de 4 de setembro
Sumário: Estabelece o regime da resolução dos conflitos de jurisdição entre os tribunais judiciais e os tribunais administrativos e fiscais, regulando a composição, a competência, o funcionamento e o processo perante o tribunal dos conflitos.
Estabelece o regime da resolução dos conflitos de jurisdição entre os tribunais judiciais e os tribunais administrativos e fiscais, regulando a composição, a competência, o funcionamento e o processo perante o tribunal dos conflitos
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece o regime de prevenção e resolução dos conflitos de jurisdição entre os tribunais judiciais e os tribunais administrativos e fiscais, regulando a composição, a competência, o funcionamento e o processo perante o Tribunal dos Conflitos.
Artigo 2.º
Composição do Tribunal dos Conflitos
1 - O Tribunal dos Conflitos é composto por um presidente e por dois juízes, determinados nos termos dos números seguintes.
2 - O Tribunal dos Conflitos é presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça ou pelo Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, consoante a última das decisões que originam o conflito ou a decisão recorrida tenha sido proferida, ou a consulta tenha sido submetida, respetivamente, por um tribunal judicial ou por um tribunal da jurisdição administrativa e fiscal.
3 - Os restantes juízes do Tribunal dos Conflitos são:
a) O vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça mais antigo no cargo ou, se for igual a sua antiguidade, o mais antigo na categoria, que fica a ser o relator sempre que a presidência caiba, nos termos do número anterior, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça; e
b) O vice-presidente do Supremo Tribunal Administrativo eleito de entre e pelos juízes das respetiva Secções de Contencioso Administrativo ou de Contencioso Tributário, consoante o pedido, o recurso ou a consulta diga respeito, respetivamente, a matéria administrativa ou tributária, que fica a ser o relator sempre que a presidência caiba, nos termos do número anterior, ao Presidente do Supremo Tribunal Administrativo.
4 - Quando, para efeitos do disposto na alínea b) do número anterior, existam dúvidas sobre a qualificação da matéria como administrativa ou tributária, compete ao Presidente do Supremo Tribunal Administrativo proceder à indicação de qual dos seus vice-presidentes integrará o Tribunal dos Conflitos.
5 - Na ausência, na falta ou no impedimento, consoante os casos:
a) Do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, este é substituído pelo vice-presidente deste tribunal referido na alínea a) do n.º 3;
b) Do Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, este é substituído pelo vice-presidente deste tribunal referido na alínea b) do n.º 3.
6 - No caso previsto no número anterior, o vice-presidente que substitua o presidente do Supremo Tribunal respetivo na presidência do Tribunal dos Conflitos é substituído, para os efeitos do disposto no n.º 3, pelo outro vice-presidente do mesmo Supremo Tribunal ou, se este faltar ou estiver impedido, pelo juiz mais antigo nesse Supremo Tribunal.
7 - Na ausência, falta ou impedimento do vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Administrativo que deva integrar o Tribunal dos Conflitos nos termos do n.º 3, o mesmo é substituído pelo outro vice-presidente do Supremo Tribunal respetivo ou, se este também faltar ou estiver impedido, pelo juiz mais antigo no mesmo Supremo Tribunal.
Artigo 3.º
Competência do Tribunal dos Conflitos
Compete ao Tribunal dos Conflitos conhecer:
a) Dos pedidos de resolução de conflitos de jurisdição formulados nos termos dos artigos 9.º e 10.º da presente lei;
b) Das consultas prejudiciais sobre questões de jurisdição submetidas nos termos do artigo 15.º da presente lei;
c) Dos recursos previstos no n.º 2 do artigo 101.º do Código de Processo Civil, os quais podem também ser interpostos nos casos em que um Tribunal Central Administrativo julgue incompetente um tribunal administrativo de círculo ou um tribunal tributário por a causa pertencer ao âmbito de jurisdição dos tribunais judiciais.
