Clínica Internacional de Campo de Ourique
Pub

Outros Sites

Visite os nossos laboratórios, onde desenvolvemos pequenas aplicações que podem ser úteis:


Simulador de Parlamento


Desvalorização da Moeda

Acórdão 444/2001/T, de 16 de Novembro

Partilhar:

Texto do documento

Acórdão 444/2001/T. Const. - Processo 6/CPP.

Acta

Aos 17 dias de Outubro de 2001, achando-se presentes o Exmo. Conselheiro Presidente José Manuel Moreira Cardoso da Costa e os Exmo.s Conselheiros Tavares da Costa, Bravo Serra, Luís Nunes de Almeida, Artur Maurício, Paulo Mota Pinto, José de Sousa e Brito, Guilherme da Fonseca, Maria Fernanda Palma, Maria Helena de Brito e Maria dos Prazeres Beleza, foram trazidos à conferência os presentes autos de apresentação de contas dos partidos políticos, relativas ao ano de 1998, para neles ser apreciado o que o Ministério Público nos mesmos promove, em matéria contra-ordenacional.

Após debate e votação, foi ditado pelo Exmo. Presidente o seguinte:

Acórdão 444/2001

I - Relatório. - 1 - Findo o prazo para entrega das contas dos diversos partidos políticos relativas ao ano de 1998, verificou este Tribunal, pelo seu Acórdão 536/99 (inédito), que alguns dos partidos inscritos no competente registo não haviam apresentado aquelas contas. Em relação a esses, e nos termos do disposto no artigo 103.º-A, n.º 1, da LTC, ordenou esse acórdão que se desse vista ao Ministério Público para promover o que entendesse relativamente a tal omissão.

Na sequência dessa notificação e subsequente vista, o Ministério Público veio promover, em 25 de Outubro de 1999, que, verificada a omissão ilícita e culposa do cumprimento do dever cominado no n.º 1 do artigo 13.º da Lei 72/93, de 30 de Novembro, fosse aplicada a correspondente coima, a graduar dentro dos limites abstractos estabelecidos no n.º 1 do artigo 14.º da mesma lei, em conformidade com os critérios estabelecidos no artigo 18.º de Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro, e a apurar, designadamente, em função também das respostas que viessem a ser apresentadas, aos seguintes partidos políticos: Partido da Democracia Cristã (PDC), Frente Socialista Popular (FSP), Partido Renovador Democrático (PRD) e Movimento o Partido da Terra (MPT).

2 - Entretanto, realizada a auditoria ordenada por este Tribunal às contas dos restantes partidos políticos, foram detectadas diversas possíveis irregularidades pelo Acórdão 262/2000 (inédito), que ordenou a notificação aos partidos em causa, para prestarem os esclarecimentos que entendessem, tendo-o feito o Partido Socialista (PS), o Partido Social-Democrata (PSD), o Partido Popular (CDS-PP), o Partido Comunista Português (PCP), o Partido de Solidariedade Nacional (PSN), o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP), a Frente de Esquerda Revolucionária (FER), o Partido Política XXI (PXXI), o Partido Ecologista Os Verdes (PEV) e o Partido Democrático do Atlântico (PDA).

Este último terminou a sua resposta solicitando um prazo suplementar de 30 dias para prestar esclarecimentos relativos à organização da sua contabilidade, tendo, por despacho de 12 de Julho de 2000, sido deferido um prazo de 15 dias para o efeito, atento o período de tempo entretanto também já decorrido.

Posteriormente, pelo acórdão 578/2000 (Diário da República, 1.ª série-A, de 12 de Março de 2001), o Tribunal apreciou e julgou as contas apresentadas, tendo julgado não prestadas as contas do PDA, dada a natureza das irregularidades de que padeciam, e tendo julgado prestadas as contas dos restantes partidos, embora, quanto a quase todos eles (foram excepção o PEV e o POUS) com irregularidades. Tendo em conta que nesse acórdão reconhecia a existência de irregularidades nas contas em causa, ordenou o Tribunal a notificação do Ministério Público, nos termos do disposto no artigo 103.º-A da LTC, para os efeitos aí previstos.

Entretanto, veio o PDA reclamar desse acórdão, por entender que se verificava uma "contradição" nos termos do aresto, "porquanto ele próprio admite que parte dessas contas estão correctamente elaboradas embora com [...] deficiências", o que é diverso de "contas inexistentes".

Este Partido sustentou na sua reclamação que, e face às anteriores recomendações do Tribunal Constitucional, "toda a escrita passou a ser entregue a uma equipa de profissionais, legalmente habilitados [...], tendo as respectivas contas sido enviadas a este areópago, como prova, aliás em parte reconhecida por este douto acórdão reclamado", e que, no tocante aos procedimentos internos de controlo, "estes existem desde sempre, visto que os orçamentos são aprovados anualmente pela Comissão Política, bem como as respectivas contas precedidas de visto favorável do conselho fiscal"; por fim, afirmou ainda que "outros mecanismos de controlo se não antevêem para fiscalizar os pagamentos de electricidade e telefone, duas ou três viagens entre ilhas antes ou durante eleições, e respectivos alojamentos e alimentação", tudo controlado de perto num partido pequeno e de poucos recursos, encontrando-se todos os registos contabilísticos devidamente arquivados e prontos a serem inspeccionados. E juntou ainda cópias de duas actas, relativas à aprovação das contas dos anos de 1998 e 1999.

O Tribunal Constitucional desatendeu esta reclamação pelo seu Acórdão 51/2001, no qual se entendeu o seguinte:

"Com efeito, e no que toca à alegação, pelo reclamante, de factos e circunstâncias com os quais se pretende contraditar a factualidade que o Tribunal deu por assente, é óbvio que uma reclamação ou pedido de reforma da decisão não é meio adequado para tal. A oportunidade processual para tanto ocorreu quando o partido reclamante foi notificado para se pronunciar sobre os resultados da auditoria (que o Tribunal teve por relevantes, no seu Acórdão 262/2000, de 2 de Maio) - oportunidade que efectivamente utilizou, havendo disposto para o efeito, de resto, de prazo que, a sua solicitação, foi inclusivamente prorrogado. Em qualquer caso, e não obstante o que fica dito, sempre se acrescentará que nada do que vem agora alegado põe em causa as conclusões e o juízo a que o Tribunal chegou.

Por outro lado, e quanto à pretensa 'contradição' do acórdão reclamado, é bom de ver que ele não ocorre: é que o Tribunal não disse, em lugar algum desse aresto, que as contas do partido reclamante, 'em parte', estavam 'correctamente elaboradas', embora com deficiências; o que disse, sim, foi que essas contas, ou o respectivo suporte documental e de controlo, apresentavam deficiências tais, que as mesmas não podiam julgar-se prestadas."

Por sua vez, veio o PCP, "tendo tomado conhecimento da interpretação dada pelo Tribunal Constitucional quanto à adequação das listas do património imobiliário ao disposto no n.º 5 do artigo 10.º da Lei 72/93", apresentar requerimento no sentido de "suprir a deficiência/insuficiência considerada por esse Tribunal, apresentando nova lista de património imobiliário, relativa às contas de 1998".

Por despacho de 8 de Fevereiro de 2001, o Presidente do Tribunal Constitucional, embora ordenando a junção da lista em causa aos autos, "para outros eventuais efeitos", considerou que a mesma "já não pode ser considerada na apreciação das contas relativas a 1998 - além do mais porque o correspondente acórdão já transitou relativamente ao partido requerente".

3 - Na sequência da notificação constante do Acórdão 578/2000, veio o Ministério Público, por promoção de 2 de Março de 2001, requerer:

a) Numa primeira parte, por incumprimento da obrigação estabelecida no n.º 1 do artigo 10.º da Lei 72/93 (ausência de contabilidade organizada), a qual constitui facto ilícito e censurável, a título de dolo, que fosse aplicada a coima sancionatória, prevista no artigo 14.º da mesma lei, a graduar dentro dos limites legais, em conformidade com o disposto no artigo 18.º do Decreto-Lei 433/82, ao Partido Democrático do Atlântico (PDA);

b) Numa segunda parte, em relação ao Partido Socialista (PS), ao Partido Social-Democrata (PSD), ao Partido Popular (CDS-PP), ao Partido Comunista Português (PCP), ao Partido de Solidariedade Nacional (PSN), à União Democrática Popular (UDP), ao Partido Socialista Revolucionário (PSR), ao Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP), ao Partido Popular Monárquico (PPM), à Frente de Esquerda Revolucionária (FER) e ao Partido Política XXI (PXXI) que fossem aplicadas as coimas correspondentes às irregularidades ou ilegalidades detectadas quanto a cada um deles, "já que, relativamente ao exercício de 1998 - conhecendo e representando as exigências legais quanto à elaboração das contas - face, nomeadamente, ao texto da Lei 72/93, às auditorias já realizadas e ao precedentemente decidido pelo Tribunal Constitucional se abstiveram de as organizar, de forma adequada e em plena conformidade com tais exigências, bem sabendo que tal traduzia e implicava inelutavelmente a prática das [...] ilegalidades, previstas e sancionadas nos artigos 4.º, n.os 2 e 3, 10.º, n.os 1, 2, 3 e 5, alínea b), e 14.º da Lei 72/93, de 30 de Novembro", coimas essas a graduar de acordo com o número de infracções verificadas relativamente a cada um dos partidos indicados, e de acordo com os critérios gerais decorrentes do artigo 18.º do Decreto-Lei 433/82.

Relativamente à primeira promoção do Ministério Público, de 25 de Outubro de 1999, apenas se pronunciaram o Partido da Democracia Cristã (PDC) e o Partido Renovador Democrático (PRD), não tendo havido resposta da Frente Socialista Popular (FSP) e do Movimento o Partido da Terra (MPT).

Já quanto à segunda promoção, de 2 de Março de 2001, veio o Partido Democrático do Atlântico (PDA) responder relativamente à primeira parte dessa promoção, e se pronunciaram na parte restante o Partido Política XXI (PXXI), o Partido Socialista (PS), o Partido Social-Democrata (PSD), o Partido Popular (CDS-PP), o Partido Comunista Português (PCP), a União Democrática Popular (UDP) e o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP). A Frente da Esquerda Revolucionária (FER) pretendeu responder fora do prazo legal para o efeito; por seu turno, o Partido de Solidariedade Nacional (PSN), o Partido Popular Monárquico (PPM) e o Partido Socialista Revolucionário (PSR) não apresentaram qualquer resposta.

4 - Entretanto, o Partido Renovador Democrático (PRD) alterou a sua denominação para Partido Nacional Renovador (PNR), conforme anotação constante do Acórdão 250/2000 (Diário da República, 2.ª série, de 4 de Maio de 2000), passando a ser identificado por esta nova denominação.

Por outro lado, a Lei 72/93 viria a ser revogada e substituída pela Lei 56/98, de 18 de Agosto (hoje, já também alterada pela Lei 23/2000, de 23 de Agosto), cujo artigo 30.º dispôs, porém, que às contas do exercício de 1998 se aplicavam as regras da anterior Lei 72/93 (n.º 2), salvo quanto aos prazos para apresentação e apreciação das mesmas contas, a que se deveria aplicar imediatamente o preceituado na lei nova (n.º 1).

Cumpre, agora, a este Tribunal decidir da punição ou não dos partidos políticos identificados.

