é inferior no caso do sistema aberto.

A LUSOPONTE opera as suas duas praças de portagens através do sistema aberto, enquanto que as restantes concessionárias, incluindo a BRISA, operam com base no sistema fechado.

D) A queixa

12 - Quer o contrato de concessão, aprovado por Resolução do Conselho de Ministros n.º 121-A/94, de 2 de Dezembro, quer as Bases da Concessão, aprovadas por Decreto-Lei 168/94, de 15 de Julho, impunham, desde logo, à concessionária, a obrigatoriedade de oferecer aos seus clientes um sistema de pagamento automático de portagem - o designado sistema via verde, o qual vinha já sendo utilizado pela JAE, à época responsável pela exploração daquela ponte.

De facto, nos termos do disposto na cláusula 59.1 do Segundo Contrato de Concessão e na Base LIV das Bases de Concessão, estabelece-se que "(a)s formas de pagamento das portagens incluirão o sistema manual, automático (via verde), por cartão de crédito ou de débito, ou outras a aprovar pelo CONCEDENTE".

Nos termos da cláusula 91.1 do Segundo Contrato de Concessão, o incumprimento das obrigações da concessionária pode dar lugar ao pagamento de multas contratuais entre 1 000 000$ e 100 000 000$.

13 - Assim, a LUSOPONTE, face à obrigatoriedade, perante o concedente, de fornecer aos utilizadores das duas pontes um sistema automático de pagamento de portagem, iniciou, através da GESTIPONTE - Operação e Manutenção das Travessias do Tejo, S. A. ( adiante designada por GESTIPONTE), negociações com a BRISA para utilização do sistema Via Verde com vista à conclusão de um contrato que abrangesse as duas pontes. A BRISA participou nessas negociações através de uma empresa cujo capitais detinha a 100%, a BRISER - Serviços Viários, S. A., a quem havia "cedido a exploração do sistema Via Verde".

As referidas negociações nunca conduziram a um contrato escrito, tendo, todavia, as partes concordado, após meses de negociações, que a BRISA continuasse a assegurar os serviços da Via Verde (serviço principal e serviços acessórios) pelo montante de 3 170 000$00, o qual seria actualizado de acordo com a taxa de inflação do índice de preços ao consumidor IPC.

A VVP descreve nos seguintes termos os antecendentes desta relação (carta à LUSOPONTE, datada de 31 de Janeiro de 2001, a fls. 237 e ss. do processo):

"Quando o sistema "Via Verde" foi adaptado à Ponte 25 de Abril, então explorada pela (...) JAE, a BRISA cobrava as importâncias correspondentes às portagens e entregava-as à JAE sem debitar a esta a quota-parte dos custos do sistema. O procedimento não era correcto, mas na altura não levantou questões: a JAE era um organismo do Estado, que também detinha a quase totalidade do capital da BRISA.

Mais tarde, a LUSOPONTE viria a transformar-se em concessionária das duas travessias sobre o Tejo (...). E, sendo o sistema "Via Verde", à luz do contrato de concessão, um dos sistemas de pagamento de portagens previsto, deveria também passar a ser tratada como uma concessionária normal: a BRISA, detentora do sistema e contratante directa com os utentes, procederia às cobranças, reteria a quota-parte dos custos e entregaria ao operador a diferença.

Curiosamente, já então, nunca foi possível qualquer entendimento com a LUSOPONTE, a BRISA, para não bloquear o sistema, viu-se na necessidade de "impor" (sic) a única solução possível: determinar a quota-parte dos custos e reter a respectiva importância. É isto que tem vindo a ser feito: a BRISA cobra e a LUSOPONTE suporta, sem jamais assumir qualquer vínculo contratual - uma pura situação de facto.

Mas a BRISA cometeu aqui um erro colossal: nunca actualizou aquele preço, salvo no que se refere ao efeito inflação. Sucede que, desde o momento inicial até hoje, a empresa adquiriu equipamento, comprou e desenvolveu "software", montou uma estrutura própria e serve mais de um milhão de clientes. Os custos de hoje, tal como os serviços prestados hoje nada têm que se assemelhe à posição de partida. Mas a LUSOPONTE continua a pagar o mesmo...

O equívoco está aqui. Não pomos em dúvida que o tarifário ora proposto pela VIA VERDE seja 30% superior ao que vinha sendo praticado pela BRISA. Em boa verdade, espanta-nos que a diferença não seja maior. A explicação é apenas esta: a BRISA, por razões que são dela, manteve-se durante vários anos a financiar a LUSOPONTE; a VIA VERDE não está disposta a fazê-lo".

Esta citação, apesar de longa, dá bem conta do objecto do litígio comercial entre a queixosa e as arguidas. Não parece, contudo, correcto caracterizar a situação de utilização do sistema Via Verde nas pontes concessionadas à queixosa como uma "pura situação de facto".

Como resulta claramente da própria expressão utilizada pela VVP, a sua accionista maioritária "impôs" a solução em vigor até 31 de Janeiro de 2001, tendo prestado um conjunto de serviços à LUSOPONTE à qual debita o montante unilateralmente imposto, com actualização em função da inflação. Aliás, é a própria BRISA, em cujo universo empresarial a VVP se integra, que no seu prospecto de Maio de 1999 refere que celebrou "um contrato de prestação de serviços com a Lusoponte Concessionária para a Travessia do Tejo, S. A. para a utilização daquele [Via Verde] sistema" (fl. 141 do processo).

Perante estes elementos é legítimo entender que desde 1 de Janeiro de 1996 a LUSOPONTE, através da GESTIPONTE, e a BRISA, através da BRISER, mantêm uma relação contratual nos termos da qual esta tem vindo a prestar aqueles serviços, constantes da cláusula 4.ª do referido Projecto do Protocolo (ver, por exemplo, a factura BRISER relativa ao mês de Janeiro de 2001 a fl. 286 do processo) até à sua substituição pela VVP, a qual continuou a oferecer os mesmos serviços com novas condições impostas pela mesma carta de 31 de Janeiro até ao presente (v. factura VVP relativa ao mês de Abril de 2001 a fl. 285 do processo), ameaçando agora suspender o serviço Via Verde a partir de 30 de Junho, na falta de aceitação da sua proposta (v. carta de 8 de Março a fls. 274 e ss. do processo).

A situação relativamente à SIBS, que detém 25% do capital da VVP e é uma interveniente necessária na prestação do serviço Via Verde, é inequívoca: existe entre a LUSOPONTE e aquela arguida um contrato escrito, em vigor desde 1 de Janeiro de 1996, que cobre igualmente os sistemas de portagem dinâmica (cl. 2.1).

No entanto, a SIBS veio, por carta de 8 de Fevereiro de 2001 (fl. 266), comunicar que "a criação da empresa Via Verde Portugal, em Setembro de 2000, terá contudo um impacto directo no objecto do [contrato entre a LUSOPONTE e a SIBS], tornando imperativa a respectiva actualização antes da passagem do serviço para a esfera da nova empresa", propondo a celebração de "uma adenda ao contrato actualmente em vigor, na qual se reflectiriam as implicações que decorrem da criação da Via Verde Portugal", a assinar conjuntamente pela LUSOPONTE, pela VVP e pela SIBS.

A esta proposta respondeu a queixosa que a mesma "não poderá ser aceite enquanto não houver um acordo entre a Lusoponte e a Via Verde Portugal", reclamando ainda contra o facto de a SIBS ter procedido à cobrança das transacções do sistema Via Verde com base no novo tarifário imposto pela VVP e comunicado na carta desta de 31 de Janeiro (fls. 268 e ss.).

14 - Nos termos da cláusula 4ª da minuta de Protocolo relativo ao processamento de dados de exploração da Via Verde na Ponte 25 de Abril, que parece, ainda que não assinado, definir o âmbito dos serviços oferecidos primeiro pela BRISER e agora pela VVP, há um conjunto de 28 tarefas a desempenhar pela empresa que explora aquele serviço.

A LUSOPONTE entendeu, no entanto, que apenas aquilo que designa como serviço principal, abrangendo as operações relativas à cobrança, associação do identificador ao utilizador, associação ao cartão multibanco - operações estas essenciais ao funcionamento do próprio sistema via verde porque essenciais ao tratamento dos elementos que a BRISA tinha de enviar à SIBS, - eram executados satisfatoriamente.

Relativamente aos serviços não essenciais e, como tal, considerados acessórios - identificação dos utilizadores com cartões sem saldo, fotografias dos infractores e emissão, entre outros, - a sua prestação foi sempre julgada insuficiente por parte da queixosa, motivo porque a LUSOPONTE decidiu instalar em 1998, ela própria, um novo equipamento de portagem, que lhe terá permitido construir, de forma gradual, uma base de dados dos infractores, os quais passaram a ser identificados a partir das fotografias obtidas aquando da sua passagem na portagem em situação irregular. Dado que o risco com as infracções parece correr pela queixosa, é fácil compreender os prejuízos que para esta podem decorrer de falhas nos serviços ligados à detecção e identificação de infracções.

Também, a partir de Setembro de 1999, a LUSOPONTE pôs em funcionamento um Call Center para atendimento dos clientes e um programa de comunicação com os clientes. Assim, a partir de Abril de 1998, para a Ponte Vasco da Gama, e de Setembro de 1998, para a Ponte 25 de Abril, a LUSOPONTE, com a instalação de novos equipamentos, deixou de solicitar à Brisa os serviços acessórios relativos à identificação de infractores através de fotografia, sem que, contudo, aquela redução viesse afectar o preço acordado com a BRISA, que continuou a ser pago sem redução do seu montante, o que, em todo o caso, parece resultar de acordo entre a LUSOPONTE e a BRISA (v. 2.6 do Relatório do administrador-delegado da LUSOPONTE sobre a Via Verde, a fls. 249 e ss. do processo).

15 - O processamento do sistema Via Verde necessita também da intervenção da SIBS, já que só esta empresa dispõe das informações necessárias para estabelecer o nexo entre código do identificador e o número do cartão MULTIBANCO do utente. Para este efeito, as duas empresas celebraram, em 1 de Janeiro de 1996, um contrato nos termos do qual a SIBS se comprometeu a creditar na conta da LUSOPONTE os montantes das portagens pagas.

Nos termos da cláusula 2ª daquele contrato, a SIBS obriga-se a prestar à LUSOPONTE os seguintes serviços:

a) Controlo e gestão de todas as operações electrónicas que serão de dois tipos: i) portagem manual, e ii) portagem dinâmica;

b) Cobrança das taxas de portagem do serviço de portagem dinâmica durante o período em que o cartão caducar, desde que o utente disponha de outro cartão, e seja tecnicamente possível associá-lo ao dispositivo utilizado;

c) Emissão mensal de factura/recibo, em nome e por conta da LUSOPONTE, com a descrição das taxas de portagem cobradas a cada utilizador do serviço de portagem dinâmico, sempre que solicitado pela LUSOPONTE.

Como resulta inequivocamente da al. c) da cl. 2.1, o serviço de emissão de factura/recibo pode ou não ser prestado pela SIBS à LUSOPONTE, dependendo da iniciativa desta. Tal compreende-se facilmente, pois a emissão da factura/recibo compete à entidade que presta o serviço ao cliente que é remunerado utilizando um qualquer meio de pagamento aceite por aquela. No caso, é à LUSOPONTE que compete a emissão da factura/recibo correspondente ao pagamento de um serviço por ela prestado, o pagamento da portagem. Neste aspecto, o serviço Via Verde não se distingue dos outros modos de pagamento, como seja o caso do sistema Multibanco ou por pagamento em numerário.

Tendo a LUSOPONTE verificado que era possível obter no mercado a um preço inferior ao praticado pela SIBS, beneficiando de uma importante economia de custos mediante a emissão de recibos agrupados por utilizador (v. fls. 16 e ss.), contratou, para o efeito a empresa CARTESIUS, prescindindo, assim, da prestação destes serviços pela SIBS. A relação de acessoriedade destes serviços relativamente ao objecto principal do contrato com a SIBS, os chamados serviços essenciais, decorre directamente da sua oferta separada, com carácter facultativo para a LUSOPONTE, nos termos da cláusula 2ª do mesmo.

16 - Resulta assim da queixa e dos elementos constantes no processo que o litígio comercial entre a queixosa e as arguidas diz respeito ao âmbito dos serviços a prestar (só os serviços considerados essenciais pela LUSOPONTE ou também os serviços acessórios) pela entidade que explora o sistema Via Verde (actualmente a VVP) bem como quanto ao preço a pagar. A VVP apenas se dispõe a oferecer o conjunto daqueles serviços, recusando-se a prestar apenas os serviços essenciais e facturando à LUSOPONTE os serviços acessórios que ou são assegurados directamente por esta ou por uma entidade com a qual ela contratou a sua prestação.

17 - Nos termos da referida carta de 31 de Janeiro, o presidente do conselho de administração da VVP informou o seu homólogo da LUSPONTE que "o conselho de administração da VIA VERDE, ouvidos também os seus accionistas de referência, deliberou o seguinte:

a) Entrar em funcionamento efectivo a partir de 1 de Fevereiro de 2001, prestando o serviço "Via Verde" a todas as concessionárias de auto-estradas com portagem existentes em Portugal;

b) Praticar, em relação a todas elas, e por um período experimental de seis meses, o tarifário já acordado com três (sic), com os ajustamentos referentes ao custo do extracto mencionados no número anterior; no caso da LUSOPONTE, isto significa 12$00/11$00 por transacção e cerca de 57$00 por utilizador;

c) Adoptar a metodologia processual já anteriormente seguida pela BRISA: cobrança da taxa, retenção do custo do serviço, pagamento à concessionária do diferencial;

d) Manifestar às quatro concessionárias disponibilidade total para, a partir desta data, desenvolver um trabalho conjunto tendente à melhoria do serviço e a uma maior redução dos custos;

e) Continuar a disponibilizar, às quatro concessionárias, todos os elementos que serviram de base ao cálculo do tarifário adoptado;

f) Manifestar à LUSOPONTE total abertura para, se assim o entender, se recorrer a uma comissão arbitral para dirimir eventuais conflitos".

Na sua resposta a esta carta, a LUSOPONTE, reafirmando embora a sua posição nesta matéria, manifestou igualmente vontade "de pôr termo às actuais divergências, seja por via arbitral, seja por via negocial" (fl. 247 do processo).

18 - Segundo o Relatório do administrador-delegado da LUSOPONTE sobre a Via Verde (fls. 249 e ss. do processo), no ano de 2000, a BRISER recebeu 48 000 contos pelos serviços prestados no âmbito do sistema Via Verde, a que correponde, segundo a queixosa, um custo de 2$95 por transacção. Ainda segundo a queixosa, no mesmo ano a LUSOPONTE pagou à SIBS cerca de 77 000 contos, o que equivalerá, segundo ela, a 4$76 por transacção.

Perante a proposta da VVP, e utilizando os valores de 2000 como base de comparação, aquele relatório da queixosa estima que em vez dos 125 262 contos pagos à SIBS e à BRISER (correspondendo a um custo por transacção de 7$71), o custo passaria a ser de 447 675 contos (elevando-se o custo por transacção a 27$56), incluindo os serviços não solicitados pela LUSOPONTE (ou mesmo 530 00 contos segundo estimativas imputadas pela queixosa à VVP a fl. 258 do processo). Este valor seria reduzido numa segunda proposta da VVP, descrita pela queixosa a fls. 260 e ss. do processo, mas ainda assim o custo a suportar pela LUSOPONTE ascenderia a 397 247 contos.

O significativo aumento de custos é comprovado pela comparação entre a factura recibo emitida pela BRISER relativamente a Janeiro de 2001 a fl. 286 do processo, no valor de aproximadamente 4 800 contos, a que acrescem os pagamentos à SIBS no total de cerca de 9 500 contos (facturas a fls. 287 a 290) com a factura apresentada pela VVP relativamente a Abril de 2001 a fl. 285 do processo, no total de 41.447 contos! Independentemente dos ajustamentos necessários a uma comparação mais precisa dos níveis de preços, a qual será certamente possível durante a instrução do presente processo, a diferença é muito considerável.

São igualmente pertinentes, e não deixarão seguramente de merecer uma análise mais detalhada em sede de instrução, as considerações tecidas pela queixosa quanto à repartição do custo pelas diferentes concessionárias de infra-estruturas rodoviárias com portagem. Assim, a fl. 262 do processo expõe-se no citado relatório da queixosa que representando a mesma 10% das receitas da Via Verde, pelas condições impostas pela VVP lhe está a ser exigido o pagamento de 25% do total de custos fixos da Via Verde (7.6, ver igualmente as afirmações nos pontos 4.8 e 4.9 daquele relatório). Dos elementos constantes do processo, é razoável inferir que o custo de operação do sistema Via Verde é superior no caso da operação em sistema fechado (como sucede em boa parte senão em todas as infra-estruturas exploradas pela BRISA) relativamente ao caso da arguida, que explora um sistema aberto, pelas razões anteriormente expostas.

19 - Perante a recusa da LUSOPONTE em aceitar as condições impostas unilateralmente pela VVP e postas em prática com a colaboração da SIBS, a VVP transmitiu à queixosa, por carta de 8 de Março de 2001, que na falta de acordo, seria cessada a prestação do serviço Via Verde nas pontes exploradas pela queixosa a partir de data que seria dada a conhecer à LUSOPONTE, mas que não seria posterior a 30 de Junho de 2001 (fls. 274 e 275).

20 - A 5 de Abril de 2001, também a SIBS comunicou à LUSOPONTE que cessaria a prestação dos serviços no âmbito da Via Verde a partir de data a determinar, se não lhe fosse enviado um contrato celebrado com a sociedade que explora aquele sistema ou uma carta que a autorizasse a cobrar o preço que a VVP determinou (fl. 279).

21 - Em síntese, destaca a Direcção-Geral do Comércio e Concorrência os seguintes factos que julga relevantes para a consideração pelo Conselho da Concorrência da sua proposta de medidas provisórias:

I) A Lusoponte estava obrigada a adoptar o sistema Via Verde, de acordo com o segundo contrato de concessão e as bases da concessão;

II) Este sistema, introduzido em Portugal pela BRISA. estava já em uso na Ponte 25 de Abril, no momento em que a Lusoponte assumiu a respectiva exploração;

III) O acordo entre a LUSOPONTE e a BRISA, embora não reduzido a escrito, foi assumido pelas partes, desde Janeiro de 1996 (v. fl. 141 do processo);

IV) Entende a Lusoponte que a Brisa prestou apenas "de forma satisfatória, o serviço principal, essencial ao funcionamento da Via Verde";

V) Relativamente a outros serviços, designados como acessórios, a sua prestação foi considerada deficiente pela queixosa, impe dindo a identificação dos infractores, pelo que desde Setembro de 1999, foram por si directamente supridos;

VI) Também relativamente aos serviços acessórios estabelecidos no contrato com a SIBS, designadamente extractos/recibos correspondentes às transacções, a LUSOPONTE tendo verificado que era possível obter no mercado a um preço inferior ao praticado pela SIBS, e agrupados por utilizador, contratou, para o efeito a empresa CARTESIUS, prescindindo, assim, da prestação destes serviços pela SIBS;

VII) Em meados de 2000, é constituída a VVP, como cessionária da BRISA/BRISER e da SIBS para a prestação, designadamente, do serviço da Via Verde;

VIII) A Lusoponte, não obstante não ter consentido na cessão da posição contratual acima referida, viu novas condições serem-lhe impostas pela VVP;

IX) A VVP impõe serviços que, segundo a queixosa, esta se recusou a contratar com a Brisa, em 1996, bem como o serviço de emissão e envio de extractos/recibo para clientes, serviço este que, desde Setembro de 1999, lhe são prestados pela empresa CARTESIUS;

X) Segundo a queixosa a proposta da VVP ao abranger, em bloco, para além dos serviços essenciais, todos os serviços acessórios contidos nos anteriores contratos com a BRISA e a SIBS, incluindo aqueles que a LUSOPONTE havia já prescindido, vem quadruplicar os custos que tinha com o cumprimento dos referidos contratos iniciais com a BRISA/BRISER e a SIBS;

XI) Daí, que a LUSOPONTE tenha informado a VVP que não poderia aceitar a proposta formulada por esta, no domínio de uma renegociação/actualização de preços e prestação mais eficiente de serviços;

XII) Em 31 de Janeiro passado, a VVP enviou uma carta ao presidente da Lusoponte informando que a partir de 1 de Fevereiro de 2001 iria aplicar, unilateralmente, os preços contidos na proposta apresentada (fls. 237 e ss. do processo);

XIII) Em 8 de Março de 2001, o presidente do conselho de administração da VVP comunica por carta à Lusoponte que deixaria de fornecer o serviço Via Verde, caso não houvesse acordo até 30 de Junho e simultaneamente informa que continuará a cobrar os preços constantes da proposta, já referida, de 18 de Janeiro;

XIV) Em 5 de Abril passado, a Lusoponte recebeu uma carta da SIBS, junta aos autos como anexo 10 da queixa, comunicando que fará cessar a prestação de serviços, "uma vez que V Exmas.", refere-se à queixosa, "parecem não concordar com o preço e demais condições estabelecidas pela sociedade que explora esse sistema dinâmico de cobrança".

E) O pedido de medidas provisórias

22 - Considerando a queixosa que os comportamentos das arguidas consubstanciam práticas restritivas da concorrência e, como tais, puníveis, requereu também à Direcção-Geral do Comércio e Concorrência que, face à gravidade da situação, solicitasse ao Conselho da Concorrência que, ordene, preventivamente, e até a decisão final, nos termos do artigo 24.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, o seguinte:

a) À BRISA/BRISER que directamente, ou através da VVP, continue a prestar à LUSOPONTE os serviços de processamento de dados da Via Verde de forma a permitir o seu envio à SIBS, nas condições em que os vinha prestando até 31 de Janeiro de 2001;

b) À VVP que cobre pela prestação dos serviços de processamento de dados da Via Verde à LUSOPONTE o montantes que estiveram em vigor até Janeiro de 2001;

c) À SIBS que continue a prestar o serviço de processamento das transacções nos termos acordados no contrato assinado com a LUSOPONTE em 1 de Janeiro de 1996;

d) À VVP que se abstenha de enviar aos clientes da Lusoponte os extractos/recibos relativos às transacções Via Verde na Ponte 25 de Abril e na Ponte Vasco da Gama.

23 - A Lusoponte justifica o seu pedido alegando que a situação se "agrava com a aproximação do fim do prazo concedido pela VVP - 30 de Junho - e com a aproximação da época balnear, que se traduz em tráfego automóvel ainda mais substancial, designadamente na Ponte 25 de Abril, ou seja, para evitar um prejuízo grave e irreparável (...) é imperativo que se decretem as referidas medidas uma vez que não existe alternativa à utilização da Via Verde por parte da Lusoponte".

Acrescenta ainda a Lusoponte que a imperatividade das referidas medidas provisórias não se funda exclusivamente nos interesses comerciais das partes mas que se justifica plenamente em situações "intoleráveis para o interesse público" fundamento essencial que se encontra preenchido no presente caso.

F) Proposta da Direcção-Geral do Comércio e Concorrência

24 - Considerando que se encontram reunidos os pressupostos exigidos no n.º 1 do artigo 24.º do Decreto-Lei 371/93, para a suspensão das práticas proibidas, a Direcção-Geral do Comércio e Concorrência propõe que o Conselho da Concorrência ordene ao abrigo daquela disposição que:

e) A BRISA/BRISER não suspenda o funcionamento do sistema via verde nas portagens das Pontes 25 de Abril e Vasco da Gama, e que, directamente, ou através da VVP, continue a prestar à LUSOPONTE os serviços de processamento de dados da via verde deforma a permitir o seu envio à SIBS;

f) A SIBS continue a prestar o serviço de processamento das transacções nos termos acordados no contrato assinado com a LUSOPONTE em 1 de Janeiro de 1996;

g) A BRISA/BRISER/VVP proceda à discriminação de preços dos serviços essenciais e não essenciais - de forma clara, transparente e objectiva, com vista ao desenvolvimento das negociações entre as partes envolvidas.

G) Outras diligências de instrução

25 - Não constam do processo referências a outras diligências que possam entretanto ter sido efectuadas pela Direcção-Geral do Comércio e Concorrência a título de instrução do presente processo. Tendo essa instrução sido iniciada a 22 de Maio e ameaçando as arguidas com a suspensão do serviço via verde a partir de 30 de Junho, é razoável concluir que não era possível ouvir em tempo útil as arguidas, consideração que não deixará de pesar, todavia, na decisão a tomar em sede cautelar pelo conselho da concorrência.

II - Apreciação jurídica e económica

A) O mercado relevante

1) Dimensão material

26 - Embora as portagens em infra-estruturas rodoviárias possam ser pagas através de várias formas de pagamento, nomeadamente, dinheiro, cartão de crédito, cartão de débito e pagamento automático por um sistema do tipo via verde, este último é substancialmente diferente dos restantes meios de pagamento.

Na descrição da própria BRISA, contida no prospecto de OPV de Maio de 1999, junto ao processo, "o sistema via verde apresenta algumas vantagens importantes, quer para os utilizadores das auto-estradas quer para a [concessionária], nomeadamente a nível de gestão de tráfego e qualidade de serviço. Com efeito, a fluidez da via verde é equivalente, na sua capacidade máxima, a 9 vezes a fluidez da via manual, em idênticas circunstâncias, pelo que o alargamento da utilização do sistema via verde permite uma melhor gestão do tráfego e menos incómodos e demoras para os utentes. Por outro lado, o Sistema via verde propicia uma economia em termos de custos de investimento, por via da redução da área exigível para as praças de portagem, e também de custos operacionais, já que reduz a necessidade de contratar portageiros adicionais para os novos troços. Esta economia em termos de custos operacionais torna-se mais evidente quanto mais portagens via verde são instaladas ao longo da rede, havendo neste caso um efeito de escala" (fl. 141 do processo).

Estas características do sistema via verde fazem com que a disponibilidade de outros meios de pagamento não se assuma como uma pressão suficiente para limitar o poder de mercado das arguidas decorrente do seu controlo do único sistema de pagamento automático em utilização em Portugal. Em particular do ponto de vista de uma empresa concessionária de infra-estruturas rodoviárias em Portugal, a substituição do sistema de pagamento automático por outros meios de pagamento dificilmente poderia ser considerada como adequada já que implicaria a renúncia a significativas poupanças em termos de custos de exploração, criando ainda problemas com o aumento do congestionamento, nomeadamente nos períodos de grande intensidade de tráfego.

A isto acresce que pelas vantagens reconhecidas, esta modalidade de pagamento passou a integrar as obrigações de todas as concessionárias constantes dos respectivos contratos de concessão. Por outras palavras, para uma concessionária da exploração de infra-estruturas rodoviárias com portagem, as empresas que exploram o sistema via verde são "partenaires obligatoires", controlando uma verdadeira infra-estrutura essencial, sem a qual não podem concorrer no mercado em condições aceitáveis. Isto porque, como se viu, os custos inerentes à renúncia ao sistema via verde poderão ser agravados pelas multas contratuais que o concedente pode impor, designadamente no que respeita à queixosa ao abrigo da cláusula 91.1 do respectivo contrato de concessão.

Naturalmente, na ausência de tal imposição por parte do concedente, seria possível imaginar que os transtornos decorrentes da ces sação do serviço via verde pudessem ser suportados, ainda que um natural acréscimo de custos para a concessionária, para os utentes e para o interesse público em geral devido ao aumento do congestionamento do tráfego rodoviário. No entanto, aquela imposição inviabiliza a renúncia ao serviço via verde, único actualmente em uso em Portugal, facto com que a própria VVP conta, como resulta claramente da sua carta de 31 de Janeiro de 2001 (em especial, ver ponto 8 a fl. 242).

O pagamento automático via verde face às especificidades que o caracterizam e atrás referidas, deve ser autonomizado das outras formas de pagamento admitidas, constituindo um mercado autónomo, definido pela Direcção-Geral do Comércio e Concorrência como o mercado dos serviços essenciais para pagamento automático de portagens rodoviárias.

27 - Deste mercado se distingue um mercado conexo, o dos serviços acessórios para pagamento automático de portagens rodoviárias.

Com efeito o sistema via verde implica um dispositivo electrónico - o identificador - associado à conta bancária do utilizador/cliente através de um cartão válido no sistema multibanco. Resulta, assim, que a oferta deste serviço depende de uma estreita intervenção da BRISA - como detentora do "identificador" - e da SIBS - como responsável pelo processamento das transacções. Trata-se de serviços essenciais para o funcionamento desta modalidade de pagamento automático via verde que, só podendo ser prestados por aquelas duas empresas, não restando qualquer outra alternativa no mercado.

No entanto, o sistema via verde implica ainda que sejam assegurados outros serviços acessórios, perfeitamente autonomizáveis, nomeadamente a identificação do condutor e do veículo automóvel que utiliza o corredor via verde, bem como a emissão e o envio a clientes de facturas/recibos referentes às transacções em causa.

Se, conforme referimos, relativamente aos serviços essenciais ao próprio funcionamento do sistema via verde não existe alternativa no mercado, tendo os mesmos de ser prestados pelas empresas referidas, já quanto à prestação dos outros serviços acessórios perfeitamente autonomizáveis, existem alternativas no mercado, podendo, por isso, ser executados por outras empresas, de que é exemplo o contrato existente entre a LUSOPONTE e a CARTESIUS.

2) Dimensão geográfica

28 - O sistema via verde encontra-se implementado em todas as infra-estruturas rodoviárias com portagem no território nacional, o que decorre igualmente de exigência do Estado enquanto concedente, sendo que só a nível nacional há a necessária homogeneidade de condições de concorrência no mercado dos serviços essenciais para pagamento automático de portagens rodoviárias. O Conselho da Concorrência concorda, pois, com a definição do mercado geográfico como sendo o mercado nacional destes serviços.

B) Posição dominante das arguidas

29 - A prestação dos serviços essenciais para pagamento automático de portagens rodoviárias supõe, por um lado, o acesso à tecnologia indispensável à detecção e identificação do veículo/proprietário, estabelecimento da correspondência entre o identificador e o titular de uma conta bancária e, por outro, o acesso a um sistema de pagamentos que permita proceder à transferência do montante devido pelo utilizador da infra-estrutura rodoviária para a conta da concessionária.

A posição da BRISA e da SIBS permite-lhes ocupar uma posição de monopólio no mercado nacional dos serviços essenciais para pagamento automático de portagens rodoviárias. Com efeito, o sistema via verde depende da intervenção da BRISA e da SIBS, pois, só a associação entre os serviços por estas prestados permite que o sistema funcione, como salienta a LUSOPONTE a fl. 28.

A BRISA é a única empresa em Portugal, detentora do dispositivo electrónico de pagamento automático e a SIBS é a única empresa que detém a gestão dos cartões Multibanco e, por via disso, com acesso à conta bancária associada ao cartão multibanco, o que lhe permite processar as transacções.

30 - Mesmo que pudesse ser importada outra tecnologia equivalente e que os custos de substituição fossem suportáveis para as concessionárias (incluindo o custo do pagamento de multas contratuais até que o novo sistema estivesse disponível), qualquer tentativa de introduzir um sistema concorrente deparar-se-ia com o obstáculo insuperável do acesso à rede de cartões Multibanco, controlada pela SIBS. Tendo esta uma participação de 25% da VVP, é pouco credível que um potencial concorrente desta última pudesse contar com a pronta colaboração da SIBS para a implantação de um novo sistema, tanto mais que qualquer sistema de portagem dinâmica que pretenda utilizar o sistema Multibanco tem de ser previamente homologado pela SIBS (cl. 1.2 do Contrato entre a LUSOPONTE e a SIBS, fls. 224 e ss. do processo). Por último, para que um concorrente potencial pudesse disputar o mercado à BRISA, seria ainda necessário que houvesse um número suficiente de utentes das pontes concessionadas à LUSOPONTE interessado em suportar os custos de aderir ao novo sistema e a ter o incómodo de colocar um segundo identificador no respectivo veículo.

31 - Donde se conclui que a BRISA/BRISER/VVP e a SIBS são as únicas empresas que, conjuntamente, fornecem, em Portugal, os serviços essenciais que integram o dispositivo de pagamento automático - via verde, que pode ser usado nas auto-estradas e pontes deste território. Assim, a BRISA/BRISER/VVP, em ligação com a SIBS, detêm uma posição de monopólio no mercado português para a prestação deste tipo de serviços, conforme já se referiu. Não se afigura que tal posição de monopólio possa vir a ser posta em causa num período razoável de tempo.

C) Exploração abusiva da posição dominante

32 - A queixa aponta dois tipos de comportamentos abusivos, concretizados pelas cartas das arguidas de 31 de Janeiro, de 8 de Fevereiro e de 8 de Março (anexos 4, 6 e 9 da queixa):

a) Imposição de serviços não solicitados;

b) Imposição de preços excessivos.

33 - Ressalta, da análise dos factos, que a BRISA e a SIBS impuseram de facto à LUSOPONTE condições contratuais que, no decurso das negociações, esta sempre houvera recusado. O pretexto para esta exigência foi a constituição da VVP em finais de Setembro de 2000.

Das condições contratuais que aquelas empresas pretendem fazer valer emergem, por um lado, a imposição de serviços, em bloco e sem discriminação de preços, a prestar pela nova sociedade por elas constituída - a VVP - integrando não apenas os serviços essenciais para o funcionamento do sistema via verde, como também todos os serviços acessórios contidos nos anteriores contratos com a BRISA e a SIBS, incluindo aqueles que a LUSOPONTE havia já prescindido, quer em virtude de ter encontrado no mercado solução a um preço inferior, quer por os conseguir obter directamente por si própria, através de novos investimentos efectuados nesse sentido.

