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Acórdão 373/2015, de 23 de Setembro

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Sumário

Não julga inconstitucional a norma do artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, interpretada no sentido de que pode ser agravada a coima em sede de impugnação judicial interposta pelo arguido em sua defesa, sem correspondente alteração e/ou agravamento dos factos, elementos e circunstâncias da decisão administrativa condenatória

Texto do documento

Acórdão 373/2015

Processo 421/15

2.ª Secção

Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

Relatório

Por deliberação de 27 de março de 2014 do Conselho Diretivo da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários foi aplicada a Finertec - Serviços de Consultoria e Participações Financeiras, S. A., uma coima de (euro)75.000,00, pela violação dolosa do dever de publicação imediata do anúncio preliminar de oferta pública obrigatória, nos termos dos artigos 191.º, n.º 1, 393.º, n.º 2, alínea f) e 388.º, n.º 1, alínea a), todos do Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei 486/99, de 13 de novembro.

A Arguida impugnou judicialmente esta decisão, tendo os autos sido remetidos para o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão que, por sentença de 24 de novembro de 2014, condenou a Arguida pela prática da infração de que vinha acusada, mas agravou a coima inicialmente aplicada pela decisão recorrida, fixando-a em (euro)450.000,00.

A Arguida interpôs recurso desta decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por Acórdão em 17 de março de 2015, negou provimento ao recurso e confirmou a sentença recorrida.

Recorreu então a Arguida para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), nos seguintes termos:

"...I. INTRODUÇÃO

A norma do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM no sentido em que foi interpretada e aplicada na Decisão recorrida é inconstitucional, violando o artigo 32.º, n.º 10 da CRP, constituindo uma restrição intolerável aos direitos, liberdades e garantias do arguido em clara violação do disposto no artigo 18.º, também da CRP.

A norma vertida no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, interpretada no sentido em que o fez o Tribunal de recurso, mais não consubstancia do que uma clara e inadmissível restrição ao exercício pelo arguido do direito de defesa constitucionalmente consagrado, na modalidade de impugnação ou recurso da decisão condenatória da autoridade administrativa.

Tal restrição é tão ou mais evidente quanto maior ou mais abrangente for o alcance da reformatio in pejus. A inconstitucionalidade da norma é evidente quando - como na Decisão recorrida - se admite a reformatio in pejus numa situação em que, do patamar administrativo para a instância judicial de recurso, nada se alterou, quer de facto quer de direito (nomeadamente no que diz respeito à situação financeira do arguido), mas, ainda assim, o Tribunal opta por agravar a coima aplicada pela entidade administrativa.

Ora, é clara a restrição, o entrave, ao apelo para qualquer instância de recurso quando se admite o agravamento da coima perante a manutenção da realidade - fáctica e jurídica - subjacente existente no momento em que a autoridade administrativa, investida de verdadeiros e próprios poderes sancionatórios, determinou o respetivo montante concreto.

Em suma, o artigo 416.º, n.º 8 do CdVM, interpretado com o sentido e alcance da Decisão recorrida, no seguimento do que havia já sido entendido pelo tribunal de primeira instância, é inconstitucional.

Segundo a interpretação feita pela Decisão recorrida, o afastamento da proibição de reformatio in pejus pela norma vertida no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, permitiria ao tribunal de recurso ampliar a medida da coima, agravando a situação do arguido, ainda que nada de novo ou adicional tivesse vindo ao seu conhecimento em resultado da tramitação do processo de recurso/de impugnação judicial.

Mais concretamente, sufragou o Tribunal a quo o entendimento segundo o qual ainda que nada se tenha alterado, o Tribunal recorrido não está impedido de avaliar a situação existente como entender, desde que fundamentada.

Significa isto que a Decisão recorrida interpretou a norma do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM em sentido clamorosamente inconstitucional, violando o direito de defesa, na modalidade de direito ao recurso, consagrado no n.º 10 do artigo 32.º da CRP, pelos motivos que sucintamente se passam a expor.

Para que bem se entenda o sentido e alcance deste recurso, refira-se que, na senda do entendimento do Tribunal Constitucional, tem vindo a ser abandonada a interpretação restritiva e redutora da norma do n.º 10 do artigo 32.º da CRP.

Tanto assim que a Doutrina e Jurisprudência Constitucional já alargaram o entendimento inicialmente propugnado, passando a aceitar que os direitos constitucionais do arguido em sede de processo contraordenacional, à luz do artigo 32.º n.º 10 da Lei Fundamental, não se limitam aos direitos de audição a e de defesa (cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 659/2006, n.º 2.2, vide também Acórdãos TC n.º 313/2007, 45/2008, n.º 2.2, 86/2008, n.º 2.1.5; José LOBO MOUTINHO, Direito e Justiça, "Estudos dedicados ao Professor Doutor Nuno José Espinosa Gomes da Silva", pág. 435).

Além disso, as garantias do arguido em sede de processo contraordenacional, não se esgotam naquele n.º 10 do artigo 32.º da CRP, desenvolvendo-se e concretizando-se ao longo de outros preceitos constitucionais tais como, para o que ao caso interessa, o n.º 1 do artigo 20.º (o direito à tutela jurisdicional efetiva) e o n.º 4 do artigo 268.º (o direito à tutela jurisdicional efetiva dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, incluindo a impugnação de quaisquer atos da administração que os lesem e, portanto, os de natureza e contudo sancionatório).

Por fim, entenda-se que toda e qualquer restrição ou desincentivo ao livre exercício do direito de impugnar um ato administrativo de natureza e conteúdo sancionatório, tende a violar o direito de tutela jurisdicional efetiva, o que, no âmbito de um direito contraordenacional em que as coimas podem atingir os milhões de euros, se afigura particularmente gravoso e desproporcionado em face das finalidades de celeridade processual e de evitar a pendência de recursos meramente dilatórios.

II. DA INTERPRETAÇÃO INCONSTITUCIONAL SUFRAGADA PELA DECISÃO RECORRIDA

Não obstante ser questionável a constitucionalidade da norma ínsita no artigo 416.º, n.º 8 do CdVM - que afasta a proibição da reformatio in pejus em sede de impugnação da decisão administrativa condenatória -, não cuida, naturalmente, o recurso que ora se interpõe de analisar a questão da constitucionalidade ou inconstitucionalidade da reformatio in pejus em sede de recurso de processo de contraordenação.

Este recurso tem por objeto tão-somente lograr obter decisão que conheça da desconformidade constitucional da interpretação feita no Acórdão recorrido da referida norma. No fundo, pretende-se sindicar e apurar o limite constitucional da reformatio in pejus, prevista por aquela específica disposição do CdVM.

Posto isto, admitindo-se como possível a alteração da medida da coima em sede de recurso de impugnação judicial em desfavor do arguido, ao abrigo do disposto no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, forçoso é entender-se que o agravamento da coima não poderá ser admitido em termos absolutos nem unicamente dependentes da apreciação subjetiva pelo juiz da realidade existente (quando nada mais do que a medida da coima se altera, no confronto da decisão administrativa condenatória/"acusação" com a sentença proferida pela instância de recurso).

Assim sendo, a possibilidade de agravamento da coima em sede de recurso de impugnação judicial é apenas de admitir caso, em sede e por via do decurso desse processo judicial, resultem provados elementos/factos agravantes além (ou de sentido diverso) dos que já constavam da decisão administrativa condenatória impugnada que o determinem e na medida em que o justifiquem.

O mesmo é dizer-se que, à luz da Lei Fundamental, sem alteração superveniente agravante dos factos e fundamentos da decisão administrativa condenatória não pode a instância jurisdicional de controlo alterar a medida da coima, em desfavor do arguido.

Dito isto, é de referir que o preceito do n.º 10 do artigo 32.º da CRP impede, em sede de processo de contraordenação, a admissibilidade da reformatio in pejus em termos absolutos e/ou ilimitados (naturalmente, passe-se a redundância, com o limite máximo da coima abstratamente aplicável) pelo tribunal de recurso.

É o n.º 10 do artigo 32.º da CRP - núcleo essencial das garantias de defesa do arguido em sede de processo de contraordenação - que impede que, sem desconformidade constitucional, o disposto no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM seja interpretado no sentido e com o alcance que lhe foi conferido pela Decisão recorrida, ao estatuir que são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa nos processos de contraordenação e em quaisquer outros processos de natureza sancionatória.

O referido preceito constitucional é claro ao estabelecer o livre exercício do direito de defesa pelo arguido, incluindo na modalidade de recurso de impugnação judicial.

Estando o direito ao recurso constitucionalmente consagrado e sem o que fica claramente vazio de conteúdo o direito de tutela jurisdicional efetiva, ele apenas pode ser restringido no necessário para salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP.

Ora, resulta claramente condicionado o livre exercício do direito de defesa pelo arguido em sede de processo de contraordenação, na modalidade de impugnação judicial da decisão administrativa condenatória, sempre que a: norma vertida no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM seja interpretada no sentido de a coima concretamente aplicada pela autoridade administrativa poder ser ampliada pelo tribunal em todo e qualquer caso.

Designadamente, condiciona o arguido no livre exercício do direito de defesa a interpretação daquela norma do CdVM no sentido de ser admissível o agravamento da coima, ainda que tudo o resto (fáctico e jurídico) permaneça inalterado no decurso e em resultado da tramitação do processo de impugnação judicial.

A norma do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, que admite a reformatio in pejus em sede de recurso judicial de impugnação da decisão administrativa condenatória tem de ser interpretada em termos consentâneos com as garantias constitucionalmente consagradas ao arguido em sede de processo de contraordenação, jamais podendo configurar-se como uma restrição injustificada ao exercício do direito de defesa.

A esta luz, a norma do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, tem forçosamente de ser entendida como uma possibilidade de agravamento em sede de recurso da sanção concretamente aplicada apenas se e quando se verifique uma alteração, de facto (nomeadamente, no que diz respeito à situação financeira do arguido) ou de direito, que o justifique e na medida em possa justificá-lo (no decurso ou em virtude do processo de recurso).

Dito por outras palavras, nada mais se provando em sede de recurso judicial da decisão administrativa condenatória, os poderes de cognição do tribunal terão de ficar limitados aos termos da própria decisão administrativa impugnada, não lhe sendo permitido ampliar o montante da coima sob pena de o arguido ser verdadeiramente surpreendido com um agravamento da sanção sem que nada mais se altere.

Recorde-se que, em sede de processo de contraordenação, o recurso de impugnação judicial da decisão administrativa condenatória assume pendor marcadamente garantístico, configurando-se unicamente como um meio de defesa do arguido já que ele é o único legitimado (a par do seu defensor) para recorrer judicialmente daquela decisão (condenatória).

Aliás, como é evidente, apenas o recurso jurisdicional assegura que o arguido tem direito a uma tutela jurisdicional efetiva, no sentido que conseguirá obter uma decisão isenta, imparcial e judicial, que sindique a decisão administrativa (proferida por uma entidade necessariamente parcial, na medida em que ela própria investiga e elabora a "acusação").

Caso o arguido não interponha recurso, a decisão administrativa condenatória transita, tornando-se definitiva e exequível (a par do que sucede com uma sentença da qual não se interponha ou não seja já admissível recurso), sendo de reconhecer-lhe um certo grau de determinação, patamar de segurança e estabilidade.

É evidente que, ainda que o arguido possa considerar injusta e desadequada a condenação de que foi alvo por parte da autoridade administrativa (munida de poderes sancionatórios próprios para prossecução dos fins que lhes estão atribuídos por lei), a mera possibilidade de ver a coima agravada quando tudo o demais se mantém, nada mais é do que um apelo à conformação e inércia do arguido que passa, naturalmente, a encarar o facto de se conformar com a decisão administrativa condenatória como um mal necessário perante o receio do mal maior de imposição de sacrifício patrimonial superior pelo agravamento da coima.