II - Fundamentos. - A) A infracção da falta de apresentação de contas. - 5 - Na sua primeira promoção, de 25 de Outubro de 1999, verificando que os partidos aí indicados "não cumpriram, relativamente ao exercício de 1998, a obrigação emergente do preceituado no n.º 1 do artigo 13.º da Lei 72/93", de enviar, no prazo legal, as respectivas contas, para apreciação, ao Tribunal Constitucional - considera o Ministério Público que "o precedente jurisprudencial resultante do decidido em anos anteriores" indicia seguramente e permite supor que os respectivos representantes legais bem sabiam que estavam obrigados ao cumprimento daquele dever, não podendo deixar de ter presente a ilicitude da omissão, traduzida na não apresentação atempada das contas. É com tal fundamento que o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, em representação do Ministério Público, promove que aos partidos políticos incursos na omissão em epígrafe seja aplicada a correspondente coima.

Liminarmente, há-de dizer-se que tal razão é, ao menos na sua linha fundamental, por inteiro procedente - e de tal modo que o Tribunal pode mesmo dispensar-se de acrescentar o que quer que seja, tendo presente o decidido nos anos anteriores.

Posto isto, o que importa verificar é se, quanto aos diferentes partidos políticos no momento em causa, ocorre algum facto ou alguma circunstância de direito, mormente invocada nas suas respostas, que seja susceptível de obstar à concludência da promoção do Ministério Público, no sentido da sua punição, ou, de todo o modo, a esta última.

6 - Como já houve ocasião de referir, apenas o Partido da Democracia Cristã e o Partido Nacional Renovador responderam àquela promoção do Ministério Público, nela contrapondo as suas razões. Só quanto a estes partidos haverá, pois, que analisar mais detidamente a questão.

Quanto aos demais - ou seja, os restantes partidos políticos abrangidos pela promoção do Ministério Público de 25 de Outubro de 1999, por não haverem apresentado contas do ano de 1998 - a saber: a Frente Socialista Popular (FSP) e o Movimento o Partido da Terra (MPT) - uma vez que nada vieram contrapor a tal promoção, também nada mais resta, em vista do que antes se disse, senão concluir, como vem promovido, que omitiram ilícita e culposamente o cumprimento do dever estabelecido no artigo 13.º, n.º 1, da Lei 72/93, relativamente ao ano de 1998.

7 - Mas também quanto aos partidos políticos que tomaram posição no processo quanto à questão em apreço, não se vê que apresentem razões susceptíveis de fazerem precludir a relevância contra-ordenacional da omissão em que ocorreram.

Com efeito, e começando pela resposta do Partido Nacional Renovador, veio este alegar que supõe "que a falta de actividade política do PRD desde há anos, com reflexo na falta de receitas e despesas e consequente ausência de estrutura administrativa e contabilística, teria tornado impossível a apresentação de contas de 1998, como aliás nos anos anteriores", concluindo assim que "não pode a actual comissão directiva outra coisa, na situação herdada, senão pagar, com a graduação permitida pelo Tribunal Constitucional, as coimas que ao PRD foram ou sejam aplicadas relativamente à não apresentação das contas de 1994, 1995, 1996 e 1997"; salientou ainda o "processo de saneamento da situação do Partido" iniciado pela actual comissão directiva, e o esforço prosseguido no pagamento das prestações relativas às coimas, tal como graduadas por este Tribunal, para requerer, por fim, "que à coima devida pela sua não apresentação atempada [das contas de 1998], seja aplicada pelo Tribunal Constitucional o mesmo regime de graduação das coimas aplicadas ao PRD pela não apresentação, em tempo legal, das contas [...] relativas a 1994 e 1995, o que evitou a consequência pior, ou seja, a dissolução do Partido".

Pois bem, estas alegações não são por molde a afastarem ou minorarem a relevância contra-ordenacional em causa, antes reconhecendo o próprio Partido Nacional Renovador a sua falta, embora procurando justificá-la com uma "carência de meios, em geral, e de organização administrativa, em particular, e nunca culpa ou dolo dos anteriores ou actuais dirigentes".

Por outro lado - e agora quanto ao Partido da Democracia Cristã -, as razões que este Partido alega, em resposta à promoção do Ministério Público, reportam-se ao facto de "não ter desenvolvido actividade partidária no período em causa", não tendo obtido qualquer receita nem realizado qualquer despesa nesse ano.

Na verdade - e como este Tribunal disse, relativamente a outros partidos políticos, no Acórdão 36/2000 (Diário da República, 1.ª série, de 29 de Fevereiro de 2000) e no Acórdão 551/2000 (Diário da República, 1.ª série, de 24 de Janeiro de 2001), no que se reporta à não apresentação de contas nos anos de 1996 e de 1997, e remetendo para o que se afirmara no Acórdão 522/98 (Diário da República, 2.ª série, de 10 de Outubro de 1998), com referência a idêntica explicação fornecida por outro partido político para a não apresentação de contas do ano de 1995 - a mera circunstância do não exercício de actividade política "de âmbito institucional" ao longo de um determinado ano não pode eximir o correspondente partido dos deveres consignados na Lei 72/93 nem constituir causa justificativa do seu incumprimento: bastará salientar que tal circunstância não é impeditiva (ao menos teoricamente) do recebimento de donativos ou do contraimento de encargos e da realização de despesas, para concluir que ela não tem forçosamente de tornar inútil e supérflua a detenção de contabilidade e a apresentação de uma conta, com referência ao ano em causa - ou seja, como este Tribunal vem afirmando uniformemente e sem discrepâncias - e aqui se reitera -, no tocante à obrigação de elaboração e apresentação de contas, não há que fazer nenhuma distinção entre partidos "grandes" ou "pequenos", com ou sem representação parlamentar, com intensa e permanente ou reduzida e esporádica (ou mesmo alegadamente nula) actividade: desde que se encontrem inscritos como tal no registo próprio de partidos políticos existente neste Tribunal, ficam adstritos àquela obrigação legal.

Assim sendo, o tipo de razões alegadas pelos partidos em causa não é susceptível de evitar as consequências contra-ordenacionais da omissão em que incorreram.

8 - Posto isto, quanto ao Partido da Democracia Cristã (PDC), importa ainda, no entanto, verificar se a sua responsabilidade contra-ordenacional, decorrente da omissão do dever de apresentação de contas, não deverá ter-se por precludida por uma diversa razão. Reside ela no facto de, na resposta à promoção do Ministério Público em que se evidenciou tal omissão, o mesmo Partido alegar que, "quanto ao ano em causa" (1998), "não obteve qualquer receita e não realizou qualquer despesa, nomeadamente, pelo facto de não ter encargos fixos, e correspondentes despesas, e não ter desenvolvido actividade partidária no período em causa".

Afigura-se que, com tal declaração, o PDC pretende afinal, ainda que tardiamente, "apresentar", de algum modo, e decerto por forma "atípica", as suas "contas" relativas a 1998, tal como, de resto, já o fizera relativamente aos anos de 1997 e 1996. Ora, independentemente da questão de saber se, em momento adequado, se poderiam aceitar tais "contas" como efectivação da obrigação legal, a verdade é que quanto a outra questão - ou seja, a de saber se uma tal apresentação de contas por um partido político já fora do prazo legal, ainda poderá relevar para o efeito de ter-se como cumprida a correspondente obrigação, e afastada a responsabilidade contra-ordenacional que decorreria do puro e simples incumprimento da mesma, e ainda que tal apresentação ocorra já depois de notificado o Partido em causa, no processo tendente ao apuramento daquela responsabilidade, da correspondente promoção do Ministério Público - o Tribunal Constitucional já apreciou e tomou posição sobre tal questão - a propósito, justamente, de situação similar verificada quanto, entre outros, ao Partido ora em causa relativamente aos anos de 1994, 1995, 1996 e 1997 - nos seus já referidos Acórdãos n.os 537/97, 522/98, 36/2000 e 551/2000 (publicado em Diário da República, 1.ª série, de 24 de Janeiro de 2001), e a ela tendo dado aí resposta negativa.

É esta mesma resposta que agora, naturalmente, se reitera, repetindo o que então se disse, a saber: é que, mesmo que se considere que o prazo estabelecido na disposição legal citada não é de tal modo peremptório que exclua a relevância de toda e qualquer apresentação de contas ocorrida depois dele esgotado (independentemente de tal apresentação sempre importar um incumprimento desse prazo e das consequências que a tal incumprimento devam ligar-se), mesmo que seja assim, de todo o modo, face, por sua vez, ao prazo concedido ao Tribunal para a apreciação das contas anuais dos partidos políticos e ao conjunto de diligências e procedimentos que essa apreciação implica, não é possível deixar indefinidamente em aberto a possibilidade, e até a obrigação, de o Tribunal Constitucional apreciar contas de partidos políticos que não lhe foram atempadamente apresentadas. Há-de haver aí um limite - e é razoável considerar que esse limite, em qualquer caso, não pode estar para além do momento em que os partidos políticos são notificados da omissão, violadora da lei, em que incorreram.

Consequentemente - e voltando à situação concreta sub judicio - tão-pouco a circunstância ora considerada é de molde a afastar, quanto ao PDC, a ocorrência da omissão do cumprimento do dever legal aqui em apreço e de precludir as legais consequências de tal omissão.

9 - Face a quanto precede - recordando, em especial, o dever de conhecimento, por banda dos partidos políticos, do novo regime de financiamento dos partidos e da diligência que, face ao mesmo, lhes era exigível, e considerando, por outro lado, a ausência, nuns casos, de resposta à promoção do Ministério Público e, nos demais, a inconcludência das "justificações" produzidas - há que concluir, pois, relativamente à Frente Socialista Popular (FSP), ao Movimento o Partido da Terra (MPT), bem como, ainda, relativamente ao Partido Nacional Renovador (PNR) e ao Partido da Democracia Cristã (PDC), que os mesmos partidos incorreram na prática da infracção prevista no artigo 14.º, n.º 1, da Lei 72/93, em razão do não cumprimento do dever, consignado no n.º 1 do artigo 13.º da mesma Lei, de apresentação da sua conta anual relativa a 1998. Nada mais resta, em consequência, senão fixar a coima que, em concreto, lhes há-de ser aplicada.

Pois bem: nessa fixação, não pode o Tribunal deixar de ter em conta que a infracção já não respeita ao primeiro ou mesmo ao segundo ano em que o cumprimento de tal dever era exigível (como sucedia nas situações sobre que versaram os Acórdãos n.os 537/97 e 522/98) De resto, trata-se de uma infracção que nem se pode considerar ainda reportada ao período inicial de aplicação da Lei 72/93; na verdade, e em particular, não só respeita a um exercício que já é posterior ao momento em que o Tribunal Constitucional veio explicitar e clarificar o conteúdo e alcance prescritivo da Lei 72/93 (também quanto ao ponto ora em causa), o que veio a ocorrer com a prolação do Acórdão 979/96, como também a obrigação de apresentação das contas ocorreu mesmo depois de prolatados já dois arestos atinentes ao sancionamento contra-ordenacional de partidos políticos com fundamento em violação de deveres cominados na referida lei (os já mencionados Acórdãos n.os 537/97 e 522/98).

Assim sendo, entende o Tribunal Constitucional que a coima a aplicar a cada um dos partidos políticos ora em causa - que, de resto, coincidem com os partidos políticos condenados pela mesma infracção no Acórdão 551/2000, respeitante ao exercício de 1997 - já não deve fixar-se tão perto, como no ano anterior, do mínimo legal (de 10 salários mínimos nacionais, conforme o disposto no citado artigo 14.º, n.º 1, da Lei 72/93) Consequentemente, tendo embora em conta a sua pequena dimensão, fixa-se o valor da coima em 30 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1999 (já que a infracção se consumou neste ano), valor esse que é de 1 839 000$, considerando o quantitativo fixado no Decreto-Lei 49/99, de 16 de Fevereiro.