Conforme foi referido, relativamente aos serviços essenciais ao próprio funcionamento do sistema via verde, não existe alternativa no mercado, tendo os mesmos de ser prestados pela BRISA e pela SIBS que detêm uma situação de monopólio de facto no que respeita aos dispositivos de pagamento automático via verde, nos termos em que ficou já demonstrado. Já quanto à prestação dos outros serviços, perfeitamente autonomizáveis, existem alternativas no mercado, pelo que os mesmo podem ser prestados em condições mais eficiente, pela própria concessionária ou por outras empresas.

Nestes termos, o comportamento da BRISA/BRISER/VVP e da SIBS, ao obrigar a Lusoponte a aceitar, incondicionalmente, os serviços prestados pela VVP em bloco, impedindo-a de optar por outras empresas da sua livre escolha, sob pena de recusa da prestação dos serviços essenciais, tem como objecto e efeito a utilização das suas posições de predominância no mercado em causa - o dos serviços essenciais para pagamento automático em portagens rodoviárias -, onde actuam, conforme vimos, sem sofrer qualquer concorrência, de forma a estender essa posição de monopólio aos serviços acessórios, onde enfrenta a pressão decorrente da substituição pelas próprias concessionárias ou por empresas por estas contratadas, como sucedeu com a queixosa desde 1998.

Esta prática configura assim um exercício abusivo da posição dominante detida pela BRISA/BRISER/VVP e pela SIBS no mercado dos serviços essenciais para pagamento automático de portagens rodoviárias por forma a estender o seu domínio ao mercado dos serviços acessórios, o que constitui uma prática restritiva da concorrência que infringe o disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, em conjugação com as alíneas f) e g) do artigo 2.º do mesmo diploma.

34 - Por outro lado, do processo resultam ainda indícios sérios da imposição de preços não equitativos, na medida em que o aumento dos custos do serviço via verde imposto pelas arguidas se traduz na quase quadruplicação do preço pago pela LUSOPONTE, incluindo o custo da prestação de serviços que já não são solicitados pela queixosa (v. fls. 20 e 21 do processo). Merecerá seguramente um exame detalhado na instrução deste processo a alegação da queixosa de que grande parte dos custos do sistema via verde lhe está, desta forma, a ser imputado, tanto mais que a accionista controladora da VVP, a arguida BRISA, é também utilizadora do serviço via verde, pelo que também aqui se poderá estar perante uma infracção ao artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, em conjugação com a alínea e) do artigo 2.º do mesmo diploma.

D) Fundamentos para a concessão de medidas provisórias

35 - Estabelece o n.º 1 do artigo 24.º do Decreto-Lei 371/93 que o Conselho da Concorrência pode ordenar preventivamente a imediata suspensão ou modificação das práticas restritivas da concorrência, desde que:

a) A investigação já efectuada indicie a existência de uma prática proibida pelos artigos 2.º, 3.º e 4.º do Decreto-Lei 371/93;

b) Essa prática seja gravemente lesiva do desenvolvimento económico e social ou do interesse de agentes económicos;

c) A suspensão seja objecto de uma proposta fundamentada da entidade instrutura.

36 - Importa, pois, determinar se é justificada à luz destes critérios a adopção pelo Conselho da Concorrência das medidas propostas pela Direcção-Geral do Comércio e Concorrência.

37 - Resulta do exposto, em particular no ponto II.C), que há indícios suficientes de práticas proibidas pelo artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93.

38 - Para que a salvaguarda do desenvolvimento económico e social ou interesse de agentes económicos ou de consumidores possa prevalecer sobre o interesse e direitos dos arguidos, não basta que a medida seja justificada apenas por um fumus boni iuris. É também necessário que essa prática seja considerada gravemente lesiva dos interesses que o legislador quis defender com o n.º 1 do artigo 24.º

A Direcção-Geral do Comércio e Concorrência considera que a ameaça da recusa, pelas arguidas, da prestação de serviços essenciais para o funcionamento do sistema via verde, com a consequente paralização do mesmo, caso a LUSOPONTE não venha a aceitar a proposta da prestação dos serviços em bloco até 30 de Junho corrente, é gravemente lesiva não só para a LUSOPONTE, como ainda para o desenvolvimento económico e social e para os interesse dos consumidores, porquanto:

A LUSOPONTE fica impossibilitada de cumprir as sua obrigações como concessionária, vinculada como se encontra contratualmente a utilizar a via verde - cf. cláusula 59.1 do Segundo Contrato de Concessão e a Base LIV das Bases de Concessão);

A paralização do sistema via verde nas portagens das Pontes 25 de Abril e Vasco da Gama implicará a formação de filas intermináveis de carros, com elevados custos para os consumidores em termos de tempo e dificuldades, provocando, ainda graves perturbações de ordem económica e social.

Este transtorno causado aos utentes de uma infra-estrutura pública de transportes em época estival foi aliás considerado pela Comissão Europeia no caso Porto de Roscoff como constituindo por si só uma lesão suficientemente grave do interesse público para fundamentar a concessão de medidas provisórias (Comunicado de Imprensa IP/95/492).

Por seu lado, a carta da VVP de 31 de Janeiro de 2001 é clara no reconhecimento de quanto a concretização da sua ameaça pode prejudicar não só o interesse da concessionária como também o interesse dos utentes das pontes concessionadas à queixosa e mesmo o interesse público:

"Como V. Ex.ª reconhecerá, não é possível adiar por mais tempo a resolução deste problema. Estivesse em causa uma banal prestação de serviços e a solução era óbvia: não há acordo, não há serviço. Mas sabemos todos que não está em causa um serviço qualquer. Sabemos todos que a não prestação deste serviço teria consequências políticas, sociais e de perturbação da ordem pública que vão muito para além do relacionamento entre duas empresas.

Aliás, estamos absolutamente convictos de que o próprio Estado, enquanto concedente e garante da estabilidade, jamais permitiria que tal sucedesse.

Enfim, para situações de excepção, medidas de excepção" (seguindo-se a apresentação das decisões do conselho de administração da VVP, citada no ponto 17, supra).

Quanto à BRISA/BRISER/VVP e à SIBS, a suspensão das práticas objecto do processo não conduzirá a prejuízos irreparáveis já que lhes será sempre possível obter junto da LUSOPONTE uma compensação adequada se a decisão final neste processo vier a dar como não provada a existência de práticas restritivas da concorrência.

Ainda que tal não corresponda a uma exigência expressa da lei, a suspensão das práticas em causa é proporcional à salvaguarda do desenvolvimento económico e social, do interesse da queixosa e dos agentes económicos e consumidores que utilizam os serviços da LUSOPONTE, tendo presente a grave lesão que a continuação dessas práticas e a consequente suspensão do serviço via verde acarretaria para esses interesses e mesmo para a manutenção da ordem pública, como a própria VVP pôde antecipar.

39 - Por último, é necessária a existência de uma proposta fundamentada da direcção-geral do comércio e concorrência, requisito formal que se encontra preenchido no presente caso.

Neste ponto convém salientar que as medidas propostas pela Direcção-Geral se afastam parcialmente do pedido da queixosa. Assim, enquanto esta última solicita, no essencial, a suspensão ou modificação das práticas acima indiciadas, mantendo-se a prestação dos serviços essenciais nas condições praticadas pelas arguidas até 31 de Janeiro de 2001, a Direcção-Geral do Comércio e Concorrência apenas dá acolhimento a este pedido no que respeita ao cumprimento do contrato em vigor com a SIBS. Quanto aos serviços essenciais prestados pela BRISA/BRISER/VVP, a Direcção-Geral propõe a obrigação de continuação da prestação à LUSOPONTE dos "serviços de processamento de dados da via verde de forma a permitir o seu envio à SIBS", sem todavia especificar em que condições: as que vigoravam antes de 31 de Janeiro de 2001 ou as que foram impostas pela VVP após essa data. Propõe também aquela Direcção-Geral que seja ordenado à BRISA/BRISER/VVP que proceda(m) à discriminação de preços dos serviços - essenciais e não essenciais - de forma clara, transparente e objectiva, com vista ao desenvolvimento das negociações entre as partes envolvidas.

A queixosa solicitou ainda à Direcção-Geral que propusesse ao Conselho da Concorrência a imposição à VVP de uma obrigação de abstenção de enviar aos clientes da LUSOPONTE os extractos/recibos relativos às transacções via verde na Ponte 25 de Abril e na Ponte Vasco da Gama, serviços esses que ela nunca solicitou e que lhe são actualmente prestados pela CARTESIUS. Segundo a queixosa, tal prática traduziu-se em custos de 17 163 contos só no mês de Fevereiro de 2001.

40 - Do ponto de vista do Conselho da Concorrência, as práticas indiciadas, e cuja continuação e consequente suspensão do serviço via verde constituem grave lesão dos interesses acima mencionados, dizem respeito à subordinação da continuação da prestação dos serviços essenciais à aceitação e pagamento de serviços acessórios, bem como à prática de preços excessivos.

Como faz notar a queixosa, ao contrário do que sucedia no caso UNICRE, na presente situação não é possível fazer repercutir sobre os utentes os custos acrescidos impostos à LUSOPONTE, em virtude de esta se encontrar limitada às tarifas estabelecidas por lei.(ver nota 1) A adequada salvaguarda dos interesses previstos no artigo 24.º torna indispensável a suspensão e modificação das práticas em causa, não bastando alegar o mero carácter ilícito das mesmas.

41 - Assim, o conselho da concorrência entende que para evitar a referida lesão grave é desde logo necessário ordenar a suspensão da subordinação da continuação da prestação do serviço via verde à aceitação de outros serviços acessórios, não solicitados pela queixosa. Tal implica impor às arguidas a continuação da prestação dos serviços essenciais.

42 - Relativamente aos serviços acessórios que já são prestados pela queixosa ou que por ela são contratados a empresas não ligadas às arguidas, o Conselho da Concorrência considera que da continuação da prestação de tais serviços não solicitados resulta uma lesão grave não só do interesse da queixosa bem como do desenvolvimento económico e social, pois a continuação de tal prática traduzir-se-á, prima facie, numa inútil multiplicação de custos que já são suportados pela LUSOPONTE.

43 - Por último, a Direcção-Geral do Comércio e Concorrência propõe a adopção de medidas tendentes a obrigar as arguidas a uma discriminação dos preços dos serviços essenciais e não essenciais. O conselho entende que aquela Direcção-Geral dispõe do poder de, utilizando os meios legais em sede de instrução, solicitar às arguidas essa informação, em particular quanto à investigação das alegações de preços excessivos, pelo que não se considera que, neste caso, essa medida seja necessária para os efeitos do artigo 24.º do Decreto-Lei 371/93.

44 - Atendendo ao exposto, o Conselho da Concorrência considera ainda que tais medidas devem ser aplicadas por um período de 90 dias. Findo esse prazo, e caso se mantenham preenchidos os pressupostos do n.º 1 do artigo 24.º do Decreto-Lei 371/93, poderá a Direcção-Geral submeter nova proposta fundamentada ao conselho tendente à prorrogação destas medidas por um período que não pode exceder 90 dias, nos termos legais.

III - Decisão

Tudo visto e ponderado, o Conselho da Concorrência decide:

1.º Ordenar às arguidas BRISA/BRISER/VVP que suspendam a subordinação da continuação da prestação dos serviços essenciais ao funcionamento do sistema via verde (serviços de processamento de dados da via verde de forma a permitir o seu envio à SIBS) à LUSOPONTE à aceitação e pagamento por esta de outros serviços acessórios, não solicitados pela queixosa, assegurando assim que o serviço via verde não seja interrompido entre a notificação da presente decisão e o termo do prazo referido no ponto quarto;

2.º Ordenar à arguida SIBS que suspenda a subordinação da continuação da prestação dos serviços essenciais ao sistema via verde [processamento de transacções nos termos da cláusula 2.ª, n.º 1, alíneas a) e b) do Contrato celebrado em 1 de Janeiro de 1996 entre a SIBS e a queixosa] à LUSOPONTE à aceitação e pagamento por esta de outros serviços acessórios, a prestar pela SIBS ou por outra empresa ligada ao sistema via verde, não solicitados pela queixosa, assegurando assim que o serviço via verde não seja interrompido entre a notificação da presente decisão e o termo do prazo referido no ponto quarto;

3.º Ordenar às arguidas que se abstenham de continuar a prestar e a cobrar os serviços acessórios que já são prestados pela queixosa ou que por ela são contratados a empresas não ligadas às arguidas;

4.º As medidas previstas na presente decisão vigorarão por um período de 90 dias;

5.º Da presente decisão são destinatárias as arguidas:

BRISA - Auto-Estradas de Portugal, S. A., com sede na Quinta da Torre da Aguilha, Edifício Brisa, 2785-599 São Domingos de Rana;

BRISER - Serviços Viários, S. A., actualmente domiciliada na Av. Fontes Pereira de Melo, n.º 6, 3.º, direito, 1050 Lisboa;

VIA VERDE PORTUGAL - Gestão de Sistemas Electrónicos de Cobrança, S. A., com sede na Quinta da Torre da Aguilha, 2785-599 São Domingos de Rana;

SIBS - Sociedade Interbancária de Serviços, S. A., com sede na Rua do Centro Cultural n.º 2, 1700 Lisboa;

6.º Da presente decisão deve ser dado conhecimento à Direcção-Geral de Concorrência e Preços enquanto entidade instrutora e proponente.

(nota 1) V. Decisão do Conselho da Concorrência de 29 de Abril de 1996 no Proc. n.º 2/96 Práticas Anticoncorrenciais no Mercado da Gestão de Transacções com Cartões de Crédito, Rel. Act. 1996, p. 53.

Lisboa, 22 de Junho de 2001. - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva (Relator) - José Álvaro Ubach Chaves Rosa (considerando que os pontos 1.º e 2.º satisfazem os objectivos da proposta fundamentada pela entidade instrutora considero inoportuno, nesta fase de instrução, tomar posição expressa no ponto 3.º) Fernando Ivo Gonçalves - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete (vencido, em parte, nos termos da declaração que junto) - Carolina de Castro Nunes Vicente e Cunha - José Anselmo Dias Rodrigues (presidente).

Declaração de voto

Reconhecendo a decisão do conselho que existe um "litígio comercial entre a queixosa e as arguidas" (p. 110); que existe entre a LUSOPONTE e a SIBS "um contrato escrito, em vigor desde 1 de Janeiro de 1996" (que, nos termos da sua Cláusula 11.ª se renova "automaticamente" por períodos de 2 anos - f. 230 do processo); e que a relação entre a LUSOPONTE e a entidade que explora a via verde não é uma "pura situação de facto" (aceitando, também, a declaração constante do Prospecto Preliminar de Oferta Pública de Venda de acções da BRISA pela PARTEST, de Maio de 1999, segundo a qual existiria "um contrato de prestação de serviços com a LUSOPONTE" f. 141 do processo), fui da opinião de que no seu ponto TERCEIRO a decisão do conselho exorbitou a sua competência, intrometendo-se na esfera de interpretação e aferição do cumprimento contratual que cabe, em última instância, aos Tribunais e que as partes quiseram reservar para a "competência exclusiva do Tribunal da Comarca de Lisboa" (no caso do contrato entre a LUSOPONTE e a SIBS Cláusula 17.ª, a fl. 233 do processo) e, sucessivamente, para a) conciliação obrigatória; b) tribunal arbitral; ou c) tribunal comum ( no caso de protocolo entre a BRISER e a GESTIPONTE, que enquadra as "relações contratuais de facto" entre as suas sucessoras via verde Portugal e Lusoponte Cláusulas 12.ª e segs., a fls. 70 e segs. do processo). Fiquei vencido. Em relação aos pontos primeiro e segundo os outros substanciais -, mesmo conhecendo apenas a versão dos factos mais favorável à queixosa, por inadiável premência da decisão, não afastei todas as duvidas embora se possam identificar no caso todos os requisitos de um abuso de posição dominante incluindo o nexo de causalidade, tal como o tenho entendido reconheço que, nalgum ponto, a ameaça de cessação do vínculo contratual (e, por enquanto, é só disso que se trata) tem de se Ter por legítimo, mesmo por parte da empresa com poder de mercado, sob pena de se tornar esta refém da que o não tem. Saber se é o caso ou não terá de esperar pela averiguação completa dos factos. Por outro lado, o recurso à retórica da "infra-estrutura essencial" (p. 21 da decisão), especialmente adequada ao caso, segundo penso, levanta outras duvidas que não cabe agora abordar.

Com estas reservas votei estes pontos.

Lisboa, 22 de Junho de 2001. - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete.

ANEXO C3

Processo 1/01 - Práticas anticoncorrenciais no mercado da gestão das transacções efectuadas com cartões de crédito.

O Conselho de Concorrência, no uso da competência que lhe é atribuída pela alínea a) do n.º 1 do artigo 13.º do Decreto-Lei 371/93, de 23 de Outubro, e visto o processo de contra-ordenação registado sob o n.º 1/2001, em 26 de Março de 2001, em que é arguida a UNICRE Cartão Internacional de Crédito, S. A., tem a ponderar os seguintes elementos de facto e de direito:

1 - Origem do processo

O presente processo teve origem numa queixa apresentada por B. M. Ewen-Smith ao Ministro da Economia, e posteriormente remetida à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência (adiante designada DGCC), contra o comportamento adoptado pela UNICRE - Cartão Internacional de Crédito, S. A. (adiante designada UNICRE), em violação da legislação da concorrência, por alegada recusa de autorização para pagamento de transacções com cartão de crédito através de mail order.

Verificando-se existir, da análise dos documentos que integram o processo, sérios indícios de prática restritiva de concorrência, por despacho de 9 de Dezembro de 1999, da directora-geral do Comércio e da Concorrência, foi ordenada a abertura do correspondente processo de contra-ordenação.

O processo deu entrada no Conselho da Concorrência no dia 26 de Março de 2001.

2 - Os factos

a) A arguida

A UNICRE - Cartão Internacional de Crédito, S. A., é uma sociedade financeira, participada com um capital social de 1 700 000 contos, integralmente detido por 30 instituições de crédito. A empresa tem como objecto social a emissão e gestão de cartões de crédito ou de pagamento, bem como a celebração de contratos e a prestação de serviços necessários a estas actividades.

Resulta do processo e do Relatório elaborado pela DGCC que a UNICRE desenvolve a sua actividade na área da prestação de serviços relacionados com cartões de pagamento, nomeadamente: a) através da concessão de crédito mediante a emissão de cartões individuais; b) através da gestão das transacções realizadas com cartões de crédito e de pagamento emitidos por outras entidades; c) através da celebração de todos os contratos para a prestação dos serviços necessários a essa actividade de gestão e da celebração de acordos e intercâmbios com organizações congéneres nacionais e estrangeiras.

i) A actividade de emissão de cartões de crédito

A actividade de emissão de cartões de crédito da empresa a chamada actividade emissora processa-se através da marca UNIBANCO, com a qual a UNICRE emite diversas versões de cartões de crédito, no âmbito dos sistemas VISA e EUROCARD/MASTERCARD, individualmente, ou em parceria com algumas instituições financeiras e empresas comerciais.

ii) A actividade de gestão das transacções realizadas com cartões

A actividade de gestão das transacções realizadas com cartões é desempenhada pela UNICRE através da REDUNICRE, na qualidade internacionalmente designada por acquirer das marcas VISA e EUROCARD/MASTERCARD. Neste âmbito, a empresa assume a exploração da rede de comerciantes para aceitação de todos os cartões de crédito nacionais e estrangeiros destas marcas e também dos cartões MULTIBANCO, em terminais de pagamento automático (TPA) da sua propriedade. A UNICRE, enquanto acquirer, responsabiliza-se, perante os estabelecimentos aderentes, pelo pagamento imediato das compras efectuadas a crédito pelos titulares dos cartões de crédito das marcas que representa (seja ela ou não a entidade emissora dos cartões em causa, sejam cartões nacionais ou estrangeiros), indo depois, se for o caso, ressarcir-se da importância correspondente junto dos respectivos emissores.

É importante salientar que a aceitação, pelos comerciantes e empresários, de cartões de crédito das marcas representadas pela UNICRE como meio de pagamento pode ocorrer em três situações distintas:

a) Em ambiente electrónico, TPA's (terminais de pagamento automático), instalados pela UNICRE ou pelos Bancos no estabelecimento do cliente, situação que é a mais usual. De acordo com os dados constantes do Relatório da UNICRE de 1999, existem, no total, 42.629 terminais em que são aceites os seus cartões, sendo, 13.793 terminais propriedade sua. As transacções são feitas "face-a-face", ou seja com a presença física do cartão e do seu titular;

b) Através de máquinas manuais, ainda existentes em pequenos estabelecimentos, e que representam um valor residual no volume total de transacções realizadas através da REDUNICRE 0,9%, em 1999. São também transacções "face-a-face";

c) Através de vendas à distância, sem a presença física do cartão, vulgarmente designadas "mail order", em que o titular dá a instrução de pagamento, através de um determinado meio de comunicação. Segundo a UNICRE, este tipo de transacções não é muito significativo, cifrando-se, em 1998, em 1072 num universo de 44 000 estabelecimentos comerciais aderentes à REDUNICRE.

iii) Actividade dirigida à celebração dos contratos com os comerciantes e empresários aderentes

As relações entre UNICRE e os comerciantes/empresários aderentes à rede que gere estão consubstanciadas em contratos-tipo, de que existem duas versões, idênticas no essencial do seu clausulado, uma destinada aos comerciantes, em geral, e outra aplicável apenas aos revendedores de combustíveis. Nos termos gerais destes contratos, os comerciantes comprometem-se a aceitar os meios de pagamento representados pela UNICRE e esta a responsabilizar-se pela liquidação imediata das transacções realizadas com os mesmos. Os comerciantes comprometem-se a pagar o serviço prestado pela UNICRE através de uma comissão percentual sobre o valor da transacção, fixada no contrato.

b) A queixa

A queixa que desencadeou o presente processo foi apresentada por B. M. Ewen-Smith, responsável pelo Centro de Observação Astronómica no Algarve (adiante designado COAA), com sede no Sítio do Poio, 8500-149 Portimão.

i) A actividade económica do queixoso

O COAA desenvolve uma actividade de investigação em pesquisas científicas, no âmbito da qual se integra a prestação de serviços a astrónomos os quais, mediante pagamento de uma contraprestação pecuniária, efectuam visitas ao COAA e aí utilizam os telescópios. São, assim, principais utilizadores dos serviços prestados pelo COAA os investigadores oriundos de países estrangeiros, para quem, a forma mais prática de pagamento - que, por isso, é a vulgarmente adoptada - consiste na utilização de cartões de crédito.

O pagamento do serviço prestado pelo COAA aos seus clientes é faseado, processando-se da seguinte forma: 1) um pagamento inicial, de cerca de 15 000$, a efectuar no acto da reserva da visita e como forma de garantir a mesma; 2) um segundo pagamento, a efectuar seis semanas antes de ter lugar a visita, o qual, em conjunto com o depósito inicial, deverá perfazer 50% do custo total; 3) finalmente, o pagamento do remanescente, que é efectuado no acto da visita.

Neste contexto, os primeiros dois pagamentos são, normalmente, efectuados por cheque ou, preferencialmente, por cartão de crédito, através de "mail order" ou pagamento à distância, devendo, neste caso, proceder-se à indicação dos dados do cartão e da assinatura do titular. O pagamento do remanescente é efectuado localmente, utilizando-se, normalmente, o cartão de crédito, mas desta feita já com a "presença física" do titular, configurando, pois, uma transacção "face-a-face".

ii) Relações contratuais entre o queixoso e a UNICRE

Em 25 de Outubro de 1994, o queixoso, B. M. Ewen-Smith, celebrou com a UNICRE um contrato de adesão à REDUNICRE. De acordo com o Relatório da DGCC, uma vez que o contrato-tipo não contemplava pagamentos à distância, o queixoso terá contactado o representante local da UNICRE, que o informou de que, em tais situações, teria que obter a assinatura do cliente, quer através de carta, quer através de uma ficha própria, e preencher uma factura da UNICRE para este tipo de transacções, inscrevendo no local da assinatura a menção "mail order; signature on file". Estas transacções, depois de autorizadas pela UNICRE, seriam liquidadas no prazo de alguns dias, devendo as fichas bem como as facturas da REDUNICRE ser guardadas por um determinado período de tempo.

Durante anos, procedeu o queixoso de acordo com as instruções referidas, tendo realizado, desde a sua adesão à REDUNICRE, 513 transacções por seu intermédio, consubstanciando a maioria delas pagamentos à distância (ver nota 1), sem que tivesse ocorrido qualquer rejeição por parte dos clientes.

Em Março de 1999, recebeu o queixoso uma carta da UNICRE (ver nota 2), igualmente enviada a todos os clientes, em que esta empresa informava que as transacções efectuadas pelo sistema de vendas à distância eram transacções de alto risco, assistindo-se a um número cada vez maior de situações fraudulentas, não obstante o controlo por ela exercido, nomeadamente, através de uma rigorosa pré-selecção dos comerciantes com os quais concluía tais tipos de contratos. Ainda segundo a UNICRE, tais situações deviam-se à "... pouca atenção e cuidado que alguns comerciantes prestam a este tipo de transacções, o que se traduz em prejuízos para si e para o sistema".

Na referida carta, a UNICRE alertava, ainda, para o seguinte:

"As transacções com cartões Visa e Mastercard efectuadas por ordem escrita ou telefónica, só poderão ser realizadas ao abrigo de um contrato específico, independente do contrato existente para vendas presenciais;

Todas as transacções deste tipo exigem a obtenção de autorização independentemente do seu valor. As autorizações concedidas pelo centro de autorizações da Redunicre apenas confirmam a existência e validade do número do cartão em causa e a disponibilidade de crédito para o valor pretendido. Não garantem, como é natural, que a ordem de débito pertença, de facto, ao verdadeiro titular do referido cartão. Todas as transacções com cartões visa e mastercard realizadas por ordem escrita ou telefónica são da inteira responsabilidade do comerciante, independentemente de terem sido autorizadas pelo Centro de Autorizações da Redunicre";

Concluía, por fim, a UNICRE, solicitando a "... melhor colaboração de V. Exmas. para o cumprimento rigoroso de todas as regras de segurança e colocamo-nos ao vosso inteiro dispor para prestar os esclarecimentos complementares que considerem oportunos".

Face aos termos muito gerais da carta, entendeu o queixoso que a mesma não se lhe aplicava directamente, porquanto actuara sempre de acordo com as instruções da UNICRE.

Contudo, viu, logo a seguir, ser-lhe recusada uma transacção à distância.

Contactado o representante local da UNICRE, solicitou o queixoso, de acordo com as instruções recebidas, um contrato específico para transacções à distância, aproveitando para o esclarecer sobre a forma como eram processadas tais transacções e juntando, para o efeito, estatísticas acerca do seu relacionamento com a UNICRE. Clarificava, assim, o queixoso, não haver qualquer risco, em virtude de os pagamentos por mail order serem efectuados ainda antes da prestação do serviço, o que permitia, no caso de recusa da factura, a possibilidade da devolução das ordens de pagamento por conta, sem que daí adviesse qualquer prejuízo para a UNICRE.

A situação manteve-se durante algum tempo porquanto, de acordo com a informação da UNICRE, o assunto estaria em estudo, até que, conforme carta do queixoso de Novembro de 1999, a UNICRE lhe remeteu, por fim, o novo modelo de contrato à distância, nos termos dos quais condiciona a sua celebração, no caso a quo, à uma garantia bancária de valor mínimo de 10 000 000$ a prestar pela empresa aderente (ver nota 3).

c) O mercado

Os dados constantes do processo quando à configuração e caracterização do mercado foram, naturalmente, recolhidos e processados pela entidade instrutora, nos termos que passamos a expor.

i) Caracterização do mercado realizada pela entidade instrutora

A análise do mercado levada a cabo pela DGCC toma como ponto de partida os serviços oferecidos pela UNICRE no que toca à emissão e gestão de cartões de crédito e de pagamento.

Arrancando deste pressuposto, a DGCC autonomiza, dentro do mercado global dos meios de pagamento (onde inclui dinheiro, cheques e cartões), o "meio de pagamento 'cartão'" (ver nota 4), que, de acordo com as respectivas funções e características, compreende as categorias "cartões de débito" (ver nota 5), "cartões de crédito" (ver nota 6) e "cartões pré-pagos" (ver nota 7).

Salienta seguidamente a DGCC que tais categorias de cartões não são, do ponto de vista do seu utilizador/titular, rigorosamente iguais e directamente substituíveis entre si. De facto, enquanto que o uso de um cartão de débito, de um porta-moedas electrónico ou de um cheque é, para o seu utilizador, rigorosamente o mesmo que usar dinheiro visto que o uso de qualquer um destes meios de pagamento implica que o utilizador deverá ter disponibilidade e liquidez financeira no momento em que a transacção ocorre, o mesmo já não se passa com o cartão de crédito em que o utilizador, tendo em conta o plafond de crédito que lhe é atribuído, pode adquirir o bem ou serviço com pagamentos diferidos no tempo.

Posto isto, a DGCC atende à estrutura do "mercado dos cartões em Portugal", onde distingue o "mercado da emissão" - que diz respeito às relações entre as entidades emissoras dos cartões e os titulares desses cartões e onde o emissor está do lado da oferta e o titular do cartão/utilizador no lado da procura - do "mercado do acquiring" - que diz respeito às relações comerciais entre as entidades gestoras das transacções e os comerciantes aceitantes desses cartões e onde o acquirer está do lado da oferta e o comerciante do lado da procura.

Finalmente, dentro do mercado do acquiring, a DGCC caracteriza, do lado da oferta, dois tipos de acquirers:

No que se refere aos cartões de débito, a função de acquiring compete ao banco do comerciante que, sem se responsabilizar pelo pagamento em si, apenas disponibiliza o acesso à rede que permite o saque da conta;

Diferentemente, em relação aos cartões de crédito, é o acquirer que se responsabiliza pelo pagamento das transacções realizadas, indo, posteriormente, ressarcir-se, se for o caso, junto do emissor. A oferta deste tipo de serviço em Portugal é assegurada por duas empresas, a UNICRE - em representação das marcas VISA e EUROCARD/MASTERCARD - e o BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS (que, em Maio de 1995, negociou com a AMEX que se instalara em Portugal após a liberalização, em 1991, do acesso à actividade de gestão das transacções com cartões de crédito), em representação da marca AMERICAN EXPRESS.

ii) Determinação e caracterização do mercado relevante levada a cabo pela entidade instrutora

No termo deste percurso, a DGCC circunscreve o mercado relevante ao mercado de gestão das transacções (acquiring) efectuadas com cartões de crédito, essencialmente por considerar que "muito embora a questão suscitada pelo queixoso se insira no mercado de cartões de crédito, só releva para efeitos do presente processo, o serviço proporcionado pelos cartões de crédito aos comerciantes que o aceitam como meio de pagamento" e ainda que "a queixa apresentada tem a ver, directa e exclusivamente, com o comportamento da UNICRE, enquanto acquirer." (ver nota 8). Entende, também, a DGCC que o mercado geográfico relevante para o presente processo é de âmbito nacional. E conclui a DGCC que, no mercado assim delimitado, a UNICRE detém uma posição preponderante, gerindo cerca de 90% das transacções realizadas com cartões de crédito em Portugal.

Para além da UNICRE, actua também neste mercado, como seu único concorrente na qualidade de acquirer, o Banco Comercial Português, com o cartão de crédito AMERICAN EXPRESS. Este cartão, durante muitos anos, foi igualmente gerido pela UNICRE, tendo, contudo, a partir de 1991, com a abertura do mercado dos cartões de crédito, passado a ser representado por uma filial da empresa americana em Portugal até 1995, ano em que foi cedido, em regime de franchising, ao Banco Comercial Português.

O cartão AMERICAN EXPRESS, muito embora considerado um forte concorrente a nível mundial, nunca atingiu, no mercado nacional, a expressão dos cartões VISA e MASTERCARD. Pelas suas próprias características, foi sempre um cartão confinado a um estrato social mais elevado, tendo, inicialmente, sido emitido em dólares. Com a transferência da actividade de acquiring para o Banco Comercial Português, não obstante ter sofrido algumas alterações que aproximaram, em termos de características, o cartão AMERICAN EXPRESS dos seus concorrentes VISA e MASTERDCARD representados pela UNICRE, aquele manteve, contudo, a sua qualidade de um cartão "topo de gama".

Verifica-se, pois, que a oferta do serviço acquiring para os cartões de crédito em Portugal, contrariamente ao que se verifica na maioria dos países europeus em que são os bancos, cada um por si, a negociar com os sistemas internacionais, está concentrado nas mãos de duas empresas sendo as comissões por elas praticadas e a estrutura das respectivas tabelas idênticas entre si.

De acordo com os dados recolhidos pela DGCC, se, em 1997, a UNICRE detinha uma posição, no mercado de acquiring, que ultrapassava os 90%, actualmente, e não obstante a mudança de política comercial desenvolvida pelo BCP em relação ao cartão AMERICAN EXPRESS, aquela posição mantém-se ainda próxima dos 90%, continuando, deste modo, a UNICRE, como acquirer, a não sofrer concorrência significativa no mercado das transacções realizadas com cartões de crédito em Portugal (ver nota 9).

d) Diligências de instrução efectuadas

No decurso da instrução, a DGCC: i) ouviu a arguida, a qual optou por se pronunciar por escrito quanto às questões suscitadas; ii) procedeu à audição das testemunhas arroladas pela arguida; iii) procedeu à audição do queixoso; iv) e, finalmente, pediu ao Departamento do American Express, do Grupo Banco Comercial Português elementos relativos ao seu serviço de pagamentos "mail orders/telephone orders - MOTO".

