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Acórdão 18/2008, de 27 de Fevereiro

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Sumário

Acorda em Plenário da 1.ª Secção: "O desrespeito dos n.º s 1 e 2 do artigo 40.º da Lei das Finanças Locais constitui violação directa de normas financeiras, o que, nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 44.º da LOPTC, é fundamento de recusa de visto." (Recurso ordinário n.º 7/2008 - processo de fiscalização prévia n.º 1598/2007).

Texto do documento

Acórdão 18/2008

16 DEZ -1.ªS/PL

Recurso ordinário n.º 07/2008 (processo de fiscalização prévia n.º 1598/2007)

I - Relatório

I.1 - Pelo Acórdão 26/08 - 19.FEV.08- 1.ª S/SS, objecto de aclaração pelo Acórdão 31/08 - 10. Mar.08- 1.ª S/SS, o Tribunal de Contas recusou o visto ao contrato de abertura de crédito até ao montante máximo de (euro) 360.000.000 (trezentos e sessenta milhões de euros), celebrado em 7 de Dezembro de 2007, entre o Município de Lisboa e a Caixa Geral de Depósitos, destinado ao saneamento financeiro do município (1).

I.2 - A recusa do visto, proferida ao abrigo da alínea b) do n.º 3 do artigo 44.º da Lei 98/97, de 26 de Agosto, teve por fundamento a violação do disposto no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais. (2)

Referiu o Acórdão, no seu ponto III.10:

"A insuficiência e falta de sustentabilidade do Plano de Saneamento Financeiro, atrás apontadas, têm por consequência o não preenchimento do condicionalismo previsto no artigo 40.º da Lei 2/2007, de 15 de Janeiro, isto é, a constatação da falta de verificação dos pressupostos conducentes à caracterização da situação financeira do Município de Lisboa, como sendo de desequilíbrio de natureza conjuntural, e, por isso, a falta de preenchimento das condições necessárias para o recurso ao empréstimo contratado com a Caixa Geral de Depósitos, enquanto instrumento recuperador do equilíbrio das finanças municipais, num quadro de saneamento financeiro. Mostra-se, pois, violado o disposto no citado artigo 40.º, da dita Lei 2/2007, de 15 de Janeiro, que é, inquestionavelmente, uma norma de natureza financeira."

I.3 - O Acórdão em causa foi votado por unanimidade, mas contou com a seguinte declaração de voto de um dos seus subscritores:

"Voto a decisão de recusa de visto, mas não os fundamentos aduzidos.

O artigo 41.º, n.º 3 da Lei 2/007, de 15 de Janeiro - Lei das Finanças Locais - estabelece indicadores objectivos caracterizadores da situação de desequilíbrio financeiro estrutural dos municípios:

a) A existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 50 % das receitas totais do ano anterior;

b) O incumprimento, nos últimos três meses, de dívidas de algum dos seguintes tipos, sem que as disponibilidades sejam suficientes para a satisfação destas dívidas no prazo de dois meses:

i) Contribuições e quotizações para a segurança social;

ii) Dívidas ao Sistema de Protecção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública (ADSE);

iii) Créditos emergentes de contrato de trabalho;

iv) Rendas de qualquer tipo de locação.

A verificação de uma destas situações implica a celebração de um contrato de empréstimo para reequilíbrio financeiro do município, acompanhado do respectivo plano de reequilíbrio financeiro.

Ora, como resulta provado na matéria de facto, o Município de Lisboa arrecadou receitas em 2006 no montante total de 570.444.921,00 (euro) [al. L) 1 do probatório] e as dívidas a fornecedores em 31 de Dezembro de 2007 ascendiam a 451.737.514,85 (euro) [al. S) do probatório], ou seja, correspondiam a 79,19 % da receita total de 2006.

Assim, o Município de Lisboa encontra-se numa situação objectiva de desequilíbrio financeiro estrutural, pelo que o contrato a celebrar deveria ser, em obediência ao disposto no artigo 41.º da LFL, de reequilíbrio financeiro e não de saneamento financeiro.

A violação do artigo 41.º da LFL, norma de inquestionável natureza financeira, é fundamento da recusa de visto [artigo 44.º, n.º 3, al. b) da Lei 98/97, de 26 de Agosto]."

I.4 - O Acórdão 31/08 - 10. Mar.08- 1.ª S/SS procedeu à aclaração do Acórdão 26/08 - 19.FEV.08- 1.ª S/SS, referindo no seu ponto 3.2. reportado ao fundamento de recusa do visto:

"(...) Tratou-se, efectivamente, de o Tribunal ter considerado que o Plano de Saneamento Financeiro apresentado - pela sua insuficiência e falta de sustentabilidade - não preenchia o condicionalismo previsto no artigo 40.º da Lei 2/2007, de 15 de Janeiro, e que, por isso, se verificava o não preenchimento das condições necessárias para a contracção do empréstimo junto da Caixa Geral de Depósitos, enquanto instrumento recuperador do equilíbrio das finanças municipais, num quadro de saneamento financeiro, - quadro em que foi submetido à fiscalização prévia deste Tribunal, o respectivo contrato - o que acarretava a violação directa daquele normativo.

Na verdade, o artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, aprovada pela mencionada Lei 2/2007, sob a epígrafe "Saneamento financeiro municipal" é, sem margem para dúvidas, uma norma de natureza financeira.

Nesta conformidade, a violação directa do referido artigo 40.º da Lei 2/2007, enquanto norma de natureza financeira, constitui o fundamento de recusa de visto previsto no artigo 44.º, n.º 3, alínea b) da Lei 98/97 de 26 de Agosto, e não o fundamento de recusa do visto a que alude a alínea c), do n.º 3, do referido artigo."

I.5 - Inconformado com o Acórdão, veio dele interpor recurso o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, pedindo a revogação do mesmo e a sua substituição por outro que conceda o visto ao contrato.

Em defesa do pretendido apresentou as alegações processadas de fls. 2 a 73 dos autos, que aqui se dão por reproduzidas. As referidas alegações culminam com as seguintes conclusões:

"1.ª O Município de Lisboa aceita os factos considerados provados nas alíneas A), B), C), D), E), F), G), J), K), L), M), N), O), P), Q), R) e T) do probatório;

2.ª Os factos considerados provados sob as alíneas H) e I) do probatório deverão ser alterados em conformidade com o exposto sob os n.os 5 e 6 das presentes alegações;

3.ª As dívidas do Município de Lisboa ao DEPFA ACS BANK e ao BPI, S. A., emergentes de cessões de créditos da Parque Expo e da SIMTEJO, não podem, em circunstância alguma, ser consideradas dívidas a fornecedores, pelo que da alínea S) do probatório deverá constar que "S) O montante total das dívidas a fornecedores, em 31-12-2007, era de (euro) 254.537.614,85.", em conformidade com o exposto sob o n.º 7 das presentes alegações;

4.ª Deverão ainda ser aditadas ao probatório as alíneas A) a P), Q) a NN) e 00) a QQ) aduzidas sob os n.os 8, 9 e 10, respectivamente, das presentes alegações;

5.ª Deverá considerar-se provado que o Município tem condições para gerar os saldos orçamentais necessários para amortizar o empréstimo contraído para sanar o desequilíbrio financeiro conjuntural em que se encontra;

6.ª Deverá considerar-se impugnada e, consequentemente, não provada, a matéria constante dos n.os 9.3.a), 9.3.b), 9.3.c), 9.3.d), 9.3.e), 9.3f), 9.3.g), 9.3.h), 9.3.i), 9.3.j), do acórdão recorrido, conforme se demonstra sob o n.º 11 das presentes alegações;

7.ª Deverão ainda ser aditadas ao probatório as alíneas RR) a WW), nos termos que se aduzem sob o n.º 11.2 das presentes alegações;

8.ª Deverá ser aditada ao probatório a referência de que a actual notação de longo prazo do Município de Lisboa é de AA - pela Fitch - e de Aa3 - pela Moody's - ambas fixadas já depois da aprovação do plano de saneamento financeiro, bem como a referência de que estas classificações têm subjacente uma avaliação em termos de «capacidade implícita de pagamento da dívida atempadamente» de «Muito forte» ou, na óptica da emissão de obrigações, uma avaliação de «Capacidade muito forte de pagamento de juros e capital»;

9.ª Deverá ainda ser aditada ao probatório a referência de que, em virtude da 3.ª alteração ao orçamento municipal para 2008, o montante total das dívidas a fornecedores irá reduzir-se em cerca de 20,4 milhões de Euros, passando para (euro) 234.137.614,85, o que permitirá reduzir a utilização dos fundos disponibilizados pelo contrato de abertura de crédito celebrado com a Caixa Geral de Depósitos, de 360M(euro) para 340M(euro);

10.ª O acórdão recorrido violou o artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, ao fazer equivaler uma suposta «insuficiência e falta de sustentabilidade do Plano de Saneamento Financeiro» à «falta de verificação dos pressupostos conducentes à caracterização da situação financeira do Município de Lisboa, como sendo de desequilíbrio de natureza conjuntural»;

11.ª O acórdão recorrido violou o artigo 40.º da Lei das Finanças Locais por ter apreciado a sustentabilidade do plano de saneamento financeiro com base nos requisitos fixados pelo legislador para os planos de reequilíbrio financeiro, ou seja, o Tribunal acabou por fundar o juízo de legalidade no artigo 41.º da Lei das Finanças Locais, quando reconhece tratar-se de uma situação de desequilíbrio financeiro conjuntural;

12.ª O acórdão recorrido, ao decidir escrutinar a «substância, fiabilidade e sustentabilidade do Plano de Saneamento Financeiro» aprovado pelo município de Lisboa, ultrapassou claramente os limites de um juízo de legalidade financeira pressuposto nos artigos 5.º, n.º 1, alínea c) e 44.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, para entrar em apreciações de adequação, justificação, oportunidade e mérito do plano de saneamento financeiro aprovado pela Assembleia Municipal de Lisboa, as quais, vão para além das suas competências, infringindo, por isso, o disposto nos artigos 5.º, n.º 1, alínea e) e 44.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas;

13.ª A decisão de recusa do visto a um contrato de empréstimo para saneamento financeiro, constante do acórdão recorrido, com fundamento em que o plano de saneamento não possui suficiente sustentabilidade, não corresponde a um juízo de legalidade financeira, mas, ao invés, à substituição, por via judicial, de uma apreciação que o legislador atribuiu à assembleia municipal, o que importa a violação do princípio constitucional da separação de poderes na vertente da reserva de administração, a que acresce uma concomitante violação da garantia constitucional da autonomia financeira local;

14.ª Não tendo o legislador definido o conteúdo do plano de saneamento financeiro a que se refere o artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, ao contrário do que fez quanto ao plano de reequilíbrio financeiro a que se refere o artigo 41.º da Lei das Finanças Locais, a sua densificação e desenvolvimento pelo Tribunal de Contas no acórdão recorrido importa a consumação de um quarto vício de violação de lei por infracção ao princípio da separação de poderes, na vertente de intromissão no exercício do poder legislativo;

15.ª O acórdão recorrido interpretou e aplicou no caso concreto o artigo 40.º da Lei das Finanças Locais e os artigos 5.º, n.º 1, alínea c) e 44.º da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, em termos que se afiguram contrários ao disposto na Constituição, por infracção ao princípio da separação e interdependência de poderes e por infracção à garantia constitucional da autonomia do poder local, na sua dimensão financeira.

Termos em que deve ser deferido o presente recurso e, em consequência, revogado o acórdão recorrido, o qual deve ser substituído por outro que conceda o visto ao contrato de abertura de crédito até ao montante máximo de (euro) 360.000.000 (trezentos e sessenta milhões de euros), celebrado em 7 de Dezembro de 2007 entre o Município de Lisboa e a Caixa Geral de Depósitos."

Em anexo ao recurso, e sustentando as suas conclusões, o município junta, entre outros documentos, quatro pareceres elaborados, respectivamente, pelo Professor Doutor Manuel Porto (em conjunto com o Mestre Fernando Rocha Andrade, a Mestre Matilde Lavouras e o Dr. Filipe Figueiredo), pelo Professor Doutor Jorge Miranda, pelo Professor Doutor Vital Moreira e pela Dra. Ana Calado Pinto, constantes de fls. 81 a 226.