B) A infracção da ausência de contabilidade organizada. - 10 - Na sua promoção de 2 de Março de 2001, o Ministério Público, partindo do que foi verificado e decidido por este Tribunal no seu Acórdão 578/2000 (Diário da República, 1.ª série-A, de 12 de Março de 2001) em que se considerou que, não obstante a documentação apresentada pelo Partido Democrático do Atlântico (PDA) não podiam considerar-se prestadas as contas relativas ao exercício de 1998, "já que lhes não subjaz um suporte documental e contabilístico minimamente organizado, que permita aferir da sua fiabilidade" -, reputa que "tal conduta deste partido político, traduzida na ausência de contabilidade organizada, relativamente ao ano de 1998, constitui facto ilícito e censurável, a título de dolo".

Está-se agora, pois, em face do ilícito que resulta do não cumprimento, no dito ano, do dever consignado no artigo 10.º, n.º 1, da Lei 72/93, segundo o qual "os partidos políticos devem possuir contabilidade organizada, de modo que seja possível conhecer a sua situação financeira e verificar o cumprimento das obrigações previstas na lei"; e é para sancionar o incumprimento deste dever que o Ministério Público promove a aplicação da correspondente coima, a graduar em conformidade com os critérios gerais do Regime Geral das Contra-Ordenações.

11 - Ao assim promovido pelo Ministério Público, veio responder o Partido Democrático do Atlântico (PDA), reconhecendo, antes de mais, que os documentos enviados ao Tribunal, "como contas relativas ao exercício de 1998, não foram acompanhados do seu suporte documental", atribuindo esse facto a "lapso" da empresa de contabilidade encarregada de efectuar tal operação, "pois pensou-se que os suportes documentais não teriam de acompanhar as referidas contas", e considerando ainda que tal "lapso" sempre estaria de "certa forma justificado pela circunstância de a lei não referir expressamente essa obrigação" e ainda por a auditoria em causa não ter recaído sobre os documentos em arquivo.

Invoca ainda a "dispersão geográfica e a pequena dimensão do Partido" como impedimentos a uma atempada "coordenação documental entre as comissões dos territórios insulares" e os auditores, estando todas as receitas e despesas documentadas e sendo todas efectivadas através de entidade bancária. Finalmente, para além de assinalar que as contas foram aprovadas pela comissão política e controladas pelo conselho fiscal, alega não ter havido dolo no não envio dos suportes documentais, "apenas deficiente interpretação legal", bem como "falta de experiência", salientando o esforço despendido pelo Partido na regularização de toda a situação relativa à apresentação das contas, e ainda a boa-fé do mesmo, para concluir requerendo a não aplicação de qualquer sanção.

12 - Cumpre, antes de mais, deixar claro que não pode obviamente aceitar-se a alegação do Partido Democrático do Atlântico, segundo a qual a assinalada falta de suporte documental terá decorrido do facto de este Tribunal entender que os suportes documentais teriam de acompanhar as contas.

Com efeito, a conclusão que o Tribunal firmou, acolhendo os resultados da auditoria, no seu já referido Acórdão 578/2000 - consoante se começou por recordar há pouco (supra, n.º 10) -, foi a de que inexistia um suporte documental e contabilístico minimamente organizado que permitisse aferir da fiabilidade das contas - ou seja, a documentação e a organização contabilísticas do PDA, no exercício de 1998, foram tidas como insuficientes, não se tendo obviamente considerado que toda a documentação contabilística devesse ser remetida com as contas apresentadas, pelo que falece a argumentação tendente a demonstrar que, não tendo havido dolo na falta dessa remessa, não houve dolo na prática da infracção imputada.

Posto isto, e quanto ao mais que vem invocado, deverá dizer-se que vale inteiramente, contra o sentido geral dessa argumentação, o que, a propósito da infracção da não apresentação de contas, atrás se disse (supra, n.º 7), e se torna desnecessário, por conseguinte, repetir neste momento, sobre a irrelevância, para os efeitos da Lei 72/93, da "falta de experiência da empresa encarregada da escrita" ou da "dispersão geográfica e a pequena dimensão do Partido" circunstâncias que não podem ter tratamento mais favorável que a que consistiria em o Partido em causa não ter desenvolvido actividade partidária.

Por conseguinte, e tal como se considerou quanto a essa outra omissão, há-de considerar-se que o circunstancialismo invocado pelo Partido em causa não é de molde a constituir uma situação de inexigibilidade, susceptível de afastar a respectiva responsabilidade contra-ordenacional pelo incumprimento do dever, que também lhe era aplicável, estabelecido no n.º 1 do artigo 10.º da Lei 72/93, de possuir contabilidade organizada, nos termos definidos nesse diploma.

13 - Do mesmo modo, portanto, também só na fixação da medida concreta da coima a aplicar pode ser levado em conta esse condicionalismo, desde logo por razões idênticas e similares às acima invocadas (supra, n.º 9), as quais é igualmente desnecessário reproduzir aqui.

Assim, e atentas essas razões, entende o Tribunal que a coima a aplicar ao Partido Democrático do Atlântico (PDA) pela infracção ora em causa deve igualmente ser menos próxima do mínimo legal (de 10 salários mínimos nacionais, conforme o disposto no citado artigo 14.º, n.º 1, da Lei 72/93) da que, relativamente ao ano anterior, foi aplicada ao mesmo Partido por idêntica infracção. Consequentemente, tendo embora em conta a sua pequena dimensão, fixa-se o valor da coima em 25 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1998 (já que a infracção se consumou no final deste ano), valor esse que é de 1 472 500$,considerando o quantitativo fixado no Decreto-Lei 35/98, de 18 de Fevereiro.

C) Infracções verificadas na organização e apresentação das contas. - 14 - Resta tratar das infracções imputadas pelo Ministério Público, ainda na sua promoção de 2 de Março de 2001, ao Partido Socialista (PS), ao Partido Social-Democrata (PPD/PSD), ao Partido Popular (CDS-PP), ao Partido Comunista Português (PCP), ao Partido de Solidariedade Nacional (PSN), à União Democrática Popular (UDP), ao Partido Socialista Revolucionário (PSR), ao Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP), ao Partido Popular Monárquico (PPM), à Frente de Esquerda Revolucionária (FER) e ao Partido Política XXI (PXXI) e relativas a diferentes ilegalidades ou irregularidades por eles cometidas nas contas que apresentaram - irregularidades e ilegalidades essas que se discriminam quanto a cada um desses partidos, sancionadas no artigo 4.º, n.os 2 e 3, no artigo 10.º, n.os 1, 2, 3 e 5, alínea b), e no artigo 14.º da Lei 72/93.

Tais ilegalidades ou irregularidades são as seguintes:

a) A não apresentação de uma conta abrangendo toda a actividade partidária, isto é, o universo de todas as estruturas organizativas do Partido e as suas correspondentes actividades de financiamento e funcionamento, mas tão-só da estrutura central da sede nacional daquele e de algumas estruturas ou actividades descentralizadas: esta omissão - que vem imputada ao PS, ao PPD/PSD, ao CDS-PP, ao PSN, à UDP, ao PCTP/MRPP, ao PPM e ao PXXI - obsta (diz o Ministério Público) a que se possa operar o pleno controlo da situação financeira do Partido, exigido pelo n.º 1 do artigo 10.º, e a verificação do cumprimento das respectivas obrigações, nomeadamente das impostas pelos artigos 4.º e 5.º da Lei 72/93;

b) A falta de organização e actualização do inventário anual do património do Partido - imputada ao PS (salvo no que toca ao afecto à sede nacional), ao PPD/PSD (salvo no que toca ao afecto à sede nacional e ao património imobiliário), ao CDS-PP e à UDP - ou a sua inadequada ou indevida reflexão nas contas apresentadas - o que vem imputado ao PSR, ao PCTP/MRPP e ao PPM -, o que traduz incumprimento do preceituado na alínea a) do n.º 3 do artigo 10.º da Lei 72/93;

c) A não elaboração, em termos suficientemente satisfatórios, da lista do património imobiliário do Partido, na medida em que não inclui uma descrição suficiente de cada imóvel, imputada ao PS e ao PCP, o que constitui violação do disposto na alínea b) do n.º 5 do artigo 10.º da Lei 72/93 (na redacção dada pela Lei 27/95, de 18 de Agosto);

d) A não obtenção, no tocante aos donativos concedidos por pessoas colectivas, de cópia da correspondente deliberação dos órgãos sociais do doador - imputada ao PS (no caso do único donativo registado, no quantitativo de 20 000$), ao PPD/PSD e ao CDS-PP -, o que traduz infracção ao preceituado no n.º 2 do artigo 4.º da Lei 72/93;

e) A não adopção da prática do depósito integral dos montantes recebidos nem da realização de todos os pagamentos através de cheque - verificada quanto ao PS, ao CDS-PP, ao PCP, à UDP e à FER -, prática essa (diz o Ministério Público) "que se configura como indispensável e constitui exigência que decorre nomeadamente do preceituado no n.º 3 do artigo 4.º da Lei 72/93, como forma de assegurar plenamente o objectivo de controlo aí instituído, relativamente aos donativos concedidos por pessoas singulares";

f) A falta de preparação regular de reconciliações bancárias formais, imputada ao PSD e ao PCP (ambos, quanto a parte das respectivas estruturas): ora - diz o Ministério Público - "a não observância desta prática inviabiliza o controlo perfeito e rigoroso de contabilidade do Partido, exigida pelo n.º 1 do artigo 10.º da Lei 72/93, nomeadamente no que concerne à certificação da natureza de todos os pagamentos e recebimentos processados, não permitindo concluir com segurança se todas as operações desenvolvidas se reflectiram integral e adequadamente nas demonstrações financeiras apresentadas";

g) A falta de suficiente ou adequado suporte ou informação documental, justificativa de receitas, despesas e mapas contabilísticos, falta essa que vem imputada de forma genérica à UDP, ao PSR, e ao PCTP/MRPP, e, de forma mais específica:

Ao PSD [no tocante à documentação de suporte das sub-rubricas "Quotas e outras contribuições de militantes - Sede" e "Correcção relativa a exercícios anteriores", "no montante de 39 638 contos, dos quais 35 000 correspondem a ganhos obtidos com a renegociação de dívidas a fornecedores, as quais impedem que se possa concluir com segurança sobre se as mesmas sub-rubricas incluem ou não donativos"];

Ao CDS-PP [este, pela falta de suporte para quer os "donativos recebidos através de mailing aos militantes, quer as inscrições dos militantes no Congresso" e ainda pelas faltas ou deficiências de documentação de suporte das sub-rubricas "Inscrições" e "Filiações"]; e

Ao PS [este, na medida em que não efectuou a "sistemática emissão de recibos, suportando, nomeadamente, os donativos recebidos e as assinaturas do jornal Acção Socialista, bem como o "insuficiente suporte documental relativamente às rubricas de receita "Angariação de fundos" (que ascendeu a um total de 60 907 contos), "Contribuições de eleitos do Partido" (no montante de 56 638 contos) e "Contribuições e quotas de filiados" (no montante de 36 085 contos), em relação às quais se verifica - como notou a auditoria - manifesta exiguidade da informação que as suporta, bem como o facto de as contribuições de filiados serem, na sua grande maioria, efectuadas em numerário, não permitindo concluir em que medida integrarão eventuais verbas recebidas a título de donativo; e ainda, quanto ao "Mapa de proveitos e custos", porquanto "uma parte significativa de custos nele incluídos não se encontra suportada por documentação apropriada, emitida pelos beneficiários dos pagamentos em causa"], sendo certo que - salienta o Ministério Público, quanto a este tipo de situações - "o suporte documental dos mapas contabilísticos a que se refere o artigo 10.º, n.º 3, alínea b), da Lei 72/93 constitui condição ou pressuposto essencial da regularidade das contas apresentadas e do integral cumprimento do estipulado neste preceito legal", e isso (diz noutro passo), "nos termos exigidos pelo n.º 1 do artigo 10.º da mesma lei";

h) A não classificação contabilística como proveito do "montante de 100 000$, relativo ao perdão de alguns meses de renda da sua sede em Lisboa", falta esta imputada apenas ao PSN, o que constitui "manifesta falta de registo contabilístico, decorrente do preceituado no artigo 10.º, n.os 1 e 3, da Lei 72/93";

i) A não inclusão, na conta geral do Partido, do "saldo da 'campanha eleitoral' para um dos referendos nacionais realizados em 1998, sendo certo que - apesar da autonomia de tais contas o seu saldo deve ser necessariamente reflectido na conta geral de funcionamento", falta que foi imputada ao PCTP/MRPP.