Dito de outra forma: bule com a Constituição uma interpretação do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM que conduza à criação de um obstáculo prático, não expressamente previsto ou desejado pelo Legislador, ao direito à tutela jurisdicional efetiva e ao recurso. Como é bom de ver, se tudo mantém igual, e o arguido (ainda assim) puder ficar numa pior situação do que estava, certamente que optará por não recorrer, mesmo que esteja seguro da injustiça de que foi alvo. De facto, do ponto vista prático, o que o arguido não quer é correr o risco de ficar numa situação ainda pior do que se encontra (ainda que nada de novo seja carreado para os autos ou nada de novo seja provado, em termos de modificar a situação fáctica e jurídica).

A este respeito, não se olvida que podem existir restrições ou compressões dos direitos fundamentais do arguido. Porém, aquela que se acaba de apontar é manifestamente injustificada, desproporcional e inconstitucional.

Em bom rigor, a admissibilidade da reformatio in pejus em sede de recurso de impugnação judicial, ao abrigo da norma vertida no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, tem de conformar-se com os comandos da Lei Fundamental, jamais podendo configurar-se como uma possibilidade de agravamento da coima num cenário de manutenção de todos os factos e fundamentos da decisão administrativa condenatória que presidiram à aplicação de uma coima concreta pela autoridade administrativa competente.

Tendo-se em consideração que o (i) tribunal de recurso não está limitado aos factos da acusação (ou seja, da decisão administrativa condenatória convolada em acusação) e pode promover todas as diligências de prova que repute ao caso adequadas, (ii) que o recurso de impugnação judicial constitui unicamente um meio de defesa do arguido (o único legitimado, a par do seu defensor, para o impulsionar) e (iii) que o tribunal de recurso não goza de qualquer poder inquisitório suplementar, o n.º 8 do artigo 416.º do CdVM só é conforme com as garantias constitucionais de defesa perante uma alteração fáctica ou jurídica que justifiquem um agravamento da medida da coima em termos proporcionais.

Sob pena de violação do direito de tutela jurisdicional efetiva (maxime, do direito de defesa), é inadmissível o entendimento de que a instância de recurso pode limitar-se a, mantendo todo o demais, agravar a medida da coima, sob pena de daqui resultar uma clara e imediata perversão da garantia de defesa: ou seja, do exercício do direito de defesa resultar um gravame injustificado para a defesa.

Por outro lado, deve ainda referir-se que a estrutura do processo de contraordenação tem o seu núcleo essencial na atribuição de poder sancionatório à autoridade administrativa que profere em nome próprio uma verdadeira e própria decisão condenatória, vinculativa para o arguido, que se torna definitiva e exequível se não for impugnada. A constitucionalidade desta solução depende da possibilidade de controlo jurisdicional materializado no direito de recurso judicial de impugnação pelo arguido.

Assim sendo, admitir-se uma interpretação do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM semelhante à que fez a primeira instância e a Decisão de que se recorre, não só configura uma restrição inadmissível do exercício do direito ao recurso pelo arguido, como (e na medida em que desincentiva o único legitimado a recorrer aos tribunais para controlo da decisão administrativa sancionatória) faz claro apelo a situações de total ausência de controle jurisdicional das decisões administrativas. Tal entendimento, uma vez mais, põe em crise o direito de tutela jurisdicional efetiva, restringindo o livre exercício do direito de defesa pelo arguido.

Em jeito de conclusão, a norma vertida no artigo 416.º, n.º 8 do CdVM interpretada no sentido de agravamento de coima em sede de recurso de impugnação judicial interposto pelo arguido em sua defesa, sem correspondente alteração e/ou agravamento dos factos, elementos e circunstâncias da decisão administrativa condenatória é inconstitucional, violando o direito à defesa, na modalidade de direito ao recurso, já que desincentiva o arguido a recorrer e apela a que se conforme com a decisão administrativa condenatória, sem que tal possa justificar-se com a salvaguarda de outros direitos constitucionalmente protegidos (em termos adequados e proporcionais).

Tal interpretação viola o disposto no artigo 32.º, n.º 10 da CRP, sendo passível de violar e pôr em crise a efetivação do direito de tutela jurisdicional efetiva, na medida em que desincentiva claramente o livre exercício do direito de defesa.

Apenas será de entender ser conforme com os preceitos constitucionais - não obstante todas as dúvidas que desde o Anteprojeto do CdVM têm sido levantadas e, diga-se, muito justificadas no âmbito de um ramo em que as coimas podem chegar aos milhões de euros - a interpretação do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM segundo a qual a reformatio in pejus é admissível sempre e quando em sede de recurso de impugnação judicial venham ao conhecimento do tribunal factos e circunstâncias agravantes. Só assim não poderá o arguido ser efetivamente surpreendido com o agravamento da coima.

Por último, apenas este entendimento ou interpretação se afigura compatível com as garantias constitucionais do arguido em sede de processo de contraordenação.

Mais se informa, nos termos do n.º 2 do artigo 75.º-A da LTC, que a questão foi suscitada nas Alegações de Recurso apresentadas no Tribunal da Concorrência, Supervisão e Regulação (para o Tribunal da Relação de Lisboa).

Nestes termos, deve ser admitido o presente recurso, seguindo-se a demais tramitação prevista na LCT e, a final, e ser decretada a inconstitucionalidade suscitada, com todas as consequências legais ao caso cabível.».

A Recorrente apresentou as respetivas alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

I. Vem este recurso interposto da Decisão recorrida na parte em que fez interpretação normativa inconstitucional do preceito vertido no n.º 8 do artigo 416.º do Código de Valores Mobiliários ("CdVM") por afrontar o disposto no n.º 10 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa ("CRP"), constituindo uma restrição intolerável aos direitos, liberdades e garantias do arguido, em violação do disposto no artigo 18.º, também da CRP.

II. Com efeito, suscitada a questão da dita inconstitucionalidade perante o Tribunal da Relação de Lisboa, foi pelo mesmo sufragado o entendimento segundo o qual o afastamento da proibição de reformatio in pejus pela norma vertida no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM permite ao tribunal de recurso ampliar a medida da coima, em desfavor do arguido, em recurso interposto por este no seu exclusivo interesse, ainda que nada de novo, diverso ou adicional venha ao seu conhecimento em resultado da tramitação do processo de recurso/de impugnação judicial.

III. Mais concretamente, sufragou o Tribunal da Relação de Lisboa que ainda que nada se tenha alterado, o Tribunal recorrido não está impedido de avaliar a situação existente como entender, desde que fundamentada (cf. Acórdão recorrido).

IV. Entende a Recorrente que tal interpretação normativa do n.º 8 do artigo 418.º do CdVM viola clamorosamente os preceitos constitucionais que consagram o direito à tutela jurisdicional efetiva (cf. artigo 20.º da CRP), restringindo de forma desproporcionada o exercício pelo arguido do direito de defesa (cf. artigo 32.º, n.º 10 da CRP), na modalidade de impugnação ou recurso das decisões condenatórias das autoridades administrativas (cf. artigo 268.º, n.º 4 da CRP), o que se afigura inadmissível em face do n.º 2 do artigo 18.º da CRP.

V. Pretende, assim, a Recorrente que seja declarada inconstitucional a interpretação normativa do preceito vertido no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, nos termos da qual o afastamento da proibição de rejormatio in pejus permite ao tribunal de recurso, ainda que nada se altere, incluindo a situação financeira do arguido, agravar a sanção que aplicada pela autoridade administrativa competente.

VI. Apesar de este recurso não cuidar diretamente da questão da constitucionalidade do afastamento da proibição de reformatio in pejus (apenas) em sede de alguns setores do direito das contraordenações, o facto é que importa considerar a debilidade da admissibilidade de tal regime para que melhor se compreenda o sentido e alcance da inconstitucionalidade da interpretação normativa do n.º 8 do artigo 416.º aqui suscitada.

VII. Com efeito, tem vindo a defender-se que o artigo 416.º, n.º 8 é, em si, inconstitucional por constituir uma restrição desproporcionada aos direitos, liberdades e garantias do arguido em sede de processo contraordenacional, pondo em crise o disposto nos artigos 20.º, n.º 1, 268.º, n.º 4 e 32.º, n.º 10 da CRP, o que se afigura inadmissível em fase do vertido no n.º 2 do artigo 18.º da Lei Fundamental.

VIII. Adicionalmente, é de defender-se que o artigo 416.º, n.º 8 viola o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da CRP, nada justificando o afastamento da regra geral do RGCO, já que não se afigura defensável que exista nas contraordenações do mercado de valores mobiliários qualquer singularidade que legitime e, assim, permita o afastamento da proibição de reformatio in pejus prevista no artigo 72.º-A do RGCO.

IX. Acresce que, tem-se assistido ao progressivo abandono da interpretação restritiva e redutora da norma do n.º 10 do artigo 32.º da CRP, tendo vindo já o Tribunal Constitucional defender que as garantias dos arguidos nos processos sancionatórios não se limitam a estes direitos de audição e defesa e reconhecido a existência de um evidente paralelismo entre o processo criminal e o processo contraordenacional, que é conformado por princípios básicos daquele, tendo em conta os interesses subjacentes. Tal ordem de considerações sai, evidentemente, reforçada quando o RGCO manda aplicar ao respetivo processo, por via de direito subsidiário, a lei do processo criminal.

X. É, ainda, entendimento sufragado pelo Tribunal Constitucional que os direitos e garantias do arguido em sede de processo contraordenacional não se esgotam, ou limitam ao referido n.º 10 do artigo 32.º da CRP, desenvolvendo-se e concretizando-se ao longo de outros; preceitos constitucionais, ou seja, o direito de impugnação perante os tribunais das decisões sancionatórias em causa, direito que se funda, em geral no artigo 20.º, n.º 1, e, especificamente para as decisões administrativas, no artigo 268.º, n.º 4, da CRP.

XI. Donde, de todo o exposto, resulta desde logo fragilizada e difícil a conciliação e legitimação constitucional do afastamento da proibição de reformatio in pejus em sede de recurso de impugnação judicial de decisão administrativa sancionatória proferida no âmbito e ao abrigo do n.º 8 do artigo 416.º do CdvM.

XII. Tendo este pano de fundo, cumpre acrescentar que se está perante um caso em que, se o arguido não interpuser recurso de impugnação judicial, a decisão condenatória da autoridade administrativa torna-se definitiva. Assim, bule com os princípios constitucionais que da interposição de recurso pelo arguido em sua defesa (no seu interesse) possa resultar um agravamento da sua situação de forma a surpreendê-lo.

XIII. Deve, também, ser considerado para efeitos de apreciação deste recurso que é possível fundar constitucionalmente um direito genérico de recorrer das decisões jurisdicionais e que o legislador na sua concretização não pode abolir o sistema de recursos in toto ou afetá-lo substancialmente através da consagração de soluções que restrinjam de tal modo o direito de recorrer que, na prática, se traduzam na supressão tendencial dos recursos.

XIV. Com efeito, as limitações ou restrições ao direito do recurso estão, por isso, sujeitas aos limites constitucionais gerais e, de modo especial, aos princípios da igualdade e da proporcionalidade, pelo que as diferenciações legais não podem ser arbitrárias e as medidas restritivas do direito de recorrer não devem ser excessivas.

XV. Afigura-se, assim, evidente que a admissibilidade do afastamento de tal proibição (regime regra em sede de processo contraordenacional, tal como definido pelo RGCO) à luz da CRP sempre ficará, ao menos, condicionada a uma interpretação normativa, e consequente aplicação, do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM conforme os comandos constitucionais garantísticos do arguido, os quais não admitem restrições desproporcionadas e injustificadas.