I.6 - Deferindo parcialmente um requerimento do Ministério Público, constante de fls. 272 e seguintes dos autos, foi dada a oportunidade ao município de, querendo, reformular as suas alegações de recurso, tendo em conta as possibilidades conferidas pelo Decreto-Lei 38/2008, de 7 de Março. O município veio, em 18 de Junho de 2008, manter integralmente as alegações anteriores, com os aditamentos constantes de fls. 298 a 305, e as seguintes conclusões:

"1.ª O Decreto-Lei 38/2008, de 7 de Março, não é um diploma de carácter interpretativo porque não vem resolver dúvidas existentes quanto ao sentido de normas legais susceptíveis de entendimentos contraditórios, mas apenas e tão só densificar e regulamentar certas e determinadas disposições da Lei das Finanças Locais: (i) as relativas aos regimes jurídicos do saneamento financeiro municipal e do reequilíbrio financeiro municipal (artigos 40.º e 41.º da Lei das Finanças Locais) e (ii) as relativas ao Fundo de Regularização Municipal (artigo 42.º da Lei das Finanças Locais);

2.ª Quando o legislador pretende atribuir natureza interpretativa a actos normativos fá-lo de forma expressa;

3.ª Para que o Decreto-Lei 38/2008 pudesse ter a natureza de uma lei interpretativa, sempre teria que provir da Assembleia da República, uma vez que se inscreve na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República a definição do «regime das finanças locais» (artigo 165.º, n.º1, alínea q), da Constituição) e uma lei interpretativa da Lei das Finanças Locais não poderia ser emanada de órgão sem competência legislativa para o efeito, a não ser mediante autorização legislativa, o que não sucedeu no caso do Decreto-Lei 38/2008;

4.ª O Decreto-Lei 38/2008, apesar de formalmente emitido ao abrigo da competência legislativa do Governo, tem natureza regulamentar e, portanto, corresponde, materialmente, a um regulamento administrativo;

5.ª Mesmo perante a indicação constante do artigo 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei 38/2008, não compete ao Tribunal de Contas proceder a juízos sobre a exequibilidade, substância, fiabilidade e sustentabilidade do plano de saneamento financeiro aprovado pela Assembleia Municipal;

6.ª O artigo 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei 38/2008 não veio corroborar a jurisprudência constante do acórdão recorrido e, sobretudo, não veio permitir ao Tribunal de Contas, no quadro da fiscalização prévia da legalidade da despesa pública, entrar em análises que envolvam a formulação de apreciações que se situam no plano da adequação, justificação, oportunidade e mérito das medidas constantes do plano de saneamento financeiro aprovado pelos órgãos competentes do Município;

7.ª A qualificação do Decreto-Lei 38/2008 como lei interpretativa e a sua aplicação retroactiva implica atribuir aos artigos 3.º, n.º 4 e 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei 38/2008 um sentido contrário aos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança ínsitos no princípio do estado de direito consagrado no artigo 2.º da Constituição;

8.ª A jurisprudência do Tribunal de Contas constante dos acórdãos n.os 47/08 de 28 de Março e 56/08 de 11 de Abril, ambos da 1.ª secção em subsecção, implica que o Município de Lisboa se devesse conformar, em Outubro de 2007, data em que foi aprovado, pelos órgãos competentes do Município, o estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia e o plano de saneamento financeiro a que se refere o artigo 40.º, n.º 2 da Lei das Finanças Locais, com um conjunto de exigências que só viria a ser formulado seis meses mais tarde, mediante a publicação e entrada em vigor do Decreto-Lei 38/2008, o que é manifestamente contrário aos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança ínsitos no princípio do estado de direito consagrado no artigo 2.º da Constituição."

I.7 - O Procurador-Geral Adjunto junto do Tribunal de Contas emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso e da manutenção da recusa do visto ao contrato, por entender que "nada de essencial se alterou, com a interposição deste recurso, relativamente à avaliação da situação, económico-financeira, da C.M.L. sobre os pressupostos do "Contrato de Saneamento Financeiro", sujeito à fiscalização preventiva do Tribunal de Contas". O referido magistrado afirmou-se ainda favorável à solução jurídica constante da "Declaração de Voto"

anexa ao Acórdão recorrido, propondo a sua inclusão actualizada na decisão final do Recurso.

I.8 - Corridos os demais vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

São as seguintes as questões a resolver:

1) Quais os factos assentes e relevantes;

2) Se o Tribunal de Contas ultrapassou, no Acórdão recorrido, os limites de um juízo de legalidade financeira sobre o contrato submetido a fiscalização prévia;

3) Se a situação financeira do município de Lisboa se encontra devidamente caracterizada como sendo de desequilíbrio financeiro conjuntural;

4) Se o Plano de Saneamento Financeiro apresentado é suficiente para os efeitos previstos nos n.º s 1 e 2 do artigo 40.º da Lei das Finanças Locais.

II - Fundamentação

II.1 - Dos factos

Em matéria de fixação da matéria de facto, o recorrente veio, no recurso, aceitar parte dos factos dados como assentes no Acórdão recorrido, impugnar outros e, ainda, solicitar o aditamento de vários factos ao probatório incluído naquele Acórdão.

Importa começar por fixar os limites da reapreciação da matéria de facto, em sede de recurso das decisões de fiscalização prévia no Tribunal de Contas.

O regime geral em processo civil é o de que, considerando os princípios processuais aplicáveis, entre os quais se inclui o da livre apreciação da prova pelo Tribunal, não deve, em recurso, proceder-se a novo e integral julgamento da matéria de facto. Os poderes de alteração da decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto só devem usar-se em situações excepcionais e devem restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados (3) (4).

Nesta linha, e de acordo com o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Janeiro de 1999 (5), a ampliação da matéria de facto deve fazer-se apenas quando sejam articulados factos que podem contribuir para uma mais correcta e precisa decisão de direito.

Assim, somente importa a matéria de facto considerada indispensável para a decisão de direito, de forma que a decisão final seja a consequência lógica daquela fundamentação. Daqui decorre que só importa discutir e fixar a prova em que a decisão assentou ou aquela que seja relevante para a solução jurídica do pleito. Conforme referiu o Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 27 de Janeiro de 2005, no processo 04B3832, não sendo os factos relevantes para a decisão da causa, não se justificará a sua alteração.

Em sede de ampliação factual, e nos termos do n.º 1 do artigo 655.º do Código de Processo Civil, o tribunal apreciará livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.

No que respeita ao regime específico dos processos de recurso relativos a decisões em processos de fiscalização prévia do Tribunal de Contas, dispõe o artigo 99.º, n.º 5, da Lei de Organização e Processo no Tribunal de Contas (doravante designada por LOPTC) (6) que "[e]m qualquer altura do processo o relator poderá ordenar as diligências indispensáveis à decisão do recurso" e estabelece o artigo 100.º, n.º 2, da mesma Lei, que: "[n]os processos de fiscalização prévia o Tribunal pode conhecer de questões relevantes para a concessão ou recusa do visto, mesmo que não abordadas na decisão recorrida ou na alegação do recorrente, se suscitadas pelo Ministério Público no respectivo parecer, cumprindo-se o disposto no n.º 3 do artigo 99.º".

Conforme se referiu no Acórdão 11/2008-18.JUL.2008-1.ªS-PL, os poderes conferidos pelos preceitos transcritos, sendo mais vastos do que aqueles que ocorrem, em regra, em sede de processo civil, permitem que o Tribunal de Contas aborde, em recurso, questões com uma conexão fáctica e ou de direito directa com o contrato que foi presente ao Tribunal, mesmo quando essas questões não tenham sido abordadas na decisão recorrida. Isso pode suceder, designadamente, quando essas questões sejam alegadas pelo recorrente e, entre essas questões, pode incluir-se a alteração ou ampliação da matéria de facto. No entanto, aqueles preceitos são claros no sentido de que as matérias ou questões devem revelar-se "indispensáveis" à decisão do recurso ou "relevantes" para a concessão ou recusa do visto.

Neste contexto, apreciemos as alegações do recorrente relativamente à matéria de facto constante do Acórdão recorrido.

II.1.1 - O recorrente aceitou os factos considerados provados na 1.ª instância, nas alíneas A), B), C), D), E), F), G), J), K), L), M), N), O), P), Q), R) e T) do ponto II do Acórdão recorrido, os quais se dão aqui como reproduzidos e confirmados.

II.1.2 - O recorrente alega que os factos considerados provados sob as alíneas H) e I) do probatório deverão ser alterados em conformidade com o exposto sob os n.os 5 e 6 das alegações.

Dizem esses factos respeito ao montante do endividamento municipal e à sua relação com os limites legais a 31-12-2006 e 17-12-2007.

a) O Acórdão recorrido refere na alínea H) do probatório, no que respeita ao endividamento de médio e longo prazo:

"A situação do Município, em termos de endividamento, e segundo informação da Direcção-Geral das Autarquias Locais (DGAL), reportada a 31-12-2006, é a seguinte:

1 - Endividamento de médio e longo prazo - artigo 33.º, n.º 1, da Lei 53-A/2006 de 29 de Novembro:

Limite (100 % dos fundos + receitas municipais) - (euro)329.337.369 Capital em dívida de médio e longo prazos não excepcionado - (euro) 207. 658.

319

Saldo disponível - (euro) 121. 679. 050

(...)"

O recorrente invoca, a fls. 13 dos autos, desconhecer a forma como esta informação foi obtida pelo Tribunal, uma vez que não foi apresentada pelo município de Lisboa no âmbito do processo de fiscalização prévia.

Mais invoca que tal informação não corresponde à verdade, uma vez que o artigo 33.º, n.º 1, da Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro, diz respeito ao endividamento municipal em 2007 e o que está em causa na alínea H) do probatório são dados referentes a 2006. Ora, em relação a 2006, aplicar-se-ia o artigo 33.º da Lei 60-A/2005, de 30 de Dezembro, que consagrava um critério diferente de cálculo dos limites de endividamento.

Em consequência, o recorrente solicita a substituição da informação constante da alínea H) do Acórdão pelos dados constantes de fls. 14.

Os dados constantes do Acórdão, na alínea em causa, tiveram por fonte o ofício n.º 784, de 23 de Março de 2007, do Gabinete do Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local (SEAAL), que, em execução de despacho do Senhor Secretário de Estado, comunicou ao Tribunal de Contas os dados apurados pela DGAL quanto ao cumprimento dos limites de endividamento pelos municípios (7).

Refira-se, no entanto, que a informação da DGAL, contendo, relativamente ao município de Lisboa, os valores efectivamente constantes do Acórdão, referenciou esses dados a 01-01-2007 e não a 31-12-2006.

Essa diferença é relevante, uma vez que o limite de endividamento municipal para o ano de 2006 foi efectivamente fixado pelo artigo 33.º da Lei 60-A/2005, o qual consagrava um critério diferente do que veio a ser plasmado no artigo 33.º da Lei 53-A/2006 para 2007.

b) A alínea H) do probatório do Acórdão recorrido referia ainda:

"A situação do Município, em termos de endividamento, e segundo informação da Direcção-Geral das Autarquias Locais (DGAL), reportada a 31-12-2006, é a seguinte:

(...)

2 - Endividamento líquido:

Limite (125 % dos fundos + receitas municipais de 2006) - (euro) 411.

671.711,00 Endividamento líquido não excepcionado - (euro) 374. 687. 770,00 Saldo disponível - (euro) 36. 983. 941,00"

Coloca a autarquia, em relação ao cálculo do endividamento líquido a 31-12-2006, as mesmas questões que foram referidas na alínea anterior relativamente ao endividamento a médio e longo prazo.

Acresce que o recorrente vem solicitar a alteração da alínea H) do probatório baseado também no facto de a própria DGAL ter comunicado à Câmara Municipal de Lisboa, pelo ofício n.º 48/DG/2007, de 13 de Julho de 2007, junto a fls. 111, valores de endividamento líquido, reportados a 31-12-2006, diferentes daqueles que constam do Acórdão recorrido.

Também aqui se observa que os valores indicados pelo SEAAL ao Tribunal de Contas se reportam a 01-01-07 e não a 31-12-2006, o que é relevante dada a diferença nos critérios de cálculo.

c) O Acórdão da 1.ª instância refere na alínea I) do probatório, no que respeita ao endividamento de médio e longo prazo:

"Segundo informação prestada pelo Município, a situação deste, em termos de endividamento, e reportada a 17-12-2007, é a seguinte:

1 - Endividamento de médio e longo prazo - artigo 33, n.º 1, da Lei 53-A/2006 de 29 de Novembro:

Limite (100 % dos fundos + receitas municipais de 2006) - (euro) 336. 577.

989,78 Capital em dívida de médio e longo prazo não excepcionado - (euro) 223.020.089,05 *

Saldo disponível - (euro) 113.557.900,73

2 - Endividamento líquido:

Limite (125 % dos fundos + receitas municipais) - (euro) 420. 722. 487,23 Endividamento líquido não excepcionado - (euro) 397. 676. 322,35 Saldo disponível - (euro) 23. 046. 164,88 * Não foram considerados os valores em dívida à SIMTEJO e à Parque Expo, objecto de contratos de cessão de créditos."

O recorrente vem requerer a alteração desta alínea do probatório, invocando que os valores correctos do endividamento líquido são os que foram reportados ao Tribunal em ofício de 25 de Janeiro de 2008, com referência a 31-12-2007, o qual já constava do processo de 1.ª instância.

Anote-se que os valores constantes do Acórdão, na alínea I) em causa, são os que a própria autarquia reportou relativamente a 17-12-2007, e não a 31-12-2007, pelo que não está em causa qualquer erro na matéria de facto, mas a solicitação de que a data de referência seja outra.

d) A fixação dos montantes de endividamento do município de Lisboa é, neste processo, relevante para apreciação da situação financeira do município e das respectivas tendências de evolução. Ora, a comparabilidade dos dados pressupõe que eles se baseiem nos mesmos critérios. Não é, no entanto, despicienda para o mesmo efeito a aferição do cumprimento dos limites legais, de acordo com os critérios efectivamente aplicáveis em cada momento.

As diferenças nos valores apontados relevam da diferença de critérios utilizados nos cálculos e das datas de referência tidas em conta.

Assim, considera-se ser de rectificar a matéria de facto constante das alíneas H) e I) do probatório do Acórdão recorrido, no que diz respeito à data de referência da informação prestada pelo SEAAL, e de ampliar a mesma de acordo com os dados fornecidos pela autarquia com referência a outras datas, a fim de que a situação não ofereça dúvidas, seja interpretável com clareza e evidencie a real evolução verificada.

Essas alíneas H) e I) passam, assim, a ter a seguinte redacção:

"H) A situação do município de Lisboa, em termos de endividamento de médio e longo prazo, é a seguinte:

(ver documento original)

I) A situação do município de Lisboa, em termos de endividamento líquido, é a seguinte:

(ver documento original)

"

I.1.3 - O recorrente alega, na conclusão 3.ª e no n.º 7 das suas alegações, que as dívidas do município de Lisboa ao DEPFA ACS BANK e ao BPI, S. A., emergentes de cessões de créditos da Parque Expo e da SIMTEJO, devem ser classificadas como dívida financeira da autarquia e não como dívida a fornecedores, razão por que devem ser retiradas do montante referido na alínea S) do probatório, que, no seu entender, deveria ter a seguinte redacção: "S) O montante total das dívidas a fornecedores, em 31-12-2007, era de (euro) 254.537.614,85.".

Os factos que quantificam e caracterizam estas dívidas constam das alíneas M), N), O), P), Q) e R) do probatório fixado no Acórdão recorrido.