15 - Pois bem: porventura com alguma pequena variante, e com alguma diferença quanto aos partidos relativamente aos quais ocorriam, pode dizer-se que todas as situações agora em causa já o Tribunal as havia verificado e posto em destaque, na apreciação das contas partidárias dos anos de 1994, 1995, 1996 e 1997 (v., respectivamente, Acórdãos n.os 979/96 e 531/97, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 19 de Setembro de 1997, Acórdão 682/98, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 12 de Janeiro de 2000, e Acórdão 453/99, publicado no Diário da República, 1.ª série-A, de 18 de Setembro de 1999). O Ministério Público, porém, quanto às contas daqueles dois primeiros anos, absteve-se de promover o sancionamento dos partidos incursos nas correspondentes irregularidades ou ilegalidades; e fê-lo por haver entendido que, não obstante haverem tais ilegalidades ou irregularidades de ter-se por verificadas, de um ponto de vista "objectivo", falecia o elemento "subjectivo" da possibilidade da sua imputação, a título de dolo, aos respectivos autores. E isso, com base em duas considerações fundamentais: o facto de poderem tais ilegalidades ou irregularidades razoavelmente assentar nas naturais dificuldades de adaptação da organização e suporte contabilísticos dos partidos, no período inicial de aplicação das exigências da Lei 72/93, e nas dificuldades de interpretação e rigorosa aplicação de um regime legal de cariz francamente inovatório, fundado muitas vezes em conceitos abertos e cláusulas gerais; e o facto de se tratar de contas organizadas e apresentadas antes de proferido o já mencionado Acórdão 979/96, relativo às contas partidárias de 1994, ou seja, antes de este Tribunal haver explicitado e concretizado (o que fez nesse aresto, pela primeira vez) o conteúdo e alcance de várias exigências da Lei 72/93 (cf., a este respeito, e por último, o Acórdão 522/98, n.os 21 e 22).

No entanto, relativamente às contas de 1996, o Ministério Público entendera já que "o argumento decisivo", que permitira excluir liminarmente o elemento subjectivo da infracção, na modalidade de dolo, quanto à ocorrência de ilegalidades ou irregularidades idênticas nas contas de 1994 e 1995 (e que fora precisamente o de se tratar aí de contas respeitantes a períodos anteriores à prolação do dito acórdão), deixara de ter o mesmo valor ou relevância relativamente a essas contas. Isso, porque a circunstância mencionada já não permitia que se excluísse liminarmente o dolo, quanto às irregularidades verificadas nas contas de 1996, na medida em que os partidos políticos, no exercício a que tais contas respeitavam, já conheciam "a exacta dimensão das exigências legais", para além de terem já "beneficiado de um tempo de adaptação razoável"; entendeu, assim, o Ministério Público impor-se que o sancionamento das irregularidades cometidas, ainda que de ordem instrumental ou de natureza meramente técnico-contabilística, fosse objecto de apreciação jurisdicional.

E o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão 36/2000, salientou que a situação ali sub judicio era já diversa, porque, designada e decisivamente, as irregularidades então em causa se reportavam a contas encerradas e apresentadas já depois da emissão do dito Acórdão 979/96, pelo que procedeu aí ao sancionamento das infracções detectadas.

Ora, relativamente ao exercício de 1997, já entendeu o Ministério Público que, "por maioria de razão" se adoptasse em relação a essas contas o mesmo entendimento que para aquelas de 1996.

E, na verdade, não pôde o Tribunal deixar de levar em linha de conta que o exercício de 1997 se iniciara e decorrera já depois de o Acórdão 979/96 ter sido proferido, notificado e publicado no jornal oficial, isto é, já depois de os partidos políticos terem integral conhecimento do sentido e alcance que o Tribunal Constitucional atribuía às disposições legais atinentes às suas obrigações relativamente à organização das respectivas contas.

Relativamente às contas de 1998, o Ministério Público renova a opinião de que, por maioria de razão, se deve adoptar idêntico entendimento. E o Tribunal não pode deixar de continuar a subscrever, agora reforçadamente, o que, a esse propósito, teve ocasião de assinalar logo no Acórdão 453/99 e salientou, aliás novamente, no Acórdão 551/2000:

"[...] as contas ora em apreciação, não só foram organizadas e apresentadas a este Tribunal após a prolação do Acórdão 979/96 (e também do Acórdão 531/97), como respeitam mesmo a um período que decorreu integralmente já depois de proferido esse aresto. O conteúdo de tal acórdão já era, assim, conhecido pelos partidos políticos que dele foram notificados - ou estava acessível ao conhecimento dos demais - não só quando apresentaram as suas contas relativas ao ano de 1997 mas logo no início desse período de gerência. Por outro lado, aquando da elaboração das mesmas contas, a contabilidade dos partidos políticos seus apresentantes - com excepção do Partido Democrático do Atlântico, da Frente de Esquerda Socialista e do Partido Política XXI - já havia sido objecto de, ao menos, uma auditoria (e até de mais, quanto à maior parte deles), de modo que, com as excepções referidas, já tais partidos se encontravam directamente advertidos das insuficiências detectadas nas respectivas contabilidades por essa auditoria."

16 - Como oportunamente se disse, todos os partidos políticos aos quais são imputadas as infracções ora em apreço vieram atempadamente responder à promoção do Ministério Público, com excepção do Partido da Solidariedade Nacional (PSN), do Partido Socialista Revolucionário (PSR), do Partido Popular Monárquico (PPM) e da Frente da Esquerda Revolucionária (FER).

Apresentam essas respostas, naturalmente, assinaláveis diferenças, seja na sua extensão e no seu desenvolvimento, seja no seu conteúdo. Pode, porém, dizer-se que, no tocante a este último, e no que se reporta a algumas questões de índole geral, elas se situam basicamente numa mesma linha, já por eles desenvolvida nas respostas às promoções do Ministério Público correspondentes às contas de 1996 e 1997, linha essa que vai no sentido seguinte: por um lado - e sem pôr em geral em causa a verificação objectiva dos factos (das irregularidades mencionadas) - procuram os partidos respondentes justificar a sua ocorrência pelas dificuldades que os mesmos vêm sentindo na implementação de uma organização financeiro-contabilística que perfeitamente corresponda, a todos os níveis do universo partidário, às exigências da lei (e isso, em consequência da natureza da sua actividade e do carácter largamente não profissional da sua organização); por outro lado, assinalam e sublinham os esforços que vêm fazendo, ano a ano, para superar tal situação e atingirem tal desiderato, e os inquestionáveis progressos que nesse capítulo vêm alcançando (como, de resto, as últimas auditorias às suas contas - e, no seguimento destas, o próprio Tribunal - vêm reconhecendo). E, nesta linha, sustentam mesmo, apertis verbis, alguns desses mesmos partidos respondentes (e outros o deixam implicitamente perceber) que a prática das irregularidades em causa não lhes pode ser imputada a título de dolo, sendo que, alegadamente, não houve da sua parte qualquer intenção (vontade ou propósito) de deixar de cumprir a lei.

Esta - poderá dizer-se - a linha geral das respostas apresentadas, mas que, evidentemente, cada partido não deixa de particularizar, com referência às infracções que concretamente lhe vêm imputadas (as quais, como pode extrair-se da súmula acima deixada, são de diferente ordem e extensão).

Entretanto - e para além desta linha generalizada de argumentação -, alguns pontos mais precisos e específicos não deixam de ser evidenciados nas respostas de alguns partidos, e deverão, por isso, ser também especificamente considerados, com excepção daqueles que se traduzem em contestar a existência factual das irregularidades já dadas por verificadas no Acórdão 578/2000. Com efeito, apenas cabe agora apreciar o que possa ter relevância em termos de excluir a punibilidade de tais irregularidades ou de contribuir para a determinação do grau de culpa dos infractores, uma vez que a existência objectiva das referidas irregularidades já foi definitivamente decidida no mencionado aresto.

Com este enquadramento, assinalam-se os seguintes pontos específicos das respostas:

Do PS, esclarecendo que, no tocante ao inventário anual do património este se encontrava "devidamente organizado", no que concerne à sede nacional, e que as federações só não estavam devidamente organizadas relativamente "aos equipamentos de escritório", o que já estaria sanado para o ano de 1999, devido à implementação entretanto efectuada do sistema contabilístico; quanto ao único donativo registado, o mesmo foi assim classificado porquanto se tratava de uma transferência bancária a favor do PS, "com informação escassa acerca do doador", e alegou ainda que "tem sido realizado um esforço por parte do PS no sentido de serem solicitados aos doadores cópia do documento da deliberação do seu órgão social"; ainda quanto aos pagamentos por cheque, entende o PS que a respectiva obrigação apenas se verifica quanto àqueles cujo montante ultrapasse quantia idêntica a 10 salários mínimos, mas que, mesmo a aceitar o entendimento de que todos os pagamentos deveriam ser efectuados por cheque, assegurando-se também o depósito de todos os montantes recebidos, alega ainda que sempre tal prática se mostraria impossível de assegurar completamente, tendo o PS, em todo o caso, procurado que a maioria de todos os pagamentos e depósitos sejam efectuados dessa forma; por fim, relativamente ao suporte documental das rubricas referidas, considerou que, sendo estas rubricas receitas próprias "têm sido devidamente recebidas e contabilizadas através de depósitos e transferências bancárias, no âmbito da lei em vigor", não aceitando a acusação relativa ao mapa de proveitos e custos, por se encontrarem "devidamente documentadas as receitas obtidas" pelo PS, com eventual excepção apenas da identificação de alguns "beneficiários de algumas despesas com deslocações e estadias em épocas de maior actividade política"; e, relativamente à elaboração da lista do património imobiliário, afirma ter junto documento contendo todas as especificações exigidas pela Lei 56/98, dispondo o Partido de todos os elementos necessários à completa identificação dos imóveis de que é proprietário, apenas não tendo apresentado tais elementos "por tal não ser exigido por lei";