XVI. Assim, a interpretação normativa do preceito do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM vertida na Decisão recorrida é vincadamente inconstitucional, consubstanciando uma restrição desproporcionada do direito de defesa (artigo 32.º, n.º 10 da CRP), na modalidade de direito ao recurso das decisões administrativas sancionatórias (artigo 268.º, n.º 4 da CRP) - corolários do direito de tutela jurisdicional efetiva (cf. artigo 20.º, n.º 1 da CRP) -, em violação do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP.

XVII. Com efeito, a interpretação normativa do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM no sentido sufragado pela primeira instância e pela Relação é manifestamente inconstitucional, já que remete o arguido para uma situação de total desincentivo e, assim, completa desproteção jurisdicional, fruto de uma restrição desproporcionada do direito ao recurso jurisdicional, em violação do disposto no artigo 18.º da CRP em matéria de restrição de direitos, liberdades e garantias.

XVIII. Quando nada se altera, a mera reavaliação subjetiva da situação existente (à data da condenação pela autoridade administrativa e tal como ela existia) levada a cabo pela instância jurisdicional de controlo que culmina no agravamento do montante da coima encerra uma verdadeira decisão surpresa, escapando totalmente ao controlo do arguido que fica totalmente desprotegido e à mercê de uma simples reavaliação (de pendor marcadamente subjetivo) do que já foi avaliado por quem para tal tinha competência e, em conformidade, aplicou uma coima de montante determinado.

XIX. É à CMVM que compete determinar em que medida é que a coima que aplica é adequada à concreta manutenção da "ordem social" que recai no âmbito das suas atribuições.

XX. Mais, caso o arguido não recorra, a decisão administrativa condenatória transita, tornando-se definitiva e exequível (a par do que sucede com uma sentença da qual não se interponha ou já não seja admissível recurso), sendo de reconhecer-lhe um certo grau de determinação, patamar de segurança e estabilidade.

XXI. Assim, considerando que o tribunal de recurso não está limitado aos factos da acusação e pode promover todas as diligências de prova que repute ao caso adequadas, nada mais se provando em sede de recurso de impugnação judicial da decisão administrativa sancionatória, os poderes de cognição do tribunal não poderão ir além dos termos da decisão administrativa condenatória, não lhe sendo permitido ampliar a coima sob pena de o arguido ser verdadeiramente surpreendido com um agravamento da sanção sem que nada mais se altere, incluindo a sua situação financeira.

XXII. Acresce que, a interpretação normativa do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM feita pelas instâncias judiciais de recurso cria, por si só, uma restrição prática/material ao exercício do direito de defesa pelo arguido, apta a traduzir-se numa supressão tendencial do recurso. Reconduzindo a situações em que o arguido é facilmente surpreendido com o agravamento da medida da coima, podendo atingir os largos milhões de euros e, por isso, tal interpretação normativa provoca um enorme e poderoso desincentivo, criando para o arguido sérios motivos para temer que o recurso que interpõe em seu favor acabe por revelar-se num impensável/imponderável desfavor, ainda que nada se altere.

XXIII. É evidente que, tudo o que o arguido não quer é ver a sua situação agravada ao recorrer. Com tal interpretação normativa do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM, o arguido sente-se impelido a conformar-se com a decisão administrativa condenatória, encarando-a como um mal necessário perante o receio do mal maior de imposição de sacrifício patrimonial superior, unicamente dependente da avaliação subjetiva pelo tribunal de recurso das circunstâncias e elementos que existiam já na data da prolação da decisão condenatória pela autoridade administrativa competente.

XXIV. Para que melhor se entenda, importa não olvidar que vigora aqui o princípio do caráter restritivo das restrições legais aos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados.

XXV. O juízo de constitucionalidade de determinada interpretação normativa de norma que restrinja direitos, liberdades e garantias afere-se à luz do princípio da proporcionalidade.

XXVI. A interpretação normativa do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM sufragada no Acórdão recorrido comporta em si mesma uma restrição desproporcionada ou desincentivo ao livre exercício do direito de impugnar um ato administrativo de natureza e conteúdo sancionatório e inviabiliza a concretização prática da tutela jurisdicional efetiva, o que é absolutamente desproporcionado em face das finalidades de celeridade processual e de evitar a pendência de recursos meramente dilatórios, violando o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP.

XXVII. Ademais, a estrutura do processo de contraordenação tem o seu núcleo essencial na atribuição de poder sancionatório à autoridade administrativa, sendo que a constitucionalidade desta solução depende da possibilidade de controlo jurisdicional materializado no direito de recorrer judicialmente das decisões administrativas condenatórias, impugnando-as.

XXVIII. Mais, perante uma entidade dotada de poderes públicos e sancionatórios próprios, que leva a cabo todo o processo e decide a condenação e a sua medida, é absolutamente fulcral que o arguido, perante uma decisão administrativa, tenha a oportunidade de exercer o seu direito (livremente e na sua plenitude), por forma a obter um controlo por parte de uma entidade que irá fazer um controlo judicial e, inerentemente, mais isento, independente e garantístico.

XXIX. Postas assim as coisas, não declarar a inconstitucionalidade da interpretação normativa do artigo 416.º, n.º 8 do CdVM sufragada pela Decisão recorrida - que constitui um claro e compreensivo desincentivo ao apelo às instâncias de recurso -, estar-se-á, a caminho da supressão tendencial dos recursos das decisões administrativas sancionatórias em sede de direito de valores mobiliários, violando o princípio da tutela jurisdicional efetiva e o direito de defesa do arguido.

XXX. Em simultâneo, não declarar inconstitucional tal interpretação normativa do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM é pôr em crise a constitucionalidade da atribuição de poderes sancionatórios à CMVM que, tendencialmente, instaurará, instruirá e decidirá processos de contraordenação, aplicando coimas, sem que tal seja, na prática, sindicado pelos interessados, entretanto, condicionados no exercício do seu direito de recurso pelo receio de verem a sua situação agravada, ainda que nada se altere (incluindo a respetiva situação financeira).

XXXI. Dito isto, resulta claro que a admissibilidade de reformatio in pejus em sede de recurso de impugnação judicial, ao abrigo da norma vertida no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, jamais pode configurar-se como uma possibilidade de agravamento da coima pela instância judicial de recurso sob toda e qualquer circunstância, ou seja, ainda que nada mais se altere. Tal configura um desincentivo poderosíssimo ao apelo às instâncias de recurso e, em conformidade com o acima exposto, uma restrição desproporcionada ao exercício pelo arguido dos seus direitos de defesa.

XXXII. Na prática, tal interpretação normativa impede a livre decisão do arguido no que tange ao exercício do seu direito ao recurso, constitucionalmente consagrado. O exercício do direito ao recurso fica, assim, desproporcionadamente restrito - já que tal restrição não encontra justificação na salvaguarda de outros direitos constitucionalmente protegidos (em termos adequados e proporcionais).

XXXIII. Sob pena de violação do direito de tutela jurisdicional efetiva (maxime, do direito de defesa), é inadmissível o entendimento de que a instância de recurso pode limitar-se a, mantendo todo o demais, agravar a medida da coima, sob pena de daqui resultar uma clara e imediata perversão da garantia de defesa: ou seja, do exercício do direito de defesa resultar um gravame injustificado para a defesa.

XXXIV. Assim, apenas será de entender ser conforme com os preceitos constitucionais a interpretação do n.º 8 do artigo 416.º do CdVM segundo a qual a reformatio in pejus é admissível sempre e quando em sede de recurso de impugnação judicial venham ao conhecimento do tribunal factos e circunstâncias agravantes. Só assim não poderá o arguido ser efetivamente surpreendido com o agravamento da coima.

XXXV. O arguido apenas pode não resultar ou pode não temer ser surpreendido com o aumento da medida da coima no caso de se verificar alguma alteração fáctico-jurídica em sede desse processo de reapreciação que o justifique e na medida em que o justifique.

XXXVI. Apenas este entendimento ou interpretação se afigura compatível com as garantias constitucionais do arguido em sede de processo de contraordenação e com a salvaguarda dos princípios constitucionais estruturantes do Estado de direito democrático.

XXXVII. Consequentemente deve ser declarada inconstitucional a interpretação normativa do estatuído no n.º 8 do artigo 416.º do CdVM, segundo a qual o Tribunal de recurso pode agravar o montante da sanção aplicada pela decisão administrativa ainda que nada se tenha alterado, incluindo a situação financeira do arguido, por tal configurar uma restrição desproporcionada do exercício pelo arguido do direito de defesa (artigo 32.º, n.º 10 da CRP), na modalidade de direito de recurso de impugnação judicial das decisões condenatórias das autoridades administrativas (artigo 268.º, n.º 4 da CRP), constitucionalmente tutelados, violando o disposto no n.º 2 do artigo 18.º da CRP..."

O Ministério Público apresentou contra-alegações, tendo concluído pela não inconstitucionalidade da norma constante do artigo 416.º, n.º 8, do Código de Valores Mobiliários, sustentando que deverá ser negado provimento ao recurso de constitucionalidade e, em consequência, mantido o acórdão recorrido.

A entidade recorrida apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma:

«1.ª A autonomia dogmática (substantiva e processual) do ilícito de mera ordenação social relativamente ao ilícito (e processo) penal - sem prejuízo de princípios gerais comuns de direito sancionatório público - impõe ao intérprete limites à transposição (acrítica e automática) de princípios e institutos processuais penais para o processo de contraordenação. Em concreto, a aplicação do regime da reformatio in pejus no processo de contraordenação deve ser avaliado à luz da natureza jurídica da impugnação judicial no processo de contraordenação.

Da natureza e fundamento da proibição de reformatio in pejus em processo penal

2.ª A Constituição não consagra (expressa ou implicitamente) uma proibição absoluta da reformatio in pejus em processo penal (como esclarece o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 499/97).

3.ª Na compreensão atual da proibição de reformatio in pejus, esta é um princípio da fase de recurso em processo penal (embora com reflexos diretos e indiretos subsequentes) que veda e limita (a)o tribunal de recurso a agravação da pena aplicada ao arguido, quando o recurso penal tenha sido exclusivamente impulsionado pelo arguido ou somente no seu interesse.

4.ª A proibição de reformatio in pejus em processo penal (sem consagração constitucional expressa) assenta fundamentalmente, segundo a jurisprudência constitucional, no princípio da estrutura acusatória e na plenitude das garantias de defesa (Acórdão 499/97).

5.ª O elemento essencial do modelo subjacente à vigência da proibição de reformatio in pejus em processo penal é a posição de paridade e de simetria entre Acusação e Defesa perante uma decisão jurisdicional.

6.ª Verificada a paridade e simetria (oportunidade de recurso), a proibição de reformatio in pejus somente se impõe se o recurso da sentença ou acórdão for interposto exclusivamente pela defesa ou no seu interesse e não, também, quando a acusação recorre autonomamente pugnando pela agravação da condenação.

7.ª No processo de contraordenação, o facto de o arguido ser o único sujeito que pode impugnar judicialmente a decisão condenatória, não significa que a impugnação não seja em si mesma controvertida.

8.ª Com efeito, não sendo a decisão condenatória revogada pela administração, a qual pode ser igualmente sustentada em alegações antes da remessa ao Ministério Público, e sendo os autos apresentados ao tribunal para julgamento pelo Ministério Público (sem retirar a acusação), significam efetivamente que não só mantêm como promovem a pretensão acusatória pública.

9.ª Neste sentido, a inexistência de paridade e simetria exigida pela proibição da reformatio in pejus em processo penal não se verifica (pois só o arguido pode impugnar), como após aquela se verificam impulsos processuais específicos que colocam em causa o segundo pressuposto, a conformação da Acusação. Pelo contrário, esses impulsos confirmam a promoção e manutenção da pretensão acusatória pública.

Da natureza jurídica da impugnação judicial no processo de contraordenação

10.ª A impugnação judicial prevista nas contraordenações consubstancia uma fase de julgamento pleno e efetivo da responsabilidade contraordenacional do arguido e não um recurso stricto sensu: na fase de impugnação judicial, o arguido tem direito a verdadeiro julgamento perante um tribunal com poderes de jurisdição plena.