Das declarações da arguida e das testemunhas por si arroladas salientam-se os seguintes dados, no que respeita aos comportamento imputados à UNICRE e às relações contratuais com o proprietário do COAA:

A reformulação do quadro contratual que habilita os comerciantes a aceitar "mail orders" (sendo estes comerciantes em número de 1072 num universo de 44 000 estabelecimentos comerciais aderentes à REDUNICRE) pretendeu implementar um sistema de controlo rigoroso que possa fazer face ao aumento do número de casos de fraude organizada neste tipo de transacções - e, ao abrigo do disposto no artigo 87.º, n.º 3, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), na aplicação da legislação de defesa da concorrência à actividade financeira deve ter-se em conta os bons usos da actividade, nomeadamente as circunstâncias de risco ou solvabilidade;

A acção de sensibilização que foi desenvolvida junto dos comerciantes que recorrem a este tipo de serviço para a necessidade de temporariamente limitarem ou não efectuarem mesmo transacções deste género não consubstanciou qualquer recusa injustificada de pagamento de transacções mas não à regionalização! uma actuação de carácter temporário e excepcional;

A eventual exigência de cauções ou garantias aos comerciantes que se proponham realizar transacções à distância destina-se a aumentar o nível de segurança por parte dos titulares dos cartões;

O novo modelo de contrato para transacções à distância remetido ao queixoso admite na sua cláusula 11.ª a dispensa da garantia bancária desde que o comerciante possua contabilidade organizada e boa solvência, faculdade que o queixoso até ao presente não entendeu utilizar;

O COAA terá actuado durante todos estes anos em violação do contrato celebrado com a UNICRE ao aceitar cartões de crédito para pagamentos faseados em três parcelas e ao proceder a transacções à distância sem haver celebrado o correspondente contrato e sem que lhe tivesse sido atribuído o necessário código de actividade factos que a UNICRE alega desconhecer;

De acordo com as regras do VISA INTERNACIONAL, a prestação de serviço em regime de "reserva" (como sucedia com o primeiro pagamento do serviço prestado pelo COAA) só é admitida no âmbito das actividades de agências de viagens, de rent-a-car e estabelecimentos hoteleiros;

Tendo o queixoso celebrado apenas o contrato para as transacções presenciais, foi-lhe atribuído o código correspondente, motivo por que, para a UNICRE, aquelas transacções foram sempre processadas como presenciais, tanto mais que os documentos remetidos pelos comerciantes, são digitalizados, pela UNICRE, com leitura de campos pré-definidos, não sendo possível, por via desta operação, saber se se trata de uma transacção presencial ou à distância;

As transacções [presenciais] efectuadas pelo comerciante queixoso não sofreram qualquer interrupção por iniciativa da UNICRE, prosseguindo tanto no ano de 1999 como no ano 2000.

A caracterização e delimitação do mercado realizada pela DGCC é contestada pela a arguida, a qual considera, nomeadamente, que:

No mercado de meios de pagamento, em geral, a posição da arguida não é dominante nem preponderante, pois no contexto das transacções comerciais efectuadas em Portugal no ano de 1994 apenas 5% foram pagas com cartões de pagamento, incluindo cartões de crédito;

A quota da UNICRE na actividade de acquiring é inferior à indicada;

Ao abrigo do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), a actividade de acquiring pode ser desenvolvida por entidades financeiras não residentes em território nacional (é o chamado cross border acquiring), com as quais os comerciantes portugueses podem celebrar contratos de aceitação de cartões de crédito isto porque ao abrigo daquele diploma não existem barreiras legais que impeçam um operador autorizado num Estado-Membro da União Europeia de prestar esse serviço em outro Estado-Membro ou, inclusivamente, a partir do seu próprio Estado de origem;

A UNICRE não é a única responsável pelo acquiring de transacções feitas em Portugal com cartões de crédito das marcas VISA e MASTERCARD, que é feito também, já há alguns anos, por empresas financeiras não sediadas em Portugal;

A UNICRE não dispõe, contudo, de dados sobre a quota de mercado dos acquirers estrangeiros que operam em Portugal.

Do auto de declarações do queixoso, destacam-se as seguintes afirmações:

Continua a poder realizar apenas transacções presenciais com cartões de crédito;

Não celebrou ainda o contrato específico para as transacções à distância, uma vez que o novo formulário condiciona a sua adesão à prestação de uma garantia bancária no valor de dez mil contos, o que acha exagerado, desproporcionado e injusto;

Por outro lado, não lhe foi facultada a alternativa prevista no próprio contrato e que consiste na dispensa da garantia bancária aos comerciantes que possuam contabilidade organizada e boa solvência;

Tem sido muito prejudicado com o comportamento da UNICRE, não só em termos financeiros, ao ver-se obrigado a recusar a prestação de serviço a clientes seus, uma vez que estes não se dispõem a efectuar o respectivo pagamento através de transferência bancária, como também da própria credibilidade da sua empresa, a qual foi posta em causa através do comportamento da UNICRE ao recusar-lhe as transacções "mail order".

Quanto aos elementos fornecidos pelo Departamento do American Express, do Grupo Banco Comercial Português sobre o seu serviço de pagamentos "mail orders/telephone orders - MOTO", regista-se que o mesmo contrato é utilizado tanto para as transacções presenciais como para as transacções à distância, não se prevendo quaisquer exigências específicas, quer de clausulado complementar, quer de garantias bancárias, para este último tipo de transacções.

O facto de, para efeitos de contrato de adesão (ver nota 10), a empresa não distinguir entre transacções presenciais e transacções à distância, tem por objectivo simplificar o sistema de controlo adoptado, não se conhecendo, até à data, quaisquer situações de fraude daí decorrentes.

3 - Apreciação jurídico-económica

e) A alegada prática restritiva da concorrência e o seu enquadramento normativo

A actuação da UNICRE atrás caracterizada constitui, nos termos da acusação formulada no Relatório da DGCC, um abuso de posição dominante no mercado nacional da gestão de transacções (acquiring) realizadas com cartões de crédito, conduta proibida pelo artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, e cuja prática constitui contra-ordenação punível com coima de 100 000$ a 200 000 000$, nos termos prescritos pelo artigo 37.º, n.º 2, do mesmo diploma. Cumpre agora ao conselho da concorrência decidir se, à luz dos elementos constantes do processo, o comportamento da arguida preenche o tipo contra-ordenacional em questão.

Saliente-se que, obedecendo ao disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, o Conselho da Concorrência solicitou ao Banco de Portugal o parecer a que se refere o artigo 88.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei 298/92, de 31 de Dezembro (ver nota 11).

O parecer requerido foi emitido pelo Banco de Portugal em 10 de Maio de 2001 e ao seu conteúdo será feita referência apropriada no decurso da presente apreciação.

f) O mercado relevante

Antes de tudo, e uma vez que o que está em causa é determinar se a arguida explorou abusivamente "uma posição dominante no mercado nacional ou numa parte substancial deste, tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência" (artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro), importa circunscrever qual o mercado relevante para efeitos do presente processo.

Conforme tem vindo a ser sustentado pela Comissão Europeia (ver nota 12) "basicamente, o exercício da definição de mercado consiste na identificação das verdadeiras fontes alternativas de fornecimento para os clientes da empresa em causa (da empresa cujo comportamento anticoncorrencial se discute), tanto em termos de produtos/serviços como em termos da localização geográfica dos fornecedores".

Era esta a interrogação que devia, desde o início, ter orientado as actividades instrutórias da DGCC no âmbito da caracterização do mercado relevante: saber se existem alternativas à aceitação de cartões de crédito VISA/MASTERCARD para a realização de pagamentos à distância e apurar se existem fora do território nacional fornecedores do serviço de acquiring de cartões de crédito VISA/MASTERCARD para os quais os clientes da UNICRE em geral e o proprietário do COAA em particular pudessem transferir a sua procura.

Ao invés, a DGCC partiu de um dos vectores da actividade desenvolvida pela arguida- a emissão e serviços de gestão de transacções com cartões em geral -, para, no termo de uma detalhada mas pouco útil caracterização desse tipo de actividade, acabar por se deter no segmento no seio do qual eclodiu o litígio contratual com o proprietário do COAA - a gestão de transacções com cartões de crédito ou actividade de acquiring (ver nota 13).

Não dispõe, assim, o Conselho da Concorrência de dados que lhe permitam alicerçar a definição de mercado nos termos que tem por convenientes. Será possível falar, neste específico contexto, de um mercado dos meios de pagamento à distância, que incluiria, além do pagamento à distância por cartões de crédito, igualmente os cheques, as transferências bancárias ou os vales postais? A experiência comum indicia que não à regionalização!, e no próprio processo é referido que os clientes do COAA também recorrem (embora com menos frequência) ao pagamento à distância por meio de cheque.

Mas não encontrou o Conselho dados minimamente rigorosos quanto à identificação desses (outros) meios de pagamento, nem tão-pouco quanto ao problema de saber se o fenómeno de substituição do lado da procura (ver nota 14) seria suficiente para incluir cada um deles no mercado relevante.

Por outro lado, manifesta o Conselho fortes dúvidas quanto à circunscrição do mercado em causa às fronteiras do território nacional.

Desde logo, conforme consta do relatório da DGCC e do processo, o COAA recorria às "mail orders" para a aceitação dos pagamentos feitos por "investigadores oriundos de países estrangeiros", circunstância que sugere que a própria delimitação do perímetro do mercado dos meios de pagamento à distância relevante deveria mover-se num contexto internacional. Repare-se, por exemplo, que, mesmo quedando-nos pelos pagamentos à distância realizados com cartão de crédito, se a maioria dos (potenciais) clientes do COAA fosse titular de um cartão AMERICAN EXPRESS a circunstância de o COAA se ver privado da possibilidade de aceitar pagamentos à distância com cartões VISA/MASTERCARD não representaria a privação de um input necessário à prestação dos serviços de observação astronómica. Ora a verdade é que não dispomos de quaisquer dados relativos ao mercado internacional do acquiring, nem às posições nele ocupadas pelos representantes das várias marcas e sistemas de cartões de crédito.

Por outro lado, nos termos do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (artigos 44.º a 64.º), é possível a entidades financeiras sediadas fora do território português prestar serviços de acquiring a comerciantes portugueses, e, de acordo com declarações da arguida (que a DGCC não investigou) já existirão mesmo exemplos concretos deste cross-border acquiring.

Em suma, entende o Conselho que não dispõe de elementos fiáveis para proceder à correcta e fundamentada definição do mercado relevante no âmbito do presente caso.

Quanto à definição de mercado apresentada pela DGCC, peca por circunscrever o mercado unicamente a partir da queixa e sem qualquer preocupação em fornecer uma justificação jurídico-económica credível para o afastamento dos meios de pagamento à distância diferentes dos cartões de crédito, pelo que o Conselho manifesta as maiores reservas em tomá-la por base das considerações subsequentes.

Ainda assim, porque ao Conselho cumpre tomar uma decisão quanto aos processos que lhe são remetidos pela DGCC (artigo 26.º, n.º 1 do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro), prossegue-se a apreciação do comportamento da arguida tendo como horizonte de referência (e sem prejuízo das reservas manifestadas) o mercado definido pela DGCC, que consiste, recorde-se, no mercado do acquiring ou gestão de transacções com cartões de crédito - mas que, para ser totalmente coerente com os pressupostos de que parte, a DGCC deveria ter restrito ao mercado do acquiring ou gestão de transacções à distância com cartões de crédito.

g) Determinação da existência de uma contra-ordenação

Para se apurar da existência de um comportamento violador do prescrito pelo artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, torna-se necessário determinar i) se a empresa arguida detém no mercado em causa uma posição dominante; ii) e, em caso afirmativo, se explorou abusivamente essa posição, tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência.

i) Existência de uma posição dominante

Se partirmos dos únicos dados disponíveis - os que dizem respeito ao mercado do acquiring ou gestão de transacções com cartões de crédito - verificamos que a arguida dispõe de uma quota próxima dos 90%.

Tal circunstância preenche a hipótese da alínea a) do n.º 3 do artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, e conduz-nos a presumir que a UNICRE detém uma posição dominante no mercado em causa. Claro que tal presunção é susceptível de ser ilidida pela demonstração da existência de concretas pressões concorrenciais susceptíveis de impedir a UNICRE de se comportar com considerável grau de independência face aos seus concorrentes, clientes e até consumidores ou de exercer uma apreciável influência sobre os preços sem perder quota de mercado.

Ora o mercado não conta com a presença de um número suficiente de concorrentes activos - do processo apenas consta a identificação de um, o Banco Comercial Português (BCP) que gere a rede AME

RICAN EXPRESS; existe uma referência, feita pela arguida, à presença de acquirers estrangeiros a operar em Portugal, mas tal referência não se estriba sequer na identificação de quais sejam esses acquirers. Por outro lado, há indícios de que a UNICRE se comporta com relativa independência em face do BCP - basta comparar a severidade das condições impostas nos seus contratos de adesão para as "mail orders", que vão ao ponto de exigir a prestação de uma garantia bancária de montante considerável, com a menor austeridade e o menor custo das condições inseridas nos contratos com os comerciantes aderentes à rede gerida pelo BCP (ver nota 15).

Finalmente, convém não esquecer que estamos a falar da gestão de sistemas que funcionam em rede, e que o poder de mercado da UNICRE enquanto acquirer vai ser tributário da dimensão das próprias redes (VISA E MASTERCARD) que explora. Pelo que se retira do processo, os utilizadores de cartões VISA e MASTERCARD no nosso país são em número consideravelmente maior do que os utilizadores de cartões AMERICAN EXPRESS. Tudo isto nos leva a concluir que, no mercado definido pela DGCC, a UNICRE dispõe, de facto, de uma posição dominante.

Isto dito, é preciso não esquecer que observámos atrás quanto à (ausência de uma correcta) definição do mercado relevante. Desde logo, em causa está a susceptibilidade de dispor de um meio de aceitação de pagamentos à distância (ainda que apenas com cartão de crédito) realizados não apenas por cidadãos portugueses, mas eventualmente (e, no caso em análise, primordialmente) por estrangeiros. Não constam do processo dados suficientes sobre a dimensão internacional das redes VISA, MASTERCARD E AMERICAN EXPRESS. Por outro lado, existe a possibilidade jurídica de outros acquirers das redes VISA, MASTERCARD e AMERICAN EXPRESS oferecerem os seus serviços seja a partir de outro Estado-Membro da União Europeia, seja a partir do nosso país. A pressão efectiva desta contestabilidade do mercado de acquiring não foi sequer investigada pela DGCC, pelo que não dispõe o Conselho de dados para a avaliar. Por fim, se após uma fundamentada análise económico-jurídica a entidade instrutura houvesse chegado à conclusão que o mercado relevante seria dos (ou de alguns dos) meios de pagamento à distância, muito provavelmente a arguida não deteria sequer uma quota superior aos 30% que a nossa lei requer para que se presuma a existência de uma posição dominante.

ii) Existência de um abuso de posição dominante

Mesmo aceitando que a UNICRE detém uma posição dominante no mercado do acquiring ou gestão de transacções com cartões de crédito, é preciso apurar se procedeu à sua exploração abusiva com consequências nefastas no plano da concorrência.

Poder-se-á sustentar que o comportamento abusivo consistiu na "recusa indevida da prestação de serviço" e nas "exigências [...] (fixadas para as transacções à distância"(ver nota 16)? Entende este Conselho que não.

A recusa da UNICRE em aceitar as "mail orders" enviadas pelo proprietário do COAA, de Março de 1999 a Novembro do mesmo ano, foi justificada pela ausência de um anterior contrato válido quanto a este tipo de transacções (uma vez que o contrato celebrado em 1994 apenas dizia respeito a transacções presenciais). É certo que, na prática, as transacções à distância com origem no COAA foram aceites pela UNICRE durante anos, e que tal poderia configurar a celebração de um contrato por declarações tácitas ou até pela via do artigo 234.º do Código Civil (ver nota 17). Mas se, de um lado, o proprietário do COAA vem invocar que desde 1994 se limitou a seguir as instruções do representante local da UNICRE para aceder à realização de transacções à distância, de outro lado o mesmo representante local vem alegar que não se recorda de qualquer contacto e a UNICRE escuda-se em particularidades da leitura óptica dos campos dos formulários para justificar o seu desconhecimento quanto à aceitação de transacções à distância. Não cabe ao Conselho servir de árbitro nesta querela contratual, tanto mais que não dispõe de qualquer elemento objectivo mas tão-só das declarações dos intervenientes.

Por outro lado, é pertinente a referência a uma das conclusões extraídas pelo Banco de Portugal no parecer supra-mencionado (ver nota 18), de acordo com a qual "a ponderação final a efectuar quanto à actuação da UNICRE (ao suspender generalizadamente, embora com carácter temporário e excepcional, o processamento das transacções por mail order) não poderá deixar de ter em consideração [por força do disposto no artigo 87º, n.º 3 do RGICSF] o factor de a actividade daquela entidade comportar particulares circunstâncias de risco, o qual resulta especialmente acrescido - quer para os titulares dos cartões, quer para a própria UNICRE) no caso concreto daquelas transacções à distância".

E mesmo que a recusa de "mail orders" entre Março e Novembro de 1999 fosse de reputar abusiva, faltaria demonstrar que "teve por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência". Tudo que consta do processo quanto às consequências do comportamento da arguida são as alegações de prejuízos financeiros pelo proprietário do COAA em virtude de os seus clientes se recusarem a utilizar o sistema de transferência bancária e o registo de um decréscimo das transacções globais (incluindo presenciais) realizadas pelo COAA na rede gerida pela UNICRE.

Quanto às condições contratuais fixadas para as transacções à distância e oferecidas pela UNICRE a partir de Novembro de 1999, saliente-se, em primeiro lugar, que são idênticas para todos os comerciantes que pretendam aderir à rede VISA (ver nota 19). Não constam, todavia, do processo quaisquer reacções de outros aderentes potenciais. Em segundo lugar, a exigência de uma garantia bancária é respaldada em justificações relativas à segurança do sistema de pagamentos à distância com cartões de crédito, e é preciso não esquecer as cautelas com que o 87.º, n.º 3, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras rodeia a aplicação da legislação de defesa da concorrência quando estejam em causa circunstâncias de risco ou solvabilidade do sistema financeiro. Saliente-se que a este propósito, o Banco de Portugal, no seu parecer, informa que "encara de forma positiva a adopção, por parte das entidades que supervisiona, de procedimentos tendentes à minimização dos riscos inerentes à actividade prosseguida por aquelas entidades".

Em terceiro lugar, existe uma alternativa à constituição da garantia bancária: o contrato-tipo prevê que será dispensada se o comerciante dispuser de contabilidade organizada e boa solvência. Mais uma vez, temos as partes envolvidas em desacordo (a UNICRE afirma que esta possibilidade não foi accionada pelo queixoso, o proprietário do COAA sustenta que não lhe foi sequer facultada). Não cabe, evidentemente, ao Conselho decidir a disputa, mas tão-só registar que o contrato-tipo oferecido a todos os comerciantes que desejem realizar transacções à distância prevê a dispensa de garantia bancária. Apurar se, de facto, a UNICRE se recusa a facultar tal alternativa e se, de facto, impõe uma garantia bancária de montante desproporcionado, são questões para os tribunais e para o direito dos contratos (nomeadamente, para o diploma que regula a utilização de cláusulas contratuais gerais e sanciona, civilmente, os abusos dessa utilização o Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro, com as suas posteriores alterações). Não apenas porque é uma questão eminentemente negocial mas sobretudo porque, em face dos dados do processo, não resulta que o comportamento da UNICRE impeça, falseie ou restrinja a concorrência e, portanto, não suscita a aplicação do direito que visa defender a concorrência (e não as posições contratuais dos concorrentes).

h) Conclusões

De toda a exposição precedente, podemos retirar as seguintes conclusões:

1.ª O Conselho não dispõe de elementos para proceder à definição do mercado de acordo com parâmetros rigorosos e minimamente fundados do ponto de vista jurídico-económico;

2.ª No mercado circunscrito pela DGCC, a quota detida pela arguida faz presumir a existência de uma posição dominante;

3.ª Não se verifica, contudo, qualquer exploração abusiva dessa posição que tenha por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência;

4.ª Como tal, não estamos em presença uma conduta proibida pelo artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, nem se preenche o tipo contra-ordenacional previsto pelo artigo 37º, n.º 2, do mesmo diploma.

4 - Decisão

Tudo visto e ponderado, o Conselho da Concorrência, considerando que a conduta da arguida não cai no âmbito da proibição constante do artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, e, por conseguinte, não preenche o tipo contra-ordenacional do artigo 37.º, n.º 2, do mesmo diploma, decide o seguinte:

1.º Ordenar o arquivamento do processo nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 27º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro;

2.º Dar conhecimento da presente decisão à arguida e à entidade queixosa.

(nota 1) Em 1998, das 130 transacções realizadas 82 consistiram em "mail orders" (cf. fls. 13/14).

(nota 2) Cf. fl. 17.

(nota 3) Cf. fls. 29/31 e 193/194.

(nota 4) Precisando, mais adiante (p. 8 do Relatório, fl. 244 do processo), que se trata dos "chamados cartões bancários, que têm como vectores comuns, por um lado, o facto de serem emitidos por um banco ou uma sociedade financeira e, por outro, a universalidade da sua aceitação, o que nos permite considerá-los como um meio de pagamento".

(nota 5) Serão os "cartões associados a uma conta bancária de depósito à ordem, que é debitada em cada utilização, transitando o montante da operação, em tempo real, para a conta de um terceiro, beneficiário da transacção, ou p/o próprio sacador no caso dos levantamentos em ATM. Estes cartões só podem ser debitados, em cada momento, pelo saldo da conta a que estão associados.", acrescentando a entidade instrutora que "no nosso mercado, existem cartões de débito emitidos no âmbito das redes nacional MULTIBANCO e internacional VISA ELECTRON." (pp. 7 e 8 do Relatório, fls. 243 e 244 do processo).

(nota 6) São cartões que "permitem a aquisição de bens ou serviços com pagamentos diferidos no tempo, bem como levantamentos de dinheiro por parte do seu titular, nas mesmas condições, ou seja, constituem, simultaneamente, um instrumento de pagamento e uma forma de obtenção de crédito. Ao seu titular é atribuído um plafond de crédito p/um determinado período de tempo, renovável, e estabelecido em função da capacidade financeira dos mesmos. São normalmente emitidos no âmbito de sistemas/marcas internacionais, largamente difundidas, sendo as mais representativas a VISA, a EUROCARD/MASTERCARD e a AMERICAN EXPRESS." (p. 8 do Relatório, fl. 244 do processo).

(nota 7) Os cartões que "são carregados previamente com determinadas quantias, p/utilização em ambientes electrónicos próprios, como moeda de pagamento de determinados bens ou serviços de pequeno valor. Incluem-se nesta categoria, os chamados porta-moedas electrónicos." (p. 8 do Relatório, fl. 244 do processo).

(nota 8) Cf. pp. 11 e 12 do Relatório, fls. 247 e 248 do processo.

(nota 9) Cf. mapa de evolução do n.º de transacções na REDUNICRE1996/1999, fls. 214 do processo.

(nota 10) As condições próprias das transacções à distância são bastante semelhantes às que o queixoso observou, no âmbito do sistema VISA, de 1994 a 1999, e consistem 1) no pedido assinado pelo titular do cartão, requerendo o fornecimento do serviço e autorizando expressamente o débito do seu cartão, donde conste o número do cartão e sua validade; 2) obtenção de autorização telefónica junto do centro de autorização, seja qual for o valor da transacção, indicando expressamente que se trata de uma venda por correspondência.

(nota 11) Cf. fl. 268 do processo.

(nota 12) "Comunicação da Comissão relativa à definição de mercado relevante para efeitos do direito comunitário da concorrência (97/C 372/03)", JOCE, 9 de Dezembro de 1997, C 372/5, ponto 13.

(nota 13) Ver supra, ponto 2.c), ii).

(nota 14) Referimo-nos, claro, à procura da disponibilidade de meios de pagamento à distância por parte das empresas que actuam (pelo menos) a nível retalhista (como o COAA) e que buscam esses meios de pagamento como input para os serviços que depois prestam aos seus próprios clientes. Claro que, em certa medida, esta procura das empresas retalhistas é hetero-induzida pelas preferências e disponibilidades dos seus próprios clientes quanto aos meios de pagamento à distância em questão.

(nota 15) Na apreciação desta diferença convém, todavia, ter em conta a opinião emitida pelo Banco de Portugal no seu parecer. Apoiando-se nas quotas de mercado constantes do processo, considera aquela entidade que dos factos de o cartão AMERICAN EXPRESS deter uma "penetração correspondente a apenas 10%" e de "a sua estratégia de distribuição (estar) confinada a um estrato social mais elevado" decorre "um grau de risco operacional substancialmente inferior àquele que se verifica no quadro da actividade prosseguida pela UNICRE".

(nota 16) Como pretende a Direcção-Geral do Concelho da Concorrência, na p. 28 do Relatório de Instrução (fl. 264 do processo).

(nota 17) Norma que dispõe que ".

(nota 18) Ver ponto 2e).

(nota 19) Esclareça-se, contudo, que o montante exacto da garantia não consta do contrato-tipo, pelo qual o comerciante apenas se obriga a "constituir a favor da Unicre e a manter válida, a todo o tempo, uma garantia bancária idónea, de montante e demais condições que a Unicre indicará".

Lisboa, 18 de Outubro de 2001. - Carolina de Castro Nunes Vicente e Cunha (relatora) - José Álvaro Ubach Chaves Rosa - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva - José Anselmo Dias Rodrigues (presidente).

ANEXO C4

Processo 2/01 - Práticas anticoncorrenciais no mercado das telecomunicações

O Conselho de Concorrência, no uso da competência que lhe é atribuída pela alínea a) do n.º 1 do artigo 13.º do Decreto-Lei 371/93, de 23 de Outubro, e visto o processo de contra-ordenação registado sob o n.º 2/2001, em 14/05/2001, em que é arguida a PT Comunicações, S. A. (em consequência da recente restruturação, aprovada pelo Decreto-Lei 219/2000, de 9 de Setembro, esta entidade ocupou a posição da anterior Portugal Telecom, S. A.), tem a ponderar os seguintes elementos de facto e de direito:

1 - Origem do processo

O presente processo teve origem numa queixa apresentada, em 20 de Janeiro de 1999, na Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência (DGCC) pela Maxitel Serviços e Gestão de Telecomunicações, S. A. (adiante designada Maxitel), através da qual a empresa denunciava ser alvo de práticas sistemáticas de abuso de posição dominante e de discriminação concorrencial, por parte do operador de rede básica, então, Portugal Telecom, S. A. e hoje, em consequência da restruturação aprovada pelo Decreto-Lei 219/2000, de 9 de Setembro, PT Comunicações, S. A. (adiante designada PT).

O processo deu entrada no Conselho da Concorrência no dia 14 de Maio de 2001.

2 - Os factos

a) A arguida

Em 23 de Julho de 1994, através da operação de fusão da Telecom Portugal, S. A., dos Telefones de Lisboa e Porto, S. A. e da Teledifusora de Portugal, S. A., foi criada a Portugal Telecom, S. A. com o desígnio de passar a prestar todo o serviço público de telecomunicações, visando dotar Portugal de um operador de telecomunicações capacitado para a melhoria da qualidade e diversidade dos serviços a prestar no domínio das telecomunicações.

Nos últimos 5 anos a PT fez a transição de pública para privada, sendo detida em 90% por accionistas privados e alcançou um crescimento médio anual de 11% nas receitas e de 37% no lucro líquido.

Com a estrutura de grupo, a PT detinha, até 2000, a 100% a PT Investimentos e, organizada sob a forma de holding detém empresas que operam, designadamente, nos planos de:

Negócios de rede fixa;

Móvel terrestre;

Multimédia;

Negócios internacionais;

Comunicações internacionais; e

Comunicação de dados.

sendo que:

Operam nos negócios de rede fixa a Marconi e a Portugal Telecom:

No plano móvel terrestre opera através da TMN;

No plano multimédia opera, designadamente, através da TV Cabo e Telepac II;

No plano da comunicação de dados opera através da PT Prime-Soluções Empresariais de Telecomunicações e Sistemas, S. A;

No plano dos negócios internacionais detém participações, importantes nuns casos e de controlo noutros, em empresas como a CRT, Telesp Celular Participações, Companhia Santomense de Telecomunicações, Cabo Verde Telecom, Guiné Telecom.

A PT, ao longo destes anos, foi reformulando a sua estrutura empresarial e de grupo, através da criação e separação de diferentes áreas de negócio, bem como da distinção entre actividade operacional e de gestão de participações sociais. Em 2000, através da vontade expressa dos seus órgãos, a PT deu mais um passo na sua reestruturação com o objectivo de fazer encabeçar o grupo por uma sociedade gestora de participações sociais.

O objectivo passou, ainda, pela constituição de uma nova sociedade, a PT Comunicações, S. A., a qual assumiu todo o conjunto de direitos e obrigações da concessionária do serviço público de telecomunicações.

b) A queixa

A queixa que desencadeou o presente processo foi apresentada por Maxitel - Serviços e Gestão de Telecomunicações, S. A.

i) A actividade económica da queixosa

A Maxitel é uma sociedade anónima de capital exclusivamente privado, com o número de pessoa colectiva 503172120 e matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o n.º 03407.

Foi criada em 29 de Março de 1994, o seu capital social é de 1 350 000 000$ (mil trezentos e cinquenta milhões de escudos) e encontra-se sediada no Campo Grande, 35, 2.º, D, em Lisboa.

De acordo com os seus estatutos, a Maxitel tem como objecto social:

A prestação de serviços de telecomunicações e informática;

A prestação de serviços de consultadoria técnica, económica e comercial, designadamente nas áreas de telecomunicações e informática;

A gestão de participações em sociedades operadoras de serviços e infraestruturas de telecomunicações, prestadoras de serviços e comercializadoras de produtos informáticos.

À data da apresentação da queixa a Maxitel era titular da licença n.º ICP - 020/TCF, emitida em 9 de Setembro de 1996, para a prestação de serviços de telecomunicações complementares fixos, compreendendo um serviço de transmissão de dados com ou sem comutação, correio electrónico e transferência electrónica de dados (EDI), ao abrigo da qual se encontrava autorizada a prestar um serviço de internet.

A Maxitel era, ainda, titular da licença n.º ICP-025/TCF, emitida em 97/02/18, para a prestação do Serviço de Redes Privativas de Voz (SRPV).

Durante o ano de 1998, e no âmbito das referidas licenças, a Maxitel prestava unicamente serviços de redes privativas de voz e dados (transmissão de fax) a empresas e/ou grupos fechados de utilizadores.

ii) Os factos que deram origem à queixa

Na origem da queixa esteve a viabilização do projecto de expansão da rede da Maxitel, que implicava a reserva de espaço nas instalações da PT e o fornecimento atempado, por esta empresa, dos circuitos solicitados pela Maxitel.