Artigo 4.º
Representação do Ministério Público
1 - O Ministério Público é representado junto do Tribunal dos Conflitos pelo Procurador-Geral da República, que pode fazer-se substituir por procuradores-gerais-adjuntos.
2 - No caso previsto na parte final do número anterior, o Ministério Público é representado por procurador-geral-adjunto que o represente no Supremo Tribunal a cujo presidente caiba, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º, a presidência do Tribunal dos Conflitos.
3 - Os magistrados referidos no número anterior fazem-se substituir nos termos do Estatuto do Ministério Público.
CAPÍTULO II
Processo perante o Tribunal dos Conflitos
SECÇÃO I
Disposições comuns
Artigo 5.º
Natureza
1 - O processo perante o Tribunal dos Conflitos é urgente, correndo nos próprios autos quando o conflito for negativo.
2 - O processo perante o Tribunal dos Conflitos é isento de custas.
Artigo 6.º
Patrocínio judiciário
Nos processos perante o Tribunal dos Conflitos é obrigatória a constituição de advogado, sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 54.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, no n.º 1 do artigo 11.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 15.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Artigo 7.º
Tramitação eletrónica
1 - A tramitação dos processos perante o Tribunal dos Conflitos pode ser efetuada eletronicamente, nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.
2 - A tramitação eletrónica dos processos deve garantir a respetiva integralidade, autenticidade e inviolabilidade.
Artigo 8.º
Secretaria competente
O expediente, a autuação e a regular tramitação dos processos são assegurados pela secretaria do Supremo Tribunal a cujo presidente caiba, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º, a presidência do Tribunal dos Conflitos.
SECÇÃO II
Pedido de resolução de conflito
Artigo 9.º
Pressupostos
1 - Para efeitos da presente lei, há conflito de jurisdição quando dois ou mais tribunais, integrados em ordens jurisdicionais diferentes, se arrogam ou declinam o poder de conhecer da mesma questão, dizendo-se o conflito positivo no primeiro caso e negativo no segundo.
2 - Não há conflito de jurisdição enquanto forem suscetíveis de recurso ordinário as decisões proferidas sobre a questão da jurisdição.
Artigo 10.º
Legitimidade
1 - Quando o tribunal se aperceber do conflito, deve suscitar oficiosamente a sua resolução junto do presidente do Supremo Tribunal a quem caiba, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º, a presidência do Tribunal dos Conflitos.
2 - A resolução do conflito pode igualmente ser pedida por qualquer das partes ou pelo Ministério Público, mediante requerimento dirigido ao presidente do Supremo Tribunal referido no número anterior.
Artigo 11.º
Tramitação inicial
1 - Recebido o pedido, o presidente ordena à secretaria a autuação do processo como conflito de jurisdição e a convocação dos demais juízes que, nos termos do n.º 3 do artigo 2.º, devam integrar o Tribunal dos Conflitos.
2 - Se do conflito de jurisdição puder resultar prejuízo grave e dificilmente reparável, o presidente designa o tribunal que deve exercer provisoriamente a jurisdição na prática de atos urgentes.
3 - As partes, no caso em que a resolução do conflito tiver sido pedida pelo tribunal ou pelo Ministério Público, ou a parte contrária à que tiver pedido a resolução do conflito, são notificadas para, querendo, se pronunciarem no prazo de cinco dias.
4 - Recebida a pronúncia prevista no número anterior, ou expirado o prazo para o efeito, o processo vai com vista ao Ministério Público junto do Tribunal dos Conflitos, pelo prazo de cinco dias.
Artigo 12.º
Exame preliminar e decisão sumária
1 - Colhido o visto do Ministério Público, o processo é concluso ao relator para exame preliminar.
2 - Quando o relator entender que o pedido é manifestamente infundado ou que a questão a decidir é simples, designadamente por já ter sido apreciada de modo uniforme e reiterado, profere decisão sumária, que pode consistir em simples remissão para precedentes decisões do Tribunal dos Conflitos, de que se juntam cópias.
3 - O Ministério Público ou qualquer das partes pode requerer que sobre a matéria apreciada na decisão sumária do relator recaia um acórdão.