11.ª A jurisdição plena - embora tematicamente vinculada pela decisão administrativa quanto à factualidade (convolada em acusação) - concede ao tribunal poderes autónomos de investigação e comprovação do ilícito apresentado em juízo e, de igual modo, permite ao arguido não só sindicar a decisão-acusação (quanto a facto, prova e direito), como aduzir novos factos e requerer novos meios de prova.

12.ª Por sua vez, embora tematicamente vinculada quanto à factua-lidade (objeto do processo), a jurisdição plena impõe não só que o tribunal não esteja vinculado à prévia definição do material probatório carreado pela administração (tem liberdade e autonomia para promover nova prova), como também quanto ao enquadramento jurídico efetuado pela administração: o tribunal é igualmente livre e autónomo na definição do direito.

13.ª A qual requer - na sua plenitude - devido à sua autonomia, que o órgão jurisdicional formule um juízo autónomo sobre a medida da sanção relativamente à infração objeto do respetivo julgamento.

Da conformidade constitucional do artigo 416.º, n.º 8 do Códigos dos Valores Mobiliários

Perspetiva histórica e de direito comparado

14.ª O artigo 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários (não vigência de reformatio in pejus nas contraordenações) não consubstancia uma opção legal inovadora no plano do sistema jurídico português nem no direito comparado.

15.ª Quer o anterior regime geral das contraordenações (Decreto-Lei 232/79, de 24 de julho), quer a versão originária do regime geral atual previam expressamente solução de reformatio in pejus na fase de impugnação judicial.

16.ª A solução originária do RGCORD (e o do preceito sindicado, o artigo 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários) é idêntica, no plano do direito comparado, à solução legal constante do regime fonte do direito português: o regime alemão. Este admite expressamente o regime de reformatio in pejus na impugnação judicial decidida em audiência.

Da alegada violação do princípio da igualdade

17.ª O princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição), segundo a concretização jurisprudencial do Tribunal Constitucional, não veda per se a previsão legal de disciplinas normativas distintas, mas somente quando as mesmas sejam arbitrárias e sem fundamento material.

18.ª A circunstância de o legislador ter consagrado no regime geral do ilícito de mera ordenação social uma regra de proibição de reformatio inpejus (fundamento da pretensão de inconstitucionalidade) não origina per se um entrave ao legislador de, no exercício da margem de discricionariedade/conformação legislativa, consagrar regimes jurídicos diferenciados.

19.ª A disciplina processual em crise visa tutelar bens jurídicos dotados de dignidade constitucional (o sistema financeiro: artigos 81.º, alínea f) e 101.º da Constituição), as exigências de celeridade processual nas contraordenações, bem como o respeito pelas garantias constitucionais da reserva da função jurisdicional e independência dos tribunais por via da expressa consagração da autonomia da fase administrativa e judicial do processo de contraordenação.

20.ª De igual modo, a disciplina processual instituída pelo legislador não pode ser dissociada da própria natureza e complexidade objetiva da ilicitude típica no setor financeiro, a qual dificulta não só a deteção da própria infração, como o próprio processamento da contraordenação.

21.ª À luz dos critérios definidos na jurisprudência do Tribunal Constitucional, a disciplina prevista no artigo 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários (inaplicabilidade da reformatio in pejus aos processos de contraordenação por infrações previstas no Código dos Valores Mobiliários) não consubstancia uma disciplina arbitrária nem destituída de fundamento material, não implicando, portanto, ao contrário do invocado pela recorrente, qualquer violação do princípio da igualdade.

Da alegada violação do direito de acesso à tutela jurisdicional

22.ª O artigo 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários não consubstancia qualquer restrição ao direito de acesso à tutela jurisdicional em sede de impugnação judicial de decisões condenatórias em processo de contraordenação.

23.ª O direito de acesso à tutela jurisdicional - garantido através do direito de impugnação judicial previsto no artigo 59.º do RGCORD - é integralmente assegurado pelo artigo 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários: o regime legal garante sempre um julgamento pleno perante autoridade judiciária (quanto a facto, prova e direito).

24.ª O artigo 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários disciplina exclusivamente o sentido e extensão dos poderes de cognição do tribunal, prescrevendo que o juízo condenatório da administração - quanto à medida da sanção - não só não se impõe necessariamente ao tribunal, como não o limita quanto à definição da medida.

25.ª A norma sindicada simplesmente dispõe que, quanto à medida da sanção, o limite imposto ao tribunal é o próprio princípio da legalidade (e da culpa) e não o juízo da administração.

Da alegada violação do direito de defesa e recurso

26.ª Não é constitucionalmente imposto ou sequer exigível a equiparação das garantias constitucionais às garantias criminais, como resulta da jurisprudência reiterada e constante do Tribunal Constitucional.

27.ª A disciplina do 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários não consagra qualquer restrição ao direito de defesa em processo de contraordenação, na vertente de impugnação.

28.ª O ordenamento garante ao arguido não só o direito de impugnação da decisão administrativa como o direito a um julgamento perante um tribunal, o qual comprovará e sindicará quanto ao facto, à prova e ao direito a pretensão acusatória pública: o direito de defesa e impugnação é, portanto, plenamente assegurado pela norma sindicada.

29.ª Não obstante e sem conceder, o artigo 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários não constituiria, em qualquer caso, uma restrição intolerável ou desproporcionada ao direito de defesa e recurso/impugnação em processo de contraordenação.

30.ª A norma preserva integralmente o conteúdo essencial da garantia constitucional (obtenção de uma pronúncia judicial sobre uma pretensão acusatória pública) e é necessária e adequada à preservação de bens jurídicos e interesses dotados de dignidade constitucional (a tutela do sistema financeiro e a celeridade e eficiência da reação sancionatória perante as lesões aos bens jurídicos protegidos), como para garantir a compatibilidade com princípios constitucionais fundamentais, como a reserva da função jurisdicional e a autonomia e independência dos tribunais.

31.ª O teste da ponderação de bens exigida pelo princípio da proporcionalidade, no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição, no caso concreto, deve fazer prevalecer, em concreto, a tutela dos bens jurídicos supra referidos, bem como os axiomas fundamentais do poder jurisdicional (sob pena de subversão da lógica e equilíbrio jurídico-constitucional), sobre uma conceção (amplíssima) do direito de defesa na vertente de impugnação, assente numa alegada exigência constitucional nas contraordenações de autoimposição do juízo da administração sobre a medida da sanção aos tribunais e, consequentemente, na vinculação dos tribunais à administração em matéria de repressão da legalidade.

32.ª O contrário significaria, assim, que a própria ideia fundamental do poder jurisdicional (a liberdade, autonomia e independência dos tribunais) não é, em si mesma, a garantia fundamental dos cidadãos perante e contra o Estado, o que é inadmissível nos seus próprios termos.

33.ª Termos em que a alegada violação do direito de defesa não se verifica no caso em apreço.

Vigência de proibição da reformatio in pejus na fase impugnação judicial

34.ª O regime de proibição da reformatio inpejus na fase de impugnação judicial (consagrado no artigo 72.º-A do RGCORD e do qual a norma sindicada se afasta), atenta a natureza jurídica da impugnação judicial e a limitação legal aos poderes de cognição e apreciação da gravidade, ilicitude e culpa da conduta do agente na determinação da medida concreta da coima em função do juízo prévio da autoridade administrativa, suscita complexos e pertinentes problemas jurídico-constitucionais de compatibilidade com a garantia da reserva da função jurisdicional e da autonomia e independência dos tribunais.

35.ª Com efeito, a limitação legal da atividade jurisdicional do tribunal pela decisão da autoridade administrativa, quanto ao elemento essencial da definição medida da sanção, subverte o equilíbrio axiológico de valores constitucionais (prevalência das decisões dos tribunais sobre as decisões da administração), ao consagrar e limitar expressamente a atividade do tribunal, relativamente à medida máxima da sanção, ao juízo de mérito efetuado pela administração.

36.ª A solução consagrada no artigo 72.º-A do RGCORD aplica nas contraordenações uma solução penal vigente num quadro de paridade e simetria dos sujeitos processuais na sequência de um julgamento (e da respetiva decisão jurisdicional), enquanto nas contraordenações se aplica não só em momento anterior à intervenção do Ministério Público, sem qualquer paridade e simetria de posições dos sujeitos processuais, como em momento anterior ao próprio julgamento.

37.ª O artigo 416.º, n.º 8 do Código dos Valores Mobiliários repõe o equilíbrio de poderes jurídico-constitucionalmente imposto, ao não limitar quanto à sanção aplicável o juízo do tribunal, o qual é somente limitado pelo princípio da legalidade e da culpa.

Termos em que se requer aos Excelentíssimos Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional que neguem provimento ao recurso.»

Fundamentação

Segundo a Recorrente, o artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, na interpretação segundo a qual é possível o agravamento da coima em sede de impugnação judicial interposta pelo arguido em sua defesa, sem que tenha havido alteração e/ou agravamento dos factos, elementos ou circunstâncias da decisão administrativa condenatória, é inconstitucional, por violação dos preceitos constitucionais que consagram o direito à tutela jurisdicional efetiva (cf. artigo 20.º da Constituição), restringindo de forma desproporcionada o exercício pelo arguido do direito de defesa (cf. artigo 32.º, n.º 10, da Constituição), na modalidade de impugnação ou recurso das decisões condenatórias das autoridades administrativas (cf. artigo 268.º, n.º 4, da Constituição), o que se afigura inadmissível em face do n.º 2, do artigo 18.º, da Constituição. Mais sustenta a Recorrente que a aludida norma viola o princípio da igualdade, nada justificando o afastamento da regra geral prevista no artigo 72.º-A do Regime Geral das Contraordenações.

Antes de analisar a questão de constitucionalidade, importa proceder ao enquadramento da proibição da reformatio in pejus no plano infraconstitucional, quer no direito processual penal, quer no processo de contraordenação.

No âmbito do processo penal, a proibição da reformatio in pejus encontra-se prevista no artigo 409.º do Código de Processo Penal, cujo n.º 1 dispõe que «[i]nterposto recurso de decisão final somente pelo arguido, pelo Ministério Público, no exclusivo interesse daquele, ou pelo arguido e pelo Ministério Público no exclusivo interesse do primeiro, o tribunal superior não pode modificar, na sua espécie ou medida, as sanções constantes da decisão recorrida, em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrentes», acrescentando o n.º 2 que esta proibição «não se aplica à agravação da quantia fixada para cada dia de multa, se a situação económica e financeira do arguido tiver entretanto melhorado de forma sensível».

Tem-se entendido que esta é uma medida protetora do direito de recurso em favor do arguido, visando evitar que neste tipo de impugnação o arguido possa ser punido com sanções mais graves, o que, a acontecer condicionaria de modo intolerável o exercício do direito ao recurso.

Já no que respeita ao domínio do ilícito de mera ordenação social, o Regime Geral das Contraordenações, instituído pelo Decreto-Lei 433/82, de 27-10, não continha na sua redação inicial norma semelhante. Só com as alterações introduzidas ao aludido regime pelo Decreto-Lei 244/95, de 14-09, é que foi aditado o artigo 72.º-A que, sob a epígrafe «Proibição da reformatio in pejus», dispõe, no n.º 1 que «[i]mpugnada a decisão da autoridade administrativa ou interposto recurso da decisão judicial somente pelo arguido, ou no seu exclusivo interesse, não pode a sanção aplicada ser modificada em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrentes», acrescentando o n.º 2 que «[o] disposto no número anterior não prejudica a possibilidade de agravamento do montante da coima, se a situação económica e financeira do arguido tiver entretanto melhorado de forma sensível».