Do PSD, segundo o qual o dever de proceder ao inventário anual do património partidário respeitava apenas aos bens imóveis e aos móveis sujeitos a registo; que o PSD "não tem por prática corrente solicitar cópia da deliberação dos órgãos sociais das pessoas colectivas", entendendo ainda que esse aspecto foi corrigido pela Lei 56/98 "ao estabelecer competência ao órgão de controlo das contas partidárias para aceder à acta que consigna a deliberação [...]"; no que concerne à insuficiente ou deficiente documentação de algumas rubricas, alegou que as mesmas não incluíam donativos, não sendo por outro lado possível obter documentação relativa aos fundos angariados de militantes em festas e organizações partidárias, apesar de o respectivo montante global e organizações em que foram angariados terem sido contabilisticamente identificados, esclarecendo ainda que, no que diz respeito à quantia de 35 000 contos indicada, não se tratara de um donativo, mas sim de uma redução de custos por via de uma "renegociação de dívidas por fornecimentos que o Partido considerou terem sido feitos a preços unitários muito superiores aos preços correntes de mercado"; e, no tocante às reconciliações bancárias formais, entendeu que "o Partido procede, na generalidade das suas estruturas, às reconciliações bancárias formais";

Do CDS-PP, segundo o qual não lhe pode ser imputada a falta das cópias das deliberações das entidades colectivas de que recebem donativos, já que sempre as pede às entidades doadoras, mas não as pode obrigar a entregar-lhas; relativamente aos pagamentos por cheque, considerou que a respectiva obrigatoriedade "é impossível de observar em termos tão restritos, pois não tem em conta" o tipo de despesas, "nem os modernos meios de pagamento", tendo, de resto, a Lei 56/98 continuado "sem consagrar a obrigatoriedade dos pagamentos serem titulados por cheque"; e, por fim, afirmou ainda que os montantes resultantes do mailing enviado aos militantes, bem como as inscrições dos militantes não são considerados donativos, antes são enquadráveis na alínea a) do artigo 3.º da Lei 72/93, uma vez que são o resultado de peditórios feitos exclusivamente a militantes, o mesmo se verificando em relação às quotas extraordinárias dos militantes;

Do PCP, que sustenta explicitamente, tal como fizera nos anos anteriores, a tese de que não pode extrair-se da lei uma obrigação de utilização do cheque como meio de pagamento e de recebimento de fundos, excepto no tocante aos donativos superiores a 10 salários mínimos nacionais, posição "que, aliás, o Tribunal Constitucional tem acolhido"; e, com referência às reconciliações bancárias, reiterando a sua preocupação em "efectuar a totalidade das reconciliações bancárias", lembra ainda este Partido que "nas contas de 1998 foram efectuadas mais 3495 conciliações do que em 1997", estando o Partido "muito perto de conseguir efectuar a totalidade" das reconciliações relativas às operações financeiras na sua totalidade, sendo certo que "as contas apresentadas reflectem já com rigor que a lei foi cumprida"; por fim, no tocante à lista do património imobiliário do Partido, uma vez que só a partir de 13 de Dezembro de 2000, data do acórdão respectivo, é que "ficou entendido definitivamente qual o procedimento para que as listas do património imobiliário satisfizessem a exigência de uma descrição suficiente de cada imóvel, em termos de permitir a sua fácil identificação pelo público", requereu o PCP que fosse aceite um aditamento às contas relativas a 1998 consistente na apresentação" de nova lista, já elaborada de acordo com essas especificações, pelo que considerou assim sanada a falta em causa;

Da UDP, relativamente à estrutura partidária, por não possuir militantes ou dirigentes a tempo inteiro, nem possuir estruturas, além da estrutura central em Lisboa, e de "organização com alguma estrutura" nos distritos de Setúbal, Porto, Santarém e Madeira - dispondo de representação parlamentar apenas neste último -, funcionando em todos os restantes distritos apenas em "sistema assembleísta", concluindo assim pela "impossibilidade de haver no campo da organização financeira uma estruturação que dê resposta a um apanhado total das despesas e receitas"; e, no tocante ao inventário imobiliário do Partido, alegando que o mesmo "não existe, em virtude de não existir nenhum nesta data";

Do PXXI, face às contas apresentadas, que reflectem "exactamente" a realidade do Partido, a qual é "reduzida e tem tendência a, geograficamente, mais se reduzir", para lá de eventuais "pequenas deficiências" verificadas, justificando a pequena dimensão com a reorganização resultante da dissolução do MDP - donde resultou o PXXI -, tendo, nomeadamente, sido encerradas ou abandonadas sedes dos núcleos do Barreiro, Damaia, Grândola, Coimbra, Faro e Lumiar e Avenida de 5 de Outubro e Marvila, em Lisboa;

Do PCTP/MRPP, relativamente ao insuficiente suporte documental, que entende não ser verdadeiro, não tendo sido apontados factos concretos, antes se estando perante uma "designação genérica" e injustamente penalizadora do Partido; e, quanto à questão de as contas não mencionarem o saldo da campanha eleitoral relativa a um referendo, porquanto estas contas têm "completa autonomia" e estando sujeitas à fiscalização de uma outra entidade - a Comissão Nacional de Eleições -, não tendo assim o Partido que registar esses custos incorridos com tais referendos, "como seria tecnicamente errado fazê-lo"; e, por fim, no tocante ao inventário anual do património do Partido, alegou o PCTP/MRPP que a própria auditoria entendeu que o mesmo inventário fora efectuado, "não se podendo conceber que ele tenha que vir reflectido nas contas", tanto mais que não sofrera qualquer alteração no ano em apreço.

Face, então, à promoção do Ministério Público, ora em apreço, e ao sentido ou teor das respostas a que acaba de fazer-se referência, quid inde?

17 - Importa, antes de mais, distinguir - nos factos ou situações referidos pelo Ministério Público - entre aqueles que se traduzem na inobservância ou incumprimento de determinações específicas da Lei 72/93, relativas à organização das contas partidárias, e aqueles outros que, por não corresponderem a qualquer dessas determinações, só podem reconduzir-se à eventual violação do dever genérico que impende sobre os partidos políticos de possuírem contabilidade organizada, de modo que seja possível conhecer a sua situação financeira e verificar o cumprimento das obrigações a que estão legalmente adstritos nessa área.

De facto, é este dever "genérico" que, antes de mais, a Lei 72/93 impõe aos partidos, enunciando-o no n.º 1 do seu artigo 10.º; mas, para além dele, não deixa o legislador de "especificar" algumas exigências que, nesse quadro, os partidos devem observar: é o que faz, por exemplo, e nomeadamente, no n.º 2 e no n.º 3 do mesmo artigo 10.º Assim, quando a Lei 72/93, sucessivamente, no seu artigo 14.º, pune com "coima" e qualifica, assim, como "contra-ordenação" o incumprimento das "obrigações impostas" aos partidos na matéria em causa, claro é que tal contra-ordenação tanto pode resultar da infracção do dito dever "genérico", como da de qualquer dos mencionados deveres "específicos".

Só que, se neste segundo caso estamos perante uma determinação precisa do "tipo" contra-ordenacional, de tal maneira que ele só é preenchido exactamente pelo comportamento inverso da conduta imposta, já no primeiro se depara com um "tipo" bastante mais aberto, cujo preenchimento é susceptível de operar-se através de condutas múltiplas e diversas, ou de também diversificadas conjugações dessas condutas: ponto é que elas tenham a ver com o desrespeito de regras ou exigências decorrentes da própria lógica e técnica da organização contabilística, de tal modo que a sua verificação ponha em causa, em maior ou menor medida, a "fiabilidade" da contabilidade partidária, ou seja, a possibilidade (como se diz no artigo 10.º, n.º 1, da lei) de através dela se conhecer, por forma rigorosa, a situação financeira do Partido e o cumprimento de certas suas obrigações legais na matéria (v. g., as respeitantes à origem e limites das suas receitas).

É neste enquadramento e tendo presente esta distinção, pois, que haverá de examinar-se e avaliar-se a relevância contra-ordenacional dos factos ou situações, ora em causa, imputadas pelo Ministério Público aos diferentes partidos políticos atrás indicados.

18 - Ora, de tais factos ou situações, três há que indiscutivelmente respeitam à omissão de deveres específicos estabelecidos pela Lei 72/93, a saber:

A não obtenção, no tocante aos donativos de pessoas colectivas, de cópia da correspondente deliberação dos órgãos sociais do doador, obrigação que o Tribunal vem entendendo decorrer do disposto, por sua vez, no n.º 2 do artigo 4.º da mesma lei (cf., e justamente aplicando-se à concreta situação em apreço, o Acórdão 682/98, n.º 11.º);

A não elaboração do inventário anual do património, exigida pelo n.º 3 do artigo 10.º da lei;

A não elaboração, em termos suficientemente satisfatórios, da lista do património imobiliário do Partido, na medida em que não inclui uma descrição suficiente de cada imóvel, o que constitui violação do disposto na alínea b) do n.º 5 do artigo 10.º da Lei 72/93 (na redacção dada pela Lei 27/95, de 18 de Agosto).

Poderá e deverá então dar-se como verificada a prática das correspondentes infracções, pelos partidos a que são imputadas? Ou, face à defesa por estes aduzida, deverá chegar-se a uma conclusão contrária?

No tocante às primeira e segunda infracções, a resposta do Tribunal vai neste segundo sentido - embora não porque ache pertinente, em termos de afastar a sua responsabilidade contra-ordenacional em qualquer dos pontos em causa, tudo quanto os partidos respondentes invocaram: grande parte do que alegaram só poderia, em boa verdade, ser levada em conta como circunstância atenuadora de tal responsabilidade.

Simplesmente, como já se sublinhou no Acórdão 551/2000, ocorre uma circunstância - e ela não deixou de ser invocada ou a ela não deixou de aludir um dos partidos políticos ora em questão: o Partido Social-Democrata (PPD/PSD) - que acaba efectivamente por impor a exclusão, pura e simples, da responsabilidade contra-ordenacional, em consequência das apontadas situações: é que, entretanto, com a publicação de uma nova lei sobre o financiamento partidário (a Lei 56/98, de 18 de Agosto), a correspondente exigência legal desapareceu, pelo menos nos precisos termos em que a lei anterior a fazia ou este Tribunal a entendia.

Na verdade:

Enquanto a alínea a) do n.º 3 do artigo 10.º da Lei 72/93 se referia ao "inventário anual do património do Partido", o preceito correspondente (e que continua justamente a ser o do mesmo artigo, número e alínea) da Lei 55/98 reporta-se agora, mais restritamente, ao "inventário anual do património do Partido, quanto a bens imóveis e móveis sujeitos a registo", sendo unicamente esse inventário que passou a constituir "requisito especial" do regime contabilístico partidário;

Por outro lado, se é certo que no n.º 2 do artigo 4.º da Lei 56/98 continuou a dispor-se (tal como exactamente já se dispunha em idêntico número e artigo da Lei 72/93) que a atribuição de donativos aos partidos políticos, por pessoas colectivas, "é precedida de deliberação, por escrito, do órgão social competente", também se acrescentou então que tal deliberação seria "consignada em acta, à qual o órgão de controlo das contas partidárias acede, sempre que necessário". Quer dizer: estabeleceu-se um preciso meio de controlo da observância da exigência legal, o que, e como o Tribunal afirmou no seu Acórdão 551/2000, é impeditivo de fazer decorrer necessariamente desta exigência, com esse mesmo objectivo controlador (como, no entendimento do Tribunal, devia fazer-se, no quadro da Lei 72/93), o dever de os partidos políticos possuírem cópia da dita deliberação (susceptível, nomeadamente, de ser examinada no decurso da auditoria e julgamento das suas contas).