A questão suscitada respeita à discordância da autarquia relativamente à qualificação jurídica que o Tribunal fez das dívidas em causa para cálculo do ratio "dívida a fornecedores". A matéria controvertida diz, assim, respeito a uma questão de direito, e não de facto.

Refira-se, aliás, que este ratio não foi sequer utilizado pelo Acórdão sub judice na aferição da situação de desequilíbrio financeiro conjuntural à luz do disposto no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, pelo que, no caso, o cálculo do seu montante era irrelevante para a decisão da causa.

Os factos relevantes já devidamente identificados nas alíneas M), N), O), P), Q) e R) do probatório fixado no Acórdão são suficientes para a caracterização da situação de endividamento da autarquia.

Em consequência, revoga-se a alínea S) do probatório constante do Acórdão recorrido, relativa à quantificação do montante total da dívida do município de Lisboa a fornecedores, por não se referir a factos simples.

II.1.4 - O recorrente solicita o aditamento ao probatório das alíneas A) a P), Q) a NN) e OO) a QQ) aduzidas sob os n.os 8, 9 e 10, respectivamente, das suas alegações.

a) Nas alíneas A) a P) do ponto 8 das alegações, a fls. 20 a 23 dos autos, que aqui se dão por reproduzidas, identificam-se procedimentos a adoptar para marcação das facturas cujo pagamento será feito através da utilização do empréstimo, para identificação, liquidação, cabimentação, registo e controlo das despesas financiadas pelo empréstimo de saneamento financeiro, a fim de impedir a liquidação inadvertida de facturas não abrangidas pelo plano de saneamento financeiro, facilitar a monitorização da utilização do empréstimo, permitir análises a todo o momento e disponibilizar informações a entidades internas e ou externas.

O recorrente invoca que toda esta matéria deverá ser levada ao probatório na medida em que demonstra a fiabilidade dos processos de execução do empréstimo para saneamento financeiro e assegura a disponibilidade da informação necessária para o controlo a posteriori da aplicação das verbas obtidas através da utilização da conta corrente em que se materializa o contrato de empréstimo sujeito a visto.

Trata-se de matéria que se encontrava já identificada no processo da 1.ª instância, mas que não tem relevância para a fundamentação da decisão então tomada nem para a respectiva reapreciação. Efectivamente, a decisão recorrida não pôs em causa a fiabilidade dos processos de execução do empréstimo nem a disponibilidade da informação necessária para o controlo da aplicação das respectivas verbas. Assim, não sendo os factos relevantes para a decisão da causa, não se justifica a sua alteração.

Improcede, assim, o pedido de aditamento destes factos.

b) O ponto 9 das alegações, a fls. 24 a 28 dos autos, que aqui se dá por reproduzido, refere-se ao teor do ofício do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, de 18 de Fevereiro de 2008, constante a fls. 761 e seguintes do processo de fiscalização prévia n.º 1598/07. Este ofício, junto ao processo já depois de aprovado o Acórdão da 1.ª instância, invocava um conjunto de circunstâncias, posteriores à aprovação do Plano de Saneamento Financeiro, reflectindo a forma realista como ele foi concretizado no Orçamento Municipal para 2008, o estado de execução de várias das medidas previstas e a evolução da situação financeira da autarquia lisboeta a 31/12/2007.

O recorrente considera que toda essa matéria deve ser levada ao probatório "na medida em que demonstra a viabilidade e exequibilidade do plano de saneamento financeiro e a forma como o mesmo já se encontra reflectido no Orçamento Municipal para 2008, o que permite comprovar a capacidade do Município para gerar as receitas necessárias ao cumprimento das suas responsabilidades correntes, assegurando, ao mesmo tempo, o pagamento da dívida financeira (reembolsos e juros), incluindo o novo empréstimo de saneamento, ou seja, deve ser considerado provado que o Município tem condições para gerar os saldos orçamentais necessários para amortizar o empréstimo contraído para sanar o desequilíbrio anterior", o que reafirma na sua conclusão 5.ª Considerando a atendibilidade das modificações de facto operadas durante a pendência dos processos e ponderando a concreta substância e valor de cada um dos factos apontados, atende-se a que, expurgados juízos de valor e meras previsões formulados pela própria autarquia, são de aditar à matéria de facto alguns dos aspectos referenciados no ponto 9 das alegações. Por apenas esses serem novos, concretos e determinantes para a caracterização da situação financeira da autarquia e relevarem para a decisão da causa, aditam-se, assim, ao probatório os seguintes factos:

"U) Do ofício do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, de 18 de Fevereiro de 2008, constante a fls. 761 e seguintes do processo de fiscalização prévia n.º 1598/07, constam os seguintes elementos relevantes:

U1) A execução da receita municipal em 2004, 2005 e 2006 foi de, respectivamente, 511, 662 e 570 M(euro) (sem considerar os saldos de gerência) e de 555 M(euro) em 2007 (de acordo com o fecho das contas em curso em Março de 2008);

U2) O montante das receitas previstas no Orçamento Municipal para 2008 é de 545.983.224 (euro), previsão que se situa abaixo da execução dos últimos anos;

U3) A execução da receita fiscal em Janeiro de 2008 encontrava-se 35 % acima da execução no período homólogo de 2007;

U4) O passivo de curto prazo, com excepção da dívida financeira, reduziu, entre 31/07/2007 e 31/12/2007, cerca de 16,6 %;

U5) A dívida a fornecedores de bens e serviços reduziu, entre 31/07/2007 e 31/12/2007, cerca de 27 %.

c) No ponto 10 das alegações, a fls. 29 dos autos, que aqui se dá por reproduzido, a autarquia considera que deverão ainda ser levados ao probatório os seguintes factos constantes do Plano de Saneamento Financeiro e das informações remetidas ao Tribunal no âmbito dos esclarecimentos prestados:

"OO) A operação de financiamento subjacente ao plano de saneamento financeiro encerra em si uma redução significativa de encargos financeiros nos próximos 5 anos, em 63 milhões de Euros, face ao custo da dívida comercial, cujos juros de mora legais se situam actualmente em 11,03 %, enquanto a taxa de juro negociada para o presente empréstimo se situa em 4,72 %;

PP) O plano de saneamento financeiro será objecto de revisões anuais em função da evolução das componentes da receita e da despesa;

QQ) A previsão do período temporal necessário à recuperação da situação financeira do Município é de 5 anos (2008-2012), sendo que a recuperação verificar-se-á já no 1.º ano de execução do plano de saneamento e a consolidação da situação de equilíbrio no final do 5.º ano do mesmo período, com um saldo estrutural na ordem dos 110 M(euro)"

O referido nas alíneas OO) e PP) consta, no essencial, do Plano de Saneamento Financeiro, elemento probatório já assumido na sua integralidade na decisão recorrida, pelo que não é necessário o aditamento.

O referido na alínea QQ) consta do ofício de 18 de Fevereiro de 2008, já referido na alínea anterior. Por se referir a elementos relevantes para a decisão, adita--se à matéria de facto nos seguintes termos:

"U) Do ofício do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, de 18 de Fevereiro de 2008, constante a fls. 761 e seguintes do processo de fiscalização prévia n.º 1598/07, constam os seguintes elementos relevantes:

(...)

U6) A previsão do período temporal necessário à recuperação da situação financeira do município é de 5 anos (2008-2012), sendo que a recuperação verificar-se-á já no 1.º ano de execução do plano de saneamento e a consolidação da situação de equilíbrio no final do 5.º ano do mesmo período, com um saldo estrutural na ordem dos 110 M(euro)."

II.1.5 - O recorrente impugna, e requer que seja considerada como não provada, a matéria constante dos n.os 9.3.a), 9.3.b), 9.3.c), 9.3.d), 9.3.e), 9.3f), 9.3.g), 9.3.h), 9.3.i), 9.3.j), do Acórdão recorrido, que considera não corresponderem a matéria de direito, mas sim a uma apreciação de supostas "debilidades" do plano de saneamento financeiro, as quais, no seu entendimento, constituem matéria de facto assente em extrapolações do Tribunal. Solicita ainda que sejam aditadas ao probatório as alíneas RR) a WW), nos termos que se aduzem sob o n.º 11.2 das suas alegações, a fls. 32 e 33 dos autos, que contraditam algumas dessas supostas debilidades.

Trata-se de matéria argumentativa, que analisaremos no ponto II.4.2 deste Acórdão, pelo que improcede o requerimento para o seu aditamento como matéria de facto.

II.1.6 - O recorrente solicita que seja aditada ao probatório a referência de que a actual notação de longo prazo do município de Lisboa é de AA - pela Fitch - e de Aa3 - pela Moody's - ambas fixadas já depois da aprovação do plano de saneamento financeiro, bem como a referência de que estas classificações têm subjacente uma avaliação em termos de «capacidade implícita de pagamento da dívida atempadamente» de «Muito forte» ou, na óptica da emissão de obrigações, uma avaliação de «Capacidade muito forte de pagamento de juros e capital».

A matéria em causa poderia relevar, nomeadamente, para a concessão do empréstimo, mas não importa para a apreciação da legalidade da decisão da 1.ª instância, improcedendo, em consequência, o requerimento para o seu aditamento.

II.1.7 - O recorrente requer ainda que seja aditada ao probatório a referência de que, em virtude da 3.ª alteração ao orçamento municipal para 2008, o montante total das dívidas a fornecedores irá reduzir-se em cerca de 20,4 milhões de Euros, passando para (euro) 234.137.614,85, o que permitirá reduzir a utilização dos fundos disponibilizados pelo contrato de abertura de crédito celebrado com a Caixa Geral de Depósitos, de 360M(euro) para 340M(euro).

Trata-se de um facto superveniente e relevante para a decisão, por se reflectir no montante global do empréstimo, que, por isso, se adita à matéria de facto nos seguintes termos:

"V) Em virtude de, em 2008, se reduzirem as dívidas aos fornecedores em cerca de 20,4 milhões de euros, a utilização dos fundos disponibilizados pelo contrato de abertura de crédito celebrado com a Caixa Geral de Depósitos irá reduzir-se de 360M(euro) para 340M(euro)."

II.1.8 - Finalmente, por ser consentido pelo disposto no artigo 712.º, n.º 4, do Código do Processo Civil, por estar suportado em elementos já constantes do processo da 1.ª instância e por ser relevante para a decisão do presente recurso, adita-se, oficiosamente, o seguinte ponto ao probatório:

"X) O Plano de Saneamento Financeiro junto a fls. 14 e seguintes do processo 1598/07 reporta-se exclusivamente ao período de 2008 a 2012."

II.1.9 - Conclusão

Em face do que antecede, procedem as conclusões 1.ª e 9.ª das alegações de recurso, procedem parcialmente as conclusões 2.ª, 4.ª e 5.ª e improcedem as conclusões 3.ª, 6.ª, 7.ª e 8.ª II.2 - Do juízo de legalidade financeira efectuado pelo Tribunal de Contas em sede de fiscalização prévia, dos seus limites e da sua eventual violação O recorrente alega, em vários passos das suas extensas alegações de recurso e dos pareceres em que se sustentou, que o Acórdão da 1.ª instância ultrapassou os limites do juízo de legalidade financeira consentido ao Tribunal de Contas no exercício da sua actividade de fiscalização prévia.

Considera que esse Acórdão:

Ultrapassou o âmbito da apreciação do contrato sujeito a visto;

Extravasou o conjunto dos poderes conferidos à 1.ª Secção do Tribunal pelos artigos 5.º, n.º 1, alínea c) e 44.º da LOPTC;

Violou o princípio da separação de poderes, invadindo a esfera do poder administrativo;

Violou o mesmo princípio, intrometendo-se no exercício do poder legislativo;

Ofendeu a garantia constitucional da autonomia do poder local, na sua dimensão financeira.

Vejamos se é assim.

II.2.1 - Dos poderes de fiscalização prévia do Tribunal de Contas.

Por força da LOPTC, o contrato de empréstimo em apreciação está sujeito a fiscalização prévia do Tribunal de Contas.

De acordo com o disposto no artigo 5.º, n.º 1, alínea c), da LOPTC, essa fiscalização prévia incide sobre a legalidade e o cabimento orçamental dos contratos a ela sujeitos.

Por força do artigo 44.º do mesmo diploma, a fiscalização prévia do Tribunal de Contas inclui:

A verificação da conformidade dos contratos com as leis em vigor (n.º 1), devendo o visto ser recusado em caso de nulidade (n.º 3, alínea a), violação directa de normas financeiras (n.º 3, alínea b) e ilegalidade que altere ou possa alterar o resultado financeiro (n.º 3, alínea c));

A verificação sobre se os respectivos encargos têm cabimento em verba orçamental própria (n.º s 1 e 3, alínea b));

No caso de instrumentos geradores de dívida pública, como é o caso em apreço, a verificação da observância dos limites de endividamento e das respectivas finalidades (n.º 2).

