de 24 de Março
1. A vinha tem grandes tradições no nosso país, podendo-se dizer que acompanhou ao longo da sua história o próprio povoamento do território.Com uma área de vinha da ordem dos 350000 ha, e uma produção média anual de vinho que se situa entre os 10 e os 11 milhões de hectolitros, Portugal ocupa o 6.º lugar na produção mundial do vinho, sendo, porém, um dos países de maior intensidade vitícola, como natural consequência de um conjunto de condições ambientais favoráveis à videira.
A vinha ocupa, durante praticamente todo o ano, a mão-de-obra equivalente à utilização da capacidade de trabalho de cerca de 200000 trabalhadores rurais, isto é, 15% da população activa agrícola do País.
As actividades directa ou indirectamente ligadas à vinha têm também grande relevância na economia geral do País, representando os vinhos importância considerável no conjunto das nossas exportações.
2. A produção média de vinho em Portugal ultrapassa as possibilidades normais do escoamento, cujo nível é da ordem dos 9 a 10 milhões de hectolitros, incluindo o consumo interno sob todas as suas formas e a exportação.
Acresce que o volume anual da colheita é altamente variável, ocorrendo, com uma periodicidade de cerca de dez anos, surtos de produções excedentárias - que chegaram já a verificar-se em quatro anos seguidos - intervalados por períodos em que as colheitas se sucedem de forma irregular, quer atingindo volumes próximos da média, quer situando-se abaixo desta e até do nível do escoamento normal.
Tal condicionalismo determina uma situação excedentária de carácter permanente com agudização conjuntural cíclica, que frequentemente tem exigido a adopção de medidas tendentes à regularização quantitativa do mercado (procurando-se simultaneamente um saneamento qualitativo) e consequente atenuação das oscilações do preço, com maior garantia de justa remuneração ao produtor.
Para este efeito, vem sendo estabelecida, nas várias regiões, capacidade de armazenagem destinada às operações de intervenção.
3. Portugal conta-se entre os primeiros países que dedicaram à política vinícola atenção especial, para o que basta assinalar que foi com a demarcação da Região do Douro que começaram no mundo o estabelecimento e defesa das denominações de origem vinícolas e que foi igualmente o nosso país que iniciou o condicionamento do plantio da vinha.
Portugal foi, por outro lado, um dos primeiros países a estruturar uma organização vinícola especializada de âmbito nacional, em que têm ainda raízes alguns dos organismos actualmente existentes.
Efectivamente, com a legislação publicada a partir de 1907-1908, foi definida a política vinícola do País, assente especialmente na demarcação das regiões vinícolas de maior interesse, cada uma com estatuto e organização próprios, sem, todavia, se perder de vista a necessidade de uma coordenação global.
Apesar de tal passado, a política vitivinícola nacional não acompanhou a evolução da política mundial, pelo que nos encontramos hoje perante um sem-número de problemas que importa enfrentar e resolver.
Há, por outro lado, que proceder também com a maior urgência a transformações das estruturas ligadas à vinha e ao vinho para as adaptar à nova orientação que se pretende imprimir à organização económica do País, consequente do novo regime político em que estamos empenhados.
4. Entre os problemas que se nos apresentam e que importa equacionar, avultam:
Localização de certas vinhas em áreas mais recomendáveis para culturas diferentes e implantação de outras com castas inconvenientes;
Predominância de vinhas velhas, com fraco rendimento unitário;
Deficiente dimensão de grande número das explorações vitícolas e sua implantação em condições que impedem qualquer forma de mecanização;
Insuficiente promoção das regiões e zonas de tipicidade vinícola, com que se poderia contribuir para uma maior valorização de certos vinhos, e a que estão ligados o estabelecimento e organização de regiões demarcadas;
Deficiências do circuito de distribuição do vinho e das organizações empresariais respectivas, a nível da comercialização interna e externa;
Complexidade, dispersão e incoerência da legislação vitivinícola e do sistema de fiscalidade aplicável aos produtos vínicos;
Conhecimento imperfeito das características dos principais mercados;
Inadaptação das estruturas orgânicas do sector vinícola, não possibilitando resposta pronta aos problemas que se levantam, quer a nível regional, quer a nível nacional.
5. Em face do que atrás foi apontado, fácil é de concluir que se impõe promover um conjunto de medidas tendentes a dar resposta a instantes problemas da nossa vitivinicultura.
Para muitos deles, porém, as respostas não poderão ser fáceis, demandando estudos adequados, alguns dos quais se encontram já em andamento.
É o caso da reorganização da Região do Douro e da revisão da disciplina dos respectivos vinhos e estruturas orgânicas, a cargo de comissões constituídas para o efeito.
Estão a merecer também a atenção do Governo o estabelecimento de novas regiões demarcadas e a regulamentação relativa, quer a essas novas regiões, quer às regiões existentes, assegurando a indispensável coordenação e disciplina de todos os vinhos regionais.