Esta disposição foi recentemente alterada pela Lei 23/2000, de 23 de Agosto, que passou a, no n.º 1 do seu artigo 5.º, proibir a entrega de quaisquer donativos aos partidos políticos por banda das pessoas colectivas, disposição esta que entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2001, não abrangendo pois as contas agora em análise, relativas ao ano de 1998.

Estamos, assim - no caso da inexistência ou incompletude do inventário, relativo ao ano de 1998, de "todo" o património de certos partidos políticos, bem como no da ausência, na documentação contabilística também de alguns partidos, de documento comprovativo da deliberação relativa à concessão aos mesmos, igualmente no ano de 1998, de donativos de pessoas colectivas perante condutas (omissivas) que deixaram de constituir uma infracção contra-ordenacional, no quadro de uma lei posterior (já que, tal como no domínio da Lei 72/93, também no domínio da Lei 56/98 - nos termos, em ambos os casos, do respectivo artigo 14.º - as infracções contra-ordenacionais relativas à contabilidade dos partidos políticos são modeladas a partir do enunciado, noutros preceitos legais, das exigências e deveres que sobre os mesmos impendem, nessa matéria) Ora, sendo princípio geral do direito das contra-ordenações o da aplicação retroactiva da norma contra-ordenacional in mitius, consagrado expressamente no n.º 2 do artigo 3.º do já várias vezes citado Decreto-Lei 433/82 (Regime Geral das Contra-Ordenações), por força da aplicação ao caso desse princípio haveria realmente de ter-se por simplesmente afastada qualquer responsabilidade contra-ordenacional que pudesse, eventualmente, ser imputada, com referência ao ano de 1998, aos partidos incursos nas condutas mencionadas, a saber:

O PS, o PPD/PSD, o CDS-PP, a UDP, o PSR, o PCTP/MRPP e o PPM no tocante à falta ou incompletude do inventário integral do seu património ou à sua indevida reflexão nas contas partidárias;

E os três primeiros (o PS, o PPD/PSD e o CDS-PP), no tocante à não obtenção, no que diz respeito aos donativos concedidos por pessoas colectivas, de cópia da correspondente deliberação dos órgãos sociais do doador.

É certo que - pese embora a alteração da alínea a) do n.º 3 do artigo 10.º da Lei sobre o Financiamento dos Partidos Políticos - concebe-se mal como possa estar cabalmente organizada (nos termos e para os efeitos do n.º 1 do mesmo artigo) a contabilidade de um partido político de cujo património "global" não existe inventário (e isto, tanto mais, quanto pode ser e será vultuoso o valor de muitos bens móveis integrantes desse património, mas não sujeitos a registo). Simplesmente, essa circunstância só poderá ser agora valorizada, quando muito, em termos "indiciários", em combinação com outras circunstâncias, num conjunto susceptível de denotar o incumprimento do dever "genérico" (a que acima se aludiu: cf., supra, n.º 18) de possuir "contabilidade organizada"; contudo, enquanto infracção "específica" (ou infracção de um dever "específico") já não pode ser considerada.

Por outro lado, é certo também - e a observação vale agora para as duas situações que têm vindo a ser apreciadas - que a Lei 56/98 só pretendeu aplicar-se, conforme os precisos termos do seu artigo 30.º, n.º 2, às contas partidárias do exercício de 1999 e seguintes (salvo, nos termos do n.º 1, quanto ao prazo de apresentação das contas de 1998): dir-se-ia, por isso, face a uma tão precisa e expressa preocupação dessa nova lei de não tocar em situações passadas, que a conclusão a que antes se chegou ficaria, afinal, posta em crise. Mas - há, por último, que adverti-lo - não é realmente assim: é que importa distinguir entre, por um lado, a dimensão normativa da lei, enquanto definidora do modo como os partidos devem organizar a respectiva contabilidade e, por outro lado, a sua dimensão normativo-sancionatória, pois que, se quanto à primeira dessas dimensões não pode deixar de valer por inteiro o disposto no mencionado artigo 30.º, n.º 2, já quanto à segunda (e é esta que agora está em causa) desde logo, e pelo contrário, se há-de dizer que a lei teve seguramente o propósito de "eliminar" as infracções tal como previstas na lei anterior.

19 - Mas que dizer da terceira infracção apontada, ou seja, da deficiente elaboração daquela lista do património imobiliário do Partido, na medida em que não inclui uma descrição suficiente de cada imóvel, imputada ao PCP - ainda que, relativamente a este Partido, o Ministério Público faça notar que "embora tardiamente" esse Partido "veio, através do requerimento a fls. 149 e segs. - dos autos - diligenciar dar cumprimento às exigências legais" - e ao PS?

A esta infracção não se podem dirigir os argumentos acima expostos, pois a respectiva previsão legal - expressamente introduzida pela Lei 27/95 não foi objecto de alteração ou revogação pela Lei 56/98, e foi mantida nos mesmos termos pela recente Lei 23/2000.

De resto, os partidos em causa, como já se afirmou no Acórdão 453/99, não podiam ignorar que o cumprimento deste dever específico pelos partidos políticos se destina a permitir a fácil identificação pelo público do respectivo património imobiliário. O certo é que, quanto aos prédios urbanos, essa identificação não pode deixar, em regra, de ser efectuada através da indicação do nome da rua e do respectivo número de polícia, e, quanto aos prédios rústicos, de ser efectuada de forma a que se possa conhecer a respectiva localização e área, de modo minimamente perceptível (cf., Acórdão 551/2000).

Porém, o PCP, na sua resposta, pretendeu que esta infracção se encontraria sanada, por via da apresentação do requerimento a que se referiu o Ministério Público; ora, este requerimento foi junto com a reclamação apresentada pelo PCP ao Acórdão 578/2000 tendo sobre ele recaído o já referido despacho do Presidente (supra, n.º 2), pelo que, e como aí se decidiu, tal lista já não podia ser considerada na apreciação das contas relativas a 1998. Não pode, pois, tal junção, por tardia, sanar ou "corrigir" a falta verificada, até porque não permitiu o pretendido conhecimento público adequado do património imobiliário do Partido, não tendo assim o PCP qualquer razão nessa sua argumentação afinal, trata-se de situação paralela a outras que o Tribunal já considerou não sanarem a irregularidade cometida: a apresentação tardia das contas (cf., supra, n.º 8) ou a entrega da lista do património com a resposta à promoção do Ministério Público (cf., Acórdão 551/2000, n.º 24, relativamente ao PEV).

Por seu turno, o PS vem contestar que a referida identificação fosse legalmente imposta, pelo que "desconhece e não podia conhecer que esse douto Tribunal entendesse serem tais elementos exigíveis", assim indiciando que pretenderá excluir qualquer actuação dolosa quanto a este ponto. Para além do que já se referiu sobre o preciso conteúdo da obrigação legal em causa, cuja razão de ser não podia o PS desconhecer, cumpre assinalar que, em anos anteriores, este Partido cumprira a mesma obrigação sem motivo para reparos, demonstrando apreender integralmente o seu âmbito e alcance.

20 - Para além das situações que ficam examinadas, não se vê que qualquer outra, das elencadas pelo Ministério Público, seja inquestionavelmente recondutível à infracção de algum dos deveres "específicos" impostos pela Lei 72/93 aos partidos políticos, no tocante à organização da sua contabilidade. É certo que, na promoção do Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, o facto - imputado a vários partidos - da não adopção da prática do depósito integral dos montantes recebidos e da não realização de todos os pagamentos através de cheque é ainda tido como implicando a violação de uma exigência decorrente do n.º 3 do artigo 4.º daquela lei, isto é, do preceito que obriga a que os donativos de pessoas singulares excedendo o valor de 10 salários mínimos mensais sejam titulados por cheque, preceito esse que, assim, conforma um preciso e "específico" dever legal, em matéria do financiamento e contabilidade partidários.

Só que - como obtemperaram três desses partidos, mais precisamente, o Partido Socialista, o Partido Comunista Português e o Partido Popular - não é menos certo que o mesmo preceito, consentindo que até esse valor os donativos de pessoas singulares sejam anónimos, logo dispensa, nesse caso, o uso de cheque. E é ainda verdade que, tirando esta referência expressa, mas limitada, no n.º 3 do artigo 4.º, nenhuma outra se encontra na lei quanto à utilização obrigatória de cheque pelos partidos políticos (seja na angariação das suas receitas, seja na realização das suas despesas).

É certo que, entretanto, a publicação da Lei 23/2000 veio consagrar, na nova redacção do n.º 1 do artigo 4.º, a obrigatoriedade de os donativos de natureza pecuniária feitos por pessoas singulares identificadas serem efectuados por cheque ou transferência bancária, desde que o respectivo montante seja superior a um salário mínimo nacional; e, para além disso, de todos os donativos de natureza pecuniária, independentemente do seu montante, serem depositados em conta bancária exclusivamente destinada a tal efeito, como determina o n.º 3 do mesmo artigo 4.º Mas tais disposições, que visam assim indubitavelmente um maior controle e rigor nesta matéria, apenas se aplicam a partir de Janeiro de 2001, não sendo, pois, aplicáveis ao exercício em análise.

Por tudo isto - e muito embora este Tribunal, nos sucessivos acórdãos em que tem apreciado as contas anuais dos partidos políticos, venha evidenciando o facto como "irregularidade" contabilística - afigura-se que, pelo menos para efeitos contra-ordenacionais, não é realmente possível reconduzir as práticas ora em apreço (da não adopção sistemática do depósito das importâncias recebidas, por um lado, e da não utilização sistemática do cheque como meio de pagamento de despesas, por outro) à infracção de um dever "específico" imposto aos partidos políticos, no tocante à organização da sua contabilidade.

Pelo menos para esses efeitos (os efeitos contra-ordenacionais), tais práticas, ou tal facto, só podem, pois, assumir relevância - à semelhança do que acontece com os demais constantes da promoção do Ministério Público - enquanto eventualmente reveladoras (só por si ou em conjunto com esses outros) do incumprimento do dever "genérico" que, na matéria em causa, decorre para os partidos políticos do artigo 10.º, n.º 1, da Lei 72/93.

21 - Posto isto, há então simplesmente que passar, por último, à averiguação e determinação do relevo contra-ordenacional desse conjunto de factos, à luz e no quadro desse "genérico" dever legal.

Pois bem: de entre esse conjunto de factos, seguramente é o da não apresentação de uma conta abrangendo toda a actividade partidária (isto é, o universo de todas as estruturas organizativas do Partido e as suas correspondentes actividades de financiamento e funcionamento) o que se reveste de maior importância. Ele é o óbvio reflexo de os partidos relativamente aos quais se verifica - a saber, o PS, o PPD/PSD, o CDS-PP, a UDP e o PPM - não disporem de uma contabilidade "integrada", e, por isso, não pode, também seguramente, deixar de denotar, só por si, o incumprimento "objectivo", por parte desses partidos, do dever que lhes impõe o artigo 10.º, n.º 1, da Lei 72/93: com efeito, sem essa "integração" contabilística - como quer que a mesma se alcance ou realize - não é possível dizer que a respectiva contabilidade permite "conhecer a sua situação financeira e o cumprimento das obrigações" a que, nos termos daquela lei, estão adstritos.

E esse incumprimento verifica-se igualmente por parte daqueles partidos - PSN, PCTP/MRPP e PXXI - relativamente aos quais se apurou que as respectivas contas se não encontram organizadas em termos de se poder concluir que abrangem todo o universo partidário. Nestes casos, a deficiência da organização contabilística é necessariamente maior, muito embora a falta de "integração" contabilística possa revestir menor dimensão.

