de 22 de Novembro
O presente diploma tem por objectivo transpor a Directiva n.º 86/278/CEE, do Conselho, de 12 de Junho, relativa à utilização agrícola das lamas de depuração, de modo a evitar os efeitos nocivos sobre o homem, os solos, a vegetação, os animais e o ambiente em geral, ao mesmo tempo que se pretende encorajar a sua correcta utilização. Esta preocupação adquire agora maior acuidade em virtude da necessidade de adequar a legislação portuguesa às regras comunitárias. Só agora as Comunidades Europeias começam a legislar no âmbito da protecção dos solos, constituindo o presente diploma o primeiro passo dado entre nós para regulamentar a matéria.Teve-se em consideração que as lamas, pelo seu teor em matéria orgânica, nutrientes e, em alguns casos, o valor de pH, podem ser consideradas correctivos e ou fertilizantes. Por um lado, a utilização dessas características na agricultura constitui uma espécie de reciclagem, reutilizando factores produtivos onde fazem falta e retirando-os de locais onde constituem poluição, por excederem a capacidade de assimilação do meio (eutrofia). Por outro lado, não pode esquecer-se que certos metais pesados são perigosos quer para o homem, quer para as plantas, através da sua presença nos produtos alimentares, o que obriga à fixação de valores limites obrigatórios para tais elementos no solo. Por isso se proíbe a aplicação de lamas sempre que a concentração daqueles elementos nos solos ultrapasse esses valores limites e se condiciona a sua adição através da fixação de quantidades máximas anuais de metais pesados a introduzir nos solos.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objectivo e âmbito
1 - O presente diploma transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 86/278/CEE, do Conselho, de 12 de Junho, relativa à utilização das lamas de depuração na agricultura, por forma a evitar efeitos nocivos no homem, na água, nos solos, na vegetação e nos animais, promovendo a sua correcta utilização.2 - As lamas de depuração provenientes de estações de tratamento de águas residuais domésticas ou urbanas ou outras de composição similar só podem ser utilizadas em conformidade com o disposto no presente diploma.
Artigo 2.º
Definições
Para os efeitos do presente diploma, entende-se por:a) Lamas de depuração:
As lamas provenientes de estações de tratamento de águas residuais domésticas ou urbanas e de outras estações de tratamento de águas residuais de composição similar às águas residuais domésticas e urbanas;
As lamas de fossas sépticas e de outras instalações similares para o tratamento de águas residuais;
As lamas provenientes de estações de tratamento de águas residuais de actividades agro-pecuárias;
b) Lamas tratadas - as lamas tratadas por via biológica, química ou térmica, por armazenagem a longo prazo ou por qualquer outro processo com o objectivo de eliminar todos os microrganismos patogénicos que ponham em risco a saúde pública e reduzir significativamente o seu poder de fermentação, de modo a evitar a formação de odores desagradáveis;
c) Utilização - a disseminação das lamas sobre o solo ou qualquer outra aplicação das lamas sobre e no solo;
d) Solo inculto - terreno agrícola que foi abandonado, não se prevendo o seu
reaproveitamento agrícola.
Artigo 3.º
Aplicação de lamas em solos agrícolas
1 - Sem prejuízo do disposto na alínea b) do artigo 4.º, só podem ser utilizadas em agricultura lamas tratadas.
2 - Os valores permitidos para os elementos que entram na composição dos solos receptores de lamas e das lamas destinadas à aplicação agrícola, bem como os respectivos métodos de aplicação, são fixados por portaria conjunta dos Ministros da Agricultura, Pescas e Alimentação e do Ambiente e Recursos Naturais.
3 - Os valores relativos à concentração de metais pesados nas lamas destinadas à aplicação agrícola deverão ser considerados como indicativos.
4 - Com base nos valores relativos à concentração de metais pesados nas lamas definidos no número anterior, a quantidade de lamas a aplicar anualmente por hectare poderá ser de 6 t, sendo possível que valores de concentração de metais pesados nas lamas menores permitirão aplicação de maiores quantidades de lamas, assim como maiores valores de concentração implicarão menores taxas de aplicação, com vista ao cumprimento do disposto na portaria a que se refere o n.º 2.
5 - A aplicação de lamas deve fazer-se sobre solos bem desenvolvidos e profundos, tendo em conta as necessidades nutricionais das plantas, por forma a proteger adequadamente a qualidade do solo e das águas superficiais e subterrâneas.
6 - A aplicação superficial de lamas deve ser acompanhada de uma zona de separação adequada das povoações, escolas ou zonas de interesse público, de modo a evitar possíveis efeitos sobre a população, devendo a referida zona de separação compreender 100 m a casas individuais ou 200 m a povoações ou outros locais, podendo estas distâncias ser reduzidas se existir permissão escrita dos indivíduos afectados ou dos seus representantes.
7 - A aplicação de lamas deve ter em atenção uma distância mínima de 50 m a poços e furos exclusivamente utilizados para rega, sendo a distância mínima a captações de água para consumo de 100 m.
8 - As lamas devem ser incorporadas no solo no máximo dois dias após a sua aplicação.
9 - O espalhamento de lamas em solos incultos fica condicionado às disposições constantes no número anterior.
Artigo 4.º
Restrições à aplicação de lamas
Os organismos regionais do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação e do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais encarregados da gestão dos recursos hídricos podem, conjuntamente, licenciar:a) A aplicação de lamas tratadas em solos com pH inferior a 5,5;
b) A injecção ou enterramento no solo de lamas não tratadas.