Referindo-se a esta opção legislativa, Paulo Pinto de Albuquerque considera que esta proibição de reformatio in pejus «é "inconveniente", "injustificável" e tem "efeitos perversos", tais como aumenta o número de recursos independentemente da gravidade das sanções e torna os recursos economicamente compensadores sempre que estejam em causa sanções muito elevadas, por via do diferimento no tempo do respetivo pagamento. [...] Pior ainda: a regra da proibição da reformatio in pejus contraria a própria natureza "provisória" da decisão administrativa e, portanto, também, a natureza da impugnação judicial, que consubstancia uma verdadeira "transferência da questão do domínio da administração para o juiz"» (cf., «Comentário do Regime Geral das Contraordenações à luz da Constituição da República e da Convenção europeia dos Direitos do Homem», Universidade Católica Editora, 2011, pp. 294-295, onde o autor faz ainda uma síntese das diversas críticas apontadas pela doutrina a este regime, com referência a outros autores com idênticas posições).

Também Alexandra Vilela (cf., «O Direito de Mera Ordenação Social», Coimbra Editora, 2013, pág. 485) defende que não se justifica a proibição de reformatio in pejus, pelo menos nos casos em que a impugnação judicial seja decidida em audiência, referindo, a este respeito o seguinte:

«[...] o princípio da proibição da reformatio in pejus não faz sentido quando o tribunal decide o recurso em audiência, pois, nesse momento, os autos já foram "examinados à lupa", primeiro pela administração, segundo pelo MP e, em último lugar, pelo juiz. Assim sendo, se, apesar de tudo, prosseguiu sem que o MP e o arguido fizessem uso dos seus poderes de, respetivamente, retirar a acusação [...] e de retirada do recurso [...], de duas uma: ou o arguido acredita no bem fundado da sua pretensão, coisa que nenhuma das três entidades que analisou os autos conseguiu enxergar, ou então aquele encontra-se disposto a arriscar tudo, pois no fundo nada perde.

Dentro deste cenário, cremos que não se justifica que o arguido, que ainda assim, pretenda ver a sua impugnação judicial decidida em audiência de julgamento, se encontre respaldado pelo princípio da proibição de reformatio in pejus.».

Esta regra da proibição de reformatio in pejus consagrada no Regime Geral das Contraordenações é, no entanto, afastada relativamente aos processos contraordenacionais previstos no Código dos Valores Mobiliários, pelo artigo 416.º, n.º 8, cuja constitucionalidade é sindicada nestes autos, e que dispõe que «[n]ão é aplicável aos processos de contraordenação instaurados e decididos nos termos deste Código a proibição de reformatio in pejus, devendo essa informação constar de todas as decisões finais que admitam impugnação ou recurso».

Esta norma foi introduzida no Código dos Valores Mobiliários pelo Decreto-Lei 52/2006, de 15 de março, que procedeu à transposição da Diretiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro, relativa ao abuso de informação privilegiada e à manipulação de mercado, tendo o aludido decreto-lei sido precedido de autorização legislativa através da Lei 55/2005, de 18 de novembro.

No preâmbulo do Decreto-Lei 52/2006, de 15 de março, o legislador refere que «a eliminação da proibição de reformatio in pejus nos processos de contraordenação, como já acontece noutras áreas do sistema financeiro» tem em vista garantir «a necessária autonomia entre a fase administrativa e a fase judicial do procedimento contraordenacional, bem como a congruência e a uniformidade de soluções do regime do ilícito de mera ordenação social vigente no setor financeiro».

Esta mesma solução tem sido adotada em outras situações em que se estabelecem regimes específicos de contraordenações aplicáveis em determinadas áreas sectoriais. É o caso, no âmbito do setor financeiro, do artigo 230.º, n.º 3, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei 298/92, de 31 de dezembro, na redação introduzida 25/2008, de 5 de junho e 28/2009, de 19 de junho, e aos Decretos-Leis n.os 260/94, de (...)">Decreto-Lei 157/2014, de 24 de outubro. É o que acontece também em matéria de concorrência, em que o artigo 88.º, n.º 1, da Lei 19/2012, de 8 de maio (Lei da Concorrência), dispõe que «[o] Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão conhece com plena jurisdição dos recursos interpostos das decisões em que tenha sido fixada pela Autoridade da Concorrência uma coima ou uma sanção pecuniária compulsória, podendo reduzir ou aumentar a coima ou a sanção pecuniária compulsória». É também o regime previsto em matéria de contraordenações ambientais, estabelecendo-se no artigo 75.º da Lei 50/2006, de 29 de agosto (Lei-quadro das Contraordenações Ambientais), a inaplicabilidade da proibição de reformatio in pejus, em termos semelhantes ao que acontece com o n.º 8, do artigo 416.º, do Código de Valores Mobiliários.

Tecidas estas considerações, importa agora apreciar da conformidade constitucional da norma sindicada.

1 - Da violação do direito de defesa do arguido e do direito ao recurso

Segundo alega a Recorrente, a norma do artigo 416.º, n.º 8, do Código de Valores Mobiliários, interpretada no sentido de ser possível o agravamento de coima em sede de recurso de impugnação judicial interposto pelo arguido em sua defesa, sem que tenha havido alteração e/ou agravamento dos factos, elementos ou circunstâncias da decisão administrativa condenatória, é inconstitucional, violando o direito à defesa, na modalidade de direito ao recurso, uma vez que desincentiva o arguido a recorrer e apela a que se conforme com a decisão administrativa condenatória, sem que tal possa justificar-se com a salvaguarda de outros direitos constitucionalmente protegidos.

Considerou ainda a Recorrente que tal interpretação atenta contra o disposto no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, na medida em que desincentiva claramente o livre exercício do direito de defesa.

Embora o Tribunal Constitucional nunca tenha sido confrontado com questão idêntica à que está em causa nos presentes autos, já foi chamado a pronunciar-se, por diversas vezes, sobre interpretações normativas do artigo 409.º do Código de Processo Penal, em que estava em causa a proibição da reformatio in pejus, sendo importante recordar tal jurisprudência.

No Acórdão 236/2007 podemos encontrar uma apreciação da jurisprudência mais relevante do Tribunal Constitucional existente sobre esta matéria:

«2.1 - O princípio da proibição da reformatio in pejus, apesar de não especificamente referido, de forma expressa, no texto da CRP, encontra óbvio suporte constitucional, como este Tribunal reconheceu no Acórdão 499/97, ao referir:

"A proibição da reformatio in pejus justifica-se fundamentalmente pela proteção das garantias de defesa (cf. parecer da Câmara Corporativa, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 180, 1968, pp. 103 e seguintes, no qual se discutem as várias posições doutrinárias sobre o fundamento jurídico da reformatio in pejus (cf. ainda Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1974, p. 259; Castanheira Neves, Sumários de Processo Penal, 1967-1968, p. 36; e Bettiol, Instituições de Processo Penal, 1974, pp. 304-313). Na realidade, a proibição da reformatio in pejus foi referida no pensamento jurídico a fundamentações de natureza diversa, desde as que são baseadas na estrutura do processo penal (princípio do dispositivo para uns, estrutura do acusatório para outros) até às que assentam em razões valorativas substanciais (iniquidade) ou, até, em razões político-criminais (favor rei). A esse tipo de razões, que pretendiam justificar uma ampla proibição da reformatio, sempre que apenas houvesse recurso de defesa ou no seu interesse, contrapôs Delitala os valores de justiça limitativos da proibição da reformatio quando não estivesse apenas em causa impedir uma modificação dos critérios do já decidido, mas corrigir erros na aplicação do direito (cf. parecer citado, loc. cit., e ainda Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 1994, p. 321).

Mas a conformação da proibição da reformatio in pejus, numa perspectiva jurídica que pondere globalmente todos os fins do sistema, não deve, na realidade, considerar apenas uma perspetiva de interesse do arguido, devendo, por isso, o âmbito da proibição ser delimitado na conexão entre as garantias de defesa e a realização da justiça.

Não decorre, obviamente, da Constituição uma proibição absoluta da reformatio in pejus, pois isso seria conflituante com o direito ao recurso da acusação e com a realização da justiça. Mas tem de ser garantida, num certo grau, a estabilidade das sentenças judiciais. A sua revogabilidade não pode ser referida a um plano de justiça absoluta, mas apenas ao plano do recurso e da recorribilidade (cf. Bettiol, ob. cit., p. 307). O próprio direito ao recurso pressupõe a verificação de requisitos determinados, os quais justificam uma reapreciação dos factos provados ou do direito aplicado dentro da matéria recorrida, sendo o recurso a emanação de um poder não ilimitado de controlo pelos tribunais superiores das decisões proferidas em 1.ª instância.

Ora, a proibição da reformatio in pejus é reclamada pela plenitude das garantias de defesa, quer porque a reformatio in pejus poderia surgir inesperadamente ou de modo insuscetível a ser contraditada pela defesa, quer porque restringiria gravemente as condições de exercício do direito ao recurso.

São, assim, princípios constitucionais, na sua concretização no sistema jurídico, que exigem a configuração de uma certa medida de proibição de reformatio in pejus [...]."

Após ter feito um excurso pela jurisprudência constitucional sobre a matéria, concluiu o Tribunal no referido Acórdão 236/2007 que os fundamentos constitucionais do princípio da proibição da reformatio in pejus «não se cingem à consideração do direito de recurso, mas se baseiam, mais amplamente, na plenitude das garantias de defesa que o processo criminal deve assegurar».

Posteriormente, referindo-se ao Acórdão 236/2007 e à restante jurisprudência do Tribunal Constitucional, o Acórdão 502/2007 sintetizou da seguinte forma as orientações resultantes dessa jurisprudência a respeito dos fundamentos constitucionais da proibição de reformatio in pejus:

«Antes do mais, o Tribunal identificou os fundamentos constitucionais da proibição de reformatio in pejus. E disse - invocando jurisprudência sua anterior, nomeadamente a decorrente dos Acórdãos n.os 499/97, 498/98, 291/2000, 135/99, 522/99, 324/99 e 187/98 - que, face à Constituição, o instituto não tinha nem podia ter uma configuração absoluta: relevando ele de uma "tensão existente entre dois valores: o direito punitivo do Estado, de que decorre o poder dos juízes aplicarem livremente as sanções adequadas, e as garantias de defesa dos arguidos" (assim mesmo, Acórdão 324/99), a proibição justificar-se-ia constitucionalmente só quando referida ao princípio da plenitude das garantias de defesa e ao direito ao recurso, consagradas no artigo 32.º, n.º 1, da CRP. Significa isto que a proibição de agravação das penas por nova decisão judicial seria assim constitucionalmente justificada - ou, melhor dito, constitucionalmente imposta - sempre que, e apenas quando, a nova decisão resultasse exclusivamente do exercício de um direito da defesa. Sempre que: é que consagrando a CRP o princípio da plenitude das garantias da defesa (incluindo o direito ao recurso), mal se compreenderia que a lei ordinária permitisse que o exercício de um direito de defesa viesse a redundar em dano para a própria defesa. Apenas quando: se se entendesse de outro modo - isto é, se se entendesse que a Constituição impunha uma proibição de agravação das penas fora destas circunstâncias, configurando-se assim uma raiz constitucional para a proibição absoluta de reformatio in pejus - tal entendimento "seria conflituante com o direito ao recurso da acusação e com a realização da justiça" (Acórdão 499/97).»

Conforme resulta da jurisprudência citada, o Tribunal Constitucional tem reconhecido que da Constituição não decorre uma proibição absoluta da reformatio in pejus, pois isso seria conflituante com o direito ao recurso por parte da acusação e com a realização da Justiça, de que decorre o poder dos juízes aplicarem livremente as sanções adequadas, ressalvando, no entanto, que tem que ser garantida, num certo grau, a estabilidade das sentenças judiciais. Assim, tem entendido o Tribunal que a proibição da reformatio in pejus é reclamada pela plenitude das garantias de defesa, quer porque a reformatio in pejus poderia surgir inesperadamente ou de modo insuscetível a ser contraditada pela defesa, quer porque restringiria gravemente as condições de exercício do direito ao recurso (cf. Acórdão 499/97).