4 - A reclamação deduzida nos termos do número anterior é decidida no acórdão que julgar o conflito.
Artigo 13.º
Preparação da decisão
1 - Decididas as questões que devam ser apreciadas antes do julgamento do objeto do processo, se não se verificar o caso previsto no n.º 2 do artigo anterior, o relator elabora o projeto de acórdão no prazo de 15 dias.
2 - O processo, acompanhado do projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos restantes juízes do Tribunal dos Conflitos, pelo prazo de cinco dias.
3 - Quando não for tecnicamente possível proceder conforme o número anterior, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto do processo.
4 - Se o volume das peças processuais relevantes tornar excessivamente morosa a extração de cópias, o processo vai com vista aos restantes juízes do Tribunal dos Conflitos, pelo prazo de cinco dias a cada um.
5 - Quando a natureza das questões a decidir ou a necessidade de celeridade no julgamento do conflito o aconselhem, pode o relator, com a concordância dos restantes juízes do Tribunal dos Conflitos, dispensar os vistos.
Artigo 14.º
Julgamento
1 - O processo é inscrito em tabela logo que se mostre decorrido o prazo para o relator elaborar o projeto de acórdão.
2 - No dia do julgamento, o relator faz sucinta apresentação do projeto de acórdão e, de seguida, os restantes juízes do Tribunal dos Conflitos dão o seu voto.
3 - Para o julgamento do conflito, é necessária a presença de, pelo menos, dois juízes, entre os quais um do Supremo Tribunal de Justiça e um do Supremo Tribunal Administrativo.
4 - A decisão é tomada por maioria, sendo a discussão dirigida pelo presidente, que desempata quando não possa formar-se maioria.
5 - A decisão especifica o tribunal competente, sendo imediatamente comunicada aos tribunais em conflito e ao Ministério Público e notificada às partes.
SECÇÃO III
Consulta prejudicial
Artigo 15.º
Pressupostos
1 - Sempre que, na pendência de uma ação, incidente, providência ou recurso, se suscitem fundadas dúvidas sobre a questão da jurisdição competente, qualquer tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento de uma das partes, submeter a sua apreciação ao Tribunal dos Conflitos.
2 - A consulta prevista no número anterior não tem lugar em processos urgentes.
3 - A decisão de submeter ou de não submeter a questão da jurisdição competente à apreciação do Tribunal dos Conflitos é irrecorrível.
Artigo 16.º
Tramitação
1 - A consulta é dirigida ao presidente do Supremo Tribunal a quem caiba, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º, a presidência do Tribunal dos Conflitos, que a pode recusar liminarmente quando considere que não se encontram preenchidos os respetivos pressupostos.
2 - Admitida a consulta, o presidente ordena à secretaria a autuação do processo como consulta de jurisdição e a convocação dos demais juízes que, nos termos do n.º 3 do artigo 2.º, devam integrar o Tribunal dos Conflitos.
3 - É aplicável à resolução da consulta o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 11.º e nos artigos 12.º a 14.º, podendo a pronúncia das partes ser dispensada no caso de estas já terem tido a oportunidade de, no processo, se pronunciarem sobre a questão da jurisdição competente.
Artigo 17.º
Efeitos
A pronúncia do Tribunal dos Conflitos, assim como as decisões liminares e as decisões sumárias proferidas, respetivamente, ao abrigo do n.º 1 do artigo anterior ou do n.º 2 do artigo 12.º, são vinculativas para o tribunal que lhe tenha submetido a consulta e para os demais tribunais que venham a intervir na causa, mas não vinculam o Tribunal dos Conflitos relativamente a novas decisões ou pronúncias que sobre a mesma questão venha a emitir no futuro noutros processos.
SECÇÃO IV
Recurso
Artigo 18.º
Tramitação
1 - Cumpridos os trâmites que houverem de ser respeitados junto do tribunal que tenha proferido a decisão recorrida, os recursos previstos na alínea c) do artigo 3.º são remetidos para o presidente do Supremo Tribunal a quem caiba, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º, a presidência do Tribunal dos Conflitos.