Artigo 5.º
Proibição da aplicação de lamas
1 - É proibida a utilização de lamas quando a concentração de um ou vários metais pesados nos solos ultrapasse os valores limites fixados na portaria a que se refere o n.º 2 do artigo 3.º 2 - É proibida a utilização de lamas quando as quantidades de metais pesados introduzidos no solo, por unidade de superfície, numa média de 10 anos, ultrapassarem os valores limites fixados na portaria referida no número anterior.3 - É proibida a utilização ou a entrega de lamas destinadas a serem utilizadas:
a) Em prados ou culturas forrageiras, dentro das três semanas imediatamente anteriores à apascentação do gado ou à colheita de culturas forrageiras;
b) Em culturas hortícolas e frutícolas, com excepção das culturas de árvores de fruto, durante o período vegetativo;
c) Em solos destinados a culturas hortícolas ou frutícolas, que estejam normalmente em contacto directo com o solo e que sejam normalmente consumidas em cru, durante um período de 10 meses antes da colheita e durante a colheita.
4 - É proibida a aplicação de lamas em margens de rios ou lagos, nos termos do Decreto-Lei 468/71, de 5 de Novembro.
5 - É proibido espalhar lamas sob condições climatéricas adversas, designadamente em situações de alta pluviosidade.
Artigo 6.º
Análises a efectuar
1 - É obrigatória a análise das lamas e solos sobre os quais elas são utilizadas.2 - As análises a que se refere o número anterior devem obedecer a critérios a fixar por portaria conjunta dos Ministros da Agricultura, Pescas e Alimentação e do Ambiente e Recursos Naturais.
Artigo 7.º
Dever de informação
1 - Os produtores de lamas de depuração são obrigados a fornecer semestralmente ao director regional do ambiente e recursos naturais da comissão de coordenação regional competente em razão da área do local da sua actividade as seguintes informações:a) A quantidade total de lamas produzidas e a quantidade de lamas entregues para fins agrícolas e outros;
b) A composição e as características das lamas, em relação à portaria referida no artigo anterior;
c) O tipo de tratamento efectuado, tal como definido no n.º 2 do artigo 2.º;
d) Os nomes e endereços dos destinatários das lamas e os locais, por estes indicados, de utilização das mesmas.
2 - Os produtores ficam também obrigados a fornecer aos utilizadores, sempre que solicitadas, todas as informações referidas na citada portaria, bem como a data mais recente em que tais informações foram recolhidas.
3 - As comissões de coordenação regional comunicarão anualmente à Direcção-Geral da Qualidade do Ambiente as informações que lhes forem prestadas nos termos do n.º 1.
4 - Pode ser decidida, por razões de saúde pública ou preservação do ambiente, a realização de análises mais frequentes ou de outros parâmetros, pelos organismos competentes nessas áreas, designadamente microrganismos patogénicos.
Artigo 8.º
Contra-ordenações
1 - A infracção do disposto nos artigos 3.º a 7.º constitui contra-ordenação punível com coima:a) De 150000$00 a 500000$00, a infracção ao disposto no artigo 3.º;
b) De 200000$00 a 500000$00, a prática, sem licença, dos actos previstos no artigo 4.º;
c) De 200000$00 a 500000$00, a infracção ao disposto no artigo 5.º;
d) De 100000$00 a 400000$00, a infracção ao disposto no artigo 6.º;
e) De 100000$00 a 400000$00, a infracção ao disposto no artigo 7.º, n.os 1 e 2.
2 - A negligência e a tentativa são puníveis.
3 - As coimas aplicadas às pessoas colectivas pelas contra-ordenações referidas nos números anteriores elevar-se-ão até ao montante máximo de 12 vezes.
Artigo 9.º
Sanções acessórias
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, pode o presidente da comissão de coordenação regional da área onde se detectou a infracção, após parecer do director-geral da Qualidade do Ambiente, determinar, quando necessário para a preservação do ambiente, a realização pelo infractor, dentro de período razoável, das operações adequadas, incluindo a remoção das lamas e acções adequadas à reposição da situação anterior à prática da infracção.2 - No caso de incumprimento da obrigação decorrido o prazo que lhe for fixado na notificação, o presidente da comissão de coordenação regional competente mandará proceder às operações necessárias, sendo apresentada nota das despesas efectuadas aos agentes infractores, para cobrança.
3 - Não sendo efectuado o pagamento no prazo fixado, constitui a nota de despesas título executivo para a instauração de competente acção judicial.
Artigo 10.º
Fiscalização
A fiscalização do disposto no presente diploma compete às comissões de coordenação regional, aos organismos do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais encarregados da gestão dos recursos hídricos, às administrações regionais de saúde e aos organismos regionais do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação com competência na área da fiscalização, sem prejuízo das competências fixadas por lei a outras entidades.
Artigo 11.º
Instrução dos processos
1 - A instrução dos processos contra-ordenacionais a instaurar ao abrigo do disposto no presente diploma compete às comissões de coordenação regional.2 - A aplicação das coimas previstas neste diploma compete ao presidente da comissão de coordenação regional da área onde se detectou a infracção.
Artigo 12.º
Distribuição do produto das coimas
A distribuição do produto das coimas far-se-á da seguinte forma:a) 20% para a entidade fiscalizadora;
b) 20% para a entidade que instaure o processo;
c) 60% para o Estado.
Artigo 13.º Disposições finais O presente diploma entra em vigor a 1 de Novembro de 1991.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 22 de Agosto de 1991. - Aníbal António Cavaco Silva - Luís Francisco Valente de Oliveira - Álvaro José Brilhante Laborinho Lúcio - Arlindo Marques da Cunha - Arlindo Gomes de Carvalho - Carlos Alberto Diogo Soares Borrego.
Promulgado em 24 de Outubro de 1991.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 28 de Outubro de 1991.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.