Ainda de acordo com a jurisprudência deste Tribunal sobre esta matéria, a estabilidade das decisões judiciais que justifica a proibição da reformatio in pejus, tem razão de ser nos casos em que o recurso tenha sido interposto exclusivamente pelo arguido ou pelo Ministério Público no interesse do arguido, uma vez que, podendo o Ministério Público interpor recurso e não o tendo feito, conformando-se com a sanção aplicada, não será admissível que o arguido veja nesse caso agravada a sua situação no recurso por si interposto.

A proibição da reformatio in pejus, tendo o seu campo de eleição no âmbito do direito criminal, encontra-se também prevista, conforme vimos, no Regime Geral das Contraordenações (cf. artigo 72.º-A do Regime Geral das Contraordenações).

Sendo certo que a norma sindicada constitui um desvio à regra estabelecida no aludido regime geral, cumpre apreciar se os fundamentos subjacentes à proibição da reformatio in pejus no âmbito criminal são transponíveis para o domínio do ilícito de mera ordenação social, mais concretamente para a fase da primeira apreciação judicial da impugnação de decisão administrativa sancionatória.

Antes de mais, importa ter em atenção que o conteúdo das garantias processuais é diferenciado, consoante o domínio do direito punitivo em que se situe a sua aplicação. Com efeito, como tem sido reiteradamente entendido pelo Tribunal Constitucional, no âmbito contraordenacional, atendendo à diferente natureza do ilícito de mera ordenação e à sua menor ressonância ética, em comparação com o ilícito criminal, é menor o peso do regime garantístico, pelo que as garantias constitucionais previstas para os ilícitos de natureza criminal não são necessariamente aplicáveis aos ilícitos contraordenacionais ou a outros ilícitos no âmbito de direito sancionatório (cf., neste sentido, entre muitos outros, os acórdãos n.os 158/92, 50/99, 33/2002, 659/2006, 99/2009 e 135/2009).

A este propósito, refere o Acórdão 659/2006:

«2.3 - Dentre os processos sancionatórios é o processo contra-ordenacional um dos que mais se aproxima, atenta a natureza do ilícito em causa, do processo penal, embora a este não possa ser equiparado.

Constitui afirmação recorrente na jurisprudência do Tribunal Constitucional a da não aplicabilidade direta e global aos processos contra-ordenacionais dos princípios constitucionais próprios do processo criminal, desde logo o princípio da judicialização da instrução consagrado no n.º 4 do artigo 32.º (neste sentido: Acórdão 158/92). A diferença de "princípios jurídico-constitucionais, materiais e orgânicos, a que se submetem entre nós a legislação penal e a legislação das contra-ordenações" reflete-se "no regime processual próprio de cada um desses ilícitos", não exigindo "um automático paralelismo com os institutos e regimes próprios do processo penal, inscrevendo-se assim no âmbito da liberdade de conformação legislativa própria do legislador", por exemplo, a não atribuição ao assistente (admitindo que a lei consente em processo contra-ordenacional esta figura) de legitimidade para recorrer, legitimidade que o artigo 73.º, n.º 2, do RGCO apenas reconhece ao arguido e ao Ministério Público (Acórdão 344/93). Assentando na liberdade de conformação do legislador ordinário, ao qual não é constitucionalmente imposta a equiparação de garantias do processo criminal e do processo contra-ordenacional, o Acórdão 50/99 não julgou inconstitucional a norma da parte final do artigo 66.º do RGCO, que afasta a redução a escrito da prova produzida na audiência em 1.ª instância. Ainda como exemplos da admissibilidade constitucional da diferenciação de regimes podem citar-se: (i) os Acórdãos n.os 473/2001 e 395/2002, que não julgaram inconstitucionais os artigos 59.º, n.º 3, e 60.º, n.os 1 e 2, do RGCO, na interpretação de que o prazo para a interposição do recurso da decisão da autoridade administrativa neles previsto não se suspende durante as férias judiciais; (ii) os Acórdãos n.os 50/2003, 62/2003, 249/2003, 469/2003 e 492/2003, que consideraram não constitucionalmente imposta a transposição para a fundamentação da decisão administrativa sancionatórias das mesmas exigências que o artigo 374.º do CPP estabelece para a sentença penal condenatória, e, consequentemente, não julgaram inconstitucional a norma do artigo 125.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, interpretada no sentido de que a fundamentação por remissão nela consentida é aplicável à decisão sancionatória de ato ilícito de mera ordenação social; (iii) o Acórdão 581/2004, que, considerando, além do mais, que "a garantia constitucional dos direitos de audiência e de defesa em processo contra-ordenacional (n.º 10 do artigo 32.º da Constituição) não pode comportar a consagração de um princípio da estrutura acusatória do processo idêntico ao que a Constituição reserva, no n.º 5 do artigo 32.º, para o «processo criminal»", não julgou inconstitucionais os artigos 39.º, n.º 1, e 40.º do CPP, 2.º do Regime Geral das Contra-Ordenações Laborais (Lei 166/99, de 4 de agosto) e 41.º do RGCO, quando interpretados no sentido da inaplicabilidade dos dois primeiros a casos em que o autor da decisão de um processo de contra-ordenação laboral confirmou, anteriormente, a auto de notícia levantado ao destinatário dessa decisão; e (iv) o Acórdão 325/2005, que considerou "não passível de censura constitucional que, no processo contra-ordenacional, e antes da sua passagem à fase jurisdicional, atenta a menor ressonância ética do ilícito contra-ordenacional face ao direito criminal, o legislador possa, no exercício da sua liberdade conformadora, subtrair das mais rigorosas exigências previstas para o processo penal determinados procedimentos concretos, mais rigorosos e porventura inultrapassáveis, quer no domínio criminal, quer no domínio de uma fase procedimental jurisdicionalizada, procedimentos esse que se reflitam, no referido processo, numa menos ampla exigência de observação de específicos requisitos processuais, como, por exemplo, a análise concreta, na decisão aplicadora da coima, da «exceções» ou «questões prévias» suscitadas pelo acoimando na sua defesa", e, consequentemente, não julgou inconstitucionais as normas dos artigos 50.º e 58.º do RGCO, interpretados no sentido de não imporem à autoridade administrativa o dever de pronúncia sobre as nulidades invocadas na defesa do arguido em processo de contra-ordenação.

No entanto, este Tribunal também tem sublinhado que a reconhecida inexigibilidade de estrita equiparação entre processo contra-ordenacional e processo criminal é conciliável com "a necessidade de serem observados determinados princípios comuns que o legislador contra-ordenacional será chamado a concretizar dentro de um poder de conformação mais aberto do que aquele que lhe caberá em matéria de processo penal" (Acórdãos n.º 469/97 e 278/99). No primeiro acórdão referido acrescentou-se que "porventura, um desses princípios, comuns a todos os processos sancionatórios, que mais constrições imporá ao legislador será, desde logo, por direta imposição constitucional, o da audiência e correlativa defesa do arguido, inseridos num desenvolvimento processual em que o princípio do contraditório deverá ser mantido, como forma de complementar a estrutura acusatória, que não dispositiva, da atuação dos poderes públicos", sublinhando que esses princípios são "imediatamente aplicáveis [...] logo na fase administrativa do processo contra-ordenacional, por exigência do n.º 8 [hoje n.º 10] do artigo 32.º da Constituição", não fazendo sentido "aceitar que os mesmos não tenham projeção na fase recursória posterior, que corresponde à jurisdicionalização daquele processo", tendo concluído pela inconstitucionalidade da "norma do artigo 416.º do CPP aplicada ao processo de contra-ordenação laboral e aí interpretada em termos de não impor a notificação à arguida do parecer do Ministério Público em que se suscita, pela primeira vez, a questão prévia do não recebimento do recurso por extemporaneidade". Uma outra situação de "extensão" ao processo contra-ordenacional de garantias do processo criminal foi contemplada no Acórdão 265/2001, que, na sequência dos Acórdãos n.os 319/99, 509/2000 e 590/2000, declarou a inconstitucionalidade das disposições conjugadas constantes do n.º 3 do artigo 59.º e do n.º 1 do artigo 63.º, ambos do RGCO, "na dimensão interpretativa segundo a qual a falta de formulação de conclusões na motivação de recurso, por via do qual se intenta impugnar a decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima, implica a rejeição do recurso, sem que o recorrente seja previamente convidado a efetuar tal formulação".

2.4 - Assente que, dada a diferente natureza dos ilícitos em causa e a menor ressonância ética do ilícito de mera ordenação social, com reflexos nos regimes processuais próprios de cada um deles, não é constitucionalmente imposto ao legislador a equiparação das garantias em ambos esses regimes, é evidente que não se pode considerar inconstitucional a não admissibilidade de recurso jurisdicional de decisões proferidas em sede de impugnação judicial de decisões administrativas aplicadoras de coimas quando nem sequer relativamente às correspondentes decisões no âmbito do processo criminal idêntica garantia é exigida.».

Importa pois, no sentido de saber até que ponto existirá uma imposição constitucional de proibição de reformatio in pejus em situações como a dos autos, ter em atenção o modo como está estruturado o processo de contraordenação, desde logo para apurar se os fundamentos constitucionais em que assenta a referida proibição no que respeita ao processo criminal são extensíveis ao tipo de processo contraordenacional em causa nos autos.

Como é sabido, no caso do processo de contraordenação, impugnada a decisão administrativa que aplicou uma sanção e caso a autoridade administrativa não revogue a decisão de aplicação da coima (cf. artigo 62.º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações), os autos são enviados ao Ministério Público, que os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação (cf. n.º 1 do referido artigo 62.º). Assim, quando recebe os autos, o Ministério Público passa a assumir o papel de titular do processo, podendo, para além de os apresentar ao juiz, nos termos referidos, optar por retirar a acusação, desde que se verifiquem os pressupostos formais do artigo 65.º-A do Regime Geral das Contraordenações, podendo, ainda, inclusive, requerer a conversão do processo em processo criminal, nos termos previstos no artigo 76.º do aludido regime (o que determinará a instauração de inquérito). Por outro lado, mesmo depois de o processo ser remetido ao tribunal, o arguido poderá também retirar o recurso, até à sentença em primeira instância ou até ser proferido o despacho previsto no artigo 64.º, n.º 2, sendo que, se o fizer depois do início da audiência carece do acordo do Ministério Público (cf. artigo 71.º).

Conforme se pode constatar, não existe paralelismo entre o processo criminal e o processo contraordenacional, não se podendo equiparar o recurso para um tribunal superior no âmbito de um processo criminal interposto pelo arguido ou no interesse deste e a impugnação da decisão administrativa que aplica uma sanção no âmbito de um processo contraordenacional para um tribunal. Neste último caso, remetidos os autos ao tribunal, o Ministério Público passa a ser, nos termos expostos, o titular da pretensão punitiva e, optando por remetê-los ao juiz, não se poderá dizer que se tenha conformado com a decisão administrativa, contrariamente ao que acontece na situação prevista no artigo 409.º do Código de Processo Penal.

Assim, tendo em atenção que a admissibilidade da reformatio in pejus na questão de constitucionalidade em análise se reporta à impugnação judicial de decisão administrativa, o direito de defesa que poderá revelar-se ameaçado com tal solução não é o direito ao recurso dentro da hierarquia jurisdicional, mas sim o direito de acesso aos tribunais, ou seja a garantia de tutela jurisdicional efetiva, pelo que o que importa verificar é se a interpretação normativa questionada viola o disposto no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, e mais especificamente a garantia da impugnação dos atos administrativos sancionatórios perante os tribunais, consagrada no artigo 268.º, n.º 4, da Constituição.