A queixa reporta-se ao aluguer de circuitos para os nós de Braga, Aveiro, Leiria e Setúbal, previstos no referido plano de expansão, e refere-se ao ano de 1998.

a) Nó de Braga

aa) Em 13 de Julho de 1998, a Maxitel solicitou à PT, indicação sobre a disponibilidade de espaço técnico nas instalações da PT tendo em vista a abertura de um novo nó da Maxitel em Braga (fl. 12).

ab) Em 23 de Julho de 1998, a PT informa estar em condições de disponibilizar o espaço pretendido pela Maxitel (fl. 13).

ac) Em 29 de Julho de 1998, a Maxitel faz uma encomenda de circuitos, a primeira (fl. 15).

ad) Em 4 de Agosto de 1998, a Maxitel faz um aditamento ao pedido de circuitos de 29 de Julho de 1998, incluindo um acesso RDIS primário com número confidencial e 100DDI's (fl. 17).

ae) Em 8 de Setembro de 1998, a PT informa de que não existe disponibilidade de espaço em Braga (fl. 22).

af) Em 11 de Setembro de 1998, a Maxitel faz uma alteração de instruções relativamente ao pedido de circuitos digitais para o nó remoto de Braga, com redefinição de locais, dada a indisponibilidade de espaço reservado nas instalações da PT em Braga (fl. 23).

ag) Em 21 de Setembro de 1998, a Maxitel questiona sobre a possibilidade dos circuitos serem entregues até ao dia 2 de Outubro de 1998, solicitando com urgência a indicação de uma data de entrega (fl. 28).

ah) Em 15 de Outubro de 1998, a Maxitel, simultaneamente à confirmação dos testes finais em Setúbal, solicita informações relativas à entrega de circuitos encomendados para os restantes nós (fl. 35).

ai) A PT facturou em Dezembro com data de 12 de Novembro de 1998 e na factura de Janeiro fez uma correcção considerando a instalação efectuada em 14/01/99 (fls. 122 e 124).

aj) Em 14/01/99, entrega parcial dos circuitos solicitados: circuito dedicado a 2Mbps (Maxitel Lisboa - Maxitel Braga). A PT informa que os circuitos de suporte para SS#7 neste nó se encontram prontos do ponto de vista da transmissão. Disponibilizando-se para o agendamento de testes de sinalização que a Maxitel entenda necessários, de modo a ser concluída a instalação (fl. 113).

al) Em 2 de Fevereiro de 1999 a PT informa que prevê realizar os testes de funcionalidade em 8 de Fevereiro de 1999 e reconhece que os circuitos ainda não estão concluídos (fl. 115).

am) Em 17 de Fevereiro de 1999, entrega de circuitos: (ver nota 1) suporte 2 Mbps C7 Maxitel Braga - PT. Todavia a PT facturou em Fevereiro com data de 8/02/99 (fl. 125).

b) Nó de Leiria/Marinha Grande

ba) Em 13 de Julho de 1998, foi solicitado à PT indicação sobre a disponibilidade de espaço técnico nas instalações da PT tendo em vista a abertura de um novo nó da Maxitel em Leiria (fl. 12).

bb) Em 23 de Julho de 1998 a PT informa estar em condições de disponibilizar o espaço pretendido pela Maxitel (fl. 13).

bc) Em 28 de Julho de 1998 é redefinido, pela Maxitel, o local de implantação na zona de Leiria que passa a ser Marinha Grande, dada a informação positiva da PT de existência de espaço nesse local (fl. 14).

bd) Em 29 de Julho de 1998, a Maxitel faz uma primeira encomenda de circuitos para a Marinha Grande.

be) Em 4 de Agosto de 1998, a Maxitel faz um aditamento ao pedido de circuitos de 29 de Julho de 1998 (um acesso RDIS primário com número confidencial e 100 DDI's) (fl. 17).

bf) Em 11 de Setembro de 1998, a Maxitel faz uma alteração de instruções relativamente ao pedido de circuitos digitais para o nó remoto da Marinha Grande, com redefinição de locais a interligar. Nesse fax, com a referência FX98040-AM, a Maxitel resume os circuitos pedidos (fl. 24).

bg) Em 21 de Setembro de 1998, a Maxitel, questiona sobre a possibilidade dos circuitos serem entregues até 6 de Outubro de 1998, solicitando, com urgência, a indicação de uma data de entrega (fl. 28).

bh) Em 15 de Outubro de 1998, a Maxitel, simultaneamente á confirmação dos testes finais em Setúbal, solicita informações sobre a entrega de circuitos encomendados para os restantes nós, incluindo Marinha Grande (fl. 35).

bi) Em 14 de Janeiro de 1999, entrega parcial dos circuitos solicitados: circuito dedicado a 2Mbps (Maxitel Lisboa - Maxitel Marinha Grande).

bj) Em 14 de Janeiro de 1999, entrega de circuitos: suporte 2 Mbps C7 Maxitel Marinha Grande - PT.

bl) Em 2 de Fevereiro de 1999 a PT informa que prevê realizar os testes de funcionalidade em 8 de Fevereiro de 1999 e reconhece que os circuitos ainda não estão concluídos (fl. 115).

c) Nó de Aveiro/São João da Madeira

ca) Em 13 de Julho de 1998, foi solicitado à PT indicação sobre a disponibilidade de espaço técnico nas instalações da PT tendo em vista a abertura de um novo nó da Maxitel em Aveiro (fl. 12).

cb) Em 28 de Julho de 1998 é redefinido, pela Maxitel, o local de implantação na zona de Aveiro que passa a ser São João da Madeira, sendo solicitada informação sobre a existência de espaço nesse local (fl. 14).

cc) Em 17 de Setembro de 1998, a Maxitel faz uma encomenda com carácter de urgência de circuitos para São João da Madeira (fl. 25).

cd) Em 21 de Setembro de 1998, a Maxitel questiona sobre a possibilidade dos circuitos serem entregues até 1 de Outubro de 1998, solicitando, com urgência a indicação de uma data de entrega (fl. 28).

ce) Em 21 de Setembro de 1998, resposta da PT relativamente ao prazo de entrega em S. João da Madeira, que não poderá ser na data objectivo pretendida pela Maxitel, sem que seja, contudo, referida qualquer data (fl. 29).

cf) Em 15 de Outubro de 1998, a Maxitel, simultaneamente à confirmação dos testes finais em Setúbal, solicita informações sobre a entrega de circuitos encomendados para os restantes nós, incluindo São João da Madeira (fl. 35).

cg) Em 22 de Outubro de 1998, a PT informa ter instalado os circuitos e linhas de rede solicitadas em 17 de Setembro de 1998, referindo que, relativamente aos 2 circuitos a 2 Mbps entre Maxitel (São João da Madeira) e Maxitel (Lisboa) será para breve a realização dos testes de sinalização (fl. 37).

ch) Em 2 de Fevereiro de 1999 a PT informa que prevê realizar os testes de funcionalidade em 8 de Fevereiro de 1999 e reconhece que os circuitos ainda não estão concluídos (fl. 115).

ci) Em 17 de Fevereiro de 1999, entrega de circuitos: suporte 2 Mbps C7 Maxitel São João da Madeira - PT.

cj) A PT facturou em Fevereiro com data de 2 de Fevereiro de 1999 (fl. 126).

d) Nó de Setúbal

da) Em 13 de Julho de 1998, foi solicitado à PT indicação sobre a disponibilidade de espaço técnico nas instalações da PT tendo em vista a abertura de um novo nó da Maxitel em Setúbal (fl. 12).

db) Em 28 de Julho de 1998, a Maxitel volta a pedir informação relativamente à existência de espaço em Setúbal (fl. 14).

dc) Em 20 de Agosto de 1998, a Maxitel faz uma encomenda de circuitos para Setúbal (fl. 19).

dd) Em 8 de Setembro de 1998, a Maxitel faz um aditamento ao pedido de circuitos digitais de 20 de Agosto de 1998, que se traduz em alterações relativas a especificações técnicas (fl. 21).

de) Em 21 de Setembro de 1998, a Maxitel questiona sobre a possibilidade dos circuitos serem entregues até 24 de Setembro de 1998, solicitando, com urgência a indicação de uma data de entrega (fl. 28).

df) Em 24 de Setembro de 1998, a PT informa relativamente à semana de entrega de circuitos em Setúbal, que deverá ser a semana seguinte à data objectivo Maxitel (fl. 30).

dg) Em 28 de Setembro de 1998, a Maxitel pede confirmação da data de entrega definitiva de circuitos em Setúbal, questionando sobre a possibilidade da sua entrega em 28 de Setembro de 1998 e, na sua impossibilidade, solicita indicação da data e hora previsível (fl. 31).

dh) Em 30 de Setembro de 1998, a PT informa relativamente à entrega de circuito RDIS e de linhas analógicas em Setúbal (fl. 33).

di) Em 12 de Outubro de 1998, a PT informa que os testes finais em Setúbal se efectuarão em 27 de Outubro de 1998 (fl. 34).

dj) Em 15 de Outubro de 1998, a Maxitel confirma a aceitação dos testes em Setúbal a realizar em 27 de Outubro de 1998 (fl. 35).

dl) A PT factura em Janeiro com data de 13 de Janeiro de 1999 (fl. 123). Na factura de Fevereiro a PT realiza um acerto mantendo a data de 13 de Janeiro de 1999 (fl. 125).

dm) Em 18 de Janeiro de 1999, entrega de circuitos: suporte 2 Mbps C7 Maxitel Setúbal - PT.

Posteriormente, em 1999, quando a Maxitel procedia à continuação da expansão da rede, designadamente nos nós de Faro e Portimão, ocorreu o seguinte:

a) Nó de Faro

aa) Em 10 de Março de 1999 a Maxitel informa a PT, que pretende abrir este nó em Maio de 1999, pelo que solicita a reserva dos recursos SS#7 necessários à implementação deste novo nó (fl. 40).

ab) Em 31 de Março de 1999 a Maxitel encomenda os circuitos (fl. 42).

ac) Em 1 de Abril de 1999 a PT solicita esclarecimentos ao pedido formulado pela Maxitel e referido na alínea anterior (fl. 47).

ad) Em 8 de Abril de 1999 a Maxitel envia os esclarecimentos solicitados (fl. 49).

ae) Em 19 de Abril de 1999 a Maxitel envia as tabelas com os reencaminhamentos pretendidos para este nó (fl. 52).

af) Em 7 de Maio de 1999 na sequência de uma reunião de coordenação com a PT em 29 de Abril de 1999, a Maxitel confirma a solicitação da PT de alteração de reencaminhamentos para este nó (fl. 54).

ag) Em 10 de Outubro de 1999, a Maxitel informa a PT dos NSPC's dos nós de Faro e Portimão, informação essa que já teria sido prestada pelo ICP (fl. 57).

ah) Em 24 de Maio de 1999 a PT informa estarem instalados os circuitos solicitados para este nó e que prevê que eles comecem a cursar tráfego em 27 de Maio de 1999, (fl. 59) e informa, ainda, que o circuito de interligação e o circuito de suporte SS#7 deverão ser concluídos em breve (fl. 60).

ai) Em 28 de Maio de 1999 a PT informa por correio electrónico, que aguarda confirmação de que os encaminhamentos em Faro estão prontos. Não é dada uma data para tal, sendo apenas referido: Logo que possível informarei (fl. 61).

aj) Em 2 de Junho de 1999 a PT refere a sua indisponibilidade para fornecer o pedido de circuitos em SS#7, para ligação aos interfaces de acesso telefónico aos serviços de comunicação de dados/internet, disponibilizando-se para a sua cedência em DSS1-acesso primário (fl. 64 e 65).

b) Nó de Portimão

ba) Em 10 de Março de 1999 a Maxitel informa a PT, que pretende abrir este nó em Maio de 1999, pelo que solicita a reserva dos recursos SS#7 necessários à implementação deste novo nó (fl. 40).

bb) Em 31 de Março de 1999 a Maxitel encomenda os circuitos (fl. 42);

bc) Em 1 de Abril de 1999 a PT solicita esclarecimentos ao pedido formulado pela Maxitel e referido na alínea anterior (fl. 47).

bd) Em 8 de Abril de 1999 a Maxitel envia os esclarecimentos solicitados (fl. 49).

be) Em 19 de Abril de 1999 a Maxitel envia as tabelas com os reencaminhamentos pretendidos para este nó (fl. 52).

bf) Em 7 de Maio de 1999 na sequência de uma reunião de coordenação com a PT em 29 de Abril de 1999, a Maxitel confirma a solicitação da PT de alteração de reencaminhamentos para este nó (fl. 54).

bg) Em 10 de Maio de 1999 A Maxitel informa a PT dos NSPC's atribuídos pelo ICP para este nó (fl. 57).

bh) Em 24 de Maio de 1999 a PT informa elencando os meios de telecomunicações que neste nó se encontram instalados e que os circuitos entre Faro e Portimão e de suporte de Portimão, vão estar concluídos em breve (fl. 60).

bi) Em 28 de Maio de 1999 a PT informa por correio electrónico, que o nó de Portimão está pendente de instalação. Logo que possível informarei da previsão. Relativamente aos encaminhamentos é dada a mesma informação: Logo que possível informarei da previsão (fl. 61).

bj) Em 2 de Junho de 1999 a PT refere a sua indisponibilidade para fornecer o pedido de circuitos em SS#7, para ligação aos interfaces de acesso telefónico aos serviços de comunicação de dados/ internet, disponibilizando-se para a sua cedência em DSS1-acesso primário (fl. 64 e 65).

iii) Outros factos relevantes apurados

Com a matéria de facto em apreço, relacionam-se outras queixas que o Instituto de Comunicações de Portugal (adiante designado ICP) recebeu de vários outros operadores. As reclamações são relativas à prestação do serviço de circuitos alugados por parte da PT, operador de serviço público de telecomunicações, e respeitam, também, à qualidade do serviço prestado por esta. Entre esses operadores destacam-se a TELEWEB, COMNEXO e GLOBALONE, que apresentaram, ao ICP, reclamações relativas aos prazos de instalação de circuitos praticados pela PT, nomeadamente no que se refere aos circuitos de 64 kbit/s (fl. 130 e 130-A).

Neste contexto o ICP solicitou informações à PT, e das informações disponibilizadas, o regulador entendeu que "não se concluiu, em termos globais, pela discriminação dos operadores, face às empresas do grupo PT" (fl. 130.A).

Do processo consta ainda um fax expedido pela Grundig, na qualidade de cliente da Maxitel e a esta dirigido, no qual se pode ler: "(...) Gostaríamos de lembrar que celebramos um contrato com a vossa empresa em 9 de Novembro de 1998, com a promessa de que tudo estaria regularizado o mais tardar no início de Dezembro, o que não se verifica.

Uma vez que não estamos dispostos a suportar por mais tempo custos mais elevados com as comunicações, e como já temos em nosso poder outras alternativas, nomeadamente da PT, informamos que se até ao dia 29 de Janeiro de 1999, este assunto não estiver regularizado iremos então proceder à rescisão do referido contrato por incumprimento da Maxitel(...)".

c) O mercado

i) O contrato de concessão de serviço público de telecomunicações e a prestação do serviço de circuitos alugados

As bases da concessão do serviço público de telecomunicações foram aprovadas em anexo ao Decreto-Lei 40/95, de 15 de Fevereiro (adiante designado por Lei de bases). Este diploma traduz, como se refere no preâmbulo, um "(...) quadro definidor das áreas de actuação exclusiva da concessionária, quer ao nível das infra-estruturas de telecomunicações, quer dos serviços que a mesma fica incumbida de prestar, como também da forma como tais infra-estruturas e serviços devem ser geridos e prestados (...)".

O artigo 2.º da Lei de bases estabelece no seu n.º 1 que a concessão tem por objecto, para além de outras prestações, a prestação do serviço de circuitos alugados.

E o artigo 8.º do mesmo diploma investe a PT nas obrigações genéricas, ao abrigo da alínea b) do n.º 1, de prestar os serviços concessionados, assegurando a sua interoperabilidade, continuidade, disponibilidade e qualidade; bem como, ao abrigo da alínea d), de garantir a igualdade e a transparência no acesso e na utilização dos seus serviços por outros operadores de telecomunicações devidamente licenciados ou autorizados para a prestação de serviços de telecomunicações mediante remuneração adequada e nas condições definidas na lei e no contrato.

A PT fica, ainda, investida, nos termos do artigo 9, n.º 1, alínea b), na obrigação específica de "(...) desenvolver, qualitativa e quantitativamente, as infra estruturas da rede básica de telecomunicações, cumprindo, nomeadamente, os objectivos que vierem a ser fixados no convénio a que alude o artigo 21.º, de modo a assegurar os níveis de qualidade adequados aos serviços que nelas se suportem (...)".

O artigo 21.º estabelece que, por convénio entre o ICP e a concessionária, ou seja a PT, serão fixados, entre outros, "(...) Padrões e indicadores de qualidade de serviços prestados (...)" e, de seguida, no n.º 4 esclarece que "(...) findo o prazo de vigência do convénio e até à celebração de novo convénio, fica a concessionária obrigada a assegurar, no mínimo, a tendência de evolução dos objectivos e indicadores estabelecidos (...)".

Nesse âmbito foi celebrado um convénio em 20 de Março de 1995 para vigorar no triénio 1995/1997, tendo a sua vigência terminado em 20 de Março de 1998.

Todavia, de acordo com as regras da concessão, definidas no artigo 21.º, finda a vigência do Convénio e "(...) até à celebração de novo convénio, fica a concessionária obrigada a assegurar, no mínimo, a tendência de evolução dos objectivos e indicadores estabelecidos (...)".

Nesse contexto foram desenvolvidos contactos, em Dezembro de 1997, entre o ICP, a concessionária e os utilizadores dos serviços, tendo-se definido para o triénio de 1998/2000 um novo conjunto de objectivos, nomeadamente para a demora média de instalação de um circuito alugado: 14, 13 e 12 dias para, respectivamente, 1998, 1999 e 2000 (fl. 73).

Para efeitos da contabilização da demora de instalação de um circuito, nos termos do n.º 4 da cláusula 21ª do Contrato de Concessão do Serviço Público de Telecomunicações, o circuito só será considerado "pronto" no momento da sua efectiva disponibilização, conforme documento enviado pelo ICP, na parte relativa aos "Indicadores de Qualidade do Serviço de Circuitos Alugados" (fl. 72).

Assim, segundo essa definição, o circuito só se encontrará disponível após a realização de eventuais "testes de operacionalidade" que tenham a ver especificamente com o serviço de circuitos alugados.

De referir, por último, que constituem direitos dos operadores de redes públicas de telecomunicações, conforme o previsto no n.º 1, do artigo 3.º, alínea d), do Decreto-Lei 290-A/99, de 30 de Julho, designadamente, o de "interligar-se a redes públicas de telecomunicações ou a serviços de telecomunicações de uso público nos termos da lei".

ii) O mercado das telecomunicações e o mercado do serviço de aluguer de circuitos

No entender da entidade instrutora, o caso em apreço enquadra-se, em termos globais, no mercado das telecomunicações.

Por telecomunicações entende-se, nos termos do artigo 2.º, da Lei 91/97, de 1 de Agosto, "(...) a transmissão ou emissão de sinais, representando símbolos, escrita, imagens, sons ou informações de qualquer natureza por fios, por sistemas ópticos por meios radioeléctricos e por outros sistemas electromagnéticos(...)".

Nos termos do n.º 7 do mesmo diploma, são definidas as redes de telecomunicações como "(...) conjunto de meios físicos, denominados infra-estruturas, ou electromagnéticos que suportam a transmissão, recepção ou emissão de sinais (...)".

E a interligação, de acordo com o n.º 9 do mesmo diploma é, "(...) a ligação física e lógica das redes de telecomunicações utilizadas por um mesmo ou diferentes operadores por forma a permitir o acesso e as comunicações entre os diferentes utilizadores dos serviços prestados (...)".

Neste mercado vasto, porém, entende a entidade instrutora que apenas releva para efeitos do presente processo o mercado do serviço de aluguer de circuitos.

A definição de circuitos alugados está prevista no Decreto-Lei 290-A/99, de 30 de Julho, na alínea b), do artigo 2.º, como sendo "(...) os meios de telecomunicações de uma rede pública que proporcionam capacidade de transmissão transparente entre pontos terminais sem envolvimento de funções de comutação controladas pelo utilizador (...)".

Como resulta dos n.os 1 e 2 do ofício ICP-1012/99, de 29 de Junho e do anexo 3 do ofício ICP-S30360/2000, de 20 de Setembro de 2000, os objectivos de demora de instalação de circuitos para efeitos do n.º 4 da cláusula 21.ª do Contrato de Concessão do Serviço Público de Telecomunicações dizem apenas respeito a circuitos alugados (fls. 67 e segs. e, ainda, 231 e segs., respectivamente). Um circuito alugado é composto por dois tipos de componentes:

a) "Terminações" que ligam as instalações do cliente à central do operador da sua área de residência; e

b) "Troços de interligação" que ligam as centrais entre si.

Partindo da noção de mercado como um lugar de encontro entre a oferta e a procura, distingue a DGCC dois mercados potencialmente relevantes e verticalmente ligados:

a) O mercado em que o produto é o aluguer de circuitos, no qual a oferta é realizada pelas entidades que dispõem de circuitos para alugar e a procura é constituída pelos operadores de redes de telecomunicações (ver nota 2);

b) Outro mercado em que o produto é a prestação de serviço de voz e dados, cuja oferta é constituída pelos diversos operadores e a procura é constituída por agentes privados ou empresas, bem como entidades públicas. Considera a DGCC que este último mercado não é o relevante, mas que nele, num segundo momento, são susceptíveis de se repercutir as consequências do que ocorre no primeiro.

iii) Caracterização do mercado do serviço dos circuitos alugados

Tomando por relevante o mercado do aluguer de circuitos, em que a procura é constituída pelos operadores de telecomunicações que prestam os seus próprios serviços de voz e de dados através dos circuitos que alugam, ocupa-se a DGCC da caracterização da oferta de circuitos alugados.

Nela se incluem não só os circuitos alugados de redes físicas como, ainda, os circuitos fornecidos através dos sistemas de telecomunicações via satélite ou via cabo (fl. 129).

A entidade instrutora identifica três tipos de operadores:

a) A PT e a Companhia Portuguesa Rádio Marconi (CPRM), sub-concessionária da PT para os serviços internacionais;

b) Os operadores de redes e de serviços de telecomunicações via satélite;

c) Os operadores de redes de telecomunicações, operando redes físicas.

Em Portugal, segundo informação prestada pelo ICP e relativa à data do processo, os operadores de televisão por cabo não se encontrariam licenciados para a prestação de serviços de redes públicas de telecomunicações, razão pela qual a DGCC entende que não devem ser tidos em consideração, no âmbito do presente processo (fl. 129-A). Quanto aos 11 (onze) operadores licenciados para prestar serviços de redes públicas de telecomunicações (ver nota 3), apenas um deles havia anunciado o início da sua actividade, em Outubro de 1999 (fl. 129-A).

Cabe ao ICP avaliar o poder de mercado dos operadores, tendo em conta os seguintes critérios:

a) Capacidade de influenciar as condições do mercado de circuitos alugados;

b) Relação de grandeza entre o volume de vendas e a dimensão de mercado;

c) Controlo de meios de acesso aos utilizadores finais;

d) Capacidade de acesso a recursos financeiros;

e) Experiência em matéria de oferta de produtos e serviços no mercado. Tendo em consideração os critérios enunciados, entendeu o ICP que a PT deveria ser considerada como entidade com poder de mercado significativo (fl. 129-B)(ver nota 4).

iv) Âmbito geográfico do mercado

Considera a DGCC que o mercado geográfico relevante, para efeitos do presente processo, é o território nacional, uma vez que a procura do serviço se estende a todo o território nacional e a da oferta cobre igualmente todo o território, sendo que as condições objectivas de concorrência aplicável ao produto em questão são semelhantes para todos os agentes económicos.

A sinalização n.º 7 (ver nota 5)

A oferta de circuitos alugados cuja definição e regime está prevista no Decreto-Lei 290-A/99, de 30 de Julho, é efectuada, também, nos termos dos standards do European Telecommunications Standards Institute (ETSI), sendo que o standard não inclui sinalização (ver nota 6).

A sinalização em causa neste processo é a sinalização n.º 7 (também referida como C7 ou SS#7), que veio a estar na origem de alguma controvérsia entre a PT e a Maxitel. Esta sinalização estabelece o protocolo de comunicação entre redes, sobre os circuitos de interligação, e sem o qual não é possível cursar o tráfego entre operadores. Na Oferta de Referência de Interligação para 2000, ficou estabelecido este tipo de sinalização na interligação entre a PT e os OPS (ver nota 7).

Segundo a queixosa, a interligação entre duas redes, com sinalização RDIS, para trocas de tráfego de voz, implica a instalação de equipamento adicional para efectuar a interligação e regista, simultaneamente, problemas de sinalização entre redes, não possibilitando esquemas alternativos de encaminhamentos ao nível da sinalização e do tráfego. A interligação em RDIS não possibilita, igualmente, a validação de clientes por códigos PIN, a não ser que todas as chamadas sejam atendidas mesmo que não sejam terminadas com sucesso, com as consequentes implicações em termos de custos de interligação, ou seja, o pagamento de chamadas mesmo em situações em que o número de destino esteja ocupado.

Tendo em vista ultrapassar estes condicionalismos inerentes ao tratamento das chamadas, que se verificaram em ligações RDIS, foi opção da Maxitel interligar-se em sinalização n.º 7 (ver nota 8), "à semelhança do que já sucedia a nível mundial entre os operadores de voz".

d) Diligências de instrução efectuadas

No decurso da instrução, a DGCC: i) ouviu a arguida; ii) procedeu à audição das testemunhas arroladas pela arguida; iii) procedeu à audição da queixosa.

Das declarações da arguida e das testemunhas por si arroladas salientam-se os seguintes dados, no que respeita aos comportamento imputados à PT e às suas relações negociais com a Maxitel:

A alegada demora na entrega dos circuitos nuns casos não existiu, noutros foi justificada e noutros ainda ficou a dever-se à própria queixosa;

Não terá existido demora com a latitude apontada pela nota de ilicitude (entre três e quatro meses) quanto aos nós de Braga, Leiria, Aveiro e Setúbal, estando os dois primeiros prontos em Janeiro de 99, o terceiro instalado em 22 de Outubro de 1998 e o último entregue em 30 de Setembro de 1998;

A demora ocorrida foi justificada quanto ao nó de Braga (o pedido inicial vinha incompleto e a própria queixosa pediu tempo de pendência a fim de modificar as suas infra-estruturas); quanto ao nó de Leiria/Marinha Grande (a queixosa solicitou circuitos para espaço na central da Marinha Grande quando este não fazia parte da oferta da PT e só em 24 de Setembro de 1998 é que a queixosa informou a PT de quais os encaminhamentos de tráfego pretendidos, escolhendo, então, o sistema de sinalização n.º 7, que estava a ser escolhido pela primeira vez e obrigando a alterações de interligação que a queixosa aceitou); quanto ao nó de Aveiro/S. João da Madeira (a queixosa só informou dos circuitos pretendidos em 24 de Setembro de 1998, e, em consequência do pedido, a PT teve de construir uma infra-estrutura de raiz); e quanto ao nó de Setúbal (a PT deu todo o serviço pronto à queixosa em 30 de Setembro de 1998, informando-a da disponibilidade para a realização de testes que só não vieram a ocorrer em 27 de Outubro de 1998 por problemas com o equipamento da queixosa);

A demora ocorrida ficou a dever-se à própria queixosa: por um lado, os pedidos iniciais não vinham completos, sendo que só após o seu aperfeiçoamento foi possível á PT averiguar e estudar as capacidades técnicas dos locais que a Maxitel pretendia dotar de circuitos; por outro lado, os circuitos pedidos foram concluídos em Setembro e Outubro de 1998 e não em Janeiro e Fevereiro tendo sido a inoperacionalidade do equipamento de ensaio da Maxitel, em Outubro de 98 que acarretou a impossibilidade da realização de testes em todos os outros nós indicados, uma vez que o teste inviabilizado serviria de referência;

A realização dos testes já referidos não deve ser considerada para efeitos de contagem do prazo de entrega de circuitos, mas, todavia, e caso não se partilhe esse entendimento, os testes só não foram realizados por motivos de inoperacionalidade;

Do equipamento da Maxitel; por essa razão, não poderá a PT ser responsabilizada pelos "atrasos";

Uma vez que o serviço de transmissão ficado concluído em Outubro de 1998, mas que a Maxitel só possibilitou a conclusão de testes de operacionalidade em Janeiro e Fevereiro de 1999, a PT ficou prejudicada pela inexistência de tráfego nesses circuitos, o que impediu a cobrança de tráfego e outras taxas - após a conclusão do serviço, a PT poderia ter cobrado as taxas mensais de ligação dos circuitos; todavia, não o fez, desejando manter um bom relacionamento com a Maxitel;

A queixosa poderia ter efectuado tráfego normal a partir do momento em que os circuitos de transmissão estavam concluídos, em Outubro de 1998; Os prazos determinados pelo convénio referem-se apenas aos circuitos de transmissão - "que são as ligações entre os locais da PT e os locais dos clientes"; ora o sistema de sinalização n.º 7 refere-se a um sistema de comutação, que se destina a pôr em contacto aparelhagens distintas e semelhante sistema não tem período de instalação definido pelo ICP;

Por outro lado, os pedidos de circuitos feitos pela queixosa tinham condicionantes como a novidade do produto (a interligação com sinalização n.º 7, que só mais de um ano depois é que foi disponibilizada em termos de oferta de ORl 2000 e uniformizada a nível nacional pelo ICP); a necessidade de adequar as infra-estruturas (que implicou um grande número de obras e de instalação de material tecnologicamente adequado, muito dele novo, cuja escolha requereu estudo e opção no mercado e obrigou a PT a depender de terceiros fornecedores).

Do auto de declarações da queixosa, destacam-se as seguintes afirmações:

A Maxitel era, em 1998, também prestadora de serviços de rede privativos de voz;

À data em que a Maxitel solicitou à PT que a interligação dos circuitos fosse efectuada em sinalização n.º 7 a PT não dispunha dessa sinalização em todas as suas centrais, o que implicava a disponibilização prévia de informação relativa às centrais dotadas daquele tipo de sinalização de modo a permitir à Maxitel a escolha correcta do ponto de interligação com a PT;

O tipo de sinalização referido era utilizado já na interligação entre a PT e os operadores móveis, pelo que a complexidade associada a uma interligação com um operador fixo como a Maxitel não seria diferente;

O representante da queixosa afirmou não se recordar porque razão os testes de sinalização agendados para 27 de Outubro não foram levados a cabo nessa data.

3 - Apreciação jurídico-económica

a) A alegada prática restritiva da concorrência e o seu enquadramento normativo

A actuação da PT atrás caracterizada constitui, nos termos da acusação formulada no Relatório da DGCC, um abuso de posição dominante no mercado nacional da prestação de serviços de aluguer de circuitos a operadores de telecomunicações, conduta proibida pelo artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro e cuja prática constitui contra-ordenação punível com coima de 100 000$ a 200 000 000$, nos termos prescritos pelo artigo 37.º, n.º 2, do mesmo diploma.

Cumpre agora ao Conselho da Concorrência decidir se, à luz dos elementos constantes do processo, o comportamento da arguida preenche o tipo contra-ordenacional em questão.

b) O mercado relevante

Antes de tudo, e uma vez que o que está em causa é determinar se a arguida explorou abusivamente "uma posição dominante no mercado nacional ou numa parte substancial deste, tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência" (artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro), importa circunscrever qual o mercado relevante para efeitos do presente processo. O Conselho da Concorrência subscreve a definição de mercado efectuada pela DGCC e atrás abundantemente referenciada (ver nota 9), por entender que, aplicando o critério fundamental da substituição do lado da procura (ver nota 10), o caso em análise diz respeito ao mercado nacional de aluguer de circuitos a operadores de telecomunicações.

c) Determinação da existência de uma contra-ordenação

Para se apurar da existência de um comportamento violador do prescrito pelo artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, torna-se necessário determinar i] se a empresa arguida detém no mercado em causa uma posição dominante; ii] e, em caso afirmativo, se explorou abusivamente essa posição, tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência.

19 - Existência de uma posição dominante

Segundo as informações colhidas no processo, a PT tem no mercado nacional de aluguer de circuitos uma quota próxima dos 100%.

Em 1999, a PT foi declarada pelo ICP uma entidade com poder de mercado significativo (ver nota 11), atendendo não apenas à quota de mercado detida como à capacidade da PT de influenciar as condições do mercado dos circuitos alugados, à relação de grandeza entre o seu volume de vendas e a dimensão do mercado, ao controlo dos meios de acesso aos utilizadores finais, à sua capacidade de acesso a infra-estruturas e recursos financeiros e à sua experiência em matéria de oferta de produtos e serviços no mercado.

Encontra-se, assim, preenchida a hipótese da alínea a) do n.º 3 do artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, o que nos conduz a presumir que a PT detém uma posição dominante no mercado em causa. Semelhante presunção não foi de modo algum iludida (muito pelo contrário) pela demonstração da existência de quaisquer pressões concorrenciais susceptíveis de impedir a PT de se comportar com considerável grau de independência face aos seus concorrentes, clientes e até consumidores ou de exercer uma apreciável influência sobre os preços sem perder quota de mercado.

Por tudo isto, considera o Conselho da Concorrência que a PT dispõe de uma posição dominante no mercado nacional de aluguer de circuitos, onde não sofre concorrência significativa e assume uma preponderância praticamente absoluta.

ii) Existência de um abuso de posição dominante

Estabelecido que a PT dispõe de uma posição dominante no mercado nacional de aluguer de circuitos, é preciso apurar se procedeu à sua exploração abusiva com consequências nefastas no plano da concorrência.

No presente caso, e nas concretas circunstâncias de mercado, podemos afirmar que a PT está obrigada a garantir a igualdade e a transparência no acesso e na utilização dos seus serviços por outros operadores de telecomunicações, designadamente pela Maxitel (ver nota 12).

Terá a conduta da PT desrespeitado semelhante imposição? Entende o Conselho da Concorrência que não.

Em primeiro lugar, tal foi já a opinião manifestada pela entidade reguladora sectorial, o ICP, que, confrontado ao seu tempo com a queixa da Maxitel relativa aos factos em discussão no presente processo, considerou que "não se concluiu, em termos globais, pela discriminação dos operadores, face às empresas do grupo PT" (ver nota 13). Ora estando em causa, em boa medida, questões de ordem técnica (disponibilidade de circuitos, adaptação de infraestruturas à sinalização n.º 7, operacionalidade dos equipamentos), é particularmente relevante a posição assumida pelo regulador sectorial, uma vez que é a entidade especialmente vocacionada e apetrechada para avaliar este tipo de situações.

Por outro lado, resulta do processo que os circuitos estavam prontos em Outubro de 1998 e que os testes cujo resultado iriam permitir à Maxitel cursar tráfego nos circuitos, agendados para 27 do mesmo mês, só não foram realizados por motivos de inoperacionalidade do equipamento da Maxitel.

A partir daí, portanto, deixa a demora na entrega dos circuitos de ser imputável à PT. O Conselho discorda da conclusão da entidade instrutora, para a qual "apesar dos esforços e diligências efectuadas não foi possível esclarecer definitivamente a questão que se prende com a imputação da pendência do serviço quanto à realização dos testes de operacionalidade que agendados para Outubro de 98 só foram realizados em Janeiro e Fevereiro do ano seguinte" e relembra que, interrogado o representante da Maxitel directamente sobre o motivo da não realização dos testes, a sua resposta foi que não se recordava. Ou seja, não apresentou a Maxitel, nesse momento ou em momento posterior, qualquer razão ou justificação para a não realização dos testes na data prevista, pelo que sibi imputet. Saliente-se, por último, que é já posterior a Outubro (9 de Novembro de 1998) a assinatura, pela Grundig (entidade que, posteriormente e em face dos atrasos, ameaçou cessar relações com a Maxitel e optar pela PT), de uma Proposta de Adesão aos Serviços de Voz e Fax da Maxitel.

No que respeita à justificação para o lapso de tempo que decorreu até Outubro de 1998, convém ter em conta a circunstância de estar em causa um pedido de interligação através de sinalização n.º 7. Este facto é relevante por diversas razões: 1) os prazos determinados pelo convénio para a disponibilização de circuitos (que, de facto, foram ultrapassados) referem-se, segundo afirmações da arguida não infirmadas pelos restantes dados do processo, apenas aos circuitos de transmissão e não se aplicam a um sistema de comutação como é o da sinalização n.º 7, que não tinha, à data, período de instalação definido pelo ICP; 2) no momento da ocorrência dos factos, a sinalização n.º 7 era um produto relativamente novo; mesmo sendo utilizada para a interligação com os operadores móveis, repare-se que só passado um ano sobre os acontecimentos em discussão é que foi uniformizada a nível nacional na ORI; 3) o que explica razoavelmente a necessidade de a PT dispor de algum tempo para adequar as suas infra-estruturas, - adequação que parece ter exigido a realização de obras, bem como a instalação de material que terá inclusive conduzido a PT a depender do timing de terceiros fornecedores.