Em parecer junto ao recurso, a fls. 190 e seguintes dos autos, Vital Moreira defende, sobre o conteúdo do controlo prévio do Tribunal de Contas, designadamente, que (17):

O Tribunal de Contas tem natureza jurisdicional;

Exerce, em sede de fiscalização prévia, uma jurisdição administrativa especial, tendo por objecto a legalidade financeira, ou seja, a vertente financeira da actividade administrativa;

O objecto da fiscalização prévia é somente a legalidade, em sentido próprio, incluindo o cabimento orçamental da despesa em causa, mas excluindo a apreciação sobre se as condições dos contratos são as mais vantajosas e excluindo igualmente a apreciação do mérito das despesas sujeitas a visto;

O Tribunal de Contas, em sede de visto prévio, pode conhecer, em princípio, de todos os vícios do acto ou contrato, podendo a recusa de visto ocorrer por violação de qualquer tipo de norma, desde a Constituição até uma norma regulamentar, passando por norma legal ou de direito europeu;

Vale para a fiscalização prévia da legalidade financeira, assegurada pelo Tribunal de Contas, o princípio aplicável aos tribunais administrativos (artigo 3.º do CPTA) de que a justiça administrativa só pode julgar o cumprimento pela administração de normas e princípios jurídicos, não podendo pronunciar-se sobre aspectos ou dimensões da actividade administrativa que impliquem o exercício de margens de liberdade de decisão administrativa, o qual constitui naturalmente uma reserva da administração, imune à apreciação judicial (ressalvado naturalmente o controlo do exercício do próprio poder discricionário, na medida em que o mesmo é limitado pela lei ou vinculado pelos princípios gerais de direito administrativo);

A restrição da justiça administrativa ao controlo da legalidade é uma decorrência incontornável do princípio da separação de poderes inerente ao Estado de Direito, em especial da separação entre a esfera da jurisdição e a esfera da administração;

Tal como existe uma reserva de jurisdição, também existe uma reserva de administração e uma reserva de decisão política. A primeira inclui o exercício de poderes de livre decisão deixados à administração pela lei (poder discricionário). A segunda inclui a escolha dos objectivos e dos meios de prossecução do interesse público, a montante da lei. Não compete aos tribunais, enquanto tais, pelo menos no exercício de poderes jurisdicionais, invadir a esfera de poderes próprios da administração ou do poder político, ou escrutinar o seu exercício. Onde a actividade dos poderes públicos se exerce para além da lei e no espaço livre deixado pela lei, cessa também a esfera da jurisdição. Sempre que os tribunais se pronunciem sobre matérias alheias à vinculação jurídica do poder político ou administrativo, estão a exceder a sua função constitucional e a infringir a regra básica do Estado de Direito que é a separação de poderes;

No âmbito do controlo de legalidade dos contratos de empréstimo para saneamento financeiro, embora o objecto directo de fiscalização seja constituído pelo contrato de empréstimo entre os municípios e as instituições bancárias escolhidas, o controlo da sua legalidade não pode deixar de abranger também a verificação de todos os seus pressupostos legais, na medida em que sejam juridicamente vinculados;

São de considerar passíveis de controlo, entre outros aspectos, e tendo em conta o regime legal dos empréstimos e do saneamento financeiro: a verificação de que a situação de desequilíbrio financeiro que o empréstimo visa sanar cabe na figura do desequilíbrio conjuntural e do saneamento financeiro e a verificação de que o executivo municipal submeteu à aprovação da assembleia municipal, como exige a lei, um "estudo fundamentado sobre a situação financeira do município", bem como um "plano de saneamento financeiro" para o período do empréstimo, e que a assembleia aprovou o respectivo plano;

O controlo do Tribunal pode abranger também a verificação dos pressupostos e procedimentos legalmente estabelecidos para a aprovação dos empréstimos, incluindo os padrões estabelecidos pela assembleia municipal tanto no plano de saneamento, como na deliberação específica de aprovação do empréstimo. A validade do contrato público depende não somente do negócio jurídico em si mesmo (o contrato de empréstimo) mas também do acto administrativo em que ele se baseia, pois a possível invalidade do segundo inquina a validade do primeiro. De facto, nos termos do artigo 185.º do CPA, para além das suas validades intrínsecas, "os contratos administrativos são nulos ou anuláveis (...) quando forem nulos ou anuláveis os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração", doutrina que vale para os demais contratos públicos;

Em sede de fiscalização prévia há uma redução do âmbito do conhecimento do Tribunal, quanto às ilegalidades relevantes. Só são relevantes as ilegalidades graves que provoquem nulidade do acto ou contrato (e não a mera anulabilidade), de acordo com as regras gerais de direito administrativo. Ao invés, são sempre relevantes as ilegalidades propriamente financeiras, concretamente a criação de encargos sem cabimento orçamental ou [em] violação directa de normas financeiras ou outra ilegalidade do acto ou contrato que altere o respectivo resultado financeiro.

Acompanhamos, no essencial, estas considerações de Vital Moreira sobre os poderes de fiscalização prévia do Tribunal de Contas.

Ora, sendo certo que os tribunais não devem pronunciar-se quando estejam em causa matérias em que não haja vinculação jurídica do poder administrativo, é central determinar, em cada caso, se essa vinculação jurídica existe ou não.

A este respeito recordemos alguns aspectos importantes.

II.2.2 - Da vinculação e da discricionariedade na actividade administrativa e da sua sindicabilidade jurisdicional.

Em primeiro lugar, relembre-se que a actividade das autarquias locais é uma actividade subordinada à lei. Nos termos dos artigos 237.º, 238.º, 241.º, 242.º e 254.º da Constituição, as autarquias locais exercem os poderes que a lei lhes confere e exercem-nos nos limites da Constituição e da lei. A elas se aplica ainda o disposto no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição. E, em especial, a autonomia financeira que lhes está atribuída é, de acordo com o disposto no artigo 238.º da Constituição e nos artigos 2.º, 3.º e 4.º, entre outros, da Lei das Finanças Locais, enquadrada e limitada pela lei.

Em segundo lugar, sublinhe-se que os requisitos de legalidade financeira incluem os pressupostos gerais que constam do artigo 42.º, n.º 6, da Lei de Enquadramento Orçamental (18):

"Artigo 42.º

(...)

6 - Nenhuma despesa pode ser autorizada ou paga sem que, cumulativamente:

a) O facto gerador da obrigação de despesa respeite as normas legais aplicáveis;

b) A despesa em causa disponha de inscrição orçamental, tenha cabimento na correspondente dotação, esteja adequadamente classificada e obedeça ao princípio da execução do orçamento por duodécimos, salvas, nesta última matéria, as excepções previstas na lei;

c) A despesa em causa satisfaça o princípio da economia, eficiência e eficácia."

Resulta desta norma que, hoje, a observância dos princípios da economia, eficiência e eficácia constitui, inequivocamente, um pressuposto legal da autorização das despesas. Não por cedência a opiniões doutrinais ou por apelo a um "conceito amplo de legalidade financeira" (19), com recurso ao princípio constitucional da prossecução do interesse público ou ao "dever jurídico imperfeito" (20) de boa administração, mas por fixação legal expressa em norma financeira.

Em terceiro lugar, refira-se que importa estabelecer a distinção entre vinculação e discricionariedade e determinar em qual delas se situa a interpretação e aplicação de conceitos indeterminados utilizados pelo legislador e, consequentemente, qual o âmbito do respectivo controlo jurisdicional.

Trata-se de matéria que tem gerado extensas querelas doutrinais.

A doutrina e a jurisprudência maioritárias consideram que o poder discricionário existe quando a lei confere ao órgão administrativo liberdade para escolher o comportamento em concreto mais adequado à satisfação de uma necessidade pública específica prevista na lei, reconhecendo, ainda assim, que, em muitos casos, a Administração só poderá adoptar um de entre uma série limitada de vários comportamentos admitidos pela lei.

Essa esfera de livre decisão constitui a reserva de administração a que o recorrente se refere, mas, tal como Vital Moreira reconhece, não afasta o controlo do exercício do próprio poder discricionário, "na medida em que o mesmo é limitado pela lei ou vinculado pelos princípios gerais de direito administrativo". Para além da necessidade de observância dos princípios, maxime os da imparcialidade e da proporcionalidade, entre os limites da discricionariedade contam-se as normas reguladoras da competência, pressupostos, finalidades, formalidades, forma, fundamentação e conteúdo dos actos. A violação de quaisquer destes limites está sujeita ao controlo dos tribunais, que têm também considerado poder averiguar da existência de erros grosseiros ou manifestos no exercício dos poderes discricionários (21).

A posição maioritária da nossa doutrina administrativa tem-se também orientado para estabelecer uma distinção entre o exercício de um verdadeiro e próprio poder discricionário e a determinação do conteúdo de eventuais conceitos vagos ou indeterminados utilizados pela lei. Ainda que não se duvide que deve ser a Administração a dar, em primeira mão, a esses conceitos o sentido ou conteúdo que melhor corresponda à realização do fim estabelecido pela lei, autores como Sérvulo Correia, Freitas do Amaral, Marcelo Rebelo de Sousa, Esteves de Oliveira, Bernardo Ayala, António Francisco de Sousa e outros, na esteira da doutrina alemã, têm considerado que a fixação do sentido de um conceito indeterminado corresponde a uma operação de interpretação da lei e não a uma actividade discricionária. Deve, assim, ser considerada uma actividade vinculada, da qual estão afastadas considerações de oportunidade e conveniência.

A jurisprudência administrativa tem vindo crescentemente a acolher este entendimento (22), aceitando a sindicabilidade contenciosa da actividade administrativa de interpretação e aplicação destes conceitos nos casos em que a sua avaliação não exige conhecimentos técnicos especiais, em que o critério de concretização resulta da exegese dos textos legais ou envolve juízos mais especificamente jurídicos, casos em que o tribunal não pode invocar não possuir os necessários conhecimentos técnicos. No Acórdão do STA de 5 de Julho de 2007, no processo 351/07, diz-se mesmo que os preceitos constitucionais (artigos 201.º, n.º s 1 e 2, e 266.º, n.º 2, da Constituição) impõem a eliminação do entendimento tradicional de que os tribunais administrativos estão impossibilitados de apreciar os conceitos indeterminados, ou, pelo menos, conduzem à sua aplicação em termos muito restritivos, sob pena de se incorrer em denegação de justiça. Refere-se também neste Acórdão que "[p]rovavelmente, nos dias de hoje, com a reforma introduzida pelo CPTA, onde a preocupação de apreciar efectivamente a substância das coisas é mais marcante se deva avançar neste sentido de uma forma mais clara e determinada.".

Quando o legislador use noções vagas ou indeterminadas deve, então, por interpretação da lei, apurar-se se ele pretendeu mesmo, ou não, deixar ao órgão administrativo a escolha discricionária dos pressupostos da sua actuação, o que, para a doutrina referida, sucederá em casos muito limitados. Serão os casos em que o legislador remete para a Administração a competência para fazer um juízo baseado na sua experiência e nas suas convicções e não aqueles em que se exige uma valoração objectiva, susceptível de ser preenchida pelas concepções objectivamente dominantes. Só no primeiro caso ficará excluída a sindicabilidade jurisdicional.

Mas mesmo relativamente a esses conceitos indeterminados em que esteja envolvida uma verdadeira discricionariedade (23), a jurisprudência administrativa tem considerado que eles estão sujeitos a escrutínio dos tribunais relativamente a vícios de forma por falta ou insuficiente fundamentação, inobservância de princípios, desvio de poder, erro sobre os pressupostos de facto ou até quando traduzam a utilização de um critério "ostensivamente inadmissível".

Nos casos em que as noções utilizadas pela lei possam ser densificadas com elementos da experiência comum que qualquer cidadão normalmente diligente possui estaremos seguramente perante uma actividade vinculada e, como tal, sindicável pelos tribunais.

Por outro lado, nos casos em que a lei, para definição dos pressupostos da actividade da Administração, remete para conceitos técnicos próprios da ciência, não resta ao órgão administrativo outra hipótese senão a de recorrer aos ensinamentos da ciência para determinação do conteúdo da lei. Como refere Esteves de Oliveira (24), "(...) as questões resultantes da utilização de conceitos técnicos pela lei, resolvem-se através de critérios exclusivamente técnicos, não tendo o órgão administrativo a liberdade de repudiar o conteúdo que lhes é imputado nos respectivos ramos de ciência e optar por qualquer outro.". Também aqui estaríamos perante uma operação vinculada, sendo legítimo que os tribunais apreciem se a interpretação ou qualificação feita pela Administração foi a melhor, apelando para a ciência e para a técnica, através de mecanismos processuais próprios.

Nesta matéria dos conceitos técnicos os tribunais administrativos têm sido mais renitentes. Têm considerado frequentes vezes que o facto de não possuírem os necessários conhecimentos técnicos os impede de questionar os juízos efectuados pela Administração.

Mas, relativamente a isso, e por último, importa clarificar que, em matéria de conceitos técnicos da ciência económico-financeira, o Tribunal de Contas não poderia acompanhar essa tradição dos tribunais administrativos. Este Tribunal nunca poderia invocar o facto de esses conceitos se reportarem a saberes que não domina, quer porque dispõe, ou pode dispor, dos recursos técnicos necessários, quer porque não se compreenderia que o país dispusesse de uma jurisdição financeira especializada e que a mesma se declarasse incompetente para avaliar as questões para cuja apreciação foi criada.

II.2.3 - Das vinculações jurídicas em matéria de empréstimos para saneamento financeiro das autarquias locais

a) Regime

O artigo 40.º da Lei das Finanças Locais dispõe especificamente sobre a situação em que os municípios podem e devem recorrer a empréstimos para saneamento financeiro, sobre as condições da sua autorização e contracção, sobre como devem aplicar os empréstimos, sobre a sua duração, sobre as vinculações aplicáveis durante o período da sua vigência, sobre as formas de controlo a exercer durante essa período e sobre as consequências do incumprimento do plano de saneamento financeiro obrigatoriamente associado ao empréstimo.

Este artigo 40.º insere-se no Título IV da Lei das Finanças Locais, relativo ao endividamento autárquico, no qual se estabelecem os tipos possíveis de endividamento por parte dos municípios e o respectivo regime e limites gerais.

O n.º 1 do artigo 38.º da mesma Lei refere que os municípios podem contrair empréstimos e utilizar aberturas de crédito nos termos da lei e o n.º 4 do mesmo artigo estabelece que os empréstimos a médio e longo prazos podem ser contraídos para aplicação em investimentos ou ainda para proceder ao saneamento ou ao reequilíbrio financeiro dos municípios.

O n.º 6 do referido artigo 38.º estipula que o pedido de autorização à assembleia municipal para a contracção de empréstimos de médio e longo prazo é obrigatoriamente acompanhado de informação sobre as condições praticadas em, pelo menos, três instituições de crédito, bem como de mapa demonstrativo da capacidade de endividamento do município e o n.º 8 estatui que sempre que os efeitos da celebração de um contrato de empréstimo se mantenham ao longo de dois mandatos, deve aquele ser objecto de aprovação por maioria absoluta dos membros da assembleia municipal em efectividade de funções.