2 - Da violação da garantia de tutela jurisdicional efetiva

Na verdade, a Recorrente também alega que o artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, restringe de forma desproporcionada o direito de acesso à tutela jurisdicional efetiva previsto nos artigos 20.º, n.º 1, bem como o direito de impugnação das decisões administrativas, previsto no artigo 268.º, n.º 4, da Constituição, o que se afigura inadmissível em face do disposto no n.º 2, do artigo 18.º, da Lei Fundamental.

O artigo 20.º da Constituição garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos (n.º 1), impondo ainda que, para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegure aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efetiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos (n.º 5).

A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem entendido que o direito de acesso aos tribunais ou à tutela jurisdicional implica a garantia de uma proteção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efetiva, cujo âmbito normativo abrange nomeadamente: (a) o direito de ação, no sentido do direito subjetivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional; (b) o direito ao processo, traduzido na abertura de um processo após a apresentação daquela pretensão, com o consequente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar mediante decisão fundamentada; (c) o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, no sentido de a decisão haver de ser proferida dentro dos prazos preestabelecidos, ou, no caso de estes não estarem fixados na lei, dentro de um lapso temporal proporcional e adequado à complexidade da causa; (d) o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumariedade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas (veja-se, neste sentido, entre outros, o Acórdão 440/94). Contudo, tem sido também entendimento reiterado do Tribunal Constitucional que, embora esteja vinculado a criar meios jurisdicionais de tutela efetiva dos direitos e interesses ofendidos dos cidadãos, "o legislador não deixa de ser livre de os conformar, não sendo de todo o modo obrigado a prever meios iguais para situações diversas, considerando ainda que a identidade ou diversidade das situações em presença há-de resultar de uma perspetiva global que tenha em conta a multiplicidade de interesses em causa, alguns deles conflituantes entre si" (cf. Acórdão 63/2003).

Este direito geral à tutela jurisdicional efetiva é concretizado, no âmbito da justiça administrativa, através da consagração, no artigo 268.º da Constituição, de um conjunto de garantias dos particulares em face da Administração, onde se inclui «o direito de impugnar quaisquer atos administrativos que os lesem» (cf. n.º 4, do artigo 268.º, da Constituição).

O Tribunal Constitucional tem entendido que, em processo de contraordenação, para além de gozar do direito de defesa constitucionalmente previsto no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, com o conteúdo acima referido, o arguido goza também do direito de acesso à tutela jurisdicional, com o consequente direito de impugnar judicialmente a decisão administrativa, nos termos previstos no artigo 59.º e ss. do Regime Geral das Contraordenações (cf., entre outros, citados acórdão n.os 659/2006 e 135/2009).

No entanto, como também tem sido realçado pelo Tribunal, o legislador dispõe de ampla margem de conformação no que respeita à modelação do regime de acesso à via jurisdicional, podendo disciplinar o modo como se processa esse acesso, nomeadamente em via de recurso-impugnação, posto que não crie obstáculos ou condicionamentos substanciais.

No caso dos autos, a opção do legislador no que respeita à forma de impugnação das decisões de caráter sancionatório aplicadas em processo de contraordenação por entidades administrativas não foi no sentido de consagrar um recurso de mera legalidade ou de cassação, mas antes um recurso de plena jurisdição (cf. a este respeito, Alexandra Vilela, ob. cit., pág. 386-387, e Joaquim Pedro Cardoso da Costa, «O Recurso para os tribunais judiciais da aplicação das coimas pelas autoridades administrativas», in Ciência e Técnica Fiscal, 366, 1992, p. 59).

Com efeito, conforme resulta do regime geral das contraordenações, o processo contraordenacional tem uma fase administrativa e, no caso de impugnação da decisão aplicada nesta fase, segue-se uma fase jurisdicional em que o arguido dispõe não apenas da possibilidade de sindicar a legalidade da decisão, mas também de um conjunto de amplas faculdades de exercício do seu direito de defesa e de contraditório. A impugnação dá lugar, não a um recurso propriamente dito, mas a um novo processo de natureza jurisdicional, em que o tribunal não se limita a apreciar a decisão, mas todo o processado nos autos, podendo ser produzida prova neste processo judicial, quer pela autoridade administrativa recorrida, quer pelo arguido, sendo que o tribunal valora em conjunto toda a prova produzida nos autos, quer a já produzida na fase administrativa, quer a realizada na fase jurisdicional, particularmente a que venha a ter lugar em audiência.

Ou seja, o tribunal, ao apreciar a impugnação da decisão administrativa, não está vinculado à qualificação efetuada pela entidade administrativa que proferiu a decisão, apreciando quer os factos (com base nas provas que são apresentadas no âmbito do recurso), quer a matéria de direito (qualificação jurídica dos factos e sanções aplicadas). Quando o processo é enviado para o Tribunal, na sequência da impugnação do arguido, tudo se passa, assim, como se tivesse lugar um novo julgamento, em que a decisão passa a ser tida como acusação e, como tal, passa a delimitar o objeto do processo.

Tendo o legislador optado por dar esta configuração ao regime geral da impugnação da decisão da autoridade administrativa em processo de contraordenação, não está impedido de, dentro da margem de livre conformação de que dispõe, e face às amplas possibilidades de defesa e de exercício do contraditório conferidas ao arguido no âmbito deste processo de impugnação, afastar em alguns regimes especiais a proibição da reformatio in pejus em relação à decisão da entidade administrativa, como sucede com o disposto no artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, impedindo assim que a decisão administrativa se imponha, no que respeita à sanção aplicada, ao Tribunal.

Com efeito, repete-se, sendo certo que o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, consagrado constitucionalmente, pressupõe a garantia da via judiciária, que implica que sejam outorgados ao interessado os meios ou instrumentos processuais adequados para fazer valer em juízo, de forma efetiva, o seu direito, e que uma das dimensões em que se concretiza a garantia da via judiciária é justamente o direito de acesso, sem constrangimentos substanciais, ao órgão jurisdicional para ver dirimido um litígio, a norma sindicada, não cria, em rigor, um qualquer obstáculo ou impedimento ao direito à impugnação judicial, se entendermos como tal a imposição ao recorrente de um qualquer ónus ou necessidade de cumprimento de um determinado requisito que tenha de ser preenchido para que a impugnação seja admitida. Nesse sentido, não se pode dizer que esta norma contenha qualquer restrição de acesso à via jurisdicional.

Por outro lado, é certo, no entanto, que não existindo proibição de reformatio in pejus o recorrente terá de fazer uma ponderação prévia quanto à decisão de interposição da impugnação judicial, face à possibilidade de a decisão impugnada vir a ser modificada em seu desfavor. No entanto, a existência deste risco, tem de ser ponderada em conjugação com o tipo de impugnação em causa, em que, conforme se referiu, o tribunal conhece dela com plena jurisdição, havendo lugar a um novo julgamento da questão.

Tendo o legislador conformado um meio de impugnação das decisões sancionatórias das autoridades administrativas com estas características, entendeu também, em alguns regimes especiais acima referidos, não ser de limitar ou vincular os poderes do tribunal ao já decidido pela autoridade administrativa sobre a responsabilidade contraordenacional, atendendo, por um lado, aos interesses e bens jurídicos envolvidos neste específico setor, e por outro lado, às especiais qualidades dos intervenientes. Esta não vinculação da instância jurisdicional à decisão administrativa implica também que o tribunal possa formular um juízo autónomo sobre a medida da sanção relativamente à infração objeto do respetivo julgamento, independentemente de se manterem ou não inalterados os elementos de facto e de direito tidos em conta na decisão administrativa.

Perante este quadro processual não há razões para que se considere que o regime em análise consagre um condicionamento excessivo, sendo certo que o recorrente não deixa de ser alertado, como impõe o regime em questão (artigo 416.º, n.º 8, do Código de Valores Mobiliários), para a possibilidade da sanção ser agravada, o que impede que seja surpreendido quanto a essa eventualidade, podendo exercer também a sua defesa quanto aos critérios de determinação concreta da coima, a ser ponderados pelo tribunal, sendo que essa ponderação, ao contrário do que parece referir a Recorrente, não é uma ponderação subjetiva, mas baseada em critérios legalmente previstos, estando sujeita a uma fundamentação lógica e racional, de modo a ser controlável, inclusive em sede de recurso para um tribunal superior.

Além disso, não pode deixar de se ter em consideração, como tem sido apontado por alguma doutrina, que a proibição da reformatio in pejus tem como consequência o aumento do número de recursos interpostos independentemente da gravidade da sanção, podendo comprometer o caráter de simplificação e celeridade do direito de mera ordenação social, tornando os recursos economicamente compensadores sempre que estejam em causa sanções elevadas, por via do diferimento no tempo do respetivo pagamento ou mesmo fazendo protelar o andamento dos autos no sentido de ocorrer a prescrição.

Pode dizer-se que, na tensão entre os valores da tutela da posição jurídica do arguido e o valor da realização da justiça, o legislador tem liberdade para optar por dar maior preponderância a este último, atendendo à especial natureza dos bens jurídicos que visa tutelar e às especiais qualidades dos intervenientes.

Em suma, com a opção do legislador, tomada dentro dos seus poderes de livre conformação, não deixa de estar assegurado para a impugnação das decisões da autoridade administrativa em causa um pleno acesso à via jurisdicional, sendo que, pelo tipo de impugnação prevista, garante-se desse modo também a não vinculação do tribunal à decisão administrativa, conferindo-lhe plena independência no que respeita ao exercício da função jurisdicional, não constituindo a possibilidade de agravamento da sanção pela decisão da impugnação um ónus ou obstáculo que restrinja ou dificulte, de modo arbitrário ou desproporcionado, o acesso à via judiciária por parte do arguido em processo contraordenacional.

Assim, o regime previsto no artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, enquanto medida necessária e adequada a garantir a tutela de bens jurídicos com dignidade constitucional (bens esses ligados à tutela do sistema financeiro), bem como a celeridade e eficiência da reação sancionatória no caso de lesão desses bens jurídicos tutelados, não poderá ser entendido como uma restrição desproporcional ao direito de impugnação judicial da decisão administrativa sancionatória, à luz dos critérios previstos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição.

Tendo em atenção estas circunstâncias, concretamente os interesses com dignidade constitucional que se tem em vista tutelar pelo artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários (quer relativos à tutela do sistema financeiro, quer relativos à própria essência e estrutura do processo de contraordenação), bem como a circunstância de não implicar para o arguido um ónus ou obstáculo excessivo ao acesso à via jurisdicional, não se nos afigura que se mostre violado o direito à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º, na modalidade de impugnação das decisões condenatórias das autoridades administrativas, prevista no artigo 268.º, n.º 4, nem o disposto no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição.

3 - Da violação do princípio da igualdade

A Recorrente sustenta ainda que a norma do artigo 416.º, n.º 8, do Código de Valores Mobiliários, viola o princípio da igualdade, uma vez que consagra uma solução legal diferenciadora, nada justificando o afastamento da regra geral prevista no artigo 72.º-A do Regime Geral das Contraordenações, sendo tal diferenciação arbitrária é infundada.

Como é sabido, o princípio da igualdade constitui um verdadeiro princípio estruturante da ordem jurídica constitucional, sendo mesmo uma exigência do princípio do Estado de Direito. Trata-se de um princípio que vincula diretamente todos os poderes públicos - particularmente o legislador -, que estão assim obrigados a tratar de modo igual situações de facto essencialmente iguais e de modo desigual situações intrinsecamente desiguais, na exata medida dessa desigualdade.

O âmbito de proteção do princípio da igualdade abrange, na ordem constitucional portuguesa, as seguintes dimensões: proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objetivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais; proibição de discriminação, não sendo legítimas quaisquer diferenciações de tratamento entre os cidadãos baseadas em categorias meramente subjetivas ou em razão dessas categorias; obrigação de diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que pressupõe a eliminação, pelos poderes públicos, de desigualdades fácticas de natureza social, económica e cultural (cf. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª Edição revista, Coimbra Editora, 2007, pág. 339).