Tudo visto e ponderado, entende o Conselho que o lapso de tempo decorrido entre o pedido de aluguer de circuitos feito pela Maxitel e a disponibilização dos mesmos pela PT não configura uma exploração abusiva da posição dominante que esta última detém no mercado de aluguer de circuitos.

Mas, ainda que assim não se entendesse, sempre estariam ausentes os efeitos negativos sobre a concorrência requeridos pela proibição contida no mencionado artigo 3.º

Não ficou demonstrado que a conduta da PT tenha tido por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência nem no mercado relevante nem no mercado verticalmente a jusante (aquele, recorde-se, em que o produto é a prestação de serviço de voz e dados, cuja oferta é constituída pelos diversos operadores e cuja a procura é constituída por agentes privados, empresas e entidades públicas).

Aliás, considera a própria DGCC (ver nota 14) que "o facto de terem surgido diversos operadores de serviços de telecomunicações que alugaram e alugam circuitos à PT para o desenvolvimento da sua actividade, parece indicar que esta não impediu a concorrência no mercado relevante assim como nos mercados onde este tem reflexos".

Quanto à prestação da Telepac, empresa do grupo PT que actua no mesmo mercado que a Maxitel no que respeita à prestação de serviço de dados, não foi apurado se o seu crescimento de 1,68% em Maio para 2,90% em Outubro de 1998 (ver nota 15), resultou de uma concorrência falseada pela vantagem proporcionada por estar integrada no grupo da operadora de rede básica.

Não foram igualmente apuradas as quotas de mercado das operadoras que actuavam no mercado de prestação de serviços de dados e de voz, pelo que nenhum juízo poderá ser feito quanto aos efeitos do comportamento da PT nesse mercado.

d) O artigo 41.º, n.º 2, do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro

Poder-se-ia ter suscitado, no âmbito do presente processo, a questão de saber se a Lei de Defesa da Concorrência é na verdade, aplicável.

Com efeito, dispõe o artigo 41.º, n.º 2 do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro que "no caso de serviços públicos, o presente diploma não é aplicável às empresas concessionadas pelo Estado por diploma próprio, no âmbito e na vigência do respectivo contrato de concessão".

Ora, no caso em análise, o Decreto-Lei 40/95, de 15 de Fevereiro, "aprova as bases da concessão do serviço público" de telecomunicações, de que é presentemente titular a PT. O Diploma estabelece "o quadro definidor não só das áreas de actuação exclusiva da PT, quer ao nível das infra-estruturas de telecomunicações, quer dos serviços que a mesma fica incumbida de prestar, como também da forma como tais infra-estruturas e serviços devem ser geridos e prestados". Sucede que o artigo 2.º do Decreto-Lei 40/95 inclui expressamente no objecto da concessão a "prestação do serviço de circuitos alugados".

Deste modo, parecem estar em causa questões relativas ao âmbito da concessão de serviço público: o (in)cumprimento de obrigações aliás, consagradas abertamente pelo próprio diploma, no seu artigo 8.º - relativas ao aluguer de circuitos. Se for de retirar esta conclusão, a consequência lógica será a da inaplicabilidade de Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro.

Em tal suposto, caberia à Direcção-Geral (que chegou a equacionar brevemente o problema no seu Relatório de Instrução) ter instruído e conduzido o processo com vista à potencial aplicação das normas comunitárias de defesa da concorrência, na medida em que os respectivos pressupostos se encontrassem preenchidos, uma vez que em sede de direito comunitário não vigora uma regra semelhante à do referido artigo 41.º, n.º 2".

e) Conclusões

De toda a exposição precedente, podemos retirar as seguintes conclusões:

1.ª A arguida detém uma posição dominante no mercado do aluguer de circuitos;

2.ª Não existiu, todavia, qualquer exploração abusiva dessa posição que tivesse por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência;

3.ª Como tal, independentemente da solução a dar à questão da aplicabilidade da Lei da Defesa da Concorrência, não estamos em presença de uma conduta proibida pelo artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, nem se preenche o tipo contra-ordenacional previsto pelo artigo 37.º, n.º 2, do mesmo diploma.

4 - Decisão

Tudo visto e ponderado, o Conselho da Concorrência, considerando que a conduta da arguida não cai no âmbito da proibição constante do artigo 3.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro e, por conseguinte, não preenche o tipo contra-ordenacional do artigo 37.º, n.º 2, do mesmo diploma, decide o seguinte:

1.º Ordenar o arquivamento do processo nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro;

2.º Dar conhecimento da presente decisão à arguida e à entidade queixosa.

(nota 1) Esta data corresponde, segundo a queixosa, à data em que os testes de funcionalidade ficaram concluídos.

(nota 2) Em que a PT aparece também do lado da procura, através da Telepac.

(nota 3) Telecel - Comunicações Pessoais, S. A.; Optimus - Telecomunicações, S. A.; Iridium - Communications Germany, GmbH; Ren - Rede Electrica Nacional, S. A.; Transgas - Sociedade Portuguesa de Gás Natural, S. A.; Maxitelsat - Redes e comunicações via satélite, S. A.; RDP - Rádio Portuguesa, S. A.; E3G - Telecomunicações, S. A.; Rede Ferroviária Nacional REFER, E. P.; TE.SA.M Télécommunications par Satellites Mobiles; Sonae - Redes de Dados, S. A..

(nota 4) Presume-se que dispõem de poder de mercado significativo os operadores que detenham uma quota igual ou superior a 25% do mercado relevante de aluguer de circuitos. Por outro lado, podem ser declaradas com poder de mercado significativo duas ou mais empresas que actuem concertadamente num mercado de telecomunicações ou um conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, mantêm entre si laços de interdependência ou subordinação.

(nota 5) Também referida como C7 ou SS#7.

(nota 6) Documento de fl. 410 e segs.

(nota 7) Operadores de redes públicas de telecomunicações ou prestadores de serviço telefónico fixo ou móvel.

(nota 8) Ver supra, ponto 0.

(nota 9) Cf. supra, ponto 0.

(nota 10) "Comunicação da Comissão relativa à definição de mercado relevante para efeitos do direito comunitário da concorrência (97/C 372/03)", JOCE, 09.12.97, C 372/5, ponto 13.

(nota 11) Esta declaração é precedida de parecer prévio da Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, sendo competência do ICP determinar, declarar e publicar, anualmente, a lista dos operadores que dispõem de poder de mercado significativo, incluindo no mercado de circuitos alugados.

(nota 12) Repare-se que a violação deste dever implicaria não só um ilícito jusconcorrencial como a violação das obrigações impostas pelo Decreto-Lei 40/95, de 15 de Fevereiro (cf. supra, ponto 0.

(nota 13) O Conselho julga que teria sido útil à DGCC ouvir directamente o ICP no âmbito do presente processo, sobretudo para estabelecer com objectividade o bem fundado das justificações técnicas (também) apresentadas pela PT. Todavia, entende o Conselho que é razoável considerar que tais justificações já foram, a seu tempo, apresentadas pela PT ao ICP e foi com base na sua avaliação que o regulador emitiu a supracitada opinião.

(nota 14) P. 30 do Relatório, fl. 624 do processo.

(nota 15) Segundo informação da arguida, prestada no documento de fl. 591.

Lisboa, 18 de Outubro de 2001. - Carolina de Castro Nunes Vicente e Cunha (relatora) - José Álvaro Ubach Chaves Rosa - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva - José Anselmo Dias Rodrigues (presidente).

ANEXO C5

Processo 3/2001 - Práticas anticoncorrenciais no mercado dos produtos de perfumaria, cosmética e higiene corporal.

O conselho da concorrência no uso da competência que lhe é atribuída pelo artigo 13.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro;

Visto o processo de contra-ordenação registado sob o n.º 3/2001, autuado em 23 de Março de 2000 e o respectivo relatório, remetidos pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência com entrada no Conselho, em 1 de Agosto de 2001, em que é arguida a Sociedade Luso-Helvética, Lda., com sede na Rua do Alecrim, 38, 2.º, em Lisboa, tem a ponderar os seguintes elementos de facto e de direito:

I - Origem do processo actual - Antecedentes de intervenção do Conselho

1 - Por carta dirigida à Inspecção-Geral das Actividades Económicas, em 15 de Setembro de 1998, apresentou a firma Simões, Pais & Matos, Lda., uma queixa contra a Sociedade Luso-Helvética, Lda., acusando-a de práticas individuais restritivas da concorrência.

Alega, em síntese, a queixosa ter celebrado no início da sua actividade em 1974, um contrato verbal de fornecimento com a arguida tendo-se constituído desde então, revendedor autorizado de artigos de diversas marcas comercializadas pela arguida, nomeadamente Pierre Balmain, Nino Cerruti, K. Lagerfeld, Molyneux e Laura Ashley, no sector da perfumaria e Isadora e Mavala, no sector de cosmética e tratamento.

2 - Tal contrato incluiria a assistência pós-venda, regular, por parte do fornecedor, situação que alegadamente teria sido descurada pelo fornecedor, que também teria deixado de fornecer tabelas de preços e os testers solicitados pelo distribuidor, acabando mesmo por deixar de fornecer alguns produtos, sob pretexto do baixo volume de vendas realizado pela queixosa.

3 - O relacionamento entre queixosa e arguida era feito através de um contrato de distribuição selectiva, tendo a instrução do processo sido efectuada pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, não como se de prática individual se tratasse - ao abrigo do Decreto-Lei 370/93 - mas, não à regionalização!, correctamente, ao abrigo do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, uma vez que as práticas anti-concorrenciais atribuídas à arguida se inseriam num contrato de distribuição selectiva.

4 - No processo em que é arguida a Sociedade Luso-Helvética, Lda., o representante legal da arguida, ouvido em auto de interrogatório de arguido, declara a fl. 73 dos autos, "relativamente às perturbações comerciais que têm ocorrido com a queixosa", que "elas se prendem com as condições comerciais quantitativas, que a queixosa se recusa a aceitar, quanto à introdução de marcas no mercado. A arguida, relativamente à matéria da distribuição selectiva e da existência de contratos, disse que as condições gerais que vinculam as partes e, que relativamente a essas condições, designadamente a imagem do estabelecimento comercial, formação do pessoal e as quantidades transaccionadas, são objectivas e aplicáveis a todos os clientes da rede de distribuição".

5 - Verifica-se, desta forma, que as relações comerciais entre a queixosa e arguida assentam em acordo meramente verbal, não existindo nessas condições um contrato escrito de fornecimento através do qual se estabeleçam regras perfeitamente definidas que permitam ao Conselho da Concorrência avaliar a coerência do sistema de distribuição selectiva. Assim não é fácil definir os critérios objectivos de ordem quantitativa e qualitativa, cujo cumprimento ou incumprimento se possa dar por verificado.

6 - Aliás, é oportuno referir, na presente decisão, que, já em 1994, o Conselho tivera de intervir na apreciação de alguns processos de contra-ordenação relativos à rede de distribuição de produtos de beleza de diversas marcas que os fornecedores estrangeiros vinham querendo organizar em Portugal na linha, aliás, das tendências que se vinham afirmando na Comunidade Europeia no sentido de institucionalização dos regimes de distribuição selectiva, designadamente através dos "regulamentos de isenção por categorias".

Ora, um desses processos refere-se precisamente à mesma arguida do presente processo (embora com outro queixoso) ou seja à Sociedade Luso-Helvética, Lda. (processo 10/92). E o diferendo no processo 10/92, que o Conselho foi chamado a julgar, é substancialmente o mesmo do presente processo: na opinião da arguida não estariam a ser atingidos objectivos de venda; na opinião da queixosa os objectivos não seriam atingidos por falta de assistência técnica e outros aspectos equiparáveis.

Na decisão do Processo 10/92, o conselho fez à arguida diversas injunções, em particular: de elaborar um contrato escrito para a distribuição selectiva, na sua rede de distribuição, da marca estrangeira em causa, considerando que em tais redes obrigações restritivas da Concorrência "poderiam ser justificadas, se reduzidas a escrito e desde que os critérios de selecção dos revendedores fossem objectivos e transparentes" e, entre outros aspectos, decidiu anular a exigência de estoques mínimos de aprovisionamento.

O Conselho, após apreciação do modelo de contrato de distribuição e das condições gerais de venda (a que aderiram os distribuidores constantes da lista fornecida), considerou que estavam satisfeitas as condições de isenção e ordenou o arquivamento do processo.

Não pode deixar de se estranhar que, tanto tempo passado, e ao que se julgava, com acatamento do regime estabelecido para a marca então em causa, a Sociedade Luso-Helvética, Lda. não tenha celebrado contratos coerentes para os outros produtos da cosmética de que é fornecedora em Portugal, voltando agora a discutir-se exactamente as mesmas questões.

7 - Concluída a instrução do processo, foi o mesmo, acompanhado do respectivo relatório, e nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 26.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, remetido ao Conselho da Concorrência, para decisão, em 1 de Agosto de 2001.

II - Identificação das partes

A) A queixosa

8 - A firma Simões, Pais & Matos é uma sociedade comercial por quotas, com sede na Rua de Rodrigo da Fonseca, 81-C, 1200 Lisboa, que desenvolve a sua actividade comercial no sector da venda a retalho de artigos de perfumaria, cosmética e higiene corporal.

9 - Tem por actividade o comércio de produtos de diversas marcas, algumas respeitantes a produtos de alta gama, salientando-se, a título de exemplo, Nino Cerruti, Pierre Balmain, S. T. Dupont e K. Lagerfeld.

10 - Desenvolve a sua actividade há 26 anos, mantendo relações comerciais, há largos anos, com a firma Luso-Helvética, que lhe fornece, no sector da perfumaria, entre outros, produtos das marcas Cerruti, e, no sector da cosmética e tratamento, os produtos das marcas Isadora e Mavala.

B) A arguida

11 - A firma Luso-Helvética é uma sociedade comercial por quotas, com sede na Rua do Alecrim, n.º 38, 2.º, 1249-046 Lisboa, que se dedica à comercialização de produtos perfumantes, cosméticos e de higiene corporal, tendo atingido em 1998, um volume de vendas, aproximadamente, de 1749 mil contos e, em 1999, um volume de vendas de 1947 mil contos.

12 - A firma Luso-Helvética desenvolve a sua actividade no sector de perfumaria e cosmética, o qual abrange segmentos de mercado distintos constituídos por gamas específicas designadas por gama baixa, média e alta ou de luxo, através das quais visa satisfazer as preferências dos consumidores.

13 - Entre outras, são representadas e comercializadas por esta empresa as seguintes marcas: Boucheron, Burberry", Cerruti, Dupont, Isadora, Karl Lagerfeld, Mavala e Valentino, algumas das quais pelas suas características pertencem à apelidada gama alta ou de luxo, como é o caso da Burberrys, Cerruti e Dupont.

14 - É relativamente a estas marcas que a empresa coloca maior rigor na sua distribuição, o que implica formação adequada do pessoal para competente atendimento do público e instalações condignas, exigências estas que, entre outras, caracterizam os regimes de distribuição selectiva.

III - O mercado

A) O mercado do produto

15 - O mercado relevante para efeitos do presente processo envolve produtos perfumantes, cosméticos e de higiene corporal, fundamentalmente, da gama alta ou de luxo - normalmente associados a marcas de prestígio, que envolvem o recurso a matérias-primas de qualidade superior, aperfeiçoamento técnico, e um maior grau de exigência na sua comercialização.

É relativamente a estas marcas que as empresas colocam maior rigor na sua distribuição, o que implica formação adequada do pessoal para um competente atendimento do público e instalações condignas.

Tem assim cabimento o estabelecimento no sector de um sistema de distribuição selectiva.

16 - Os sistemas de distribuição selectiva caracterizam-se, ainda, por exigir do fabricante ou do seu distribuidor a prévia definição dos critérios de selecção dos retalhistas, a implementação de um processo de selecção com base nesses critérios, o estabelecimento de normas de comercialização que devem pelos mesmos ser permanentemente observadas, e a adopção e execução de processos de fiscalização destinados a verificar o respeito pelos ditos critérios e normas.

17 - No mercado dos produtos perfumantes, cosméticos e de higiene corporal é possível distinguir três categorias: gama baixa, média e alta ou de luxo, dirigidas a públicos diferentes cujas opções se cir cunscrevem à procura desses produtos, não tanto por fidelidade a determinada marca, mas antes pela procura dentro da mesma gama à qual atribuem "dignidade" autêntica.

18 - A gama alta ou de luxo, quase sempre associada a alguma marca ou nome de prestígio no mundo da moda ou da arte - na defesa do qual a empresa produtora investe em pesquisas, aperfeiçoamento técnico, originalidade do produto implicando o recurso a matérias de nível superior, em termos de qualidade, e, por outro lado, resultando de profundas pesquisas quer no que respeita à originalidade na criação, quer na utilização de materiais de nível elevado -, demarca-se das restantes não só pelo preço a que é colocada no mercado como pela própria imagem.

19 - A designada gama de luxo respeita a determinados produtos cujo prestígio e imagem de marca se pretende ver preservada tendo em conta o binómio imagem/qualidade, para o que o produtor organiza uma rede de distribuição que exige não só uma escolha dos revendedores (perfumarias) como também a imposição de algumas obrigações na sua comercialização, assim evitando uma distribuição generalizada e incontrolada.

20 - Esta selecção de revendedores, com todas as condições que são impostas na comercialização do produto, constitui um sistema de distribuição selectiva que comporta critérios qualificativos com vista à entrada, ou manutenção, na rede de distribuição.

O sistema de distribuição selectiva apoia-se em geral em contratos pré-redigidos, em que as cláusulas essenciais respeitam, por um lado, a critérios de selecção relativos aos distribuidores e, por outro, a regras relativas às relações entre o fornecedor e os seus distribuidores.

Neste sistema são importantes as condições oferecidas pelo local onde os produtos irão ser comercializados - perfumarias - pelo que, através da sua visualização (localização do estabelecimento, tipo de negócio envolvente, condições internas do estabelecimento, pessoal de que dispõe) se conclui da possibilidade de entrada imediata na rede de distribuidores ou da necessidade de correcção de factores negativos, para a qual é dado determinado prazo de adequação.

21 - Acresce, ainda, a exigência da assunção de obrigações de carácter quantitativo no que respeita à introdução da marca - todas as referências e determinado número de unidades por referência - rotação do estoque e volume anual mínimo de compras.

22 - Nos últimos anos tem-se verificado, em Portugal, uma expansão do mercado selectivo, ligada a um grande aumento do interesse na comercialização de produtos de gama alta ou de luxo.

Este crescimento encontra-se correlacionado com as solicitações dos próprios consumidores, que manifestam uma nova necessidade, ligada ao prestígio dos produtos que pretendem adquirir, motivada por razões de generalizado desenvolvimento económico e de subida do nível de vida, aliadas a hábitos de consumo cada vez mais exigentes.

23 - Tendo como base os elementos disponibilizados à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência pela Associação dos Industriais de Cosmética, Perfumaria e Higiene Corporal - e que constam do relatório de instrução do processo - pode afirmar-se que, actualmente, no mercado português, existem mais de 20 empresas cuja actividade se traduz na distribuição de produtos de perfumaria de qualidade, as quais, no seu conjunto, operam uma centena de produtos considerados de luxo.

Pode resumir-se da seguinte forma a situação no mercado português dos produtos de perfumaria de qualidade:

a) As quotas de mercado dessas 20 empresas situam-se (valores de 1999, para vendas em escudos) escalonadamente, sem posições dominantes ou relevantes; as quatro primeiras da lista detêm 57% do mercado (as três maiores quotas são respectivamente de cerca de 25%, 15% e 9%, sendo a quarta quota justamente a da Sociedade Luso Helvética no valor de 8,9%);

b) Apesar das exigências inerentes à distribuição selectiva, o número de postos de venda tem vindo a aumentar em correspondência ao aumento global de consumo pela modernização geral do estilo da vida do País;

c) Como conclusão geral, está assegurado um mercado concorrencial para produtos de valia equivalente.

B) O mercado geográfico

24 - A arguida opera em todo o território nacional, tendo, como clientes, empresas dispersas por todo o País.

Geograficamente, considera-se, assim, que o mercado relevante em causa se circunscreve ao território nacional.

IV - Os factos

25 - A firma Simões, Pais & Matos, Lda., apresentou à Inspecção-Geral das Actividades Económicas uma queixa (fls. 5 e 6), datada de 15 de Setembro de 1998, posteriormente remetida à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência.

26 - Nos termos da queixa apresentada, a empresa queixosa alega os seguintes factos:

Por ocasião do início da actividade comercial da firma Simões, Pais & Matos, Lda., esta sociedade celebrou, verbalmente, contrato comercial de fornecimento com a firma Luso-Helvética, Lda., constituindo-se, desde então, revendedora autorizada de artigos de diversas marcas distribuídas por aquela empresa, designadamente Pierre Balmain, Nino Cerruti, K. Lagerfeld, Molyneux, Laura Ashley, no sector da perfumaria e Isadora e Mavala no sector de cosmética e tratamento.

O contrato de fornecimento verbalmente celebrado incluía, nomeadamente, a assistência pós-venda, regular, por parte do fornecedor, com deslocações ao ponto de venda uma a duas vezes por mês.

A partir de 1996, a firma Luso-Helvética começou a descurar a assistência técnica até então garantida.

Em Janeiro de 1998, a firma Luso-Helvética endereçou carta à queixosa (fls. 7) comunicando a decisão, unilateral, de cessar o fornecimento da marca Mavala, alegando o facto de o volume de vendas da firma Simões, Pais & Matos, não justificar a continuidade do ponto de venda como depositário da referida marca.

Em resposta (fls. 8 a 10), a queixosa justificou o escasso volume de vendas dos produtos da marca Mavala com a insuficiente assistência prestada pela Luso-Helvética e, nomeadamente, com o facto de, desde finais do ano de 1997, a qualquer pedido formulado pela queixosa, a resposta ser no sentido de a mercadoria solicitada estar esgotada.

A firma Simões, Pais & Matos refere, ainda, diversas deficiências de assistência por parte da firma Luso-Helvética relativamente aos produtos das marcas Isadora, Chloe, Chloe Narcisse, Photo, P. Balmain e Nino Cerruti. No que respeita a esta última marca, a queixosa sublinha as parcas visitas efectuadas pelo vendedor daquela empresa ao estabelecimento da queixosa. Segundo esta, os vendedores teriam afirmado terem recebido instruções para não darem continuidade à assistência prestada à queixosa.

Segundo a queixosa, a recusa de fornecimento da marca Mavala, bem como as deficiências de fornecimento e assistência relativamente aos produtos das marcas supra referidas mantinham-se até á data da queixa apresentada.

27 - Em Dezembro de 1998, a Inspecção-Geral das Actividades Económicas remeteu à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência elementos complementares, enviados pela queixosa, relativamente ao comportamento adoptado pela Luso-Helvética no que respeita aos fornecimentos das marcas anteriormente referidas.

28 - Efectivamente, foi apresentada correspondência trocada entre a queixosa, Simões, Pais & Matos e a arguida, Luso-Helvética (fls. 15 a 23), constatando-se o seguinte:

A firma Luso-Helvética comprometeu-se perante a queixosa a prestar uma assistência regular às marcas representadas por esta, através dos seus vendedores. Todavia, segundo a queixosa, tal assistência não se verificou, pelo menos até à data de 26 de Novembro de 1998.

A firma Luso-Helvética sublinhou o facto de se ter disponibilizado para receber propostas da empresa queixosa no sentido da dinamização da marca Mavala.

No entendimento da firma Luso-Helvética, e no que respeita, em concreto, à marca Mavala, num leque de 33 produtos de tratamento e 50 vernizes, a empresa queixosa deveria comercializar mais do que quatro produtos, número correspondente ao que havia solicitado à empresa fornecedora.

Relativamente aos produtos das marcas Nino Cerruti e Karl Lagerfeld, as encomendas feitas pela firma Simões, Pais & Matos foram satisfeitas.

No que respeita à marca Burberrys, a Luso-Helvética afirma não ser possível a satisfação de encomendas, dado o estabelecimento da firma Simões, Pais & Matos não ser depositário oficial da marca. Todavia, não colocou obstáculos a que acedesse à rede de distribuição daquela marca, desde que estivesse interessada em adquirir as quatro linhas da mesma.

Por seu lado, a empresa queixosa, afirma ter requisitado a presença dos vendedores da firma Luso-Helvética com o objectivo de encomendar produtos daquela marca, tendo a firma Luso-Helvética informado a firma Simões, Pais & Matos da sua não intenção em abrir novos pontos de venda.

Sublinha, ainda, a queixosa, ter tido conhecimento do lançamento de novas colecções da marca em questão, tendo-lhe sido sempre vedada, pela empresa fornecedora, a possibilidade de acesso à venda das mesmas.

Relativamente às quantidades mínimas exigidas pela firma Luso-Helvética, a queixosa entende esta exigência como uma recusa de venda, já que, afirma, são superiores aos mínimos exigidos pela firma Luso-Helvética em termos de facturação dos respectivos produtos.

A firma Simões, Pais & Matos afirma, peremptoriamente, não aceitar quantidades mínimas de aquisição unilateralmente impostas pela firma Luso-Helvética como condição sine qua non de fornecimento.

29 - Em Abril de 2000, a firma Simões, Pais & Matos remeteu à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, elementos com plementares da queixa apresentada, traduzindo-se em correspondência trocada com a arguida, junta a fls. 58 a 67.

30 - Dos elementos apresentados, salientam-se os seguintes factos:

Perante uma encomenda efectuada pela firma Simões, Pais & Matos, relativa a produtos da marca S. T. Dupont, a firma Luso-Helvética confirmou ser representante da mesma e informou a queixosa do facto de a introdução de uma marca pertencente ao mercado da perfumaria selectiva obedecer a quantidades determinadas e valores de introdução.

A firma Luso-Helvética apresentou uma factura-tipo do plano de introdução correspondente à marca S. T.Dupont, declarando a queixosa considerar inaceitável a imposição unilateral de quantidades e qualidades de produtos da marca em questão, por parte da empresa fornecedora.

A firma Luso-Helvética confirmou que, em virtude da falta de potencialidade do ponto de venda da firma Simões, Pais & Matos, esta empresa não representaria uma prioridade em termos de lançamento de uma marca; do mesmo modo, afirmou não considerar preenchidos, pela queixosa, os requisitos mínimos de fornecimento, correspondentes a critérios qualitativos e quantitativos.

Em Dezembro de 1999, a queixosa, em carta dirigida à firma Luso-Helvética, sublinhou o facto de a assistência pós-venda não ter sido, ainda, regularizada.

Por outro lado, acusa a arguida do facto de impor condições mínimas para o fornecimento, sem que, previamente, fossem ponderadas as especificidades do ponto de venda em causa, nomeadamente a respectiva área, localização, e qualidade da clientela.

No entender da queixosa, a imposição de quantidades mínimas representaria uma restrição da liberdade de aprovisionamento junto de outros fornecedores e de escoamento dos produtos destes.

31 - É pois, inconformada com esta situação que, a firma Simões, Pais & Matos, Lda. apresenta queixa, alegando recusa de venda por parte da firma Luso-Helvética.

V - O relatório da instrução do processo

32 - Na sequência de diligências efectuadas pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, a firma Simões, Pais & Matos forneceu àquela Direcção-Geral as informações adicionais (fls. 24 e 25) das quais se destacam as referidas a seguir.

A empresa queixosa e a Sociedade Luso-Helvética, Lda., celebraram contrato de fornecimento verbal, o qual esteve na base do início do fornecimento, pela firma Luso-Helvética, em 1988, dos produtos da marca Mavala.

Não foram convencionadas entre as partes quaisquer condições de venda particulares, para além da obrigação genérica de assistência pós-venda que impende sobre o fornecedor.

A firma Luso-Helvética é representante exclusiva da marca Mavala em Portugal.

33 - Em Maio de 1999, a firma Luso-Helvética forneceu também a solicitação da Direcção-Geral do Concelho da Concorrência, novos elementos, juntos a fls. 26 a 40, dos quais se salientam os a seguir referidos:

A firma Luso-Helvética é representante exclusiva para Portugal e Regiões Autónomas das marcas Mavala e Burberrys; estas marcas inserem-se num sistema de distribuição selectiva, sendo vendidas em estabelecimentos especializados na venda de perfumaria e cosméticos e acessórios de moda.

Não existem contratos-tipo de distribuição escritos relativamente a estas duas marcas.

Ainda no que se refere às marcas Mavala e Burberrys, a política comercial no âmbito dos preços e de marketing é definida conjuntamente com as representadas.

A prática de comercialização, distribuição, formação do pessoal, condições e objectivos dos pontos de venda para distribuírem a marca mantêm-se anualmente.

Relativamente aos critérios subjacentes à escolha dos depositários, salientou a arguida os seguintes:

Abertura do ponto de venda - está sujeita a uma compra mínima, igual para todos os depositários, que corresponde a um estoque-instrumento, permitindo ao depositário dispor de um número mínimo em cada um das referências do catálogo da marca;

Ambiente geográfico - o ponto de venda deverá ser adaptado ao comércio de perfumaria de luxo, situado em local que permita respeitar o equilíbrio económico da distribuição da marca na zona geográfica considerada, e com acesso directo sobre uma via aberta ao público;

Qualidade das instalações - apresentação dos produtos de forma homogénea, exigindo-se qualidade e boa apresentação dos móveis, iluminação, tectos, paredes e chão dos estabelecimentos;

Enquadramento com outros produtos - tratando-se de uma loja destinada a vários comércios, estes devem apresentar igualmente uma imagem de luxo ou de gama semelhante, devendo ser excluídos aqueles cuja imagem não seja compatível com o prestígio das marcas de luxo. Neste caso, a zona de perfumaria deve estar delimitada, sendo destinada apenas a este tipo de comércio;

Qualificação do pessoal - a direcção técnica da loja deve ser assegurada por um técnico com qualificação profissional em perfumaria, e dispor de pessoal competente e em número suficiente, de forma a assegurar à clientela o aconselhamento e demonstração necessários;

Aptidão comercial - avaliada pelo movimento efectuado no ano anterior em outras marcas concorrentes, solvabilidade e antecedentes financeiros.

34 - Em 19 de Abril de 2000, prestaram declarações (fls. 49 a 56 v.º) na Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência os representantes de diversas empresas clientes da arguida, Luso-Helvética, Lda.

Das declarações prestadas, pelas empresas clientes da arguida, em Auto de Declarações, salientam-se os seguintes aspectos:

Foi confirmada a existência de uma imposição, por parte da firma Luso-Helvética, relativamente a quantidades mínimas a adquirir das marcas Mavala e Burberrys;

No que respeita, ainda, às marcas Mavala e Burberrys e relativamente à assistência técnica prestada pela arguida aos seus pontos de venda, foi referido o facto de ser, a mesma, realizada diversas vezes por ano;

Foi confirmada a não existência de qualquer contrato escrito com a firma Luso-Helvética, relativamente à comercialização das marcas Mavala e Burberrys;

No que respeita a imposições na introdução das referidas marcas, referiu-se a exigência da aquisição completa das respectivas linhas.

35 - Em Maio de 2000, prestou declarações na Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, o gestor da firma Luso-Helvética, Lda., em auto de interrogatório de arguido (fls. 72 a 73 v.º), declarações das quais se destacam os seguintes pontos:

Não existirem contratos escritos que especifiquem as condições de comercialização relativamente às marcas Isadora, Cerruti, Burberrys e Dupont;

Afirmou, ainda, que a queixosa é depositária das marcas Isadora, Mavala e Cerruti, não sendo depositária das marcas Burberrys e Dupont;

O representante da arguida confirmou que a introdução das marcas obedece a requisitos mínimos que estabelecem condições qualitativas e quantitativas, critérios esses que são menos exigentes quanto às marcas Mavala e Isadora, pelo facto de estas não terem a notoriedade internacional das marcas Dupont, Burberrys e Cerruti;

Relativamente às perturbações comerciais ocorridas com a queixosa, o representante da arguida declarou que se prendem com o facto de a firma Simões, Pais & Matos não aceitar as condições comerciais quantitativas exigidas na introdução das marcas;

No que respeita às condições exigidas pela firma Luso-Helvética para a comercialização das marcas que representa, confirmou o representante da empresa a existência de condições gerais que vinculam as partes, designadamente quanto à imagem do estabelecimento comercial, formação do pessoal e condições relativas às quantidades transaccionadas, sendo objectivas e aplicáveis a todos os clientes da rede de distribuição.

VI - O direito aplicável

36 - Da análise dos factos descritos considera-se que a actuação da empresa Luso-Helvética deve ser apreciada no quadro do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, nos termos do qual "são proibidos os acordos e práticas concertadas entre empresas e as decisões de associação de empresas, qualquer que seja a forma que revistam, que tenham por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência no todo ou em parte do mercado nacional...".

Conforme se descreveu, a arguida, detentora da comercialização de produtos da gama selectiva ou de luxo, (entre os quais citamos, pelo interesse que assumem no presente processo, as marcas Burberry, Dupont, Isadora e Mavala), tem vindo a implementar uma forma de distribuição selectiva firmada em contratos verbais com os respectivos pontos de venda.

37 - Ora, desde logo, como é óbvio, qualquer sistema de distribuição selectiva tende a restringir a livre concorrência por tender a limitar o número de distribuidores, uma vez que subordina, quer o acesso à rede, quer a manutenção na mesma, a determinadas condições e limitando, por um lado, a liberdade de acção do distribuidor e, por outro, entravando o acesso a terceiros.

Mas, desde há muito, tais regimes de distribuição têm sido considerados aceitáveis no âmbito da Comunidade Económica Europeia desde que se trate de produtos de natureza especial que os justifiquem e desde que as regras de selecção dos distribuidores e as regras de funcionamento do sistema sejem pré-definidas de forma transparente e coerente e sem abusos por parte do detentor ou representante da marca.