A reestruturação da organização vinícola no seu conjunto vai ser igualmente objecto de estudo, a que se seguirá a revisão de toda a complexa e dispersa legislação vinícola, com vista à elaboração do Estatuto ou Código do Vinho Português.
Em ligação com a reorganização vinícola deverá também proceder-se à revisão de todo o sistema das taxas que ao longo dos anos passaram a incidir sobre os produtos vínicos, no sentido de uma maior simplificação ou, até, da sua eliminação.
O regime de venda dos vinhos a granel e de alguns vinhos engarrafados foi já objecto de estudo, pelo que o assunto é considerado em diploma à parte.
Também em diploma à parte se efectua a actualização das características legais dos diferentes produtos vínicos.
6. Independentemente dos estudos a que se está a proceder e de outros que serão iniciados em breve dentro da problemática enunciada, convém desde já dar seguimento, no território do continente, a um conjunto de medidas que decorrem especialmente da necessidade de definir os parâmetros em que deverá efectuar-se a acção imediata a realizar, designadamente com vista ao saneamento qualitativo do mercado, e em particular no referente aos termos da intervenção sobre os vinhos da última colheita.
Assim, determina-se que passa a ser obrigatória a entrega aos organismos interventores dos vinhos cujas características os tornam contra-indicados ao consumo público.
Dentro da linha de orientação definida e sem prejuízo de uma ulterior regulamentação mais minuciosa da matéria, aproveita-se para certos ajustamentos na disciplina relativa à actividade comercial, pensando-se que tal decisão será compreendida pelas empresas conscientes da responsabilidade da sua actuação no circuito do vinho, sendo até de referir que as exigências ora estabelecidas se encontram de há muito em vigor noutros países com projecção na vitivinicultura.
Alguns ajustamentos ao regime de taxas sobre os produtos vínicos com vista à simplificação da sua cobrança são objecto de diploma à parte.
7. No tocante à campanha vinícola de 1975-1976 é de referir que sofrerá influência da anterior, que foi superabundante, e da qual transitaram stocks elevados, que, não obstante a colheita de 1975 ser da ordem dos 9,4 milhões de hectolitros, conduzem a uma disponibilidade total próxima dos 13 milhões de hectolitros.
Esta circunstância, aliada à situação que atravessa a maior parte do comércio grossista, conduz à necessidade de intervenção no mercado do vinho.
Na acção a desenvolver, visando especialmente a última colheita, integrar-se-á a intervenção a efectuar pelos organismos económicos do sector vinícola, que este ano se revestirá de características particulares, dentro já de uma linha de actuação permanente no mercado, não só com vista à aquisição de vinhos à lavoura, mas também para fornecimento ao comércio armazenista e exportador.
A intervenção por compra destinar-se-á expressamente à defesa dos pequenos e médios viticultores, quer isolados, quer associados em adegas cooperativas, tendo-se tomado em conta no estudo das tabelas de preços o propósito de uma justa remuneração ao produtor, sem esquecer a necessidade de manter em níveis aceitáveis os preços no consumidor, objectivo este que, logicamente, se relaciona também com os já mencionados estudos relativos à disciplina dos preços de venda ao público.
As tabelas de intervenção por compra para os vinhos da colheita de 1975 constantes do presente diploma apresentam, relativamente às do ano anterior, uma diferente esquematização, mais equitativa para o produtor, permitindo simultaneamente um mais correcto ajustamento ao destino a dar aos vinhos adquiridos e maiores possibilidades de saneamento qualitativo do mercado.
Na Região Demarcada dos Vinhos Verdes, a situação actual do mercado requer apenas, de momento, uma intervenção destinada a vinhos impróprios para consumo, cujo único destino é a destilação. Não se exclui, todavia, que, ulteriormente, se as condições do mercado o aconselharem, possa vir a ser estabelecida uma operação de compra para vinhos sãos.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida no artigo 3.º, n.º 1, alínea 3), da Lei Constitucional 6/75, de 26 de Março, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º - 1. os produtores que tenham vinhos que não satisfaçam as características legais ou que se apresentem defeituosos ou alterados ficam obrigados a comunicar aos organismos vinícolas das respectivas áreas a sua existência e a proceder à entrega dos mesmos nos armazéns que lhes forem indicados.
2. Os vinhos a que se refere o número anterior serão pagos pelos preços dos vinhos destinados a destilação nas tabelas estabelecidas anualmente para as operações de intervenção.
Art. 2.º - 1. O comércio por grosso de vinhos e derivados na área do extinto Grémio dos Armazenistas de Vinhos poderá ser exercido não só pelos armazenistas e produtores armazenistas, mas também pelos armazenistas registados, a que se refere o Decreto-Lei 46868, de 10 de Fevereiro de 1966, que se encontrem devidamente inscritos na Junta Nacional do Vinho.
2. Os armazenistas registados que queiram exercer a actividade a que se refere o número anterior deverão manter permanentemente as existências mínimas determinadas para os armazenistas, suportando os respectivos vinhos as mesmas imposições fiscais que incidem sobre os vinhos comercializados por estes últimos.