A generalidade dos partidos políticos aos quais vêm imputadas estas omissões explicam-nas ou justificam-nas, todavia, invocando as razões já atrás resumidas (supra, n.º 16), e salientando (como também já aí referido) os esforços e progressos que vêm fazendo nessa matéria. Ora - é o problema que agora se põe - haverão tais circunstâncias de ter-se por bastantes para excluir a imputação "subjectiva" da mesma omissão, a título de dolo, a tais partidos, deste modo retirando-lhe qualquer relevância contra-ordenacional? A resposta não pode deixar de ser negativa.

É que - como sublinha o Ministério Público, da mesma forma que já o fizera relativamente ao ano anterior - no exercício a que tal omissão agora se reporta (o exercício de 1998) o quadro das obrigações que a Lei 72/93 veio impor aos partidos políticos, em matéria de organização contabilística, e das suas implicações, já se encontrava bem desenhado e esclarecido, nomeadamente com a prolação, a noti ficação e a publicação do Acórdão 979/96. Assim, não podendo as mesmas entidades ignorar que de tais obrigações decorria para elas, inter alia, a indispensabilidade de possuírem uma contabilidade que abrangesse todo o universo das suas estruturas e actividades e da qual decorresse com clareza a efectivação dessa abrangência, é claro que a correspondente falta não pode também deixar de ser-lhes censurável, e, nesse sentido, de lhes ser imputável a um título que ultrapassa o da mera "negligência" (entretanto, sobre a exclusiva imputabilidade a título de dolo das infracções contra-ordenacionais previstas no artigo 14.º da Lei 72/93, (cf., o já citado Acórdão 537/97, n.º 21).

E se as circunstâncias invocadas pelos partidos políticos ora em causa para justificarem a irregularidade contabilística aqui em apreço até poderiam assumir alguma relevância (o que este Tribunal não tem deixado de fazer em sucessivos arestos relativos aos anos anteriores), a verdade é que tal irregularidade respeita agora a um período de aplicação da Lei 72/93 que já não se pode dizer "inicial", inclusivamente porque se reporta a um exercício iniciado já mais de um ano após a data da prolação do mencionado Acórdão 979/96. Tal como o Tribunal considerou quanto a outras irregularidades ou ilegalidades já apreciadas no presente aresto (supra, n.º 13), esse circunstancialismo ou condicionalismo poderá, contudo, ser levado em consideração na fixação da medida da coima a aplicar aos partidos infractores, mas agora de modo menos intenso do que em anos anteriores, dado o tempo já decorrido (aliás, sublinhe-se que, apesar de a generalidade dos partidos políticos, nas suas respostas, ao longo dos anos, virem e continuarem a invocar, perante este Tribunal, a necessidade de um período transitório de adaptação às exigências consignadas na Lei 72/93, a Lei 56/98, quer na sua versão original, quer na redacção da Lei 23/2000, apesar de ter esclarecido outras questões controvertidas, como já se assinalou, contudo não estabeleceu qualquer período transitório de adaptação).

22 - Mas, se a falta de "integração" ou de "globalização" da conta se apresenta como a irregularidade contabilística de maior significado, em termos de incumprimento do dever a que os partidos políticos se acham adstritos por força do disposto no n.º 1 do artigo 10.º da Lei 72/93, que dizer, a esse respeito, de outros factos ou situações irregulares, ou menos regulares, do ponto de vista contabilístico, verificados quanto a certos partidos, no ano de 1998, e atrás elencados (supra, n.º 14)?

Afigura-se que, de novo, importa aqui distinguir - e distinguir consoante a expressão e a extensão desses factos ou situações.

Assim, no tocante à falta de suficiente ou adequado suporte ou informação documental, justificativa de receitas, despesas e mapas contabilísticos, imputada na promoção do Ministério Público ao PS, ao PPD/PSD, ao CDS-PP, à UDP, ao PSR e ao PCTP/MRPP, não poderá ela deixar também de ser levada à conta de um incumprimento, contra-ordenacionalmente relevante, do dever decorrente do dito n.º 1 do artigo 10.º da Lei 72/93. E isso, de um lado, porque, dada precisamente a extensão e o carácter "sistemático" dessa falta ou ausência de documentação, a mesma afecta necessariamente, também de modo relevante, a "fiabilidade" das correspondentes rubricas contabilísticas; e, de outro lado, porque uma tal falta não pode deixar de acarretar e justificar um juízo de censura dos partidos políticos que nela incorreram - já que, no tocante a este aspecto (da imputação subjectiva da infracção) terá aqui inteiro cabimento quanto se disse, a esse respeito, a propósito de falta de integração contabilística.

Sublinhe-se que, ao responder à promoção do Ministério Público, e como já se referiu, o PPD/PSD veio esclarecer que as correcções relativas a exercícios anteriores, no quantitativo de 35 000 contos, se reportavam a redução de dívidas contraídas com fornecedores, situação em tudo análoga a outra que o Tribunal sancionou (ao PS) no Acórdão 551/2000, por considerar que a "anulação de facturas cujo pagamento não foi exigido pelos respectivos credores corresponde a um donativo no valor dessas mesmas facturas por parte dos seus emitentes à face da ratio legis", o que revela a gravidade da falta de adequado suporte documental, neste caso.

Um juízo semelhante caberá ainda, por sua vez, no respeitante à falta, apontada ao PSN, consistente em não contabilizar como proveito o montante de 100 000$ relativo ao perdão de alguns meses de renda da sede em Lisboa, cujo pagamento não foi exigido pelo respectivo senhorio, o que corresponde a um donativo no valor dessas mesmas rendas, à face da ratio legis.

Também a não inclusão, na conta geral do Partido, do saldo da campanha eleitoral para um dos referendos nacionais, irregularidade praticada pelo PCTP/MRPP merece censura: na verdade, este saldo teria de ser reflectido na conta geral de funcionamento do Partido, como este bem deveria saber, pois que este Tribunal, desde o Acórdão 979/96, vem assinalando que, embora as contas das campanhas eleitorais se encontrem submetidas a regime especial (tal como as das campanhas com referendos), "não se vê como o saldo (positivo ou negativo) que [elas vierem] a revelar possa deixar de ser levado à contabilidade geral do Partido".

Já, porém, no tocante à falta de preparação regular de reconciliações bancárias formais em apenas algumas estruturas partidárias, imputada também ao PSD e ao PCP, muito embora traduza uma imperfeição ou irregularidade de organização contabilística, não parece que se apresente com "consistência" ou relevo bastante para justificar uma censura contra-ordenacional.

Finalmente, também não se vê - agora à luz e no quadro do dever "genérico" de dispor de uma contabilidade organizada, que não no de qualquer "específico" dever estabelecido pela lei a esse respeito - que deva, em definitivo, atribuir-se relevo contra-ordenacional à não adopção de prática do depósito integral dos montantes recebidos e da não realização de todos os pagamentos através de cheque, verificada quanto ao PS, ao CDS-PP, ao PCP (no tocante a algumas estruturas), à UDP e à FER: é que, em boa verdade (e para além do que já foi afirmado supra, n.º 20, quanto à obrigatoriedade do uso de cheque), o Tribunal não dispõe de elementos que lhe permitam exactamente estabelecer a extensão desse facto no conjunto global dos movimentos de receita e despesa de cada um desses partidos, o que sempre seria necessário para verificar se ele afecta significativamente a contabilidade partidária, em termos de a mesma cumprir o que dela se exige no n.º 1 do artigo 10.º da Lei 72/93.

23 - De quanto precede, decorre que é de reconhecer a responsabilidade contra-ordenacional, por irregularidades ou insuficiências verificadas na organização e apresentação das suas contas, relativas a 1997, dos seguintes partidos políticos: PS, PPD/PSD, CDS-PP, PSN, UDP, PCTP/MRPP, PPM, PXXI e PCP. Com excepção do último, tal responsabilidade resulta, em todos os restantes casos, da infracção do dever genérico, relativo à organização da sua contabilidade, que impende sobre os partidos políticos, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, da Lei 72/93. Quanto ao PCP, tal responsabilidade resulta, por sua vez, da não elaboração, em termos suficientemente satisfatórios, da lista do património imobiliário do Partido, consistente na não descrição suficiente de cada imóvel, o que constitui infracção do dever específico disposto na alínea b) do n.º 5 do artigo 10.º da Lei 72/93 (na redacção dada pela Lei 27/95, de 18 de Agosto), infracção esta que é também imputada ao PS.

Assim, resta apenas, concretizando essa responsabilidade, fixar a medida concreta da coima a aplicar, em função dela, a esses diferentes partidos tendo em conta, de um lado, a natureza e gravidade dos factos que lhes são imputados, mas, de outro, as circunstâncias atenuadoras da mesma responsabilidade que caiba reconhecer. Nestas últimas circunstâncias, devem destacar-se as atrás referidas, relativamente à falta de integração contabilística (supra, n.º 21); mas por outro lado, e além disso, há-de incluir-se, de todo o modo, a própria pequena dimensão de alguns dos partidos políticos em causa, já que da mesma decorrerá, compreensivelmente, uma menor exigência quanto à complexidade e completude da sua organização.

Nestes termos, considera-se:

Que ao Partido Socialista (PS), uma vez que a infracção do preceito legal referido resulta, não só da falta de integração da sua contabilidade, mas ainda da insuficiência de suporte documental de certas receitas, despesas ou rubricas contabilísticas, bem como da não elaboração em termos satisfatórios, da lista do património imobiliário do Partido, a coima a aplicar, pese o circunstancialismo atenuador referido, mas, de todo o modo, levando-o em conta, deverá ser fixada no valor de 50 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1998 (já que a infracção se consumou no final desse ano), valor que será de 2 945 000$;

Que ao Partido Social-Democrata (PPD/PSD), uma vez que também está em causa, além da falta de integração da respectiva contabilidade, uma grave insuficiência de suporte documental, a coima a aplicar, levando igualmente em consideração o dito circunstancialismo atenuador, deverá ser fixada no valor de 45 salários mínimos nacionais correspondentes ao dito ano, valor que será de 2 650 500$;

Que ao Partido Popular (CDS-PP), uma vez que está em causa, de novo, não só a falta de integração contabilística como também uma insuficiência de suporte documental, só que de relevo menor que a já assinalada quanto aos dois partidos agora considerados, mas continuando a levar em conta o mesmo circunstancialismo atenuador, a coima a aplicar deverá ser fixada no valor de 32 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1998, valor que será de 1 884 800$;

Que ao Partido de Solidariedade Nacional (PSN), uma vez que está em causa unicamente a impossibilidade de concluir pela integração da respectiva contabilidade e considerando, do mesmo modo, a reduzida dimensão desse Partido, justifica que, quanto a ele, a coima a aplicar deverá ser fixada no valor de 18 salários mínimos nacionais correspondentes ao dito ano de 1998, valor esse que é de 1 060 200$;

Que à União Democrática Popular (UDP), uma vez que já estão de novo em causa, não só a falta de integração da respectiva contabilidade, como ainda a falta de suporte documental adequado dessa contabilidade, mas levando em conta, de todo o modo, a dimensão do mesmo Partido, a coima a aplicar deverá ser fixada no valor de 23 salários mínimos mensais nacionais correspondentes ao ano de 1998, valor esse que é de 1 354 700$;