Fizeram escola os "regulamentos de isenção por categorias", da CEE dos anos 80 dos quais se destacaram justamente os produtos de perfumaria de que nos ocupamos na presente decisão estabelecidos ao que se julga, por influência das grandes marcas francesas da especialidade.

Tal regulamentação da CEE, nos termos em que vigorou até 1999 (Regulamento CE n.º 2790/1999, de 22 de Dezembro, que veio a alterar sensivelmente o enquadramento dos sistemas selectivos), a admissibilidade do sistema estava dependente, tão só, da obediência a determinados princípios, entre os quais os critérios de selecção objectiva deverem ser qualitativos e não apenas quantitativos, a par de uma uniformidade na sua aplicação. Por outro lado, admitia-se, do mesmo modo, um sistema selectivo, desde que as características do produto o justificassem, no intuito de serem preservadas as suas qualidades e melhorada a eficácia do seu uso; assim sendo, admitir-se-ia o sistema para bens de consumo não duradoiro, como é o caso dos produtos perfumantes, cosméticos e de higiene corporal os quais, como se disse, assumiram relevo nessa regulamentação dos sistemas selectivos.

38 - Acontece que - como decorre do que já se referiu sobre o Regulamento CE n.º 2790/1999, de 22 de Dezembro - houve uma evolução no âmbito da Comissão Europeia no sentido de uma maior flexibilização dos regimes de distribuição selectiva.

Assim, nos termos do antes citado Regulamento de Isenção por Categoria (Regulamento CE n.º 2790/1999), a distribuição selectiva, qualitativa e quantitativa é isenta até uma quota de 30% do mercado relevante, independentemente da natureza do produto em causa, desde que as vendas activas por parte dos distribuidores autorizados entre si e a utilizadores finais não seja restringida.

De facto, cria-se uma presunção de legalidade relativamente aos acordos verticais, presumindo-se que - quando a quota do mercado relevante representada pelo fornecedor (no caso, a arguida) não ultrapassa 30% - que os acordos verticais conduzem, geralmente, a uma melhoria da distribuição e permitem aos consumidores uma parte equitativa dos benefícios daí resultantes. Já acima dos limiares de quota de mercado de 30% não se presume que os acordos verticais que sejam abrangidos pelo âmbito de aplicação do n.º do artigo 81.º, CE, dêem, normalmente, origem a benefícios objectivos dessa natureza e dimensão, de forma a compensar as desvantagens causadas à concorrência.

39 - É de salientar, todavia, que, sem prejuízo da aplicação imediata, na ordem interna, do Regulamento 2790/1999, de 22 de Dezembro, o seu âmbito de aplicação não se estende ao caso ora em apreço, já que é relativo às práticas restritivas susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-Membros.

Assim sendo, no caso presente, aplicar-se-á somente a legislação nacional, mormente o Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, não deixando de se considerar os princípios que caracterizaram as decisões proferidas pela Comissão e pelo Tribunal de Justiça das Comunidades.

40 - Como lhe compete, o Conselho da Concorrência tem acompanhado esta situação de avaliação feita no âmbito da Comissão Europeia.

Conforme já referido nesta decisão, em 1994, ao apreciar o processo de contra-ordenação n.º 10/92 da mesma arguida - e outros processos na mesma época - o Conselho procurou fomentar a criação dum regime de distribuição selectiva transparente e coerente, exigindo a apresentação de contactos escritos, o que a mesma arguida então aceitou para a marca em causa mas agora se conclui nunca ter aplicado às outras marcas suas representadas.

Nos anos entretanto decorridos, tem-se registado, como referido, alguma flexibilização, no âmbito da Comissão Europeia, da definição dos requisitos mínimos a garantir nos regimes de distribuição selectiva, quer quanto ao alargamento da natureza dos sectores elegíveis para o efeito, quer quanto à influência da posição do agente no mercado relevante, naturalmente sem prejuízo da transparência e coerência, das regras e dos funcionamento dos referidos sistemas de distribuição selectiva.

Assim o Conselho - no acompanhamento dessa evolução e no julgamento de outros processos de contra-ordenação n.os 1/95 e 2/95 - tem deliberado também com um critério de maior liberalização comparativamente à jurisprudência anterior a 1999. Por uma questão de coerência, não se retomará, no presente processo, a referida exigência de 1994 de contratos escritos para os sistemas selectivos de distribuição, naturalmente procurando-se evitar que contratos não escritos venham a ser, na prática, meras imposições dos fornecedores da marca, o que faria perder o carácter selectivo dos sistemas de distribuição que se vem procurando incentivar na Europa com a nova orientação dos Regulamentos da Comissão Europeia sobre o assunto.

41 - Entrando agora mais directamente no julgamento dos factos apurados e demais diligências constantes do relatório de instrução apresentado pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência - de que decorrerá a decisão final deste processo - o Conselho considera que os aspectos mais relevantes para a decisão final são os seguintes:

a) O relatório de instrução é desenvolvido e preenche os requisitos formais de audição do arguido e de testemunhas;

b) O relatório não consegue pôr a queixosa e a arguida a falar exactamente a mesma linguagem, considerando-se no entanto, provado que:

O diferendo reside essencialmente na imposição pelo representante da marca de quantitativos mínimos de venda, em vez de adaptação, por acordo, dos valores do contrato inicial (contrato verbal, e não escrito; e aqui reside a dificuldade, que o Conselho da Concorrência tentou em 1994 eliminar, exigindo contratos escritos, o que, para outra marca, a mesma arguida então aceitou, como antes referido);

Terá havido pela arguida desinteresse na assistência técnica, com aparência de retaliação, e criação de outras dificuldades;

c) São importantes as declarações prestadas, na Direcção-Geral do Concelho da Concorrência, por diversas empresas clientes da arguida relativamente à não existência de qualquer contrato escrito para as demais marcas mais em causa e à imposição de quantidades mínimas de venda e aquisição completa das respectivas linhas, sendo também referida como normal a periodicidade da assistência técnica.

42 - À luz dos preceitos do presente capítulo, foram elaboradas Conclusões da Decisão a seguir apresentadas.

VII - Conclusões

43 - Conforme exposto desenvolvidamente nos capítulos anteriores, a distribuição selectiva implica uma escolha dos retalhistas com os quais se estabelecem relações comerciais. Todavia, quando essas relações são estabelecidas com o objectivo da instituição de uma rede fechada de venda ao público, dependem de acordos, e torna-se necessário avaliar globalmente a coerência do sistema. Como condições de justificação de um sistema de distribuição selectiva, e da inerente escolha dos parceiros comerciais, essencialmente estão em causa critérios de selecção objectivos e transparentes, de natureza qualitativa, isto é, relacionados com as características dos produtos e com a adequação dos retalhistas. É reconhecido, também, que não podem ignorar-se os objectivos a fixar para as vendas por cada retalhista, isto é os aspectos de natureza quantitativa (que não se podem negar, também, como indispensáveis num regime selectivo). Mas uns e outros aspectos têm de ser fixados de forma coerente e transparente, através de acordos concretos, quer sejam escritos, quer verbais.

Como já foi dito anteriormente, os contratos escritos - sobretudo a existência de um contrato-tipo com as regras determinantes - são preferíveis para a coerência e transparência do sistema; e foi essa a posição do Conselho em 1994 em relação à mesma arguida a propósito doutra marca. Também o contrato-tipo é preferível para a apreciação de diferendos, dificultando a sua ausência, desde logo, a clareza das conclusões dos relatórios de instrução e dos próprios processos como o presente.

44 - Nestes termos, a partir do relatório de instrução, e em síntese, considera-se que ficou provada uma recusa de venda (aliás, por carta da arguida, a denunciar o "contrato"), por não aceitação pela queixosa de quantitativos mínimos (que são defensáveis, como regra de comercialização, na distribuição selectiva, mas não é curial impor em contrato tão antigo, ainda que verbal, e ao que se crê, com medidas paralelas de redução de assistência técnica que se configuram como de retaliação).

Em complemento, anota-se - a partir dos testemunhos dos outros clientes da rede - que não existirá uma discriminação nas regras (portanto, discriminação entre clientes), desde que sejam aceites os valores mínimos de venda impostos pela arguida.

45 - Antes de concluir, acresce ainda:

a) Das reuniões realizadas com os outros clientes da arguida, não transparece qualquer diferenciação na aplicação das regras internas do sistema de distribuição nos aspectos qualitativos e quantitativos;

b) No caso em apreciação, tendo em conta os elementos disponibilizados ao Conselho, não se afigura estar-se perante uma prática que tenha por objecto ou com efeito "impedir, falsear ou restringir concorrência" nos termos do artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93.

De resto cumpre não deixar de referir que, tendo em conta a data das ocorrências em apreciação, o processo já prescrevera antes do seu envio ao Conselho.

Tudo visto e ponderado, o Conselho da Concorrência decide:

1.º Ordenar o arquivamento do processo;

2.º É destinatária da presente decisão a Sociedade Luso-Helvética, Lda., com sede na Rua do Alecrim, 38, 2.º, em Lisboa;

3.º Dê-se conhecimento à queixosa Santos, Paes & Matos, Lda., com sede na Rua de Rodrigues da Fonseca, 81-C, em Lisboa.

Lisboa, 6 de Dezembro de 2001. - Fernando Ivo Gonçalves (relator) - José Álvaro Ubach Chaves Rosa - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva - José Anselmo Dias Rodrigues (presidente).

ANEXO D

Quadro sinóptico dos pareceres proferidos pelo Conselho em processos de apreciação prévia em 2000

Decisões proferidas pelo conselho em processos de apreciação prévia

Em 2000

(ver documento original)

Em 2000

(ver documento original)

ANEXO D1

Processo 1/99 - Declaração de validade provisória, requerida nos termos do artigo 9.º da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro.

Decisão de inaplicabilidade do artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, nos termos do n.º 3 do artigo da citada portaria

O Conselho da Concorrência, no uso da competência atribuída pelo artigo 13.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, e pelos n.os 1.º e 9.º da Portaria 1097/93, da mesma data, visto o processo de apreciação prévia, registado sob o n.º 1/99, entrado em 16 de Agosto de 1999, em que é requerente STIHL - Aparelhos a Motor, S. A., com sede na Avenida de Fontes Pereira de Melo, 15, 7.º, em Lisboa, tem a ponderar os seguintes elementos de facto e de direito.

I - Os factos

1 - Em requerimento entrado neste Conselho, em 16 de Agosto de 1999, veio a requerente solicitar ao Conselho da Concorrência a declaração de inaplicabilidade do artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, aos contratos de distribuição selectiva que pretende celebrar com os seus distribuidores, segundo modelo de minuta que sujeitou à apreciação do Conselho da Concorrência.

2 - Da referida minuta constam as cláusulas do contrato-tipo, que se podem resumir da forma seguinte:

a) A maioria do capital social da requerente é detida pela sociedade alemã STIHL International GmbH, fazendo ambas parte do grupo de empresas em que se integra a sociedade alemã STIHL Ag & Co, fabricante dos produtos comercializados pela requerente e que constituirão o objecto do contrato;

b) Os produtos objecto do contrato serão os seguintes: motosserras e motosserras com motor eléctrico; guias e correntes para motosserras; cortabordos, foices e roçadeiras a motor; sistemas de limpeza (hidrolavadoras e aspiradores); atomizadores e sopradores; corta-sebes/podadores; perfuradoras/escavadoras; cortadores de ferro e pedra; roupas de protecção e de trabalho e acessórios;

c) É, no essencial, exigido ao distribuidor, além da satisfação de critérios qualitativos relativos às instalações, equipamento, qualificação de trabalhadores e recursos financeiros, a manutenção de um estoque suficiente de produtos e a realização de um conjunto anual de objectivos de venda, em unidades e valor de bens vendidos, só definível individualmente em face das condições apresentadas por cada distribuidor seleccionado;

d) O distribuidor só efectuará vendas no território que lhe for contratualmente atribuído, podendo nele contratar intermediários desde que aceites pela STIHL. O distribuidor poderá, todavia, satisfazer pedidos de utilizadores finais e de outros distribuidores autorizados, feitos fora do seu território (vendas passivas), reservando-se ainda a STIHL o direito de vender directamente a clientes e entidades oficiais e de efectuar vendas especiais que, dado o seu volume, não possam ser satisfeitas pelo distribuidor;

e) Dentro do prazo de garantia as reparações são da responsabilidade do fabricante, sendo o distribuidor obrigado a utilizar peças STIHL, a menos que o utilizador solicite expressamente outras. Fora do pedido de garantia é recomendado o uso de peças STIHL;

f) O contrato não impõe ao distribuidor qualquer exclusividade na venda de produtos.

3 - O pedido de apreciação prévia foi remetido, em 25 de Agosto de 1999, pelo Conselho da Concorrência à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência para organização e instrução do processo, não tendo entretanto sido devolvido para decisão: Foram recolhidas observações de terceiros, no caso apenas da firma Joaquim Verdasca Júnior, Herdeiros, Lda., nos termos do n.º 11.º da Portaria 1097/93 e na sequência do aviso publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 221, de 21 de Setembro de 1999 (pp. 14 227 e 14 228) e no jornal Público, de 15 de Setembro de 1999, em que em suma conclui que "a pretensão da STIHL não deve ser atendida, uma vez que viola claramente princípios e regras básicas da livre concorrência, designadamente os artigos 2.º, 3.º e 4.º do Decreto-Lei 371/93", não apresentando qualquer elemento em apoio da sua alegação de que está consagrado o princípio da exclusividade e de que se trata de "manifestações abusivas resultantes da sua (da STIHL) posição dominante e da dependência económica dos distribuidores, condicionantes ilegais da livre concorrência".

4 - Por requerimento de 22 de Dezembro de 2000, entrado neste Conselho, em 28 de Dezembro de 2000, veio a STIHL - Aparelhos a Motor, S. A., prevalecendo-se do disposto no n.º 9.º da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro, solicitar que fosse considerado provisoriamente válido o contrato de distribuição submetido à apreciação do Conselho.

II - Apreciação jurídica

5 - Estabelece o n.º 9.º da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro, que, tendo decorrido mais de 90 dias sobre a data de apresentação do pedido sem que tenha sido proferida decisão, podem as empresas "requerer ao Conselho da Concorrência, que o comportamento em apreciação seja considerado provisoriamente válido".

6 - Para o efeito e nesta fase do processo, não compete ao Conselho apreciar o interesse da requerente na declaração de validade provisória mas, tão somente, ponderar se, tendo em conta as características do comportamento notificado e as demais circunstâncias invocadas no pedido, a aceitação do mesmo, ainda que provisória, ofende princípios e regras de concorrência, cuja violação é, por norma, insusceptível de justificação.

7 - Feita uma apreciação sumária do pedido conclui-se estar em causa um contrato de distribuição selectiva que não se afasta nas suas cláusulas essenciais de modelos que têm sido aceites pelo Conselho da Concorrência.

8 - Tem o Conselho sustentado em anteriores decisões que podem ser justificáveis à luz do disposto no artigo 5.º n.º 1 do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, contratos de distribuição selectiva em que nomeadamente não se imponham cláusulas de reserva absoluta de território, não se fixem directa ou indirectamente os preços de venda dos produtos objecto do contrato e nem se imponha a exclusividade da venda dos mesmos produtos.

9 - Nestas circunstâncias, sem prejuízo da decisão final que o Conselho da Concorrência possa vir a adoptar, em face das observações de terceiros interessados, da instrução final do processo pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência e da eventual audiência da requerente sobre a conclusão do procedimento, considera-se que no caso vertente estão reunidas as condições para que o comportamento em causa possa ser considerado provisoriamente válido.

10 - Tudo visto e ponderado, o Conselho da Concorrência, ao abrigo do artigo 13.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, e do n.º 9.º da Portaria 1097/93, da mesma data, decide:

1.º Deferir o pedido de validade provisória do contrato de distribuição selectiva, segundo minuta apresentada pela requerente;

2.º É destinatária da presente decisão a STIHL - Aparelhos a Motor, S. A., com sede na Avenida de Fontes Pereira de Melo, 15, 7.º, em Lisboa.

Lisboa, 25 de Janeiro de 2001. - Fernando Ivo Gonçalves (relator) - José Álvaro Ubach Chaves Rosa - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva - José Anselmo Dias Rodrigues (presidente).

Decisão de inaplicabilidade do artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro

O Conselho da Concorrência, considerando o pedido de apreciação prévia n.º 1/99, apresentado pela STIHL - Aparelhos a Motor, S. A., com sede na Avenida de Fontes Pereira de Melo, 15, 7.º, em Lisboa, ao abrigo do n.º 1.º da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro;

Visto o processo, instruído pela Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, remetido a este Conselho, em 26 de Janeiro de 2001;

Vistas as observações apresentadas por terceiros, na sequência dos avisos publicados no Diário da República, 2.ª série, n.º 221, de 21 de Setembro de 1999 (pp. 14 227 e 14 228) e no jornal Público, de 15 de Setembro de 1999;

Tem a ponderar os seguintes elementos de facto e de direito.

I - Os factos

1 - Em requerimento entrado neste Conselho, em 16 de Agosto de 1999, veio a requerente solicitar ao Conselho da Concorrência a declaração de inaplicabilidade do artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, aos contratos de distribuição selectiva que pretende celebrar com os seus distribuidores, segundo modelo de minuta que sujeitou à apreciação do Conselho da Concorrência.

2 - O pedido de apreciação prévia foi remetido, em 25 de Agosto de 1999, pelo Conselho da Concorrência à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência para organização e instrução do processo, o qual foi devolvido, devidamente instruído, por ofício de 26 de Janeiro de 2001.

3 - A instrução permitiu concluir, por um lado, que a requerente detém uma posição dominante no mercado nacional apenas quanto a dois produtos: motosserras (32,6%) e podadoras de sebes (38,3%), sem que seja conhecido qualquer abuso dessa posição e, por outro lado, que nesses casos, se trata de produtos cuja utilização é potencialmente perigosa, sendo importante uma cuidada assistência pós-venda, justificando-se uma criteriosa escolha dos distribuidores.

4 - Entretanto - à data de 18 de Outubro de 1999 - haviam sido recolhidas observações de terceiros, no caso apenas da firma Joaquim Verdasca Júnior, Herdeiros, Lda., nos termos do n.º 11.º da Portaria 1097/93, em que em suma conclui que "a pretensão da STIHL não deve ser atendida, uma vez que viola claramente princípios e regras básicas da livre concorrência, designadamente os artigos 2.º, 3.º e 4.º do Decreto-Lei 371/93", não apresentando qualquer elemento em apoio da sua alegação de que está consagrado o princípio da exclusividade e de que se trata de "manifestações abusivas resultantes da sua (da STIHL) posição dominante e da dependência económica dos distribuidores, condicionantes ilegais da livre concorrência". Anote-se que a referida firma, era o representante da Sociedade STIHL, antes de esta ter decidido assumir a comercialização directa dos seus produtos no mercado português.

5 - Por requerimento de 22 de Dezembro de 2000, entrado neste Conselho, em 28 de Dezembro de 2000, veio a STIHL - Aparelhos a Motor, S. A., prevalecendo-se do disposto no n.º 9.º da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro, solicitar que fosse considerado provisoriamente válido o contrato de distribuição submetido à apreciação do Conselho, o que lhe foi concedido por decisão do Conselho da Concorrência, de 25 de Janeiro de 2001.

II - Análise do contrato-tipo

6 - Da referida minuta constam as cláusulas do contrato-tipo, que se podem resumir da forma seguinte:

a) A maioria do capital social da requerente é detida pela sociedade alemã STIHL International GmbH, fazendo ambas parte do grupo de empresas em que se integra a sociedade alemã STIHL Ag & Co, fabricante dos produtos comercializados pela requerente e que constituirão o objecto do contrato;

b) Os produtos objecto do contrato são os seguintes: motosserras e motosserras com motor eléctrico; guias e correntes para motosserras; cortabordos, foices e roçadeiras a motor; sistemas de limpeza (hidrolavadoras e aspiradores); atomizadores e sopradores; corta-sebes/podadores; perfuradoras/escavadoras; cortadores de ferro e pedra; roupas de protecção e de trabalho e acessórios;

c) É, no essencial, exigido ao distribuidor, além da satisfação de critérios qualitativos relativos às instalações, equipamento, qualificação de trabalhadores e recursos financeiros, a manutenção de um estoque suficiente de produtos e a realização de um conjunto anual de objectivos de venda, em unidades e valor de bens vendidos, só definível individualmente em face das condições apresentadas por cada distribuidor seleccionado;

d) O distribuidor só efectuará vendas no território que lhe for contratualmente atribuído, podendo nele contratar interme diários desde que aceites pela STIHL, ficando-lhe, todavia vedado que "possa desenvolver uma política de vendas, de publicidade e promoção activas fora do território, nem manter depósitos ou armazéns para os produtos fora do território";

e) O distribuidor poderá, todavia, satisfazer pedidos de utilizadores finais e de outros distribuidores autorizados, feitos fora do seu território (vendas passivas), reservando-se ainda a STIHL o direito de vender directamente a clientes e entidades oficiais e de efectuar vendas especiais que, dado o seu volume, não possam ser satisfeitas pelo distribuidor;

f) Dentro do prazo de garantia as reparações são da responsabilidade do fabricante, sendo o distribuidor obrigado a utilizar peças STIHL, a menos que o utilizador solicite expressamente outras. Fora do período de garantia é recomendado o uso de peças STIHL;

g) O contrato não impõe ao distribuidor qualquer exclusividade na venda de produtos.

III - Apreciação jurídica

7 - Está em causa um contrato de distribuição que não se afasta em algumas das suas cláusulas essenciais de modelos que têm sido aceites pelo Conselho da Concorrência. Na verdade, tem o Conselho sustentado em anteriores decisões que podem ser justificáveis à luz do disposto no artigo 5.º n.º 1 do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, contratos de distribuição selectiva em que nomeadamente não se imponham cláusulas de reserva absoluta de território, não se fixem directa ou indirectamente os preços de venda dos produtos objecto do contrato e nem se imponha a exclusividade da venda dos mesmos produtos.

8 - O contrato através do qual a STIHL pretende estruturar a sua rede de distribuição assenta, desde logo, na selecção dos distribuidores através de critérios objectivos, respeitantes a qualidades que devem ser preenchidas pelo distribuidor e respectiva empresa e justificados pela natureza dos produtos em causa. A esta vertente de distribuição selectiva puramente qualitativa vem juntar-se uma vertente quantitativa, que limita de forma mais acentuada e directa o número de potenciais representantes. Referimo-nos não apenas à imposição de objectivos anuais de venda mas, sobretudo, à nomeação de um único distribuidor por território.

9 - Ora a atribuição de um determinado território a cada distribuidor é acompanhada da proibição de vendas activas para lá dos limites da zona assinalada. É esta combinação que suscita particulares reservas do ponto de vista do direito da concorrência (ver nota 1), atentando contra o disposto no artigo 2.º, alíneas c), d) e f) do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro.

10 - Poderá, ainda assim, a restrição da concorrência operada pela cláusula de proibição de vendas activas beneficiar de um balanço económico positivo se preencher as condições estabelecidas pelo artigo 5.º do mencionado decreto-lei. Os efeitos positivos invocados pela STIHL prendem-se com a necessidade de evitar situações de "parasitismo" (free-ride) entre os distribuidores no que toca aos serviços pré-venda, traduzidas na possibilidade de o cliente efectuar a aquisição do produto junto do distribuidor que não suportou os custos da respectiva promoção (informações, demonstrações, aconselhamento, etc.). Desta perspectiva, a proibição de vendas activas é susceptível de contribuir para melhorar a distribuição dos produtos contratuais, na medida em que incentiva os representantes da STIHL a investir num nível adequado de serviços pré-venda, com evidentes vantagens para o utilizador final (até porque a imposição de objectivos de vendas anuais é apta a conter a tentação do distribuidor em aumentar os preços). Uma vez que não se proíbem, concomitantemente, as vendas passivas, não se impõem aos membros do sistema restrições desnecessárias ao objectivo pretendido. Também não é eliminada a concorrência numa parte substancial do mercado em causa, até porque o efeito restritivo da cláusula se verifica sobretudo no interior da marca.

11 - Esta análise, que conduz à justificação em sede de balanço económico da restrição concorrencial operada pela proibição de vendas activas num contrato de distribuição selectiva com delimitação de territórios, deve, contudo, ser temperada por algumas considerações suscitadas pelas características do caso concreto. Na verdade, a intensidade dos efeitos negativos causados pela diminuição da concorrência no interior da marca depende da posição de mercado ocupada pela STIHL: quanto maior for o seu poder de mercado, mais nociva se torna a redução da concorrência intramarca pela ausência de pressão concorrencial externa e menos os utilizadores finais serão contemplados com uma parte equitativa dos benefícios económicos gerados pela restrição. Ora a STIHL detém uma posição muito significativa em dois dos mercados visados pelo contrato: o mercado das motosserras (32,6%) e o mercado das podadoras de sebes (38,3%). Considera o Conselho que, nestes dois mercados, a forte implantação da STIHL retira justificação à proibição de vendas activas.

12 - O Conselho é, no entanto, sensível à dificuldade que a STIHL pode encontrar ao pretender nomear seu distribuidor para um dado território uma empresa que disponha de estabelecimentos abertos ao público em vários outros territórios contratuais. Se não puder impedir tal empresa de distribuir os produtos contratuais nos territórios em que já dispõe de outros representantes, só resta à STIHL renunciar a escolher essa empresa como parceiro contratual, o que pode contribuir para afastar do mercado um distribuidor eficiente. Para evitar esta situação, o Conselho considera admissível que, nos mercados das motosserras e das podadoras de sebes, e sem prejuízo da impossibilidade de proibir as vendas activas, a STIHL possa impedir o representante a quem tenha sido atribuído um determinado território de proceder à distribuição dos produtos contratuais em outros estabelecimentos que possua para lá das fronteiras do território assinalado (ver nota 2).

IV - Decisão

Nos termos do disposto no n.º 1 da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro, o Conselho decide:

1.º No prazo de 90 dias deverá a requerente suprimir do contrato a cláusula que proíbe as vendas activas (cláusula 4.ª, n.º 2), no que diz respeito às motosserras e podadores de sebes, sem prejuízo de introduzir a possibilidade de, mesmo nesses produtos, se proibir um membro do sistema de efectuar vendas em estabelecimento(s) não autorizados;

2.º Declarar a inaplicabilidade do artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, ao contrato de distribuição, segundo a minuta apresentada pela requerente, e depois de efectuada a alteração ordenada no número anterior, por considerar que estão preenchidas as condições previstas no n.º 1, do artigo 5.º do mesmo diploma, mediante a existência de um balanço económico positivo;

3.º Declarar a presente decisão válida por um período de cinco anos a contar da data em que seja celebrado o primeiro contrato de distribuição, de acordo com a minuta apresentada pela requerente, devendo o Conselho ser informado no prazo de 30 dias úteis após a celebração do referido contrato;

4.º É destinatária da presente decisão a STIHL - Aparelhos a Motor, S. A., com sede na Avenida de Fontes Pereira de Melo, n.º 15, 7.º, em Lisboa.

(nota 1) Saliente-se, aliás, a suspeita com que o direito comunitário encara a restrição das vendas activas pelos membros de um sistema de distribuição selectiva, suficiente para fazer perder ao acordo vertical o benefício da isenção por categoria independentemente da dimensão da quota de mercado do fornecedor (artigo 4.º, alínea c), do Regulamento CE n.º 2790/1999, da Comissão, de 22 de Dezembro de 1999, relativo à aplicação do n.º 3 do artigo 81.º do Tratado CE a determinadas categorias de acordos verticais e práticas concertadas (e para o tornar objecto de uma apreciação individual, norteada pelas directrizes enunciadas na comunicação da comissão sobre orientações relativas às restrições verticais (2000/C 291/01).

(nota 2) Preocupação similar parece ter conduzido a Comissão a ressalvar a manutenção da isenção por categoria em relação aos contratos de distribuição selectiva nos quais se imponham restrições à capacidade de o representante "operar a partir de um local de estabelecimento não autorizado" - artigo 4.º, alínea c), do Regulamento CE n.º 2790/1999, acima citado.

Lisboa, 3 de Maio de 2001. - Fernando Ivo Gonçalves (relator) - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva - Carolina de Castro Nunes Vicente e Cunha - José Anselmo Dias Rodrigues (presidente).

ANEXO D2

Processo 3/2000 - Declaração de legalidade proferida nos termos do n.º 2 do artigo 1.º da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro.

O Conselho de Concorrência, considerando o pedido de apreciação prévia n.º 3/2000, apresentado por Interbanco, S. A., Volkswagen Bank, GmbH, Siva, SGPS (actualmente, SAG GEST, SGPS) e João Pereira Coutinho, relativo ao acordo dito de participação celebrado entre os requerentes, ao abrigo do n.º 1 da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro;

Visto o processo, instruído pela Direcção-Geral do Comércio e Concorrência e remetido a este Conselho a 14 de Março de 2001;

Considerando a ausência de quaisquer observações de terceiros na sequência do aviso 1/2001;

Tem a ponderar os seguintes elementos de facto e de direito:

I - Factos

1 - Descrição sumária do objecto do processo

1 - O presente processo tem por objecto o acordo de associação em participação celebrado a 29 de Novembro de 1999 entre a Interbanco, S. A, o Volkswagen Bank GmbH, a Siva, SGPS, S. A., (que passou a designar-se SAG GEST - Soluções Automóvel Globais, SGPS S. A., por escritura outorgada em 15 de Fevereiro de 2000), e João Manuel de Quevedo Pereira Coutinho.

No requerimento, apresentado ao abrigo do disposto na Portaria 1097/93, de 29 de Outubro, as partes solicitam ao Conselho da Concorrência que seja proferida declaração de legalidade do acordo ou declaração de inaplicabilidade do artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, por se encontrarem preenchidas as condições estabelecidas no artigo 5.º do mesmo diploma.

2 - Nos termos do disposto no n.º 5.º da referida Portaria 1097/93, o Conselho da Concorrência, remeteu o pedido à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência para que procedesse à organização e instrução do respectivo processo.

3 - A Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência, ao abrigo do disposto no n.º 7 da mesma portaria solicitou ao representante legal das empresas esclarecimentos adicionais.

4 - Como resulta do processo, o pedido das requerentes surge na sequência da resposta dada pela Task-Force de Concentrações, serviço da Direcção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia, a uma consulta.

Aquando da celebração do acordo, as partes signatárias, considerando que este podia estar abrangido pelo âmbito de aplicação do Regulamento (CEE) n.º 4064/89, do Conselho, de 21 de Dezembro, enviaram à Comissão Europeia, um memorando contendo um resumo das principais disposições do mesmo, solicitando-lhe orientações no sentido de determinar se o acordo constituía ou não uma empresa comum que desempenha de forma duradoura todas as funções de uma entidade económica autónoma e por conseguinte uma concentração.

A Comissão considerou que a transacção descrita não caía no âmbito do Regulamento (CEE) n.º 4064/89, e, por conseguinte, não tinha que ser notificada, ressalvando que se tratava de uma opinião produzida face à informação fornecida pelas partes. Neste contexto, a Comissão entendeu que o acordo de participação não constituía uma full function joint venture, visto que, embora a parte do negócio do Interbanco em questão, actue como um ramo autónomo no qual o Volkswagem Bank participa em termos de controlo conjunto, não existe uma autonomia entre esta e a restante actividade do Interbanco, não estando reunida a condição de autonomia económica que caracteriza a empresa comum com carácter de concentração.

2 - As partes

5 - Interbanco, S. A. (adiante designado Interbanco), é uma sociedade anónima, com sede em Lisboa, na Rua de Castilho, 2 a 4, e com um capital social de 6000 milhões de escudos. O Interbanco era integralmente detido pela SGC SGPS, S. A. Em Dezembro de 1999, a SGC alienou o capital da empresa, que passou a ser detido em termos paritários, bem como os correspondentes direitos de voto, pela sua participada Siva SGPS, actual SAG GEST - Soluções Automóvel Globais, SGPS, S. A., e pelo grupo BCP Atlântico, que exercem, assim, conjuntamente o controle da mesma. A SAG GEST, por sua vez, é controlada directamente pela SGC SGPS, S. A., e indirectamente por João Pereira Coutinho.

A empresa tem como objecto social global a realização de operações bancárias e financeiras, e a prestação dos serviços permitidos por lei às instituições de crédito, tendo-se especializado no financiamento da actividade automóvel. Neste âmbito, o Interbanco presta serviços de vária natureza, nomeadamente, financiamentos, concessão de garantias, contratos de locação financeira, factoring, concessão e gestão de créditos e outros, aos agentes económicos do ramo automóvel e a consumidores finais.

6 - Volkswagen Bank GMBH (adiante designado Volkswagen Bank), é uma sociedade por quotas, de direito alemão, com um capital social de 318 279,2 mil euros, e com sede em Gifhorner Strasse, 57, D-381 12 Braunschweig, Alemanha. O seu capital é integralmente detido pela Volkswagen Financial Services, AG, que por sua vez é controlada pela sociedade-mãe do Grupo Volkswagen, a Volkswagen, AG.

O Grupo Volkswagen é o maior fabricante de automóveis a nível europeu, e um dos cinco maiores produtores mundiais, e é composto por nove marcas independentes: Audi, Bentley, Bugatti, Lamborghini, Rolls Royce, Seat, Skoda, VW Comercial Vehicles e Volkswagen Pessenger Cars. O Grupo presta diversos serviços financeiros e leasing, através da sua divisão Financial Services, encabeçada pela Volkswagen Financial Services, AG, e de que fazem parte o Volkswagen Bank GMBH e a Volkwagen Leasing GmbH. Em Portugal, o Grupo está activo na produção automóvel através da Auto Europa Automóveis, Lda.