No caso dos autos, embora o legislador tenha consagrado no Regime Geral das Contraordenações, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 244/95, de 14 de setembro, a regra da proibição da reformatio in pejus no processo de contraordenação, tal regra tem sido afastada em alguns regimes aplicáveis a determinados setores.

Na verdade, o aludido regime diferenciado verifica-se não apenas no que respeita à impugnação das decisões previstas no n.º 8, do artigo 416.º, do Código de Valores Mobiliários, mas também nas prevista no artigo 230.º, n.º 3, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, no artigo 88.º, n.º 1 da Lei 19/2012, de 8 de maio (Lei da Concorrência) e no artigo 75.º da Lei 50/2006, de 29 de agosto (Lei-quadro das Contraordenações Ambientais).

Estando-se num domínio reservado à margem de conformação do legislador, há que apenas apreciar se tal diferença de regime legislativo se poderá ter por irrazoável.

A este respeito, importa ter em atenção o Acórdão 546/2011, onde o Tribunal refere o seguinte:

«[...] não cabe ao juiz constitucional garantir que as leis se mostrem, pelo seu conteúdo, "racionais". O que lhe cabe é apenas impedir que elas estabeleçam regimes desrazoáveis, isto é, disciplinas jurídicas que diferenciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente. Só quando for negativo o teste do "merecimento" - isto é, só quando se concluir que diferença, ou a igualização, entre pessoas e situações que o regime legal estabeleceu não é justificada por um qualquer motivo que se afigure compreensível face à ratio que o referido regime, em conformidade com os valores constitucionais, pretendeu prosseguir - é que pode o juiz constitucional censurar, por desrazoabilidade, as escolhas do legislador. Fora destas circunstâncias, e, nomeadamente, sempre que estiver em causa a simples verificação de uma menor "racionalidade" ou congruência interna de um sistema legal, que contudo não se repercuta no trato diverso - e desrazoavelmente diverso, no sentido acima exposto - de posições jurídico-subjetivas, não pode o Tribunal Constitucional emitir juízos de inconstitucionalidade. Nem através do princípio da igualdade (artigo 13.º) nem através do princípio mais vasto do Estado de direito, do qual em última análise decorre a ideia de igualdade perante a lei e através da lei (artigo 2.º) pode a Constituição garantir que sejam sempre "racionais" ou "congruentes" as escolhas do legislador. No entanto, o que os dois princípios claramente proíbem é que subsistam na ordem jurídica regimes legais que impliquem, para as pessoas, diversidades de tratamento não fundadas em motivos razoáveis.»

No caso concreto, estando-se no domínio das contraordenações e da impugnação, nos termos já referidos, da decisão proferida pela autoridade administrativa, não há uma imposição constitucional de proibição de reformatio in pejus.

Por outro lado, sendo certo que, no que respeita ao regime geral das contraordenações, o legislador optou por consagrar a regra de proibição de reformatio in pejus, tal não impede que, em determinados setores, atendendo à especificidade dos mesmos, haja um desvio do regime geral, como aconteceu no caso concreto e acontece a respeito de outros aspetos em outros regimes (v.g., limites mínimos e máximos das coimas, prazos e regime de prescrição, etc.), em que o legislador, dentro da liberdade de conformação que lhe é conferida estabelece regras que se afastam do regime geral, construindo regimes especiais.

Ora, atendendo à especificidade do setor regulado pelo Código de Valores Mobiliários e aos valores que este se propõe tutelar, bem como à tendencial maior complexidade dos ilícitos contraordenacionais previstos no aludido código, não se revela arbitrária e destituída de qualquer fundamento a opção do legislador no sentido de, no caso de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa, como consequência da possibilidade de o tribunal conhecer do recurso com plena jurisdição, afastar a proibição da reformatio in pejus. Tendo em conta a especial natureza dos bens jurídicas que se tutelam neste regime especial contraordenacional, encontra-se dentro da liberdade do legislador previlegiar o valor da realização da justiça. E, no caso, estão em causa bens jurídicos que gozam, inclusive, de tutela constitucional, designadamente, na alínea f) do artigo 81.º, da Constituição, no qual se estabelece como incumbência prioritária do Estado assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral, e no artigo 101.º da Constituição, que impõe que o sistema financeiro seja estruturado por lei, «de modo a garantir a formação, a captação e a segurança das poupanças, bem como a aplicação dos meios financeiros necessários ao desenvolvimento económico e social»).

A necessidade de proteção destes bens jurídicos muito específicos, dotados de dignidade constitucional, num setor regulado, em que operam agentes económicos altamente especializados, não torna evidentemente desrazoável uma opção legislativa diferente da adotada para os processos de contraordenção em geral.

Conclui-se, por isso, que a opção do legislador no sentido de afastar a proibição da reformatio in pejus, nos termos previstos no artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, não se revela destituída de fundamento material bastante, nem destituída de razoabilidade face aos valores constitucionais em causa, não se evidenciando que a mesma viole o princípio da igualdade.

4 - Conclusão

Pelo exposto, há que concluir que a norma do artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, interpretada no sentido de que pode ser agravada a coima em sede de impugnação judicial interposta pelo arguido em sua defesa, sem correspondente alteração e/ou agravamento dos factos, elementos e circunstâncias da decisão administrativa condenatória, não viola qualquer norma ou princípio constitucional, designadamente, o direito à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º, na modalidade de impugnação ou recurso das decisões condenatórias das autoridades administrativas, prevista no artigo 268.º, n.º 4, o direito de defesa do arguido, previsto no artigo 32.º, n.º 10, nem o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º, todos da Constituição.

Deste modo, deve ser julgado improcedente o recurso interposto.

Decisão

Nestes termos, decide-se:

a) Não julgar inconstitucional a norma do artigo 416.º, n.º 8, do Código dos Valores Mobiliários, interpretada no sentido de que pode ser agravada a coima em sede de impugnação judicial interposta pelo arguido em sua defesa, sem correspondente alteração e/ou agravamento dos factos, elementos e circunstâncias da decisão administrativa condenatória;

e, consequentemente,

b) Negar provimento ao recurso interposto para o Tribunal Constitucional por Finertec - Serviços de Consultoria e Participações Financeiras, S. A.

Custas pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei 303/98, de 4 de outubro (artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma).

Lisboa, 14 de julho de 2015. - João Cura Mariano - Ana Guerra Martins - Pedro Machete - Fernando Vaz Ventura - Joaquim de Sousa Ribeiro.

208946527

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1588712.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1979-07-24 - Decreto-Lei 232/79 - Ministério da Justiça

    Institui o ilícito de mera ordenação social.

  • Tem documento Em vigor 1982-10-27 - Decreto-Lei 433/82 - Ministério da Justiça

    Institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo.

  • Tem documento Em vigor 1992-12-31 - Decreto-Lei 298/92 - Ministério das Finanças

    Aprova o regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras.

  • Tem documento Em vigor 1995-09-14 - Decreto-Lei 244/95 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Justiça

    ALTERA O DECRETO LEI NUMERO 433/82, DE 27 DE OUTUBRO (INSTITUI O ILÍCITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL E RESPECTIVO PROCESSO), COM A REDACÇÃO QUE LHE FOI DADA PELO DECRETO LEI NUMERO 356/89, DE 17 DE OUTUBRO. AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELO PRESENTE DIPLOMA INCIDEM NOMEADAMENTE SOBRE OS SEGUINTES ASPECTOS: CONTRA-ORDENAÇÕES, COIMAS EM GERAL E SANÇÕES ACESSORIAS, PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO POR CONTRA-ORDENAÇÃO E PRESCRIÇÃO DAS COIMAS, PROCESSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO (COMPETENCIA TERRITORIAL DAS AUTORIDADES ADMINISTR (...)

  • Tem documento Em vigor 1998-10-07 - Decreto-Lei 303/98 - Ministério da Justiça

    Dispõe sobre o regime de custas no Tribunal Constitucional.

  • Tem documento Em vigor 1999-09-14 - Lei 166/99 - Assembleia da República

    Aprova a Lei Tutelar Educativa, anexa à presente lei e que dela faz parte integrante.

  • Tem documento Em vigor 2001-07-16 - Acórdão 265/2001 - Tribunal Constitucional

    Declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade [por violação do nº 10 do art. 32º, em conjugação com o nº 2 do art. 18º da Constituição] da norma que resulta das disposições conjugadas constantes do n.º 3 do artigo 59.º e do n.º 1 do artigo 63.º, ambos do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, na dimensão interpretativa segundo a qual a falta de formulação de conclusões na motivação de recurso, por via do qual se intenta impugnar a decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima (...)

  • Tem documento Em vigor 2005-11-18 - Lei 55/2005 - Assembleia da República

    Autoriza o Governo a regular os crimes de abuso de informação e de manipulação no âmbito do mercado de valores mobiliários.

  • Tem documento Em vigor 2006-03-15 - Decreto-Lei 52/2006 - Ministério das Finanças e da Administração Pública

    Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2003/6/CE (EUR-Lex), do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, relativa ao abuso de informação privilegiada e à manipulação de mercado, e a Directiva n.º 2003/71/CE (EUR-Lex), do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Novembro, relativa ao prospecto a publicar em caso de oferta pública de valores mobiliários ou da sua admissão à negociação.

  • Tem documento Em vigor 2006-08-29 - Lei 50/2006 - Assembleia da República

    Aprova a lei quadro das contra-ordenações ambientais.

  • Tem documento Em vigor 2008-06-05 - Lei 25/2008 - Assembleia da República

    Estabelece medidas de natureza preventiva e repressiva de combate ao branqueamento de vantagens de proveniência ilícita e ao financiamento do terrorismo e altera (segunda alteração) a Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto, relativa ao combate ao terrorismo.

  • Tem documento Em vigor 2009-06-19 - Lei 28/2009 - Assembleia da República

    Estabelece o regime de aprovação e de divulgação da política de remuneração dos membros dos órgãos de administração e de fiscalização das entidades de interesse público e procede à revisão do regime sancionatório para o sector financeiro em matéria criminal e contra-ordenacional. Altera o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, o Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro, bem com (...)

  • Tem documento Em vigor 2012-05-08 - Lei 19/2012 - Assembleia da República

    Aprova o novo regime jurídico da concorrência e altera (segunda alteração) a Lei n.º 2/99, de 13 de janeiro, que aprovou a Lei de Imprensa.

  • Tem documento Em vigor 2014-10-24 - Decreto-Lei 157/2014 - Ministério das Finanças

    No uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 46/2014, de 28 de julho, transpõe a Diretiva n.º 2013/36/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, e procede à alteração ao Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, ao Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, às Leis n.os 25/2008, de 5 de junho, e 28/2009, de 19 de junho, e aos Decretos-Leis n.os 260/94, de (...)

Ligações para este documento

Este documento é referido nos seguintes documentos (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

  • Tem documento Em vigor 2019-03-07 - Acórdão do Tribunal Constitucional 74/2019 - Tribunal Constitucional

    Declara inconstitucional, com força obrigatória geral, a norma do artigo 67.º, n.º 5, dos Estatutos da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, no sentido em que determina que o recurso de impugnação das decisões finais condenatórias da ERS, que imponham uma coima, tem, por regra, efeito meramente devolutivo, ficando a atribuição de efeito suspensivo sujeita à prestação de caução e alegação de prejuízo considerável, para o recorrente, decorrente da execuç (...)

  • Tem documento Em vigor 2019-07-02 - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 3/2019 - Supremo Tribunal de Justiça

    «Em processo contraordenacional, no recurso da decisão proferida em 1.ª instância o recorrente pode suscitar questões que não tenha alegado na impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa.»

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