Este regime é, por sua vez, enquadrado pelos princípios orçamentais do equilíbrio e da estabilidade, nos termos estabelecidos nos artigos 9.º, 23.º, 25.º e 84.º e seguintes da Lei de Enquadramento Orçamental, aos quais os municípios estão sujeitos, por força do disposto no artigo 4.º da Lei das Finanças Locais, aplicando-se ainda o disposto no ponto 3.1.1.e) do POCAL, aprovado pelo Decreto-Lei 54-A/99, de 22 de Fevereiro.

O disposto nestes preceitos legais impõe como regra uma situação de equilíbrio orçamental, traduzida na necessidade de as receitas efectivas deverem ser, pelo menos, iguais às despesas efectivas do mesmo orçamento, regra que é válida tanto para a elaboração e aprovação do orçamento como para a respectiva execução. Uma vez que as receitas e despesas efectivas não incluem as respeitantes aos passivos financeiros, a inclusão e utilização de receitas provenientes de empréstimos para fazer face a despesas efectivas corresponde, de acordo com estas normas, a uma situação financeira de desequilíbrio. Ainda assim, a legislação financeira aplicável estabelece a possibilidade de as autarquias recorrerem ao crédito para financiamento de determinados tipos de despesa efectiva, mas fixando limites ao seu endividamento anual.

b) Vinculações legais

Do regime legal exposto, nomeadamente do disposto no citado artigo 40.º, resulta que o recurso por um município a empréstimos para saneamento financeiro está sujeito, designadamente, e pelo menos, às seguintes vinculações legais:

i) Para poder recorrer ao empréstimo, a autarquia tem de se encontrar numa situação de desequilíbrio financeiro conjuntural;

ii) O pedido de empréstimo deve ser instruído com um estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia;

iii) O empréstimo destina-se ao saneamento financeiro do município;

iv) O empréstimo deve ser aplicado na reprogramação da dívida e na consolidação de passivos financeiros;

v) O resultado da operação não pode aumentar o endividamento líquido do município;

vi) O empréstimo deve ser acompanhado por um plano de saneamento financeiro;

vii) O plano de saneamento financeiro deve abranger o período a que respeita o empréstimo;

viii) O estudo sobre a situação financeira e o plano de saneamento financeiro são propostos pela Câmara e aprovados pela Assembleia Municipal;

ix) O empréstimo deve ser apreciado e aprovado tendo presentes as condições praticadas por, pelo menos, três instituições de crédito;

x) O empréstimo deve ser aprovado pela Assembleia Municipal e por maioria absoluta dos seus membros em efectividade de funções, se os seus efeitos se mantiverem ao longo de dois mandatos;

xi) O empréstimo não pode exceder um prazo de 12 anos e um período máximo de diferimento de 3 anos;

xii) Durante o período do empréstimo não podem ser feitos novos empréstimos de saneamento financeiro;

xiii) A Câmara Municipal fica obrigada, durante o período do empréstimo a cumprir o plano de saneamento financeiro;

xiv) Durante o período do empréstimo, a Câmara Municipal deve remeter à Assembleia Municipal relatórios semestrais sobre a execução do plano de saneamento financeiro e demonstrar anualmente o respectivo cumprimento, por ocasião da prestação de contas.

Todas estas condições, por serem vinculações legais, são susceptíveis de ser escrutinadas jurisdicionalmente e todas elas estão fixadas em normas financeiras.

c) Conceitos indeterminados incluídos naquelas vinculações legais Enquanto elementos destas vinculações encontramos alguns conceitos e documentos cujo conteúdo não está directamente fixado: "situação de desequilíbrio financeiro conjuntural", "saneamento financeiro", "estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia" e "plano de saneamento financeiro".

Serão estas noções e documentos conceitos indeterminados ou conceitos técnicos? São determináveis por meras operações de interpretação da lei ou implicam escolhas livres, valorações ou criações jurídicas por parte dos órgãos autárquicos? Do conceito de desequilíbrio financeiro conjuntural trataremos no ponto II.3.1 deste Acórdão.

Quanto ao conceito de saneamento financeiro afigura-se-nos claro que exige apenas uma operação de interpretação. Tem um sentido que decorre da experiência e senso comuns, correspondendo a uma actuação que consiga transformar uma má situação financeira numa situação financeira sã. Por seu turno, o seu sentido mais específico, em termos de finanças públicas, completa-se com facilidade a partir dos textos legais financeiros. Sanear financeiramente uma autarquia só pode significar a acção de corrigir uma situação de desequilíbrio financeiro (neste caso conjuntural), transformando-a numa situação financeira equilibrada, que respeite os princípios e leis financeiras aplicáveis. A experiência comum e a lei fornecem um padrão suficientemente claro para a interpretação e apreciação deste conceito, sem qualquer conteúdo valorativo ou discricionário, o que, consequentemente, permite a sua sindicabilidade jurisdicional.

Quanto aos dois documentos (estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia e plano de saneamento financeiro), reconhecemos que foi deixada à Administração margem para a definição do seu conteúdo, sobretudo antes da entrada em vigor do Decreto-Lei 38/2008. No entanto, é também fácil descortinar alguns elementos vinculados nestes documentos.

d) Elementos vinculados do estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia e do plano de saneamento financeiro Desde logo, é vinculada a finalidade dos documentos em causa.

A lei estabelece que o estudo se destina a caracterizar a situação financeira da autarquia e que o plano se destina a operar o respectivo saneamento financeiro.

Se os elementos incluídos no estudo não lograrem, com credibilidade, caracterizar a situação como de desequilíbrio financeiro meramente conjuntural, o estudo deve ter-se por não fundamentado e insuficiente face ao seu objectivo vinculado.

No caso do plano, é inquestionável que o legislador quis deixar aos órgãos autárquicos a definição das medidas que considerem adequadas à recuperação da situação financeira e que isso releva da sua reserva de administração e da sua autonomia financeira. Mas não pode deixar de se garantir que essas medidas conduzem ao saneamento financeiro da autarquia. Este objectivo está juridicamente estabelecido e é, portanto, vinculado e se a estratégia constante do plano, qualquer que ela seja, não for apta a preencher esse objectivo, então ele deve ter-se por insuficiente e insusceptível de preencher a exigência legal.

Pode mesmo dizer-se que, neste caso, o fim fixado não é um mero critério orientador mas se converte em verdadeiro pressuposto vinculado.

Por outro lado, existem também vinculações quanto ao próprio conteúdo destes documentos.

Diz expressamente a lei que o estudo sobre a situação financeira da autarquia deve ser fundamentado. Isto significa que, embora variando em função das circunstâncias do caso concreto, tem de permitir que um destinatário normal se possa aperceber do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido para se concluir ou decidir de uma dada maneira. Se ele for obscuro, contraditório, ininteligível ou insuficiente para fundamentar a conclusão não pode ter-se por fundamentado.

Como suporte da decisão em causa, um estudo fundamentado sobre a situação financeira de uma autarquia nunca poderá, designadamente, deixar de incluir a análise e diagnóstico da situação económico-financeira dos últimos anos, baseada nos indicadores financeiros próprios dos sistemas orçamentais e contabilísticos utilizados, a identificação das causas do desequilíbrio financeiro e os critérios e razões técnicas que levam a qualificar esse desequilíbrio como meramente conjuntural. Só essa análise poderá servir de suporte à análise prospectiva, à decisão sobre as medidas necessárias e à fixação dos objectivos correctivos quantificados e controláveis que hão-de integrar o plano de saneamento financeiro.

Quanto ao plano de saneamento financeiro, e mesmo na falta ou inaplicabilidade do Decreto-Lei 38/2008, não poderia aceitar-se como idóneo um plano que não identificasse os objectivos fixados e as medidas de recuperação da situação financeira municipal, em termos de permitir o respectivo controlo legalmente estabelecido, ou que não contivesse os elementos tecnicamente necessários a demonstrar que a recuperação financeira se verifica. Se o plano não contiver as adequadas projecções financeiras, como é que se alcança que, durante o período em causa, o equilíbrio orçamental e patrimonial é obtido, o endividamento líquido não aumenta, o endividamento a fornecedores não é retomado, os limites de endividamento são respeitados? Voltaremos adiante, com mais detalhe, àquilo que um plano de saneamento financeiro pode ou deve incluir.

Importa, desde já, no entanto, referir que a publicação do Decreto-Lei 38/2008, e nomeadamente do seu artigo 4.º, veio evidenciar com clareza, entre outras coisas, duas muito importantes: que a intenção do legislador não era a de deixar a delimitação do conteúdo do plano de saneamento financeiro à livre escolha dos órgãos autárquicos; e que os elementos a integrar nesse plano eram facilmente definíveis através de uma operação de interpretação jurídica, com recurso a critérios lógicos, teleológicos, sistemáticos e técnicos. Confirmou-se, assim, que a fixação desses elementos corresponde, não ao exercício de um poder discricionário mas, antes, a uma operação de interpretação e integração de um conceito.

Importa também sublinhar que, pelo menos a partir da entrada em vigor desse diploma, se tornou inquestionável que o plano de saneamento financeiro é um documento com um conteúdo mínimo legalmente vinculado. Se atentarmos no corpo do n.º 2 do artigo 4.º deste diploma, diz-se que o plano de saneamento financeiro inclui, designadamente, os elementos referidos nas alíneas subsequentes. Isto significa não apenas que a autarquia poderá incluir outros elementos que julgue adequados, mas também que a situação e a demonstração da realização do objectivo legal podem impor a necessidade objectiva de outros elementos.

Clarifique-se e reitere-se que uma coisa é aferir se o estudo e o plano contêm os elementos necessários para cumprirem a sua função, outra é a escolha das medidas adequadas ao saneamento financeiro. O Tribunal poderá sindicar se o plano contém as medidas e se demonstra a respectiva eficácia mas nunca poderá sindicar a escolha discricionária das medidas.

Saliente-se ainda a vinculação legal expressa de que o plano de saneamento financeiro deve abranger todo o período de vigência do empréstimo.

Compreende-se esta exigência pois é necessário demonstrar que o equilíbrio financeiro é assegurado e mantido durante todo esse período e que os compromissos assumidos são válidos para esse período.

e) Vinculações do estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia e do plano de saneamento financeiro enquanto vinculações do empréstimo a apreciar pelo Tribunal de Contas As vinculações aplicáveis ao estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia e ao plano de saneamento financeiro são vinculações jurídicas do próprio empréstimo, uma vez que constituem formalidades essenciais do respectivo procedimento e asseguram a demonstração dos seus pressupostos legais.

Por força do disposto no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, um empréstimo para saneamento financeiro só pode ser autorizado e contraído caso a autarquia se encontre em situação de desequilíbrio financeiro conjuntural. Se o estudo que deve caracterizar essa situação não conseguir demonstrar que ela se verifica, esse pressuposto vinculado não poderá ser dado por verificado.

Por seu turno, por força da mesma norma legal e, ainda, da tipicidade das finalidades dos empréstimos municipais, o empréstimo a que se refere o artigo 40.º da Lei das Finanças Locais só pode ser contraído para saneamento financeiro do município. A mesma lei vincula os órgãos autárquicos a só adoptarem um empréstimo com este fim se o fizerem acompanhar de um plano de saneamento financeiro para todo o período da sua vigência, o qual é objecto de acompanhamento e controlo permanente, havendo lugar à aplicação de sanções em caso de incumprimento. Se o plano apresentado, quaisquer que sejam as medidas escolhidas, não evidenciar que o saneamento financeiro é atingido, não se poderá considerar legal um empréstimo contraído para uma finalidade/pressuposto que não se verifica ou comprova.

f) Conclusão

Fica, então, claro que, enquanto requisitos legalmente vinculados, todos os aspectos referidos resultam de operações de interpretação de conceitos utilizados pela Lei das Finanças Locais, com apelo a noções do senso comum e a princípios, conceitos e normas constantes de leis financeiras e são susceptíveis de escrutínio jurisdicional quanto à sua verificação e idoneidade.

II.2.3 - Dos limites do juízo de legalidade relativo ao contrato sujeito a visto O recorrente impugna o Acórdão da 1.ª instância por o mesmo ultrapassar os limites de um juízo de legalidade relativo ao contrato sujeito a visto, considerando que a avaliação do plano de saneamento financeiro não é objecto de fiscalização prévia nem pode ser feita no âmbito da apreciação da legalidade do empréstimo.

Explicitando melhor esta ideia, o parecer de Vital Moreira, junto a fls. 190 e seguintes do processo, refere, designadamente (25):

Embora o plano de saneamento seja obrigatório, a lei deixou para os órgãos municipais a liberdade da sua configuração, não havendo nenhuma norma nem princípio vinculante sobre a matéria;

O plano de saneamento financeiro não gera em si mesmo nenhuma responsabilidade financeira, pelo que não pode incorrer em nenhuma ilegalidade financeira, por violação de alguma norma financeira;

Incidindo a fiscalização prévia sobre a legalidade do contrato de empréstimo, o plano de saneamento só releva se e na medida em que a sua eventual ilegalidade afectasse a legalidade daquele. Ora, não sendo o plano de saneamento um instrumento juridicamente vinculado quanto ao seu conteúdo, ele está fora do âmbito de controlo da legalidade do contrato de empréstimo, salvo para verificar se o empréstimo respeita os termos adrede estabelecidos no próprio plano;

No que respeita ao plano de saneamento, o único aspecto que pode ser verificado pelo Tribunal é verificar a sua aprovação pela assembleia municipal, pois ele constitui um requisito procedimental da aprovação do empréstimo pela mesma assembleia. A sua falta afecta a validade da aprovação do empréstimo, o que por sua vez arrasta a invalidade do próprio contrato de empréstimo.