7 - Siva, SGPS, S. A., que através de escritura pública outorgada em 15 de Fevereiro de 2000 passou a designar-se SAG GEST - Soluções Automóvel Globais, SGPS, S. A., (adiante designada SAG GEST), sociedade anónima, com sede na Estrada de Alfragide, quilómetro 1, Alfragide, Amadora, com um capital social de 150 milhões de euros.

8 - A SAG GEST é uma sociedade gestora de participações sociais, cotada em Bolsa e controlada pela SGC SGPS, S. A., cujas sociedades suas participadas se dedicam à importação, distribuição e comércio de veículos automóveis, bem como à prestação, a clientes finais, concessionários e importadores, de todos os serviços conexos com o automóvel. Para além do negócio relacionado com a importação de veículos das marcas VW, Skoda e Audi (ao abrigo de um contrato de distribuição exclusiva celebrado em 1996 com o Grupo Volkswagen), a empresa está ainda presente, através de uma sua participada, a MULTIRENT - Aluguer e Comércio de Automóveis, S. A., no aluguer de longa duração e aluguer operacional, e nos serviços financeiros através do Interbanco (em parceria Banco Comercial Português).

9 - João Manuel de Quevedo Pereira Coutinho, morador na Quinta de São Gonçalo, 2780 Oeiras, é o accionista maioritário da holding SGC SGPS, S. A., exercendo, por essa via, o controlo exclusivo sobre a SAG GEST e o controle conjunto sobre o Interbanco.

3 - O acordo

3.1 - Caracterização do acordo

10 - O objectivo do acordo é combinar o know-how de cada uma das partes, por forma a aumentar e alargar os serviços financeiros, no que se refere às marcas do grupo VW representadas pela SAG GEST (VW, Audi e Skoda) em termos de volume e respectiva rentabilidade, através da associação do Interbanco e do Volkswagen Bank, partilhando os resultados positivos e negativos dessa actividade.

11 - O acordo consubstancia um contrato de associação em participação, submetido ao regime do Decreto-Lei 231/81, de 28 de Julho, definido pelo n.º 1 do artigo 21.º deste diploma como a associação de uma pessoa a uma actividade económica exercida por outra, ficando a primeira a participar nos lucros, ou nos lucros e perdas, que desse exercício resultarem para a segunda.

Este tipo de acordo, conforme referem as partes, não envolve qualquer modificação estrutural com efeito sobre terceiros, tratando-se apenas de uma relação obrigacional entre associante e associado.

Em concreto, nos termos do acordo, o Volkswagen Bank passará a partilhar os lucros e perdas do Interbanco, mas apenas naquilo que se refere à actividade do Interbanco relativa à prestação de serviços financeiros e conexos com os produtos oriundos do Grupo Volkswagen (adiante designada "Negócio"). O Volkswagen Bank não assumiu qualquer obrigação de contribuir com bens ou numerário para o Interbanco, com excepção da sua participação nos eventuais prejuízos do Negócio.

12 - O acordo tem como âmbito a actividade levada a cabo em Portugal pelo Interbanco de prestação de serviços financeiros às empresas que comercializam veículos Volkswagem (dealers), com excepção do próprio importador (a actual SAG GEST), bem como a consumidores. Inclui-se no seu objecto a prestação de todos os serviços relativos à concessão de créditos qualquer que seja a sua forma, nomeadamente empréstimos, garantias, acordos de financiamento, leasing, e outros (cláusula 2.ª).

13 - O acordo foi celebrado em 29 de Novembro de 1999 e notificado à Comissão Europeia em 13 de Dezembro de 1999, estando prevista a sua entrada em vigor três semanas após esta data. A comissão Europeia enviou o seu ofício em 13 de Janeiro de 2000, e as partes iniciaram a vigência do acordo após recebimento da mesma, tendo, entretanto, celebrado um aditamento, nos termos do qual ficava suspensa, desde a entrada em vigor do acordo até à decisão das autoridades de concorrência portuguesas, a cláusula 18.ª, que contém obrigações de não concorrência.

O acordo foi celebrado por cinco anos, terminando a sua vigência em 29 de Novembro de 2004.

14 - Nos termos do acordo, o Volkswagen Bank e o Interbanco irão partilhar lucros e perdas do Negócio relativo às marcas do grupo VW, numa base de 35-65%, respectivamente (cláusula 6.ª). Estas proporções passarão a ser de 50%-50%, no caso de o Acordo vir a ser estendido à marca Seat, caso qualquer das partes venha a adquirir o controle, directo ou indirecto, do importador da Seat em Portugal, comprometendo-se as partes e envidar todos os esforços para integrar no Negócio os serviços financeiros da marca Seat.

Neste sentido, e nos termos do acordo, o Interbanco comprometeu-se a organizar a sua contabilidade e registos, por forma a autonomizar toda a parte do Negócio correspondente às marcas VW, Audi e Skoda, tendo o Volkswagen Bank o direito de solicitar e aceder a toda a informação que considerar relevante para o desenvolvimento do negócio (cláusula 8.ª).

As partes acordaram, igualmente, que SAG GEST (à data denominada Siva SGPS), na sua qualidade de accionista com controle da Multirent, compromete-se a pagar ao Volkswagen Bank, uma comissão mensal de 1% sobre o volume de capital financiado relativo às actividades de Aluguer de Longa Duração (ALD) e Aluguer Operacional de Veículos (AOV) (cláusula 10.ª). A SAG GEST compromete-se também a, enquanto durar o acordo, não modificar a sua participação na Multirent, de forma a perder o controle da mesma, no entendimento de que uma participação inferior a 51% dos direitos de voto significa perda de controle.

O acordo prevê a constituição de um Comité de Coordenação composto por quatro membros, dois do Interbanco e dois do Volkswagen Bank, que deliberará por unanimidade e que preparará o business plan por três anos, com a estratégia, projectos a desenvolver e projecções de custos e receitas, e que será também responsável pela gestão o Negócio, numa base permanente, competindo-lhe, nomeadamente, a decisão sobre a política geral a ser seguida, nomeadamente, no que se refere a markeging, risco, fundos e aprovação das contas. (Cláusulas 12.ª e 13.ª).

Haverá ainda um Comité de Direcção composto por dois membros (o presidente do conselho de administração do Interbanco e um membro da direcção do Volkswagen Bank) que aprovará anualmente o business plan elaborado pelo Comité de Coordenação (cláusula 14.ª).

Nos termos da cláusula 15.ª do acordo, matérias com a política de marketing, e o risco, nomeadamente campanhas de redução de juros, modificação nos sistemas de comissão dos dealers e revendedores, política de preços dos produtos, alteração das características dos produtos, formação dos revendedores, publicidade, risco de atribuição de créditos/procedimentos aplicáveis aos incobráveis, política respeitante ao valor residual, política de financiamentos, decisões que tenham a ver com a competitividade dos pacotes de produtos oferecidos, têm que ser decididas por mútuo consenso.

3.2 - Cláusulas de não concorrência

15 - Nos termos da cláusula 18.ª-1 do acordo, as partes comprometem-se a, mutuamente, não negociar, participar ou envolver-se, directa ou indirectamente, na prestação de serviços financeiros em Portugal, mas apenas no que diz respeito às marcas do Grupo VW incluídas no Negócio, e, se vier a ser o caso, à marca Seat. A actividade da Multirent não constitui uma violação deste compromisso (18.2).

Também não infringem esta cláusula (18.3):

A oferta de serviços financeiros pelo Volkswagen Financial Services Group através da Internet, mesmo que a mesma seja prestada a residentes em Portugal que a procuram através daquele meio;

A oferta de serviços financeiros nos designados "mercados profissionais", como sejam o mercado monetário, de derivados e de capitais.

3.3 - Cláusula de confidencialidade

16 - Nos termos da cláusula 19.ª, as partes obrigam-se ainda a, durante os cinco anos posteriores ao termo da vigência do acordo, manter confidenciais as informações transmitidas entre elas relativas ao Negócio, e a não divulgar o conteúdo do acordo, salvo se tais informações forem razoavelmente exigidas pela gestão corrente do Negócio, ou fornecidas a consultores profissionais, ou quando impostas por lei.

4 - Delimitação do mercado relevante

4.1 - Posição sustentada pelas partes

17 - O Interbanco desenvolve a sua actividade no sector bancário, tendo-se especializado na prestação de todos os serviços financeiros inerentes ao comércio automóvel em toda a cadeia de comercialização, desde o importador/distribuidor, passando pelos concessionários, até aos clientes finais. Ou seja, oferece toda a gama de serviços bancários e financeiros a um tipo determinado de procura: os agentes económicos do sector automóvel e o consumidor final de veículos automóveis.

Neste contexto, o Interbanco concorre, por um lado, com os bancos em geral, quer no financiamento das empresas do ramo automóvel, quer no financiamento ao consumidor final na aquisição do veículo, e, por outro lado com empresas financeiras de leasing e, de certa forma, com as empresas de ALD, Aluguer de Longa Duração e Aluguer Operacional de Longa Duração, uma vez que aos seus balcões comercializa os produtos de outras empresas do Grupo SAG GEST, nomeadamente da Multirent.

O Interbanco presta este tipo de serviços a todas as marcas automóveis que o procuram. No entanto, o acordo reporta-se apenas à concessão de financiamentos prestados relativos aos veículos das marcas do Grupo Volkswagen, VW, Audi e Skoda, podendo eventualmente ser alargado à marca Seat do mesmo Grupo.

18 - As partes apresentam uma análise de mercado em duas perspectivas: uma perspectiva mais abrangente, que inclui como mercado relevante o mercado bancário em geral, tendo em conta que, em seu entender, a actividade do Interbanco em nada se distingue das operações da banca comercial e por sua vez as próprias instituições bancárias tradicionais também se dedicam ao financiamento automóvel quer aos seus balcões, quer através de empresas autónomas como a Caixa Rent ou o BPI Rent e das sociedades de leasing por elas detidas.

Nesta perspectiva, considerando que, no financiamento a empresas na aquisição de automóveis, o Interbanco concorre com os bancos e com as sociedades de locação financeira, as partes estimam que a sua quota tenha sido de 0,9% em 1998 e 1,1% em 1999. No financiamento à aquisição de viaturas por particulares, o mesmo concorre com bancos no crédito ao consumo e com sociedades financeiras de aquisições a crédito e a sua quota seria de 1,7% e 2,5%, respectivamente, nos mesmos anos.

19 - Por outro lado, e embora considerando não ser essencial à exposição ou à decisão requerida que se tome uma posição definitiva sobre esta matéria, as partes apresentam uma perspectiva mais restrita do mercado, que designam por mercado dos serviços bancários e financeiros conexos com o comércio automóvel, à semelhança do que é referido pela Comissão no processo IV/M. 1370 - Peugeot/Credipar (decisão onde as notificantes admitem mesmo a configuração de um mercado limitado à locação financeira de longa duração), ou, com as devidas adaptações, no processo IV/M.823 - John Deer Capital Corp/Lombard North Central, em que a Comissão define como mercado relevante o mercado do leasing para a maquinaria agrícola, equipamentos e outros fornecimentos.

Aqui, numa perspectiva mais restritiva, focam apenas as actividades financeiras especificamente relacionadas com o comércio automóvel, considerando que, neste caso, a certeza quanto aos dados é bem menor, mas que as conclusões não seriam muito distintas. Com efeito, para além das empresas que se dedicam especificamente a este ramo, as instituições bancárias e financeiras também estão presentes neste mercado e não autonomizam as respectivas demonstrações financeiras.

O Interbanco estima, sem grande certeza, que os contratos celebrados em 1999 representem 9,5% dos negócios de concessão de crédito à aquisição de viaturas novas através de crédito especializado, excluindo o crédito pessoal da banca tradicional. Contudo a parte do negócio afectada pelo acordo apenas se reporta às marcas VW, pelo que no mesmo período, a quota relativa ao crédito especializado concedido a viaturas novas seria de 3,7%.

20 - No que diz respeito à delimitação geográfica, consideram que o mercado deve corresponder à totalidade do território nacional, como aliás é, sistematicamente, aceite pela Comissão neste tipo de serviços.

21 - Em termos de oferta, o Interbanco é, como já se referiu, até agora, o único banco especializado em crédito automóvel, tendo como mais directos concorrentes para além dos restantes bancos comerciais, as SFAC's sociedades financeiras para aquisições a crédito, agregadas a fabricantes ou importadores, como a Renault Gest, a GMCrédito, a FiatCrédito ou a grupos financeiros nacionais como o BPI, bem como empresas como a Woochester Finance (sociedade irlandesa pertencente ao grupo GE capital), a Sofinloc ou a Credifin.

4.2 - Posição da entidade instrutora

22 - No entender da Direcção-Geral do Conselho da Concorrência, o mercado relevante deve ser definido numa perspectiva mais restrita e, dada a especialização do Interbanco, terá que ser circunscrito à prestação a nível nacional de serviços bancários e financeiros conexos com o crédito automóvel, posição sustentada nos argumentos que aqui se reproduzem na íntegra.

23 - No mercado relevante considerado, o Interbanco oferece financiamentos diversos que se podem agrupar em dois grupos, destinados a dois tipos de procura: 1) às empresas da cadeia de distribuição automóvel; e 2) aos consumidores finais, sejam particulares ou empresas:

1) Nos financiamentos às empresas da cadeia de distribuição automóvel o INTERBANCO concorre com a banca comercial em geral na concessão de créditos a empresas;

2) Nos financiamentos aos consumidores finais, quer sejam empresas ou particulares, o INTERBANCO concorre com sociedades de locação financeira (leasing), com as SFACSs (sociedades de aquisições a crédito) e com os próprios bancos, na concessão de créditos quer ao consumo dos particulares, quer ao investimento das empresas que optam por investir na compra de viaturas próprias. Nesta óptica, o INTERBANCO concorre também com as empresas não financeiras, de ALD (aluguer de longa duração) e AOV (aluguer operacional de viaturas), que são para as empresas uma opção económica à compra.

Neste âmbito, considera a DGCC que a quantificação do mercado se torna difícil, uma vez que o INTERBANCO é um banco vocacionado só para o crédito automóvel e os dados disponíveis fornecidos pelas estatísticas do Banco de Portugal, tal como as partes referem, encontram-se sempre agregados: os créditos ao investimento por parte da banca incluem todos os sectores empresariais e os dados relativos aos créditos ao consumo concedidos pelos bancos, bem como os dados relativos às SFACs e às sociedades de leasing incluem os créditos concedidos aos particulares para os mais diversos fins (viagens, electrodomésticos, viaturas e outros, com excepção de habitação).

E, como se viu atrás nas estimativas das partes, face a estas estatísticas as quotas de mercado do INTERBANCO são muito reduzidas.

24 - No entanto, a DGCC considera que há que ter em conta que, embora o INTERBANCO forneça créditos a todo o sector automóvel, apenas os financiamentos relacionados com os automóveis do grupo VW são objecto do acordo, e que os seus fins últimos são incrementar, as vendas das suas marcas, produzindo-se os respectivos efeitos ao nível do mercado da venda de veículos automóveis, seja directa ao consumidor final (particulares ou empresas), seja indirecta através dos diferentes tipos de locação, financeira ou não.

Neste contexto, e tendo em conta o tipo de distribuição existente no sector automóvel, entende a entidade instrutora que faz sentido uma quantificação deste mercado e da posição do grupo VW face aos seus concorrentes.

A SAG GEST é o importador exclusivo das marcas VOLKSWAGEN, AUDI e SKODA, e segundo se depreende do Acordo, existia à data da celebração do mesmo, a intenção de adquirir a posição do importador da SEAT (negócio que, segundo declarações do representante das partes à DGCC, não se teria concretizado e já estaria posto de parte.

Segundo as estatísticas da ACAP - Associação dos Comerciantes de Automóveis de Portugal, foram vendidos em Portugal, em 1999 um total de 375 161 veículos ligeiros de passageiros e comerciais ligeiros (v. quadro 4, Anexo 1). Destes, 44 915 eram VW, AUDI e SKODA, o que significa uma quota de mercado de 12%, esta quota passariua para os 16,9%, se incluíssemos a marca SEAT.

Na óptica das vendas de automóveis a crédito, podemos avaliar a posição das empresas do grupo, que financiam a aquisição de veículos (e aqui incluiríamos a MULTIRENT, visto que o aluguer de longa duração, com componente de gestão de frotas constitui, por parte da procura, uma opção à compra a crédito) face ao total dentro da própria marca.

Nesta perspectiva, na resposta às informações complementares solicitadas pela DGCC, o representante legal das partes, (ressalvando que se trata de valores não muito rigorosos que podem apresentar algumas discrepâncias face a valores apresentados anteriormente), estima que, relativamente às marcas VW e AUDI (v. quadro 3, Anexo 1), dos veículos novos vendidos em 1999, 24,7% foram vendidos pelo INTERBANCO e pela MULTIRENT, e que, relativamente aos veículos novos financiados das mesmas marcas, 50,8% foram financiados por estas duas empresas do grupo SAG GEST.

II - Apreciação jurídica e económica

1 - Definição do mercado relevante

25 - Embora se possa admitir que a definição de mercado relevante proposta pela DGCC, ou seja, o mercado nacional dos serviços bancários e financeiros conexos com o crédito automóvel, corresponde melhor às finalidades da aplicação das regras nacionais de concorrência ao caso em espécie, o Conselho entende que não é necessário tomar agora uma posição definitiva sobre essa questão, dada a posição moderada do INTERBANCO nesse mercado e a ausência do VOLKSWAGEN BANK do mesmo, pelo menos até à celebração do acordo.

2 - O acordo

26 - Como refere a entidade instrutora, o acordo de associação em participação celebrado entre o VOLKSWAGEN BANK e as empresas do grupo SAG GEST não implica qualquer alteração estrutural na empresa alvo, ou seja o INTERBANCO, visto que este continuará a desenvolver, sem qualquer limitação, a sua actividade de concessão de créditos a diversas marcas automóveis concorrentes com as do grupo em que se encontra integrado, e apenas uma parte do seu negócio, correspondente às marcas do grupo VW (38,5% dos créditos concedidos), passará a ser gerida em conjunto com o VOLKWAGEN BANK, que não adquiriu qualquer participação no INTERBANCO, e que até agora não tinha qualquer actividade em Portugal. Estamos assim perante uma associação entre empresas concorrentes que, não constituindo uma alteração estrutural, ainda assim cria condições para uma coordenação do respectivo comportamento concorrencial. Para determinar se este acordo tem por objecto ou como efeito restringir a concorrência é necessário analisar o contexto em que o mesmo será concretizado.

27 - Sendo certo que o INTERBANCO com este Acordo irá beneficiar do know-how do VOLKSWAGEN BANK, o que contribuirá para o alargamento e aperfeiçoamento das soluções de financiamento aos vários níveis da cadeia de distribuição automóvel, reforçando a sua presença no mesmo, nada indica que o mesmo seja susceptível de produzir qualquer restrição de concorrência ou, menos ainda, de conduzir à criação de qualquer posição dominante no mercado.

Com efeito, as quantificações do mercado efectuadas pela DGCC mostram que no mercado da concessão de financiamentos ao comércio automóvel a posição do INTERBANCO não tem relevo assinalável. Apenas quando analisados os dados referentes às marcas VW em si, os financiamentos assumem valores mais relevantes, que decorrem, essencialmente, do tipo de distribuição dentro da cadeia automóvel. É normal que existindo uma empresa especializada em crédito automóvel dentro do grupo - e outras marcas atrás referidas também possuem empresas especializadas na concessão de créditos à aquisição viaturas -, os financiamentos sejam canalizados para essa empresa, nomeadamente ao nível da publicidade dos revendedores pertencentes ao grupo, situação que continuará a verificar-se com ou sem acordo.

28 - Como observa a DGCC, os reflexos deste acordo far-se-ão sentir, em última análise, num mercado vizinho - o da comercialização de veículos automóveis -, na concorrência entre as diferentes marcas automóveis, visto que potenciará a apresentação de soluções de crédito mais atractivas para os consumidores, aumentando assim a procura destas marcas. Neste mercado as quotas do grupo VW, como se viu atrás, situam-se bastante abaixo dos 20%, a oferta é concorrencial, e assenta sobre vectores muito variados para além do crédito, como o preço e as características do produto em si, existindo diversas marcas com quotas muito próximas.

29 - Perante estes elementos, entende o Conselho da Concorrência que o acordo de associação em participação não deve ser considerado restritivo da concorrência, uma vez que não tem por objecto restringir a concorrência e que não se pode considerar que ao nível dos seus efeitos o mesmo seja susceptível de afectar a concorrência, quer no mercado relevante quer no mercado vizinho da distribuição automóvel.

3 - Restrições acessórias: cláusulas de não concorrência e de confidencialidade

30 - O acordo notificado é qualificado pelas partes como sendo "uma espécie de criação de empresa-comum embora sem relações de capital entre uma das sociedades-mãe e a empresa-comum e sem que esta última tenha personalidade jurídica" (fl. 28 do processo), retirando daí as notificantes um conjunto de argumentos relativos ao enquadramento das obrigações de não concorrência e de confidencialidade como restrições acessórias, aplicando por analogia a jurisprudência e prática administrativa comunitárias em sede do Tratado de Roma e do Regulamento 4064/89.

31 - A teoria das restrições acessórias foi consagrada no direito antitrust norte-americano no fim do século XIX, antecipando o posterior desenvolvimento da rule of reason. (ver nota 1) Embora ainda sujeita a alguma controvérsia doutrinal, ela é geralmente aceite pela jurisprudência e doutrina comunitárias como traduzindo o princípio segundo o qual as restrições acessórias a uma transacção que prossegue um objectivo legítimo (e compatível com as regras de concorrência) não serão contrárias às normas de proibição do direito da concorrência, desde que elas sejam necessárias à transacção principal. (ver nota 2)

Como o nome indica, são tratadas ao abrigo desta teoria cláusulas que constituem uma restrição ao comportamento de pelo menos uma das partes. Para que tais cláusulas possam beneficiar de uma apreciação favorável ao abrigo da teoria das restrições acessórias, devem estar presentes os seguintes elementos: em primeiro lugar, elas devem desempenhar um papel acessório face ao objecto principal do contrato; seguidamente, esse objecto principal deve ser compatível com o direito da concorrência; por último, deve ser demonstrada a necessidade da restrição acessória para garantir a realização do objecto do contrato, o que envolve um juízo quanto à intensidade e duração da restrição.

32 - Aplicando estes princípios à cláusula de confidencialidade e à cláusula de não concorrência, entende o Conselho da Concorrência que as mesmas preenchem, neste caso, os requisitos atrás enunciados, sendo de salientar que as mesmas não se configuram como restrições autonomizáveis do comportamento das partes, apresentando um nexo de subordinação razoável com o objecto do acordo, sendo também necessárias para garantir a sua realização.

Quanto a este último aspecto, a cláusula de não concorrência é necessária ao funcionamento do acordo, uma vez que garante o empenhamento das partes na prossecução dos objectivos do acordo, impedindo que uma ou ambas ponham em causa o seu cumprimento através de actividades concorrentes com as que são objecto da associação. Note-se ainda que esta obrigação apenas diz respeito às actividades previstas no contrato, não se estendendo ao conjunto de actividades desenvolvidas pelo INTERBANCO ou por sociedades do grupo SAG e deixando de fora a actividade da MULTIRENT. Por fim, a obrigação apenas vigora durante a vigência do acordo, garantindo a liberdade de actuação das partes após o fim da relação de participação.

33 - O mesmo entendimento é válido para cláusula de confidencialidade, que abrange apenas as informações transmitidas por uma parte a outra no âmbito das actividades objecto da associação. A protecção do valor do know-how cuja partilha constitui o fundamento do contrato de associação em participação torna indispensável que esta restrição subsista por um período razoável após o termo daquela relação contratual, no caso em apreço, cinco anos, sendo que a cláusula em questão não impede as partes de utilizarem essa informação na sua actividade.

4 - Conclusão

34 - À luz do exposto, o conselho da concorrência entende que, com base nos factos comunicados, o acordo notificado pelas partes não viola o disposto no artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro.

III - Decisão

Nos termos do disposto no n.º 1 da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro, o Conselho decide:

1.º Considerar que o acordo de associação em participação celebrado entre INTERBANCO, S. A., VOLKSWAGEN BANK, GmbH, SIVA, SGPS (actualmente, SAG GEST, SGPS) e João Pereira Coutinho não tem por objecto nem como efeito impedir, falsear ou restringir a concorrência, não havendo, por isso, qualquer violação do disposto no artigo 2.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro;

2.º Declarar a legalidade do contrato em conformidade com o disposto no parágrafo 2 do n.º 1 da Portaria 1097/93, de 29 de Outubro;

3.º Dar conhecimento da presente decisão aos requerentes do controlo prévio: INTERBANCO, S. A., VOLKSWAGEN BANK, GmbH, SIVA, SGPS (actualmente, SAG GEST, SGPS) e João Pereira Coutinho.

(nota 1) United States c. Addyston Pipe & Steel (1898), Federal Reporter, vol. 85, p. 271. Sobre esta decisão judicial e sua inserção no contexto do desenvolvimento da rule of reason, ver Robert H. BORK, The Antitrust Paradox - A Policy at War With Itself, The Free Press, Nova Iorque, 1978, pp. 26 a 30.

(nota 2) Sobre a aplicação da teoria das restrições acessórias no direito comunitário, ver F. Enrique GONZALES DIAZ, "Some Reflections on the Notion of Ancillary Restraints Under EC Competition Law", 1995 Fordham Corp. L. Inst. 325 (B. Hawk ed. 1996).

Lisboa, 5 de Julho de 2001. - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva (relator) - Fernando Ivo Gonçalves - José Álvaro Ubach Chaves Rosa - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete - José Anselmo Dias Rodrigues (presidente).

ANEXO E

Quadro sinóptico dos pareceres proferidos pelo Conselho em processos de concentração de empresas em 2000

ANEXO E1

Pareceres proferidos pelo Conselho em processos de concentração de empresas em 2000

(ver documento original)

Pareceres proferidos pelo Conselho em processos de concentração de empresas em 2001

(ver documento original)

ANEXO E1

Processo 1/2001 - Parecer proferido sobre a operação de concentração notificada por Porto Editora, S. A.

O Conselho de Concorrência, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 13.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, no procedimento relativo à operação de concentração notificada pela empresa Porto Editora, Lda., formula o seguinte:

PARECER

I - Objecto

1 - Em cumprimento do disposto no artigo 33.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, vem o Conselho da Concorrência apreciar se a operação de concentração notificada é susceptível de afectar negativamente a concorrência nos termos definidos no n.º 1 do artigo 10.º e ponderar a concreta verificação das condições previstas no n.º 2 do mesmo artigo.

II - Os factos

a) A operação notificada

2 - A Porto Editora pretende adquirir a totalidade do capital social da sociedade Areal Editores S. A. A operação descrita encontra-se sujeita a notificação prévia nos termos do artigo 7.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei 371/93, pois da mesma resulta a criação ou o reforço de uma quota superior a 30% no mercado nacional de determinados bens ou serviços.

3 - Com efeito, como decorre do relatório da DGCC, a quota de mercado detida ou a adquirir pela notificante no mercado nacional dos livros escolares é superior a 30%, tendo a operação notificada por efeito reforçar essa posição.

b) As empresas envolvidas na concentração

Porto Editora

4 - A Porto Editora Lda. faz parte do Grupo Porto Editora (ver nota 1), sendo detida em 73,54% por Urbagest, S. A. (empresa que pertence em 100% a 4 pessoas), em 15,92% pelo Bloco Gráfico, Lda., em 3,61% pela Livraria Arnado, Lda. e tendo uma quota própria de 1,03%. Por sua vez a Porto Editora, Lda. detém posições maioritárias nas Empresa Literária Fluminense, Lda. (90%), ComLivros, Lda. (99,6%), Bloco Gráfico, Lda. (98%) e Livraria Arnado, Lda. (53,3%).

5 - De acordo com a notificação, o Grupo Porto Editora tem actividade nas seguintes áreas de negócios:

Edição e distribuição de livros escolares;

Edição e distribuição de outros livros;

Edição e distribuição de produtos multimédia e videojogos;

Venda a retalho, em duas áreas, conforme o cliente: público em geral e professores;

Outras áreas (investimentos imobiliários e financeiros).

6 - Em 2000 ao volume de negócios total de 15 803 429 contos, o que, deduzido de 6 593 823 contos de vendas intragrupo, correspondeu um volume de negócios consolidado de 9 209 606 contos. Deste valor consolidado a área da edição e distribuição de livros escolares é responsável por cerca de 78% desse volume, assim distribuído:

... Em contos

Porto Editora ... 3 552 235

Emp. Literária Fluminense ... 2 181 150

Livraria Arnado ... 1 248 621

ComLivros ... 208 347

A distribuição dos livros escolares deste grupo é feita pela Porto Editora na zona Norte, pela Livraria Arnado na zona Centro, pela Fluminense na zona Sul, ficando a ComLivros encarregada da distribuição dos livros do 1.º ciclo do ensino básico.

Areal Editores

7 - A Areal Editores, S. A. (ver nota 2) é detida por 7 accionistas, estando 95% das acções na posse de um único accionista.

Tem como actividade a edição e distribuição de livros escolares e venda de material didáctico, constituído por mobiliário e material de apoio ao desenvolvimento de crianças, possuindo também uma loja de venda ao público desse material e, residualmente, dos livros escolares que edita. Tem uma participação (47%) na empresa Cubo Mágico - Actividades Publicitárias, Lda. da sendo esta destacada da Areal antes da operação de concentração.

8 - Em 2000 ao volume de negócios total de 1 066 613 contos correspondeu a venda de livros escolares (834 201 contos), de material didáctico (228 088 contos) e prestação de serviços (4 235 contos). A Areal distribui directamente cerca de 60% dos livros que edita, designadamente na região Norte, tendo nas demais um conjunto de distribuidores.

Mercado relevante

i) Do produto

9 - Quer a notificadora, quer a D.G.C.C., identificam como mercado relevante do produto a edição e distribuição de livros escolares destinados ao ensino básico e secundário, no qual existe portanto sobreposição entre a actividade das duas empresas. A DGCC considera que os livros escolares abrangem quer os manuais escolares quer os livros auxiliares.

10 - De acordo com o artigo 2.º do Decreto-Lei 369/90, de 26 de Novembro, "entende-se por manual escolar o instrumento de trabalho, impresso, estruturado e dirigido ao aluno, que visa contribuir para o desenvolvimento de capacidades, para a mudança de atitudes e para a aquisição dos conhecimentos propostos pelos programas em vigor, apresentando a informação básica correspondente às rubricas programáticas, podendo ainda conter elementos para o desenvolvimento de actividades de aplicação e avaliação da aprendizagem efectuada".

O Decreto-Lei 369/90 pretende definir uma política de manuais escolares que, salvaguardando o direito dos alunos e professores recorrerem a outras fontes de informação, se oriente por um conjunto de objectivos, de acordo com a Lei 46/86, de 14 de Outubro, Lei de Bases do Sistema Educativo -, e corresponder às exigências da entrada em vigor dos planos curriculares então definidos pelo Decreto-Lei. n.º 286/89, de 29 de Agosto, hoje revogado, e substituído pelo Decreto-Lei 6/2001, de 18 de Janeiro. Esta legislação contém uma série de disposições que consideramos de primordial interesse para este parecer e que abordaremos mais à frente.

11 - A Direcção Geral do Comércio e Concorrência, embora reconhecendo que os manuais escolares a utilizar nas diferentes disciplinas dos diferentes anos escolares, não sendo permutáveis pelo utilizador, constituem, em rigor, segmentos de mercado distintos, entende não se justificar tal segmentação, parecendo-lhe ajustado considerar como relevante o mercado do conjunto dos manuais e livros auxiliares, editados pela generalidade das editoras, e é nesta acepção que quantifica o mercado.

12 - Considera por outro lado que, dentro de uma diversidade de artigos não propriamente substituíveis entre si que constituem o mercado de material didáctico este deve ser considerado como único dentro da natureza da operação de concentração em causa. Consideramos não ter esta relevância que mereça apreciação no presente parecer, nos termos constantes do processo.

ii) Geográfico

13 - Sendo os livros escolares, no contexto deste processo, unicamente os elaborados de acordo com os programas em vigor estabelecidos pelo Ministério da Educação o correspondente mercado relevante geográfico é o mercado nacional.

d) A oferta

14 - A notificante, considerando não existirem dados estatísticos disponíveis, utilizou para quantificação do mercado a informação constante em Boletim de Preços de Manuais Escolares publicado anualmente pela DGCC, em Setembro, retirando daí conclusões quanto às quotas de mercado da Porto Editora e Areal, como sejam que em 2000 a quota média do Grupo Porto Editora seria de 29% e a da Areal 4%, salientando que as editoras não estão presentes em todos os graus de ensino e a sua posição relativa será variável consoante os graus de escolaridade em que operem.

A DGCC optou por solicitar ás várias editoras o seu volume de vendas de livros escolares nos anos de 1998, 1999 e 2000, expurgado dos montantes correspondentes à margem de distribuição, quando esta seja efectuada pela própria, por forma a que os respectivos valores sejam comparáveis em análise de mercado.

15 - Nos termos expostos a DGCC considerou que actuam como editoras de livros escolares 18 empresas (já tendo em conta a agregação de empresas do mesmo grupo).

Assim, e para as seis empresas com maior volume de vendas, a correspondente quota de mercado nos anos de 1998, 1999 e 2000 é a seguinte:

... 1998 (percetagem) ... 1999 (percetagem) ... 2000 (percentagem)

Porto Editora ... 39,7 ... 42,1 ... 42,4

Texto Editora ... 16,2 ... 15,6 ... 16,4

Grupo Plátano ... 10,0 ... 9,6 ... 9,3

Constância Editores (ver nota 3) ... 7,0 ... 6,6 ... 6,1

Areal Editores ... 6,1 ... 6,1 ... 5,2

Editorial O Livro (ver nota 4) ... 5,6 ... 5,3 ... 5,2

16 - Constata-se que estas 6 empresas têm uma quota conjunta de mercado de 84,6%, 85,3% e 84,3% para aqueles mesmos três anos. A quota de mercado para o conjunto das demais 12 empresas nunca excede os 15,7%. Considerando o conjunto Porto Editora/Areal Editores a correspondente quota de mercado para aqueles anos passará a ser de 45,8%, 48,2% e 47,6%.