Que ao PCP, uma vez que apenas está em causa a não elaboração, em termos suficientemente satisfatórios, da lista do património imobiliário do Partido, na medida em que não inclui uma descrição suficiente de cada imóvel, a coima a aplicar deverá ser fixada no valor de 14 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1998, valor esse que será de 824 600$;

Que ao PCTP/MRPP, uma vez que já não se está apenas perante uma insuficiência de suporte documental, mas também perante a não apresentação de contas organizadas em termos de se poder concluir que traduzem uma conta global consolidada, e ainda a não inclusão, na conta geral do Partido, do saldo da campanha para um dos referendos nacionais, mas levando em conta, de todo o modo, a dimensão do mesmo Partido, a coima a aplicar deverá ser fixada no valor de 25 salários mínimos mensais nacionais correspondentes ao ano de 1998, valor esse que é de 1 472 500$;

Que ao PSR, uma vez que está apenas em causa uma insuficiência de suporte documental e tendo em conta o circunstancialismo atenuador, designadamente a pequena dimensão do Partido, a coima a aplicar não deverá ultrapassar o mínimo legal (no valor de 10 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1998), valor esse que é de 589 000$;

Que ao PPM e ao PXXI, tendo em conta que apenas está em causa relativamente a estes partidos a não apresentação de uma conta consolidada ou de uma conta organizada em termos de se poder concluir por essa mesma consolidação, respectivamente, e atento o circunstancialismo atenuador, nomeadamente a pequena dimensão desses partidos e o facto de terem passado a apresentar uma contabilidade organizada, a coima a aplicar não só não deverá ultrapassar o mínimo legal (no valor de 10 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1998), como a conjugação destas duas circunstâncias justifica que se faça uso da faculdade de atenuação especial prevista no artigo 72.º do Código Penal, aplicável ex vi do artigo 32.º do Decreto-Lei 433/82 e utilizável até ao limite previsto no n.º 3 do artigo 18.º do mesmo diploma, assim devendo a coima a aplicar ser fixada no valor de 7 salários mínimos nacionais correspondentes ao referido ano, valor esse que é de 412 300$, para cada um dos partidos indicados.

III - Decisão. - 24 - Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide:

1.º Condenar a Frente Socialista Popular (FSP), o Partido Nacional Renovador (PNR), o Movimento O Partido da Terra (MPT) e o Partido da Democracia Cristã (PDC), pela prática da infracção, prevista no artigo 14.º, n.º 1, da Lei 72/93, de 30 de Novembro, decorrente da omissão do cumprimento, quanto ao ano de 1998, da obrigação consignada no artigo 13.º, n.º 1, da mesma lei, na coima, que se fixa para cada um deles, no valor de 30 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1999, ou seja, no montante de 1 839 000$ (equivalente a Euro 9172,89);

2.º Condenar o Partido Democrático do Atlântico (PDA) pela prática da infracção, prevista no mesmo artigo 14.º, n.º 1, da Lei 72/93, decorrente da omissão do cumprimento, no ano de 1998, da obrigação consignada no artigo 10.º, n.º 1, dessa lei, na coima, que se fixa no valor de 25 salários mínimos nacionais correspondentes ao mesmo ano, ou seja, no montante de 1 472 500$ (equivalente a Euro 7344,80);

3.º Condenar os seguintes partidos políticos, pela prática da infracção prevista ainda no artigo 14.º, n.º 1, da Lei 72/93, decorrente do defeituoso cumprimento, traduzido nos factos ou omissões oportunamente descritos, e quanto ao ano de 1998, da obrigação consignada no mesmo artigo 10.º, n.º 1, dessa lei:

O Partido Socialista (PS) este também pela prática da infracção prevista no artigo 10.º, n.º 5, alínea b), da Lei 72/93 (na redacção dada pela Lei 27/95, de 18 de Agosto) em coima no valor de 50 salários mínimos nacionais correspondentes ao mesmo ano de 1998, ou seja no montante de 2 945 000$ (equivalente a Euro 14 689,60);

O Partido Social-Democrata (PPD/PSD) em coima no valor de 45 salários mínimos nacionais correspondentes ao dito ano, ou seja no montante de 2 650 000$ (equivalente a Euro 13 218,14);

o Partido Popular (CDS-PP) em coima no valor de 32 salários mínimos nacionais correspondentes igualmente ao ano de 1998, ou seja no montante de 1 884 800$ (equivalente a Euro 9401,3);

O Partido de Solidariedade Nacional (PSN) em coima no valor de 18 salários mínimos nacionais correspondentes ainda ao mesmo ano, ou seja no montante de 1 060 200$ (equivalente a Euro 5288,26);

A União Democrática Popular (UDP) em coima no valor de 23 salários mínimos nacionais correspondentes sempre ao ano de 1998, ou seja no montante de 1 354 700$ (equivalente a Euro 6757,22);

O Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP) em coima no valor de 25 salários mínimos nacionais correspondentes ao anos de 1998, ou seja, no montante de 1 472 500$ (equivalente a Euro 7344,80);

O Partido Socialista Revolucionário (PSR) em coima no valor de 10 salários mínimos nacionais correspondentes ao mesmo ano, ou seja, no montante de 589 000$ (equivalente a Euro 2937,92);

O Partido Popular Monárquico (PPM) e o Partido Política XXI (PXXI), considerada a atenuação especial e o disposto no n.º 3 do artigo 18.º do Decreto-Lei 433/82, em coima, que se fixa para cada um deles, no valor de 10 salários mínimos nacionais correspondentes ao mesmo ano de 1998, ou seja, no montante de 412 300$ (equivalente a Euro 2056,54);

4.º Condenar o Partido Comunista Português (PCP) pela prática da infracção prevista no artigo 10.º, n.º 5, alínea b), da Lei 72/93 (na redacção dada pela Lei 27/95, de 18 de Agosto), em coima no valor de 14 salários mínimos nacionais correspondentes ao ano de 1998, ou seja, no montante de 824 600$ (equivalente a Euro 4113,09).

17 de Outubro de 2001. - Alberto Manuel Portal Tavares da Costa - José Manuel de Sepúlveda Bravo Serra - Luís Manuel César Nunes de Almeida - Artur Joaquim de Faria Maurício - Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto - José Inácio Clímaco de Sousa e Brito - Maria Fernanda dos Santos M. Palma Ferreira - Guilherme Frederico Dias Pereira da Fonseca - Maria Helena Barros de Brito - Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza - José Manuel Moreira Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1953018.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-10-27 - Decreto-Lei 433/82 - Ministério da Justiça

    Institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo.

  • Tem documento Em vigor 1993-11-30 - Lei 72/93 - Assembleia da República

    Regula o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 1995-08-18 - Lei 27/95 - Assembleia da República

    Altera a Lei 72/93, de 30 de Novembro (regula o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais), designadamente no que se refere ao regime contabilístico e a apreciação das contas dos partidos pelo Tribunal Constitucional.

  • Tem documento Em vigor 1996-09-04 - Acórdão 979/96 - Tribunal Constitucional

    JULGA PRESTADAS, EMBORA COM IRREGULARIDADES, AS CONTAS RELATIVAS AO EXERCÍCIO DE 1994, APRESENTADAS PELOS SEGUINTES PARTIDOS: PARTIDO SOCIAL-DEMOCRATA, PARTIDO SOCIALISTA, PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS, PARTIDO POPULAR, PARTIDO ECOLOGISTA OS VERDES E PARTIDO DE SOLIDARIEDADE NACIONAL. JULGA NAO PRESTADAS AS CONTAS REMETIDAS AO TRIBUNAL, RELATIVAS AO EXERCÍCIO DE 1994, PELOS SEGUINTES PARTIDOS: UNIÃO DEMOCRÁTICA POPULAR E PARTIDO SOCIALISTA REVOLUCIONÁRIO. DETERMINA QUE OS AUTOS SEJAM CONTINUADOS COM VISTA AO (...)

  • Tem documento Em vigor 1997-09-19 - Acórdão 531/97 - Tribunal Constitucional

    Julga prestadas, embora com irregularidades, as contas relativas ao exercício de 1995 apresentadas pelos seguintes partidos políticos: Partido Socialista (PS), Partido Social-Democrata (PPD/PSD), Partido Popular (CDS/PP), Partido Comunista Português (PCP), Partido Ecologista Os Verdes (PEV), Partido de Solidariedade Nacional (PSN) e União Democrática Popular (UDP); Julga não prestadas as contas remetidas ao Tribunal, e relativas ao exercício de 1995, pelos seguintes partidos políticos: Partido Socialista Re (...)

  • Tem documento Em vigor 1997-10-20 - Acórdão 537/97 - Tribunal Constitucional

    Em autos de contas de partidos políticos, julga cometidas pelos partidos políticos que identifica infracções previstas no artigo 14º (sanções), da Lei 72/93, de 30 de Novembro - Regula o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais -, e consequentemente pune cada um desses partidos com as coimas que indica. (Proc. nº 2/CPP)

  • Tem documento Em vigor 1998-02-18 - Decreto-Lei 35/98 - Ministério do Trabalho e da Solidariedade

    Actualiza os valores da remuneração mínima mensal, a que se referem o nº 1 do artigo 1º e o nº 2 do artigo 3º do Decreto-Lei 69-A/87, de 9 de Fevereiro, que passam a ser de 58.900$ e 54.100$ respectivamente, para o trabalhador por conta de outrém e para o trabalhador do serviço doméstico. Produz efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1998.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-18 - Lei 55/98 - Assembleia da República

    Altera a Lei 7/93, de 1 de Março, que aprovou o Estatuto dos Deputados.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-18 - Lei 56/98 - Assembleia da República

    Regula o regime aplicável aos recursos financeiros dos partidos políticos e das companhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 1999-01-12 - Acórdão 682/98 - Tribunal Constitucional

    Julga prestadas, embora com irregularidades, as contas relativas ao exercício de 1996, apresentadas pelos seguintes partidos políticos: Partido Socialista (PS), Partido Social-Democrata (PPD/PSD), Partido Popular (CDS-PP), Partido Comunista Português (PCP), Partido Ecologista Os Verdes (PEV), Partido de Solidariedade Nacional (PSN) e União Democrática Popular (UDP); julga não prestadas as contas remetidas ao Tribunal, e relativas ao exercício de 1996, pelos seguintes partidos políticos: Partido Socialista R (...)

  • Tem documento Em vigor 1999-02-16 - Decreto-Lei 49/99 - Ministério do Trabalho e da Solidariedade

    Actualiza os valores do salário mínimo nacional, fixados em 61 300$00 e 56 900$OO respectivamente para o trabalhor por conta de outrém e para o trabalhador do serviço doméstico.

  • Tem documento Em vigor 1999-09-18 - Acórdão 453/99 - Tribunal Constitucional

    Julga, respectivamente, não prestadas e prestadas pelos partidos políticos no que se refere às contas relativas ao exercício de 1997.

  • Tem documento Em vigor 2000-08-23 - Lei 23/2000 - Assembleia da República

    Primeira alteração às Leis 56/98, de 18 de Agosto (financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais), e 97/88, de 17 de Agosto (afixação e inscrição de mensagens de publicidade e propaganda).

  • Tem documento Em vigor 2001-03-12 - Acórdão 578/2000 - Tribunal Constitucional

    Julga, respectivamente, não prestadas e prestadas pelos partidos políticos que refere as contas relativas ao ano de 1998.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

O URL desta página é:

Clínica Internacional de Campo de Ourique
Pub

Outros Sites

Visite os nossos laboratórios, onde desenvolvemos pequenas aplicações que podem ser úteis:


Simulador de Parlamento


Desvalorização da Moeda