2 - Recebidos os autos, o presidente ordena à secretaria a autuação do processo como recurso e a convocação dos demais juízes que, nos termos do n.º 3 do artigo 2.º, devam integrar o Tribunal dos Conflitos.
3 - Cumprido o disposto no número anterior, o processo vai com vista ao Ministério Público junto do Tribunal dos Conflitos pelo prazo de cinco dias, sendo aplicável à tramitação subsequente do recurso o disposto nos artigos 12.º a 14.º
CAPÍTULO III
Disposições complementares
Artigo 19.º
Direito subsidiário
Em tudo o que não estiver especialmente regulado na presente lei, aplicam-se, subsidiariamente e com as necessárias adaptações, as disposições do Código de Processo Civil.
Artigo 20.º
Extensão de aplicação
O disposto nas secções I e II do capítulo II é subsidiariamente aplicável, com as necessárias adaptações, à resolução dos conflitos de jurisdição entre o Tribunal de Contas e o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do n.º 3 do artigo 1.º da Lei 98/97, de 26 de agosto, que estabelece a Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, na sua redação atual.
Artigo 21.º
Publicação das decisões do Tribunal dos Conflitos
1 - Todos os acórdãos proferidos pelo Tribunal dos Conflitos, bem como as demais decisões por este prolatadas que não tenham natureza meramente interlocutória, são publicados na 2.ª série do Diário da República e disponibilizados no sítio na Internet da responsabilidade do Ministério da Justiça destinado à publicação de jurisprudência.
2 - A publicação e a disponibilização previstas no número anterior são promovidas pelo presidente do Supremo Tribunal que tiver presidido ao Tribunal dos Conflitos no processo respetivo, o qual pode determinar que a secretaria competente lhe preste o apoio necessário, nos termos do artigo 8.º
CAPÍTULO IV
Disposições finais
Artigo 22.º
Norma revogatória
1 - Determina-se expressamente que não se encontram em vigor, em razão de caducidade, revogação tácita anterior ou revogação efetuada pela presente lei:
a) O Decreto-Lei 23 185, de 30 de outubro de 1933;
b) O Decreto-Lei 28 105, de 22 de outubro de 1937;
c) O Decreto-Lei 30 317, de 15 de março de 1940;
d) O Decreto-Lei 31 571, de 14 de outubro de 1941;
e) O Decreto-Lei 31 663, de 22 de novembro de 1941;
f) O Decreto-Lei 36 395, de 4 de julho de 1947;
g) O 23185, de 30 de Outubro de 1933 e 36395, de 4 de Julho de 1947, no que se refere à nomeação e substituição de juízes do Supremo Tribunal Administrativo.">Decreto-Lei 38 517, de 20 de novembro de 1951;
h) O Decreto-Lei 39 604, de 9 de abril de 1954;
i) O Decreto-Lei 39 874, de 28 de outubro de 1954;
j) O Decreto 18 017, de 28 de fevereiro de 1930;
k) O Decreto 19 243, de 16 de janeiro de 1931;
l) O Decreto 19 438, de 11 de março de 1931.
2 - Quando incida sobre normas cuja vigência já tenha cessado anteriormente, a determinação expressa de não vigência, nos termos do número anterior, não altera o momento nem os efeitos daquela cessação de vigência.
Artigo 23.º
Aplicação no tempo
A presente lei aplica-se apenas:
a) Aos pedidos de resolução de conflitos de jurisdição formulados após a sua entrada em vigor; e
b) Aos recursos para o Tribunal dos Conflitos interpostos de decisões proferidas após a sua entrada em vigor.
Artigo 24.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Aprovada em 21 de junho de 2019.
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.
Promulgada em 23 de julho de 2019.
Publique-se.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Referendada em 29 de julho de 2019.
Pelo Primeiro-Ministro, Augusto Ernesto Santos Silva, Ministro dos Negócios Estrangeiros.
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