Tratando-se claramente de uma formalidade essencial, a sua falta pode resultar em nulidade do acto de aprovação do empréstimo e, consequentemente, do contrato submetido a fiscalização prévia.

A este respeito referiu o Ministério Público, no seu parecer, a fls. 312 e seguintes dos autos:

"(...) o legislador entendeu dever rodear, estas operações, de certas cautelas e de apertadas condições e pressupostos; desde logo, aquela que é a mais importante, tem a ver com a necessidade de uma prévia e rigorosa caracterização (ou qualificação) sobre o verdadeiro estado (ou situação) financeira do organismo a financiar).

(...) Para o decidir fundadamente, o Tribunal tem de dispor de todos os instrumentos de informação financeira actual (no momento da operação de financiamento) e, bem assim, a respectiva programação financeira, sustentada em dados objectivos e em previsões realistas e credíveis; é, justamente, da conjugação destes dois instrumentos (análise "perspectiva" e "prospectiva") que qualquer decisor estará habilitado a avaliar, se a situação subjacente é a do desequilíbrio "estrutural" ou meramente "conjuntural", para que se possa decidir em conformidade com tais realidades e suas exigências."

"(...) nada, na legislação que conhecemos, legitima qualquer exclusão do Tribunal de Contas, em sede de "fiscalização prévia", de sindicar, quer o chamado "estudo fundamentado sobre a situação financeira da Autarquia", quer o chamado "plano de saneamento financeiro"; tratando-se de peças, essenciais, de análise "perspectiva" e "prospectiva", para serem sérias e credíveis terão de partir de dados contabilísticos objectivos, positivos e concretos e que possam ser aceites pelo Tribunal - pois, que, de contrário, não cumprem as finalidades que o legislador pretendeu, expressamente, ao exigir que tais "elementos de prova" viessem a "instruir" o pedido de saneamento financeiro; defender o contrário é cair no absurdo de impedir um qualquer Tribunal de sindicar os elementos documentais de prova, que as partes processuais fazem juntar, aos Autos, em defesa das suas pretensões legalmente tuteladas! Ora, se é, não apenas, legítima, como necessária e essencial, a intervenção, do Tribunal de Contas, ao nível do "controlo da qualidade" desses documentos (que servem, afinal, para "instruir" o pedido), daí decorre, que a recorrente apenas terá a faculdade de discordar das apreciações (ponderações e conclusões), do Tribunal, sobre tais documentos de prova, mas nunca de colocar em causa, tal acto de julgamento, do Tribunal, em si mesmo; da mesma forma que em qualquer outro Tribunal, ou em qualquer outra causa judicial, qualquer "parte processual"

possa discordar da livre apreciação das provas, feita pelo Juiz, mas nunca do próprio acto, em si mesmo considerado (cf. artigo 655.º Código do Processo Civil)."

Como decorre do disposto no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, e usando as próprias palavras de Vital Moreira, o plano de saneamento financeiro é "obrigatório", "constitui um requisito procedimental da aprovação do empréstimo", constitui uma "formalidade essencial" e "a sua falta afecta a validade da aprovação do empréstimo", "pode resultar em nulidade do acto de aprovação do empréstimo e, consequentemente, do contrato submetido a fiscalização prévia".

O mesmo se diga do estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia.

Como elementos instrutores do empréstimo, estes documentos contêm, como referiu o Senhor Procurador-Geral Adjunto, os elementos financeiros destinados a caracterizar a situação financeira da autarquia e a previsão da respectiva evolução.

Como também já referimos, só é, então, possível sindicar a verificação do pressuposto e do escopo, legalmente vinculados, do empréstimo objecto de fiscalização prévia com base na informação constante daqueles documentos.

Se o Tribunal de Contas não pudesse apreciar o seu conteúdo, ficaria privado de poder verificar que a situação de desequilíbrio financeiro que o empréstimo visa sanar cabe na figura do desequilíbrio conjuntural e do saneamento financeiro e de verificar que foi cumprida, pelos órgãos competentes, a obrigação legal e vinculada de elaborar e aprovar um estudo fundamentado sobre a situação financeira do município e um plano de saneamento financeiro para o período do empréstimo. Sem se debruçar sobre o conteúdo dos documentos, o Tribunal estaria impedido de verificar se o estudo se apresenta fundamentado, como exige a lei, se o plano prevê o saneamento financeiro da autarquia, como é da sua natureza, e se abrange o período do empréstimo, como estabelece, vinculadamente, a norma aplicável.

Ora, os vícios destes documentos, por falta de elementos essenciais, acarretam a invalidade do contrato, por falta de demonstração dos seus pressupostos legais.

Se o Tribunal não pudesse apreciar o seu conteúdo, ficaria ainda, como refere o Ministério Público, efectivamente coarctado na liberdade de julgamento e apreciação da prova que lhe confere o citado artigo 655.º do Código do Processo Civil.

De resto, como já vimos, o Tribunal de Contas deve, em sede de fiscalização prévia, e por determinação legal expressa constante do n.º 2 do artigo 44.º da LOPTC, verificar a observância das finalidades dos empréstimos. Fácil é concluir que, para proceder a essa verificação, deve sindicar se o plano de saneamento financeiro demonstra e assegura a finalidade do empréstimo.

Por outro lado, cabe ao Tribunal, também em sede de controlo prévio, fiscalizar a legalidade das despesas públicas. Dos empréstimos decorre despesa pública e a verificação da legalidade dessa despesa deve fazer-se tendo também em conta a norma financeira constante da alínea c) do n.º 6 do artigo 42.º da Lei de Enquadramento Orçamental. Ora, se não se demonstrar que essa despesa permite atingir o objectivo que legalmente lhe foi estabelecido (recuperar uma sã situação financeira), terá de dar-se como não comprovado que obedeça ao princípio da eficácia (26).

Deve, pois, concluir-se que, ainda que o acto sujeito a visto não seja o plano de saneamento financeiro, mas sim o contrato de empréstimo, a apreciação da legalidade do empréstimo para saneamento financeiro envolve necessariamente, por força dos n.º s 2 e 3 do artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, a apreciação da existência e teor do estudo sobre a situação financeira do município e do plano de saneamento financeiro, por constituírem um pressuposto da decisão de contratar e do respectivo contrato e o instrumento de demonstração da respectiva finalidade, requisitos legalmente estabelecidos em norma financeira.

E deve também concluir-se que a não observância da norma financeira em causa afecta a legalidade financeira do contrato.

Considera-se, assim, que não foram ultrapassados quaisquer limites quanto ao juízo de legalidade que ao Tribunal de Contas compete fazer relativamente ao contrato sujeito a visto.

II.2.4 - Dos limites à apreciação do conteúdo do plano de saneamento financeiro O recorrente invoca que, ao sindicar o conteúdo do plano de saneamento financeiro, o Tribunal extravasou os poderes de controlo da legalidade conferidos à 1.ª Secção do Tribunal pelos artigos 5.º, n.º 1, alínea c) e 44.º da LOPTC, violou o princípio da separação de poderes, invadindo a esfera do poder administrativo, violou o mesmo princípio, intrometendo-se no exercício do poder legislativo e ofendeu a garantia constitucional da autonomia do poder local, na sua dimensão financeira.

Esses vícios são apontados ao Acórdão, em virtude de se considerar que o mesmo:

Apreciou o mérito de um documento aprovado pelos órgãos da autarquia, quando só pode, em fiscalização prévia e no exercício dos correspondentes poderes jurisdicionais, proceder a juízos de legalidade estrita sobre dimensões legalmente vinculadas da actuação da Administração;

Escrutinou as medidas previstas no plano de saneamento financeiro, controlando a actividade a exercer pela autarquia e sindicando opções de política económico-financeira, que se incluem na esfera da livre apreciação política e administrativa dos órgãos autárquicos quanto à pertinência e oportunidade da realização da despesa pública. A este respeito, refere o recorrente: "A fiscalização judicial não pode versar sobre a escolha dos meios para alcançar certos objectivos, porque isso integra a esfera de livre decisão orçamental dos municípios";

Definiu requisitos de substância, fiabilidade e sustentabilidade do plano de saneamento financeiro não expressamente definidos pelo legislador, assumindo uma função de criação normativa e intromissão no exercício do poder legislativo;

Condicionou a autonomia financeira do município, garantida constitucionalmente, a qual não pode ser controlada para além dos poderes de controlo que são conferidos ao Tribunal pela Constituição e pela lei.

Será, então, que o Tribunal ultrapassou os limites da apreciação da legalidade financeira ao decidir apreciar o "conteúdo do estudo e do plano de saneamento financeiro apresentados pelo município, a fim de apurar da sua credibilidade e fiabilidade, bem como da sua adequação ao fim a que se destina, ou seja, a sua adequação à recuperação da situação de desequilíbrio financeiro em que se encontra o município"? Considerou o acórdão que "só perante a análise do conteúdo e sustentabilidade desse plano, do tipo de medidas que o município se propõe tomar, dos efeitos financeiros previsíveis de tais medidas, se poderá aferir o grau de desequilíbrio financeiro do município, avaliar as previsões de cumprimento dos objectivos ínsitos na opção pelo saneamento financeiro, e, designadamente, se o empréstimo de saneamento contratado, aumenta ou não o endividamento líquido do município"(27).

É tal análise compatível com os limites de verificação da legalidade financeira, nos termos apontados nos pontos anteriores? Aceitámos nesse ponto que o Tribunal de Contas deve limitar-se, no exercício dos poderes de fiscalização prévia, a verificar o cumprimento pela Administração de normas e princípios jurídicos, no domínio da sua actividade juridicamente vinculada, a sindicar a aplicação feita pela Administração dos conceitos indeterminados que apenas exijam operações de interpretação ou valoração objectiva e a controlar o exercício do poder discricionário apenas na medida em que o mesmo é limitado pela lei ou vinculado pelos princípios gerais de direito administrativo.

Defendemos já que o estudo sobre a situação financeira do município e o plano de saneamento financeiro constituem um pressuposto da decisão de contratar e do respectivo contrato, pressuposto esse legalmente estabelecido em norma financeira, pelo que podem ser apreciados pelo Tribunal no âmbito da fiscalização prévia do contrato de empréstimo que devem acompanhar.

O Acórdão recorrido pronunciou-se sobre o conteúdo do plano de saneamento financeiro apresentado, no seu ponto III.9.3.

Nesse ponto, o Acórdão apontou debilidades ao Plano de Saneamento Financeiro apresentado, por o mesmo:

Não perspectivar adequadamente a situação económico-financeira futura;

Não incluir, para o período de vigência do empréstimo, balanços previsionais anuais (designadamente, a evolução dos saldos anuais das contas dos fornecedores), demonstrações de resultados anuais, mapas de fluxos financeiros e peças contabilísticas previsionais anuais;

Não conter objectivos quantificados;

Não concretizar, caracterizar e quantificar as medidas a tomar;

Não se apresentar articulado com um plano estratégico plurianual;

Não considerar devidamente o risco;

Não conter um plano de investimentos.

Considerando o que concluímos atrás, eram estes aspectos sindicáveis pelo Tribunal de Contas em sede de fiscalização prévia e de controlo de legalidade? Estabelecemos com segurança que o plano deve demonstrar a recuperação do equilíbrio financeiro municipal e a manutenção dessa situação durante o período de vigência do empréstimo. Deve, então, ser apresentado de forma que, com grande verosimilhança, fique demonstrado, no caso, que a autarquia recebe o empréstimo, paga as dívidas a fornecedores e, no final do prazo contratual, amortizou o mesmo e se encontra numa situação de equilíbrio financeiro.

Considerando as normas financeiras aplicáveis, isso significa, designadamente, que as receitas devem cobrir as despesas dos respectivos exercícios, que as obrigações da autarquia com terceiros são pontualmente cumpridas, inexistindo endividamento ou atrasos de pagamento junto de fornecedores ou outros credores e que o endividamento é mantido dentro dos limites legais, tanto em termos de passivos financeiros como de endividamento líquido. Consoante o diagnóstico da situação actual e das suas causas, poderá ser necessário conhecer a evolução de outros indicadores para estar certo de que o saneamento financeiro se atinge.

Dir-se-á, então, que a verificação da observância do objectivo legal do empréstimo não se pode fazer sem um conjunto de elementos que demonstrem os aspectos acabados de referir. Ora, o Acórdão em causa considerou que os elementos fornecidos não o asseguravam.

Com esta apreciação, feita sobre uma dimensão legalmente vinculada da actuação da autarquia, não excedeu o Tribunal os seus poderes jurisdicionais nem invadiu a esfera da livre apreciação política ou administrativa dos órgãos autárquicos nem, consequentemente, a sua autonomia constitucional.

Com a constatação das debilidades do plano também não se intrometeu o Tribunal no exercício do poder legislativo, nem exerceu qualquer poder normativo.

Não estabeleceu regras gerais para aplicação em todos os casos. Limitou-se a interpretar os conceitos legais, em articulação com o conjunto das normas financeiras aplicáveis, e a constatar, no caso concreto, que os elementos disponíveis não eram suficientes para que o escopo do empréstimo estivesse demonstrado e garantido.

No essencial, o Acórdão recorrido proferiu um juízo de insuficiência de fundamentação, o qual é possível mesmo no âmbito dos poderes discricionários.

Assim sucedeu com os aspectos relativos à projecção da situação económico-financeira futura, a qual não foi perspectivada nem em relação a todo o período do empréstimo, como exige a lei, nem em relação a todas as vertentes relevantes para a identificação da situação financeira da autarquia, nomeadamente as vertentes patrimoniais e do endividamento.

Assim sucedeu também com a constatação de que o Plano de Saneamento Financeiro apresentado não continha objectivos quantificados e não concretizava, caracterizava e quantificava as medidas a tomar. Nos termos da lei, como já vimos, o Plano é objecto de acompanhamento e controlo quanto ao seu cumprimento. Ora, o controlo só pode ser efectuado sobre objectivos e medidas quantificados e mensuráveis, quaisquer que eles sejam.