17 - Os mapas que indicamos em anexo I (ver nota 5) podem traduzir e dar uma ideia do número de manuais escolares necessário em cada ano escolar.

18 - A venda de manuais escolares e livros auxiliares utilizáveis em cada disciplina ou actividade destinados aos vários anos de escolaridade obrigatória está sujeita a regime de preços especialmente definido (ver nota 6). Assim, através de convenção a acordar entre a Direcção-Geral do Comércio e Concorrência e as associações representativas do sector, ouvida a Direcção-Geral do Ensino Básico e Secundário, definem-se as actualizações de preços ou a fixação de preços dos manuais escolares para os diferentes graus de ensino e as regras e margens de comercialização. A convenção tem de ser ratificada pelos Secretários de Estado do Comércio e da Reforma Educativa e será aplicável aos manuais escolares destinados a serem utilizados no ano lectivo com inicio em 1 de Setembro seguinte à data da ratificação.

Na formação do preço de um livro escolar há a considerar as margens de comercialização de retalhista (livreiro) e do distribuidor, normalmente fixadas em termos percentuais sobre o PVP (preço de venda ao público), a margem do autor (variável de acordo com o contrato com o editor) e o preço de custo e de venda pelo editor.

e) A procura

19 - Deve ter-se presente que os manuais escolares são um bem essencial em cuja escolha os utilizadores não intervêm, sujeitando-se, outrossim, à escolha feita pelas várias escolas (ver nota 7), estando em causa na sua venda os interesses dos editores, autores, distribuidores, livreiros e utilizadores.

De facto, dentro do estabelecido pelo Decreto-Lei 369/90 (ver nota 8), constata-se que:

O Ministério da Educação constitui comissões científico-pedagógicas para apreciação da qualidade dos manuais escolares, com excepção dos relativos à disciplina de Educação Moral e Religiosa;

O Ministério da Educação atribui competências a serviços seus para promover a elaboração de critérios de selecção para apreciação dos manuais escolares, os quais terão em consideração não só a qualidade e adequação pedagógica mas também a sua robustez, o seu preço e a possibilidade da sua reutilização. Estes critérios são publicados conjuntamente com os progra mas relativos às disciplinas ou áreas disciplinares de cada ano de escolaridade e enviados às escolas e às associações representativas do sector editorial;

Os órgãos de gestão e administração das escolas do ensino público e o órgão de direcção técnico-pedagógico dos estabelecimentos particulares devem afixar, em modelo próprio, em locais de fácil acesso ao público, a lista dos manuais escolares adoptados, por disciplina ou área disciplinar, com a indicação do título, autor e editor;

A adopção dos manuais escolares é feita pelas escolas dos ensinos básico e secundário dentro das seguintes competências:

Estruturas de decisão pedagógica (1.º ciclo do ensino básico);

Conselhos pedagógicos, sob proposta dos conselhos de disciplina (os demais) devem ser consultadas as escolas situadas nas mesmas áreas pedagógicas ou em zonas geográficas vizinhas e podem associar-se para efeitos de escolha comum de manuais escolares;

Nos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo a adopção dos manuais escolares é da responsabilidade dos respectivos órgãos de direcção técnico-pedagógica, uma vez ouvidos os professores do estabelecimento.

É assim preponderante na escolha dos manuais adoptados a decisão das escolas, pelos seus órgãos próprios, ficando os alunos de cada estabelecimento de ensino obrigados a ser compradores/detentores dos manuais escolares seleccionados para serem os utilizados nas aulas desse estabelecimento.

20 - A adopção dos manuais escolares é válida por um período mínimo de quatro anos nos 1.º e 2.º ciclos do ensino básico e de três anos no 3.º ciclo do ensino básico e no ensino secundário, não sendo permitidas alterações à lista dos manuais adoptados depois da sua adopção e durante o período referido (ver nota 9). No final de cada período de adopção, as estruturas de decisão pedagógica no 1.º ciclo e os conselhos pedagógicos nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e no ensino secundário procedem à aprovação dos manuais escolares para o período seguinte, com vista à sua readopção ou substituição.

21 - Os órgãos de gestão e administração das escolas do ensino público e o órgão de direcção técnico pedagógico dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo devem remeter, em prazo fixado, à Direcção-Geral do Ensino Básico e Secundário a lista dos manuais escolares adoptados, com a indicação dos títulos, autores, editores e estimativa do número de exemplares necessários para os alunos de cada estabelecimento.

22 - A Direcção-Geral do Ensino Básico e Secundário envia nos 10 dias seguintes a lista dos manuais adoptados à Direcção-Geral do Comércio e Concorrência, a outras entidades do Ministério da Educação e às associações representativas do sector editorial. Deduz-se assim que a DGCC, a APEL (ver nota 10) e a UNEP (ver nota 11) têm ao seu dispor a listagem completa dos manuais adoptados, com indicação dos títulos, dos autores e editores.

23 - Têm interesse, como indicativos para a análise da procura, os elementos estatísticos que apresentamos para o ano lectivo de 1998-1999 (ver nota 12):

(ver documento original)

Não deixamos de referir que, de acordo com a mesma fonte, a educação pré-escolar abrangia, em 1998/99, 208 139 matriculados.

f) A posição das empresas concorrentes e das entidades do Ministério da Educação

23 - A DGCC solicitou posição sobre a operação de concentração em causa às várias editoras e empresas que actuam na área da comercialização, bem como ao Departamento da Educação Básica e Departamento do Ensino Secundário do Ministério da Educação. A UNEP, por iniciativa própria, também tomou posição.

24 - As empresas concorrentes da notificadora, com mais ou menos veemência, adoptaram a atitude de considerar que a operação só traz desvantagens e problemas como sejam:

Reforçar a posição no mercado e conduta já adoptada pela Porto Editora de uma "postura de arrogância face aos seus concorrentes, clientes e fornecedores";

Condicionar a liberdade de formação da oferta e da procura;

Não beneficiar "a livre concorrência e os interesses dos consumidores";

Colocar-se "em risco a independência e a diversidade dos manuais escolares";

Ser "prejudicial ao mercado no que respeita à pluralidade da oferta e preços de venda";

Poder conduzir ao encerramento de algumas editoras;

Dela resultar um reforço de posição dominante no mercado com todos os inconvenientes;

Ser considerada ilegal face à lei;

Ter efeitos nefastos no que se relaciona com os autores de livros escolares;

Passar a Comissão do Livro Escolar (formada pela Porto Editora, Areal e Didáctica Editores), que representa a APEL junto das entidades oficiais, a ser dominada pela Porto Editora.

25 - A UNEP - União dos Editores Portugueses toma posição, manifestando preocupação pelo poder económico da Porto Editora, que diz "também se prepara para adquirir a Lisboa Editora"(?). Considera que a concentração "colocará em perigo os interesses dos consumidores e o equilíbrio das relações entre os agentes económicos, ficando os autores sujeitos a ameaças pelo abuso de dependência económica que pesará sobre eles".

26 - O Departamento do Ensino Secundário admite que a concentração "poderá ocasionar uma diminuição do leque de escolha por parte das escolas e demais profissionais da área". O Departamento da Educação Básica considera principal problema "a hipotética insuficiência do número dos diversos manuais da editora Areal existentes em estoque", o que não permitiria o abastecimento nos anos seguintes dentro dos períodos de vigência legais.

g) Audiência escrita

27 - A DGCC, dentro dos factos, procedeu a uma audiência escrita(ver nota 19) à notificadora, comunicando, em resumo, que a operação lhe suscitava reservas, dado a Porto Editora deter posição de preponderância no mercado pela sua quota de 42%, dado da operação resultar o reforço nesse mercado pela quota detida pela Areal Editores, dado também o facto de reforçar a sua capacidade de angariar os melhores autores, enfraquecendo as pequenas editoras. Da resposta da Porto Editora destacamos o realçar esta a forte posição no mercado que tem a Texto Editora, empresa colocada em segundo lugar, e sobre o que fornece vários elementos, o referir estar a Areal Editora em dificuldades, tendo no último exercício prejuízos, ter quota de mercado em sentido descendente, estando em situação económica e financeira débil, contribuindo a concentração para garantir a continuidade da Areal, e referindo, finalmente, que a operação nada altera no que se relaciona com a problemática dos autores de livros escolares.

h) A posição da Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência

28 - Destacam-se como relevantes na sua informação e despachos nela exarados:

Além das normais dificuldades de implementação num dado mercado, acresce, neste, a imprescindíbilidade dos contactos e conhecimentos pessoais com os autores que regra geral são professores e em alguns casos responsáveis ou com capacidade de influenciar a selecção e aquisição dos manuais por parte das escolas;

A fidelidade, a situação de estabilidade de colaboração entre os autores de livros escolares e as suas editoras que se verifica, e que é admitida pela própria Porto Editora, limita fortemente o leque de escolha apenas a novos autores, constituindo, nessa medida, uma dificuldade acrescida para a conquista de partes de mercado;

Os autores são o elemento fundamental, incontornável, para o desenvolvimento e sucesso de qualquer editora;

Há eventuais perigos anticoncorrenciais uma vez que, a nível dos preços, a regulação existente incide só nas actualizações e não nas novas adopções;

A operação suscita reservas.

III - Apreciação jurídica e económica

a) A operação de concentração

29 - A aquisição pela Porto Editora da totalidade do capital social da Areal Editores constitui uma concentração de empresas em face do disposto no artigo 9.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro.

Considerando o mercado nacional de edição de livros escolares encontra-se preenchido o requisito da alínea a) do n.º 1 do artigo 7.º do mesmo diploma, que determina a notificação prévia da operação de concentração e, não tendo esta dimensão comunitária, pode aplicar-se a legislação nacional.

b) A apreciação prevista no artigo 33.º, n.º 1, do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro

30 - Compete ao Conselho da Concorrência apreciar se a operação de concentração em apreço é susceptível de afectar negativamente a concorrência nos termos definidos pelo n.º 1 do artigo 10.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, ou seja, importa apurar se a aquisição pela Porto Editora da totalidade do capital social da Areal Editores se deve considerar proibida por criar ou reforçar uma posição dominante no mercado nacional de determinado bem ou serviço, ou numa parte substancial deste, susceptível de impedir, falsear ou restringir a concorrência.

i) O mercado relevante

31 - Quanto à delimitação material do mercado tanto a notificadora como a DGCC consideram ser este o da edição e distribuição de livros escolares destinados ao ensino básico e secundário. Porém, na avaliação de quota de mercado, divergem na sua abordagem e, de facto, devemos debruçar-nos com um pouco mais de atenção sobre o mercado dos livros escolares aprovados e suas características próprias.

32 - A DGCC, tomando como base o volume de vendas das editoras (sem contemplar a margem atribuída à função distribuição), considera que a quota de mercado da Porto Editora no mercado da edição de livros escolares (compreendendo os manuais escolares e os livros auxiliares), nos anos de 1998-1999-2000, foi, respectivamente, de 39,7%-42,1%-42,4%(ver nota 20). Se quisermos considerar o mercado da edição e distribuição de livros escolares, e distribuindo a notificadora directamente a totalidade dos livros que edita (ver nota 21), a quota da Porto Editora neste mercado, dentro do critério adoptado pela DGCC, será maior, igual ou menor que no mercado da edição consoante tenha uma margem atribuída à função distribuição superior, igual, ou inferior à adoptada pelas demais editoras consideradas (ver nota 22). Seja porém considerado o mercado da edição, ou o mercado da edição e distribuição, as quotas de mercado são sempre superiores aos 30%, sendo a posição no mercado da edição reforçada com a aquisição da Areal Editores, passando para uma quota de 47,6% no ano 2000.

33 - A Porto Editora, considerando não dispor de dados estatísticos disponíveis, recorreu a uma publicação da DGCC (ver nota 23) para quantificar as suas quotas de mercado. A DGCC, não concordando com a metodologia, reconhece porém que os manuais escolares a utilizar nas diferentes disciplinas dos diferentes anos escolares, não são permutáveis pelo utilizador, constituindo, em rigor, segmentos de mercado distintos (ver nota 24). De facto, para os utilizadores:

Os livros escolares do ensino básico não são permutáveis com os do ensino secundário;

Os livros do 1.º ciclo do ensino básico não são permutáveis com os do 2.º ou 3.º ciclo, e vice-versa;

Os livros de um dos 4 anos do 1.º ciclo do ensino básico não são permutáveis com os de outro dos 3 anos desse 1.º ciclo;

Num mesmo ano do 1.º ciclo um livro de cada área curricular disciplinar não é permutável com um livro de outra área disciplinar do mesmo ano ( por exemplo, Língua Portuguesa por Matemática, ou outras).

O mesmo raciocínio podemos aplicar a qualquer um dos anos dos ciclos do ensino básico e ensino secundário.

34 - Assim sendo, teria todo o interesse estabelecer, para os vários segmentos do mercado, a posição ocupada pelas editoras, o que não foi feito pela DGCC. E tal seria perfeitamente possível pois, como já atrás referido, a DGCC tem ao seu dispor (bem como está à disposição da APEL e UNEP) a listagem completa dos manuais adoptados em cada ano lectivo, por disciplina ou área disciplinar, com indicação dos títulos, dos autores e dos editores (ver nota 25), podendo, eventualmente, ter também acesso à estimativa do número de exemplares necessários para os alunos dos estabelecimentos de ensino.

35 - O mercado geográfico relevante é, dentro da especificidade de um produto que é determinada pelo Ministério da Educação, o mercado nacional.

ii) A criação ou reforço de uma posição dominante susceptível de impedir, falsear ou restringir a concorrência

36 - Feita a delimitação do mercado relevante, cabe apreciar se a operação de concentração notificada implica a criação ou o reforço de uma posição dominante em tal mercado, susceptível de impedir, falsear ou restringir a concorrência. Corresponde isto a dizer que se trata de averiguar se a aquisição da totalidade do capital social da Areal pela Porto Editora é passível de gerar para esta um determinado grau de poder de mercado que até aí não existia (criação) ou de fortalecer um apreciável grau de poder de mercado já existente (reforço) (ver nota 26).

37 - Antes da aquisição, a Porto Editora detém, desde logo, um forte poder de mercado. Na acepção da editora que ocupa a 2.ª posição no mercado "A Porto Editora é há cerca de 40 anos a editora mais poderosa do mercado. Esse poder económico que nasceu na época do livro único (Estado Novo) e que continuou depois, permitiu-lhe uma acumulação de capital de tal forma impressionante que correntemente é conhecida na "concorrência" pela designação de "o banco". Esta situação não tem qualquer paralelo com os demais editores concorrentes"(ver nota 27).

38 - Esse poder adquirido no mercado do livro escolar não lhe permite porém agir hoje de forma independente no mercado concorrencial pois de facto constata-se, como já atrás referimos, que:

O produto manual escolar está sujeito a critérios de selecção para a sua apreciação que têm em consideração não só a adequação pedagógica mas também a sua robustez, preço e possibilidade de reutilização (ver nota 28);

Existem constituídas comissões científico-pedagógicas para a apreciação dos manuais escolares que integram especialistas de reconhecida competência, sem quaisquer interesses directos em empresas editoras, e organizadas por ciclo de ensino e por disciplina ou área disciplinar, podendo as empresas editoras inserir na capa ou contracapa do manual a indicação do resultado da sua apreciação, bem como difundir esse resultado na comunicação social ou por outros meios (ver nota 29);

A adopção dos manuais escolares para qualquer escola dos ensinos básico ou secundário (e nos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo) é feita por órgão próprio da própria escola (ver nota 30);

A venda de manuais escolares (e livros auxiliares) de cada disciplina ou actividade destinados aos vários anos de escolaridade obrigatória está sujeita a regime especial de preços (ver nota 31).

39 - Tomando como exemplo o caso do 1.º ciclo do ensino básico, a cada ano desse ciclo, correspondem, pelo menos, um livro de Língua Portuguesa, um livro de Matemática, um livro de Estudo do Meio, além de outros. Para os 9957 estabelecimentos de ensino básico existentes em 1996/97, com 36 800 docentes e 500 823 alunos (ver nota 32), cada um desses estabelecimentos pode adoptar o livro (dentro dos critérios estabelecidos) que entenda para cada uma das disciplinas e para cada um dos 4 anos do ciclo. Assim ficamos com uma ideia da atomização na escolha a que está sujeita, para adopção, a oferta dos manuais escolares das diferentes editoras, que os apresentam dentro dos critérios estabelecidos pelo Ministério da Educação e a que fizemos referência. O mesmo se dirá para os dois outros ciclos do ensino básico, com muito mais disciplinas e áreas curriculares disciplinares (ver nota 33), bem como para o ensino secundário.

40 - Tem interesse debruçar-nos sobre a problemática dos autores de livros escolares, questão que suscita fortes reservas nas posições tomadas pela DGCC relativamente a esta operação de concentração. Relembramos destacar esta (ver nota 34) "a imprescindibilidade dos contactos e conhecimentos pessoais com os autores que regra geral são professores e em alguns casos responsáveis ou com capacidade de influenciar a selecção e aquisição dos manuais por parte das escolas" e que a operação "limita fortemente o leque de escolha apenas a novos autores, constituindo, nessa medida, uma dificuldade acrescida para a conquista de partes de mercado", afirmando-se "que os autores são o elemento fundamental, incontornável, para o desenvolvimento e sucesso de qualquer editora".

Embora admitamos ser muito importante para as editoras ter bons e considerados autores de livros escolares (como o é em qualquer actividade poder dispor-se de profissionais conceituados e qualificados), não deixa de ser preocupante o facto de, a confirmar-se, ser imprescindível dispor de contactos e conhecimentos pessoais dos autores de livros escolares para influenciar a selecção e aquisição dos manuais por parte das escolas. Se, mau grado tudo o legislado para estabelecer os critérios que devem presidir à selecção de manuais escolares, para garantir não só a qualidade e adequação pedagógica destes, como também, a sua robustez, o seu preço e a possibilidade da sua reutilização, for aquele um factor determinante na escolha dos manuais escolares adoptados nas escolas, algo está errado e estará aqui em causa um problema que não cai no âmbito da aplicação da legislação da concorrência, que não poderá contribuir para o resolver, antes não à regionalização! de outro tipo de actuação por parte do poderes públicos. E vem a propósito destacar o que pode ler-se, por constar do processo (ver nota 35), a propósito de campanhas para a venda de livros escolares envolvendo a distribuição de brindes.

41 - A Areal Editores tem uma quota no mercado de edição de livros escolares, em 1998-1999-2000, de 6,1%-6,1% e 5,2% respectivamente, como anteriormente referido. A sua oferta de livros não cobre por forma uniforme os vários ciclos do ensino básico e o ensino secundário, estando mesmo ausente no 1.º ciclo do ensino básico e só marginalmente presente no 2.º ciclo, isto em comunicação da Porto Editora. Não é porém possível testar o significado dessa sua presença, como atrás clarificámos (ver nota 36).

Assim, sendo evidente que a operação faria subir em 2000 a quota de mercado da Porto Editora de 42,4% para 47,6%, não se tem por evidente qual o reforço da posição desta nos vários segmentos de mercado, inclusive qual o corpo de seus autores que vêm reforçar em áreas de ensino os que já trabalham com a Porto Editora.

42 - De qualquer modo, e por tudo o exposto, consideramos que a concentração não é passível de gerar para a Porto Editora um grau de poder de mercado que até aí não existia ou fortalecer um apreciável grau de poder de mercado já existente susceptível de afectar a concorrência.

43 - Também não deixamos de assinalar que preocupações manifestadas (ver nota 37) como seja passar a Comissão do Livro Escolar (formada pela Porto Editora, Areal Editora e Didáctica Editores), que representa a APEL junto das entidades oficiais, a ser dominada pela Porto Editora, por certo que não deixará de originar a necessária reformulação da constituição daquela comissão, bem como não deixará de merecer a atenção das editoras a hipotética insuficiência de número de manuais em estoque da Areal (ver nota 38).

44 - Tudo ponderado, nas concretas condições do mercado como resultam dos factos carreados para o processo, não se afigura que a concentração permita à Porto Editora/Areal Editora reforçar uma posição dominante susceptível de impedir, falsear ou restringir a concorrência no mercado nacional de edição de livros escolares, não se verificando, deste modo, os pressupostos da proibição cominada no n.º1 do artigo 10.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro.

i) A apreciação prevista no artigo 33.º, n. do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro

45 - Independentemente da conclusão a que chegue quanto à proibição da operação de concentração em face do n.º 1 do artigo 10.º do Decreto-Lei 371/93, deve o Conselho ponderar se em concreto estão verificadas as condições previstas no n.º 2 do mesmo artigo (ver nota 39).

Constata o Conselho que, apesar de alguns elementos constantes do processo, nem a notificante preencheu o ónus da prova que lhe competia, nem a DGCC obteve, ao abrigo dos n.os 2 e 5 do artigo 31.º do Decreto-Lei 371/93, de 29 de Outubro, elementos complementares que permitissem ao Conselho realizar uma apreciação concludente das referidas condições.

46 - Não é assim possível considerar fundamentadamente verificados nem os pressupostos do artigo 5.º do Decreto-Lei 371/93(ver nota 40), nem o reforço da competitividade internacional das empresas participantes na operação de concentração.

Conclusões

Em conclusão, entende o Conselho:

a) Que a operação de concentração não permite à Porto Editora/Areal Editores reforçar uma posição dominante susceptível de impedir, falsear ou restringir a concorrência no mercado nacional da edição de livros escolares;

b) Que não estão reunidos elementos suficientes para estabelecer um balanço económico;

c) Que não pode afirmar-se que da concentração resulte o reforço significativo da competitividade internacional das empresas participantes na concentração.

(nota 1) V. p. 81 do processo.

(nota 2) V. p. 82 do processo

(nota 3) Participada do grupo espanhol Santillana.

(nota 4) Tem parceria com o grupo espanhol Anaya.

(nota 5) Mapas que constituem os anexos I, II e III do Decreto-Lei 6/2001, de 18 de Janeiro.

(nota 6) Estabelecido pela Portaria 186/91, de 4 de Março.

(nota 7) Tal como referido no preambulo da Portaria 186/91, de 4 de Março, que estabelece o regime de preços para os manuais escolares.

(nota 8) O Decreto-Lei 396/90, de 26 de Novembro, estabelece o sistema de adopção e o período de vigência dos manuais escolares correspondentes aos programas de cada uma das disciplinas e áreas disciplinares dos ensino básico e secundário.

(nota 9) Excepto nas situações anormais referidas no n.º 2 do artigo 4.º de Decreto-Lei 369/90.

(nota 10) APEL Associação Portuguesa dos Editores e Livreiros.

(nota 11) UNEP União dos Editores Portugueses.

(nota 12) Valores retirados de "A Situação social em Portugal", vol. II, organização de António Barreto, edição Imprensa de Ciências Sociais.

(ver notas referentes no documento original)

(nota 19) V. pp. 101 a 107 do processo.

(nota 20) V. pontos 15 e 16 do presente parecer.

(nota 21) V. ponto 6 do parecer.

(nota 22) No processo a Porto Editora refere adoptar uma margem de 20% sobre o PVP, sem IVA, indica que Areal aplica uma margem de 25% e que a maior parte dos editores escolares, com distribuição própria ou externa, adoptam a margem de 35% (pp. 50 e 51 do processo).

(nota 23) V. ponto 14 deste parecer.

(nota 24) V. ponto 11 do parecer e p. 12 do processo.

(nota 25) Dentro de disposto no artigo 8.º do Decreto-Lei 369/90, de 26 de Setembro, e como referido nos pontos 22 e 23 deste parecer.

(nota 26) Na mesma linha de apreciação em anteriores pareceres do Conselho da Concorrência, como seja Anexo E1, a p. 107/108, do Relatório de Actividades de 1999.

(nota 27) V. carta dessa empresa a fl. 84 do processo.

(nota 28) Artigo 7.º do Decreto-Lei 369/90, de 26 de Novembro.

(nota 29) Artigo 6.º do Decreto-Lei 369/90.

(nota 30) Artigo 5.º do Decreto-Lei 369/90.

(nota 31) Portaria 186/91, de 4 de Março, e artigo 12.º do Decreto-Lei 369/90.

(nota 32) De "A Situação Social em Portugal 1960-1999", edição da Imprensa de Ciências Sociais.

(nota 33) Conforme se constata dos mapas que apresentamos em anexo I.

(nota 34) V. ponto 28 deste parecer.

(nota 35) V. p. 63, fotocópia de texto publicado na revista "Fortuna e Negócios" em que se refere a campanha "Adoptou, ganhou", na qual os professores que adoptassem determinados livros recebiam brindes em troca.

(nota 36) V. pontos 33 e 34 deste parecer.

(nota 37) V. ponto 24 deste parecer.

(nota 38) V. ponto 26 do parecer.

(nota 39) Para além do constante em anteriores pareceres emitidos pelo Conselho, "o cumprimento cumulativo das duas obrigações de apreciação impostas pelo artigo 33.º, mesmo nos casos em que não se dá por verificada a situação que implica a intervenção de tais clausulas justificativas do n.º 2.º do artigo 10.º é perfeitamente compreensível "na medida em que se destina a dar suporte a uma decisão de outra entidade (o "ministro responsável pela área do comércio" - cf. artigos 32.º e 34.º do mencionado diploma): a entidade com poderes decisórios pode exercê-los com base em qualquer das apreciações do Conselho, aceitando umas e não aceitando outras, tem é de dispor de todas elas. - Calvete ,V., "Da relevância de considerações de eficiência no controlo de concentrações em Portugal", AB VNO OMNES - 75 anos da Coimbra Editora, Coimbra, 1998, pp. 305 e 349/350.

(nota 40) Como determina a alínea a) do n.º 2 do artigo 10.º

Lisboa, 20 de Agosto de 2001. - José Alvaro Ubach Chaves Rosa (relator) - Victor João de Vasconcelos Raposo Ribeiro Calvete - Miguel José Pinto Tavares Moura e Silva - Carolina de Castro Nunes Vicente e Cunha - José Anselmo Dias Rodrigues (presidente).

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2047754.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1981-07-28 - Decreto-Lei 231/81 - Ministérios da Justiça e das Finanças e do Plano

    Estabelece o regime jurídico dos contratos de consórcio e de associação em participação.

  • Tem documento Em vigor 1982-10-27 - Decreto-Lei 433/82 - Ministério da Justiça

    Institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo.

  • Tem documento Em vigor 1983-12-03 - Decreto-Lei 422/83 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministérios da Justiça, das Finanças e do Plano, da Agricultura, Florestas e Alimentação, da Indústria e Energia e do Comércio e Turismo

    Estabelece disposições relativas à defesa da concorrência no mercado nacional.

  • Tem documento Em vigor 1985-10-25 - Decreto-Lei 446/85 - Ministério da Justiça

    Aprova o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais.

  • Tem documento Em vigor 1986-10-14 - Lei 46/86 - Assembleia da República

    Aprova a lei de bases do sistema educativo.

  • Tem documento Em vigor 1990-11-26 - Decreto-Lei 369/90 - Ministério da Educação

    Estabelece o sistema de adopção, o período de vigência e o regime de controlo de qualidade dos manuais escolares.

  • Tem documento Em vigor 1990-12-11 - Decreto-Lei 396/90 - Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

    Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 89/440/CEE (EUR-Lex), do Conselho, de 18 de Julho relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas.

  • Tem documento Em vigor 1991-03-04 - Portaria 186/91 - Ministérios da Educação e do Comércio e Turismo

    Estabelece o regime a que deverá obedecer a fixação dos preços dos manuais escolares e livros auxiliares utilizáveis em cada disciplina de actividade destinados aos vários anos de escolaridade obrigatória.

  • Tem documento Em vigor 1991-04-10 - Decreto-Lei 142-A/91 - Ministério das Finanças

    Aprova o Código do Mercado de Valores Mobiliários.

  • Tem documento Em vigor 1991-05-15 - Portaria 407/91 - Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação

    Sujeita ao regime cinegético especial os prédios rústicos denominados "Quinta do Leão" e outras, sitos na freguesia de Vieiros, concelho de Estremoz e "Herdade da Gafa" e outras, sitos na freguesia e concelho de Monforte e concessiona, pelo período de dez anos, a zona de caça turística da Herdade da Quinta do Leão e anexas (processo nº 562-DGF).

  • Tem documento Em vigor 1992-12-31 - Decreto-Lei 298/92 - Ministério das Finanças

    Aprova o regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras.

  • Tem documento Em vigor 1993-10-29 - Decreto-Lei 370/93 - Ministério do Comércio e Turismo

    PROÍBE PRÁTICAS INDIVIDUAIS RESTRITIVAS DE COMERCIO, NOMEADAMENTE NO QUE SE REFERE A APLICAÇÃO DE PREÇOS OU DE CONDICOES DE VENDA DISCRIMINATÓRIAS, AS TABELAS DE PREÇOS E CONDICOES DE VENDA, A VENDA COM PREJUÍZO E A RECUSA DE VENDA DE BENS OU DE PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS. ESTABELECE O REGIME SANCIONATÓRIO E A FISCALIZAÇÃO DAS REFERIDAS PRÁTICAS QUE COMPETE A INSPECCAO-GERAL DAS ACTIVIDADES ECONÓMICAS E FIXA COIMAS PARA AS INFRACÇÕES VERIFICADAS. ESTE DIPLOMA ENTRA EM VIGOR NO DIA 1 DE JANEIRO DE 1994.

  • Tem documento Em vigor 1993-10-29 - Portaria 1097/93 - Ministério do Comércio e Turismo

    DEFINE OS TERMOS EM QUE O CONSELHO DA CONCORRENCIA PODE DECLARAR A LEGALIDADE OU ILEGALIDADE DE ACORDOS OU PRÁTICAS CONCERTADAS, DE EMPRESAS, OU DE QUALQUER DECISÃO DE ASSOCIAÇÃO DE EMPRESAS, ASSIM COMO A VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS DE JUSTIFICAÇÃO PREVISTOS NO NUMERO 1 DO ARTIGO 5 DO DECRETO LEI NUMERO 371/93, DE 29 DE OUTUBRO.

  • Tem documento Em vigor 1993-10-29 - Decreto-Lei 371/93 - Ministério do Comércio e Turismo

    ESTABELECE O REGIME GERAL DA DEFESA E PROMOÇÃO DA CONCORRENCIA, O QUAL SE APLICA A TODAS AS ACTIVIDADES ECONÓMICAS EXERCIDAS COM CARÁCTER PERMANENTE OU OCASIONAL NOS SECTORES PRIVADO, PÚBLICO E COOPERATIVO (EXCEPTUANDO-SE AS RESTRIÇÕES DECORRENTES DE LEI ESPECIAL) DESIGNADAMENTE NO ATINENTE AS PRÁTICAS PROIBIDAS AS CONCENTRACOES DE EMPRESAS E AOS AUXÍLIOS DE ESTADO. COMETE A DIRECÇÃO GERAL DE CONCORRENCIA E PREÇOS E AO CONSELHO DA CONCORRENCIA A DEFESA DA CONCORRENCIA, AOS QUAIS DEFINE COMPETENCIAS NESTA ÁR (...)

  • Tem documento Em vigor 1994-06-15 - Decreto-Lei 168/94 - Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

    APROVA AS BASES DA CONCESSAO DA CONCEPCAO, DO PROJECTO, DA CONSTRUCAO, DO FINANCIAMENTO, DA EXPLORAÇÃO E DA MANUTENÇÃO DA NOVA TRAVESSIA SOBRE O RIO TEJO EM LISBOA, BEM COMO DA EXPLORAÇÃO E DA MANUTENÇÃO DA ACTUAL TRAVESSIA, AS QUAIS CONSTITUEM O ANEXO I AO PRESENTE DIPLOMA. ATRIBUI AO CONSORCIO LUSOPONTE A REFERIDA CONCESSAO, MEDIANTE A CELEBRACAO DE DOIS CONTRATOS, NOS TERMOS DO PRESENTE DIPLOMA E DAS RESPECTIVAS BASES. A PROPOSTA DE CONCESSAO FOI ADJUDICADA A ESTE CONSORCIO POR DESPACHO CONJUNTO (DIDC74/ (...)

  • Tem documento Em vigor 1995-02-15 - Decreto-Lei 40/95 - Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

    Aprova as bases da concessão do serviço público de telecomunicações a celebrar com a Portugal TELECOM, S.A.

  • Tem documento Em vigor 1997-08-01 - Lei 91/97 - Assembleia da República

    Define as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de redes de telecomunicações e a prestação de serviços de telecomunicações. Consagra o princípio da liberalização das telecomunicações, competindo ao Estado assegurar a existência, disponibilidade e qualidade de uma rede pública de telecomunicações endereçadas denominada "rede básica".

  • Tem documento Em vigor 1999-07-30 - Decreto-Lei 290-A/99 - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território

    Estabelece as condições gerais a que obedece a exploração de redes públicas de telecomunicações no território nacional tendo em vista a oferta de rede aberta, incluindo a oferta de circuitos alugados.

  • Tem documento Em vigor 1999-11-13 - Decreto-Lei 486/99 - Ministério das Finanças

    Aprova o novo Código dos Valores Mobiliários.

  • Tem documento Em vigor 2000-09-09 - Decreto-Lei 219/2000 - Ministério do Equipamento Social

    Aprova a reestruturação da Portugal Telecom, S. A..

  • Tem documento Em vigor 2001-01-18 - Decreto-Lei 6/2001 - Ministério da Educação

    Aprova a reorganização curricular do ensino básico.

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