Art. 3.º - 1. Além dos já legalmente estabelecidos, são também necessários para o exercício da actividade de armazenista ou de exportador de vinhos e derivados os seguintes requisitos:
a) Organização e manutenção de contas correntes, para o registo diário de entradas e saídas dos produtos vínicos;
b) Colaboração, em tempo inteiro ou parcial, de um técnico idóneo responsável pela legalidade e qualidade dos produtos comercializados.
2. As contas correntes a que se refere a alínea a) do número anterior poderão ser verificadas pelos organismos que superintendem nos respectivos produtos sempre que o entendam e deverão ser estabelecidas segundo modelo a indicar pelos mesmos organismos, ouvidas as associações de classe representativas do sector.
3. Salvo em casos justificados, e mediante prévia autorização a conceder pelos organismos competentes, é proibido o comércio de vinhos e derivados entre armazenistas.
Art. 4.º As entidades singulares ou colectivas que detenham, para uso próprio ou para fornecimento a outrem, livros de guias de trânsito para vinhos e derivados emitidos pelos organismos vinícolas, deverão enviar mensalmente aos respectivos organismos, até ao dia 15 do mês seguinte a que respeitam, relações com o movimento das guias utilizadas, discriminando as entidades de origem e de destino dos produtos movimentados.
Art. 5.º Sem prejuízo do disposto no artigo 1.º deste diploma, tem lugar em 1976 uma operação de intervenção por compra à lavoura de vinhos da colheita de 1975, a efectuar pelos organismos vinícolas nas condições estabelecidas nos artigos seguintes.
Art. 6.º - 1. Podem beneficiar da operação de intervenção os produtores que o desejem, desde que a sua produção em 1975 se encontre devidamente manifestada e não exceda 500 hl (100 pipas).
2. Esta operação de compra de vinhos é extensiva às adegas cooperativas na base das entregas dos seus associados que satisfaçam às condições dos números anteriores.
3. Na Região Demarcada dos Vinhos Verdes a intervenção limita-se, no ano em curso, aos vinhos a que se refere o artigo 1.º deste diploma.
Art. 7.º - 1. Os termos de classificação e os preços relativos aos vinhos que sejam propostos para venda aos organismos interventores são os constantes das tabelas anexas ao presente diploma.
2. Os organismos interventores expedirão as instruções necessárias para execução da operação de intervenção.
Art. 8.º Por despacho conjunto dos Ministros da Agricultura e Pescas e do Comércio Interno ou, por sua delegação, dos Secretários de Estado dos respectivos Ministérios, poderá ser alargado o âmbito da intervenção, se as circunstâncias o vierem a aconselhar.
Art. 9.º - 1. As infracções do disposto no artigo 1.º do presente diploma constituem transgressões puníveis com a multa de 3$50 por litro de vinho objecto da infracção, que no caso de reincidência passará para o dobro.
2. O não cumprimento dos requisitos legais estabelecidos para o exercício da actividade de armazenista ou de exportador de vinhos e derivados, entre os quais aqueles a que se refere o artigo 3 do presente diploma, será punido, conforme a gravidade da infracção, com multa de 2500$00 a 20000$00 ou com a suspensão temporária ou cessação da actividade.
3. Em relação às restantes disposições, e sempre que outra penalidade específica não couber, nos termos da lei, às infracções, estas serão punidas com a multa de 2500$00 a 100000$00.
Art. 10.º O presente decreto-lei é aplicável ao território nacional do continente e entra em vigor à data da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - José Baptista Pinheiro de Azevedo - João de Deus Pinheiro Farinha - Francisco Salgado Zenha - António Poppe Lopes Cardoso - Joaquim Jorge Magalhães Mota.
Promulgado em 12 de Março de 1976.
Publique-se.
O Presidente da República, FRANCISCO DA COSTA GOMES.
TABELA I
(A que se refere o artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei 214/76)Preços para intervenção por compra do vinhos
Área da Junta Nacional do Vinho e da Região Demarcada do Dão - Campanha
1975-1976
(ver documento original)
NOTAS
Os vinhos com teor alcoólico mínimo de 11,5% e acidez volátil corrigida máxima de 0,7, limpos de prova e cheiro, irão para a categoria 1.ª-B.Os vinhos com teor alcoólico mínimo de 8% e acidez volátil corrigida máxima de 0,5, limpos de prova e cheiro, irão para a 2.ª categoria.
As correcções da acidez volátil serão feitas deduzindo apenas o anidrido sulfuroso livre.
A partir de 1 de Junho será concedida uma tolerância de 0,1 na acidez volátil corrigida para os vinhos das categorias alta qualidade e 1.ª-A.
TABELA II
(A que refere o artigo 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei 214/76)Preços para intervenção por compra de vinhos
Área da Região Demarcada dos Vinhos Verdes - Campanha 1975-1976
(ver documento original) O Ministro do Comércio Interno, Joaquim Jorge Magalhães Mota.