Refere o recorrente: "Mas a apreciação das opções orçamentais e das medidas de execução nele contidas só pode caber à assembleia municipal. Cabe aos próprios municípios definir livremente no plano de saneamento, com mais ou menos pormenor, as vias para superar o desequilíbrio e satisfazer os necessários compromissos financeiros, incluindo o empréstimo contratado para o efeito. O município terá de gerar um excedente orçamental efectivo para pagar o empréstimo e os seus encargos. Saber se esse excedente anual há-de provir de saldo do orçamento ordinário ou de receitas extraordinárias, isso é matéria de livre opção municipal, insusceptível de censura judicial."

Tem razão o recorrente.

Reconhece-se que, na formulação das suas apreciações, o Acórdão, para além de constatar omissões no elenco e quantificação dos objectivos e medidas do Plano, parece sindicar, nalguns passos, a adequação, justificação, oportunidade e mérito das medidas constantes do plano. É o caso do conteúdo das alíneas c), d), e), g) e i) do ponto III.9.3. do Acórdão, que, na parte em que se pronunciam sobre a adequabilidade das medidas, se admite poderem ter excedido os limites do controlo da legalidade, da esfera de livre apreciação dos órgãos autárquicos e da autonomia financeira do município.

Reitera-se, no entanto, que as debilidades de fundamentação e de demonstração de que o objectivo de saneamento financeiro é assegurado se mantêm. Vê-lo-emos mais à frente.

II.2.5 - Conclusão

Em face do que antecede, deve, então, concluir-se que o Acórdão recorrido, ao evidenciar as insuficiências de fundamentação, de âmbito e de conteúdo do Plano de Saneamento Financeiro apresentado:

Não ultrapassou o âmbito de apreciação do contrato sujeito a visto, tal como resulta do ponto II.2.4;

Não ultrapassou os poderes conferidos pela LOPTC, não invadiu a esfera de livre decisão dos órgãos autárquicos nem ofendeu a garantia constitucional da autonomia do poder local, na sua dimensão financeira, por, no essencial, se ter pronunciado sobre a observância de vinculações legais e alegado insuficiências de fundamentação;

Não se intrometeu no exercício do poder legislativo, pois se limitou a sindicar a interpretação feita pela autarquia dos conceitos legais e a constatar, no caso concreto, que os elementos disponíveis não eram suficientes para que o escopo do empréstimo estivesse demonstrado e garantido.

Em consequência, improcede a conclusão 14.ª das alegações de recurso, procedem as conclusões 12.ª, 13.ª e 15.ª apenas quanto a parte do conteúdo das alíneas c), d), e), g) e i) do ponto III.9.3. do Acórdão recorrido e improcedem as mesmas conclusões em relação ao restante teor do mesmo Acórdão.

II.3 - Da situação financeira do município de Lisboa e da sua caracterização como de desequilíbrio financeiro conjuntural II.3.1 - Do conceito de desequilíbrio financeiro conjuntural e da sua sindicabilidade em sede de fiscalização prévia.

O disposto nos artigos 38.º, n.º 4, e 40.º, n.º 1, da Lei das Finanças Locais autoriza os municípios a contrair empréstimos de médio ou longo prazo para saneamento financeiro quando se encontrem em situação de desequilíbrio financeiro conjuntural.

A verificação de uma situação de desequilíbrio financeiro conjuntural é, assim, como já vimos, um pressuposto vinculado do recurso a este tipo de empréstimos, cabendo aos tribunais sindicar, no âmbito do controlo da legalidade do empréstimo, a verificação desse pressuposto.

O recorrente reconhece isso mesmo. Diz-se expressamente num dos pareceres que sustentam o recurso apresentado, já acima citado no ponto II.2.1., que "São de considerar passíveis de controlo, entre outros aspectos, e tendo em conta o regime legal dos empréstimos e do saneamento financeiro: a verificação de que a situação de desequilíbrio financeiro que o empréstimo visa sanar cabe na figura do desequilíbrio conjuntural e do saneamento financeiro". E refere-se, na petição de recurso, a fls. 57 dos autos, que "o requisito essencial para que se verifiquem os pressupostos legais da contratação de empréstimos para saneamento financeiro não está na suficiência ou sustentabilidade do Plano de Saneamento Financeiro mas, outrossim, na demonstração de que a autarquia se encontra em situação de desequilíbrio financeiro conjuntural".

O Acórdão recorrido apontou no mesmo sentido ao fundamentar a recusa do visto em que "A insuficiência e falta de sustentabilidade do Plano de Saneamento Financeiro (...) têm por consequência o não preenchimento do condicionalismo previsto no artigo 40.º da Lei 2/2007, de 15 de Janeiro, isto é, a constatação da falta de verificação dos pressupostos conducentes à caracterização da situação financeira do Município de Lisboa, como sendo de desequilíbrio de natureza conjuntural".

Esta é a questão central da declaração de voto formulada no Acórdão, por um dos seus subscritores, e é também a questão eleita como determinante no parecer do Ministério Público proferido no âmbito do recurso agora em apreciação. Refere este magistrado que as questões suscitadas no recurso não devem desviar-nos do essencial: "a análise da verdadeira situação financeira da C.M.L. e quais as suas consequências legais nos termos previstos pelos artigos 40.º e 41.º da L.F.L.".

À unanimidade quanto à necessidade de sindicar esta questão não corresponde, no entanto, unanimidade quanto à forma de o fazer.

Entendemos, nesta matéria, que estamos, mais uma vez, perante um conceito indeterminado utilizado pelo legislador. A dúvida está em saber se esse mesmo legislador quis utilizar a noção de desequilíbrio financeiro conjuntural como um conceito para cuja densificação apenas pode ser admitido como critério de decisão o sentido objectivo que resulta da lei e da ciência económico-financeira.

Ou se, ao invés, pretendeu conferir aos órgãos autárquicos um poder discricionário ou valorativo de densificação desse conceito.

Nem o Acórdão da 1.ª instância nem o recurso nem os pareceres que o sustentam são claros a este respeito.

Parece-nos que a identificação de uma situação de desequilíbrio financeiro não oferece dúvidas de interpretação. No ponto II.2.3. vimos que a conjugação das normas legais financeiras constantes da Lei das Finanças Locais, da Lei de Enquadramento Orçamental e do POCAL permite definir uma situação de desequilíbrio financeiro como aquela em que as receitas efectivas de um orçamento não são suficientes para fazer face às despesas efectivas e em que o défice daí resultante não pode ser colmatado com recurso a endividamento legalmente admissível.

De resto, Jorge Miranda, no parecer a fls. 146 e seguintes dos autos, começa por afirmar: "O município de Lisboa encontra-se em notórias dificuldades financeiras, geradoras de incapacidade de satisfação de compromissos assumidos perante numerosos credores". Nesta afirmação parece estar implícito que a noção de desequilíbrio financeiro é até determinável por recurso à experiência comum.

Também parece a um normal destinatário que a eventual discricionariedade da norma não está na estatuição. Referem, designadamente, Manuel Porto e outros, em parecer junto pelo recorrente a fls. 81 e seguintes do processo, que "o recurso a empréstimos para correcção destes desequilíbrios corresponde a um dever dos municípios, como se extrai do n.º 1 do artigo 40.º da LFL". Referiam-se estes consultores à parte do texto legal em que se diz: "Os municípios que se encontrem em situação de desequilíbrio financeiro conjuntural devem contrair empréstimos para saneamento financeiro".

A eventual margem de decisão ou valoração só poderia então estar na avaliação da natureza conjuntural do desequilíbrio financeiro. É, portanto, necessário determinar se este atributo é densificável por recurso a normas técnicas ou a operações de interpretação legal ou implica uma insindicável liberdade de valoração por parte dos órgãos autárquicos.

A declaração de voto proferida no Acórdão, cuja doutrina o Ministério Público invocou no parecer que emitiu no âmbito do presente recurso, e que vinha na senda da posição perfilhada no Acórdão s 138/07- 11.DEZ.07-1.ª S/SS, deste Tribunal, assentou na convicção de que o conceito era susceptível de interpretação sistemática, baseada nos textos legais.

Considerando a fórmula imperativa utilizada na estatuição dos n.º s 1 dos artigos 40.º e 41.º da Lei das Finanças Locais, entendeu-se então que o legislador não havia conferido aos órgãos autárquicos qualquer poder de escolha sobre o instrumento a utilizar para recuperação da situação financeira do respectivo município. Esse instrumento seria vinculadamente o saneamento financeiro ou o reequilíbrio financeiro, consoante a situação de desequilíbrio financeiro verificada fosse conjuntural ou estrutural. Quanto à caracterização dessa situação, a margem de valoração era também limitada, dado estarmos perante uma operação interpretativa. Considerou-se que se a própria lei, no artigo 41.º, oferecia indicadores de desequilíbrio financeiro estrutural para sustentar uma decisão do Ministro das Finanças, a mesma lei não desejaria que, verificadas as mesmas circunstâncias, um órgão autárquico pudesse qualificar de outra forma a mesma situação.

Os subscritores desta posição consideravam conter-se dentro dos limites dos poderes de fiscalização prévia da legalidade financeira, respeitando o princípio da separação de poderes, uma vez que usavam o disposto no artigo 41.º da Lei das Finanças Locais tão só como critério de interpretação do artigo 40.º, para concluir que, em certos casos, o pressuposto legal do recurso ao empréstimo para saneamento financeiro não se verificava.

O Acórdão da 1.ª instância rejeitou, no seu ponto 8.1., esta operação interpretativa, não por fazer uma interpretação diferente, mas por considerar que, através dela, o Tribunal se estaria a substituir à Administração na densificação dos conceitos indeterminados que servem de pressuposto aos mecanismos previstos nos artigos 40.º e 41.º da Lei das Finanças Locais. Ao fazê-lo, parece ter considerado implicitamente que o legislador, quando utilizou as noções vagas de desequilíbrio financeiro conjuntural e estrutural, quis deixar aos órgãos autárquicos o poder discricionário ou valorativo de as densificar em cada caso concreto e, consequentemente, apontou para a insindicabilidade dessa densificação.

Ora, foi a mesma razão que levou o recorrente e Jorge Miranda, a fls. 157 e 158 dos autos, a impugnar o Acórdão recorrido por contradição insanável uma vez que, ao ter acabado por concluir pela "constatação da falta de verificação dos pressupostos conducentes à caracterização da situação financeira do Município de Lisboa, como sendo de desequilíbrio de natureza conjuntural", incorreu no mesmo erro, "não aceitando, no fundo, a deliberação do órgão autárquico competente e acabando por se lhe substituir", o que "ultrapassa os poderes do Tribunal; está para além - como ele próprio diz (n.º 8.1, de novo)- do âmbito de fiscalização prévia da legalidade financeira.". O autor do parecer encontra aí uma ofensa ao princípio da separação e interdependência dos poderes. Refere: "A interdependência justifica a fiscalização financeira, mas a separação impede que esta se transforme em decisão política, como vem a ser a decisão dos municípios segundo o artigo 40.º da Lei 2/2007.".

Não entendemos que essas ofensas tenham ocorrido, por considerarmos que sempre esteve em causa a sindicabilidade de uma mera actividade interpretativa, o que veio a ser confirmado com a publicação do Decreto-Lei 38/2008.

Este diploma veio "densificar" "as regras referentes aos regimes jurídicos do saneamento financeiro municipal e do reequilíbrio financeiro municipal, previstos nos artigos 40.º e 41.º da Lei das Finanças Locais" (in artigo 1.º), especificando, entre outros aspectos, os indicadores que fundamentam a necessidade de recurso a empréstimos para saneamento financeiro ou para reequilíbrio financeiro e, através deles, introduzindo parâmetros legais de densificação dos conceitos de desequilíbrio financeiro conjuntural e estrutural. Com isso, obviamente favoreceu a sindicabilidade jurisdicional da sua aplicação.

No entanto, este diploma fez mais: estabeleceu, nos seus artigos 8.º e 9.º, o carácter subsidiário e residual da situação de desequilíbrio financeiro estrutural ou ruptura financeira, rodeando a sua declaração de um conjunto de exigências acrescidas, entre as quais a demonstração da impossibilidade de recurso a outros mecanismos, designadamente à adopção de um plano de saneamento financeiro. Veio, deste modo, afirmar que, mesmo que uma autarquia se encontre numa situação que, de acordo com os indicadores financeiros, é caracterizável como de desequilíbrio financeiro estrutural, ela pode e deve, em primeira linha, recorrer ao mecanismo previsto no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais. A alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º do Decreto-Lei 38/2008 estabelece, aliás, que a declaração da situação de desequilíbrio financeiro estrutural deve ser acompanhada da "demonstração do esgotamento de todos os mecanismos legais de saneamento das finanças, nos termos da LFL".

Mesmo que se defenda a natureza estritamente regulamentar deste Decreto-Lei, como sustenta o recorrente, há-de necessariamente considerar-se que os artigos 40.º e 41.º da Lei das Finanças Locais sempre tiveram o sentido que por ele lhes é atribuído. Ou seja, a interpretação que deve ser dada à noção de desequilíbrio financeiro conjuntural é a de que ela corresponde a uma situação de desequilíbrio financeiro que consegue ser resolvida através de um empréstimo e de um plano de saneamento financeiro, enquanto a situação de desequilíbrio financeiro estrutural exige medidas acrescidas, nomeadamente o aumento do grau de endividamento líquido, a contenção obrigatória de despesas e um prazo mais alargado do empréstimo.

Mesmo considerando que este diploma não tem quaisquer efeitos retroactivos, como faz o recorrente, há-de reconhecer-se que o Decreto-Lei 38/2008 veio, afinal, confirmar o entendimento, já anteriormente defendido, de que o legislador não pretendeu atribuir aos órgãos autárquicos, nem na estatuição nem na hipótese das correspondentes normas, quaisquer poderes discricionários para as decisões de recorrer a empréstimos para saneamento financeiro ou para reequilíbrio financeiro.

Não há, pois, nesta matéria qualquer reserva de decisão política ou administrativa.

Em caso de se encontrarem em situação de desequilíbrio financeiro e de um empréstimo e um plano de saneamento financeiro serem suficientes para recuperar as finanças municipais, os municípios estão em desequilíbrio financeiro conjuntural e devem adoptar o mecanismo previsto no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais. No caso de isso não ser suficiente, estão em desequilíbrio financeiro estrutural e devem adoptar o instrumento consagrado no artigo 41.º A densificação e desenvolvimento operados por aquele Decreto-Lei vieram, ainda, introduzir pressupostos e vinculações legais acrescidos relativamente ao que resulta da Lei das Finanças Locais, nomeadamente no que concerne à necessidade de verificação dos indicadores financeiros indicados, o que valerá em casos futuros.

Em qualquer caso, estamos perante pressupostos e vinculações que podem e devem ser jurisdicionalmente sindicados no âmbito da jurisdição financeira que cabe ao Tribunal de Contas, sem que isso implique qualquer usurpação de poderes.

II.3.2 - Dos elementos a considerar para a caracterização da situação financeira do município.

Para que a decisão do município de Lisboa de recorrer a um empréstimo para saneamento financeiro pudesse ser considerada legal, era, então, necessário provar que a autarquia se encontrava numa situação de desequilíbrio financeiro conjuntural. Ou seja, numa situação em que as receitas efectivas do orçamento não eram suficientes para fazer face às despesas efectivas e em que o défice daí resultante não podia ser colmatado com recurso a endividamento legalmente admissível, mas situação essa susceptível de ser ultrapassada com recurso a um empréstimo e a um plano de saneamento financeiro.

Como já referimos noutros pontos, o Acórdão sub judice considerou que "A insuficiência e falta de sustentabilidade do Plano de Saneamento Financeiro, atrás apontadas, têm por consequência o não preenchimento do condicionalismo previsto no artigo 40.º da Lei 2/2007, de 15 de Janeiro, isto é, a constatação da falta de verificação dos pressupostos conducentes à caracterização da situação financeira do Município de Lisboa, como sendo de desequilíbrio de natureza conjuntural, e, por isso, a falta de preenchimento das condições necessárias para o recurso ao empréstimo contratado com a Caixa Geral de Depósitos, enquanto instrumento recuperador do equilíbrio das finanças municipais, num quadro de saneamento financeiro."

O recorrente veio arguir, na conclusão 10.ª do recurso, que "O acórdão recorrido violou o artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, ao fazer equivaler uma suposta «insuficiência e falta de sustentabilidade do Plano de Saneamento Financeiro» à «falta de verificação dos pressupostos conducentes à caracterização da situação financeira do Município de Lisboa, como sendo de desequilíbrio de natureza conjuntural».

Nas alegações de recurso, a fls. 56 e seguintes do processo, o recorrente explicita este argumento, referindo que "o acórdão recorrido confunde o "plano de saneamento financeiro" com o "estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia" a que se refere o artigo 40.º, n.º 2, da Lei das Finanças Locais, porque a caracterização da situação financeira do Município de Lisboa, como sendo de desequilíbrio financeiro conjuntural, não resulta do plano de saneamento financeiro, mas sim do estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia."; "o Tribunal confundiu a problemática da qualificação da situação financeira do município, com outra problemática que se prende com as medidas de saneamento financeiro a cujo cumprimento fica obrigado o executivo municipal (artigo 40.º, n.º 4, alínea a) da Lei das Finanças Locais)";"o estudo destina-se a caracterizar a situação financeira da autarquia, ao passo que o plano há-de conter as linhas de actuação a empreender para restaurar o equilíbrio financeiro conjuntural. Por outras palavras, o estudo fundamenta o empréstimo e o plano consiste no modo de aplicação das verbas e na demonstração da capacidade financeira do município para restaurar o equilíbrio financeiro conjuntural. Nesta conformidade, mesmo que o plano não fosse suficiente ou sustentável, nem por isso deixavam de se verificar os pressupostos injuntivos de recurso ao saneamento financeiro".

A este respeito diz ainda Vital Moreira, a fls. 212 do processo: "Nem se diga que a análise da consistência do plano de saneamento é necessária para apuramento da questão de saber se estamos perante uma situação de "desequilíbrio conjuntural", que se baste com um empréstimo para saneamento financeiro, ou perante uma situação de "desequilíbrio estrutural" (ou "ruptura financeira") que exija o recurso ao mecanismo do reequilíbrio financeiro. Na verdade, essa opção depende da gravidade da situação de desequilíbrio financeiro do município, e isso não se pode aferir pelo plano de saneamento mas sim por meio de outro instrumento que a lei também refere, que é o "estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia" (LFL, artigo 40.º-2), que deve ser apresentado juntamente com o plano financeiro, sendo também aprovado pela assembleia municipal*. Esse estudo é que fornece os elementos necessários para a qualificação do desequilíbrio financeiro municipal. O plano de saneamento, ao contrário, supõe essa questão resolvida, enunciando as medidas necessárias para superar o desequilíbrio das finanças municipais. O estudo define a situação; o plano enuncia as soluções.

*Bem entendido, nada impede que os dois instrumentos - o estudo e o plano - sejam formalmente apresentados no mesmo documento. Mas a diferença de funções é evidente. Um relata a situação e as perspectivas financeiras do município; outro apresenta as medidas orçamentais e financeiras para superar o desequilíbrio."

Efectivamente, o n.º 2 do artigo 40.º da Lei das Finanças Locais estabelece que os pedidos de empréstimos para saneamento financeiro dos municípios são instruídos com um estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia e com um plano de saneamento financeiro para o período a que respeita o empréstimo, delimitando bem as funções de um e de outro documento, no sentido alegado pelo recorrente.

No entanto, devem referir-se dois aspectos.

Por um lado, no caso em apreço, o município de Lisboa juntou ao processo de fiscalização prévia um único documento intitulado "Plano de Saneamento Financeiro, 2008-2012"(28), o qual incluiu quer a análise da situação financeira da autarquia quer o enunciado do Plano, propriamente dito.

Por outro lado, ao considerarmos a situação de desequilíbrio financeiro conjuntural como a situação de desequilíbrio financeiro susceptível de ser recuperada através de uma operação de saneamento financeiro, estamos a reconhecer que só a conseguiremos caracterizar como tal se o plano de saneamento financeiro lograr demonstrar que atinge o objectivo de recuperar o equilíbrio financeiro.

A par do estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia, o plano de saneamento financeiro fornece, assim, igualmente, elementos probatórios indispensáveis à verificação do pressuposto legal do empréstimo.

Em passagem já acima transcrita, o Ministério Público, no seu parecer, alertava para esta necessária dupla perspectiva: "Para (...) decidir fundadamente, o Tribunal tem de dispor de todos os instrumentos de informação financeira actual (no momento da operação de financiamento) e, bem assim, a respectiva programação financeira, sustentada em dados objectivos e em previsões realistas e credíveis; é, justamente, da conjugação destes dois instrumentos (análise "perspectiva" e "prospectiva") que qualquer decisor estará habilitado a avaliar, se a situação subjacente é a do desequilíbrio "estrutural" ou meramente "conjuntural", para que se possa decidir em conformidade com tais realidades e suas exigências."

Consideramos, assim, que o Acórdão recorrido se referiu ao Plano de Saneamento Financeiro, enquanto documento único assim intitulado pela própria autarquia, englobando, no entanto, quer o estudo fundamentado sobre a situação financeira do município quer o plano de saneamento financeiro propriamente dito (29).

Mais consideramos que os dados constantes do Plano propriamente dito são relevantes para a caracterização do pressuposto de recurso ao empréstimo e que uma eventual insuficiência do Plano pode acarretar a não demonstração da verificação desse pressuposto.

Importa ainda clarificar que não se atende, no presente caso, aos indicadores referidos no n.º 4 do artigo 3.º do Decreto-Lei 38/2008, os quais apenas constituem pressuposto do recurso a empréstimos para saneamento financeiro, enquanto indicadores de uma situação de desequilíbrio financeiro conjuntural, após a respectiva entrada em vigor.

Consequentemente, não se torna necessário, no presente caso, densificar o conceito de dívida a fornecedores nem o exacto montante do ratio em causa, como não se torna necessário densificar qualquer dos outros conceitos referidos nas várias alíneas desse n.º 4 ou apurar os correspondentes valores.

Sem prejuízo da sua importância para outras situações e para casos futuros, a resolução da questão jurídica referenciada no ponto II.1.3. não releva, pois, neste concreto caso, para a caracterização da situação financeira da autarquia nem para a decisão da causa, razão por que não é abordada.

II.3.3 - Da demonstração de que o município de Lisboa está numa situação de desequilíbrio financeiro conjuntural.

No ponto 2 do denominado "Plano de Saneamento Financeiro, 2008-2012", procede-se à análise da situação financeira do município de Lisboa.

Aí se caracteriza a situação do município como de desequilíbrio financeiro conjuntural, fundado numa elevada dívida de curto prazo. Refere-se: "Esta situação deriva, como evidencia o presente relatório, da aprovação de sucessivos orçamentos cujas receitas ficaram muito aquém das expectativas iniciais, potenciando a acumulação de "deficits" expressivos; por outro lado, não foram implementadas as medidas de contenção que adequassem o valor da despesa à receita efectiva, permitindo-se a realização da despesa sem que estivessem assegurados, razoavelmente, os meios de financiamento respectivos."

Na análise efectuada à evolução da eficácia orçamental da receita, concluiu-se que o desvio entre receita prevista em orçamento inicial e o cobrado atinge valores e percentagens significativas a partir de 2003, mas que esse desvio ocorre no financiamento alheio e na receita extraordinária e não na receita estrutural (componente das receitas próprias que o município espera cobrar de uma forma estável e com regularidade, nela se incluindo, entre outras receitas, os impostos, taxas e transferências do Orçamento do Estado).

A análise regista um crescimento significativo da dívida a terceiros a partir de 2003 (de 45.492.000 (euro) em 2002 para 485.963.000 (euro) em 2006 (30)), cuja maior componente é a dívida a fornecedores, a qual necessita, para ser resolvida, de meios monetários no curto prazo.

A fls. 64 e 65 dos autos reporta-se um aumento progressivo do endividamento do município e a ultrapassagem dos limites legais a partir de 2003.

Na componente do Plano e das previsões 2008-2012 (ponto 3, a fls 29 e seguintes do processo 1598/2007), evidencia-se a previsão da receita estrutural e da despesa estrutural para 2008-2012. Considera-se um cenário conservador nas receitas e uma redução dos encargos de funcionamento, de forma a permitir a viabilização do serviço da dívida (já integrado na previsão da despesa estrutural) e a geração de saldos estruturais positivos. As previsões integram saldos estruturais positivos a partir de 2008, que, num cenário de receita estrutural crescente e de despesa estrutural estabilizada, dão origem a saldos estruturais positivos crescentes. O Plano refere que estes saldos serão mobilizáveis para o investimento, podendo vir a ser reforçados, para esse efeito, com os saldos de gerência e outras receitas não consideradas, como as provenientes de concessões, de transferências e de receitas do casino.

Em 19 de Fevereiro de 2008, data da sessão em que foi aprovado o Acórdão recorrido, foi junto ao processo de fiscalização prévia o Orçamento municipal para 2008, que consagra um montante global de receita inferior à execução dos dois anos anteriores. O ofício a fls. 761 do processo 1598/07 refere que esta previsão de receita "atesta o carácter conservador e realista do Orçamento aprovado para 2008 - abaixo até da execução dos últimos anos - e permite, portanto, concluir pela impossibilidade legal de acumulação de novas dívidas, na medida em que constituirá cobertura suficiente para o conjunto das despesas orçamentadas no corrente ano."

O mesmo ofício referia:

"O Município de Lisboa tem feito um enorme esforço de resolução da situação de desequilíbrio conjuntural gerada nos últimos anos, tendo reduzido, nos últimos 6 meses, o nível do endividamento líquido, que passou de um excesso na ordem dos 86 M (euro), a 31/07/07, para uma margem positiva de 17 M (euro), em 31/12/07".

"À luz da legislação em vigor, aplicável ao caso em análise, julgamos estar devidamente comprovada a situação de desequilíbrio conjuntural do Município de Lisboa, o que nos obriga à contratação de um empréstimo de saneamento financeiro".

"Salienta-se que o conteúdo do Plano de Saneamento Financeiro inclui, designadamente:

A previsão do período temporal necessário à recuperação da situação financeira do Município: 5 anos, sendo que a recuperação verificar-se-á já no 1.º ano de execução do PSF e a consolidação da situação de equilíbrio no final do 5.º ano do mesmo período, com um saldo estrutural na ordem dos 110 M (euro) "

Os elementos referidos constituem prova de que o município de Lisboa se encontrava em situação de desequilíbrio financeiro, incapaz de satisfazer todos os seus compromissos com recurso às receitas orçamentais e em excesso de endividamento, e, por outro lado, incluem indicadores de que a situação possa ser recuperada com recurso ao empréstimo e a uma prática de orçamentos baseados em previsões realistas de receitas e controlo de despesas.

Efectivamente, face aos elementos disponíveis e aos factos aditados ao probatório quanto à evolução da situação financeira do município, nomeadamente a redução do endividamento líquido para patamares que se contêm dentro dos limites legais, é possível concluir pela susceptibilidade de uma provável recuperação do equilíbrio financeiro dentro do período de vigência do empréstimo. Ainda que o Plano de Saneamento Financeiro não integre todas as previsões necessárias a demonstrar a recuperação e manutenção do equilíbrio, nomeadamente as componentes relativas à evolução da situação patrimonial e do endividamento, os dados entretanto fornecidos quanto à já obtida contenção do endividamento líquido, as previsões de receita e despesa para 2008 (muito abaixo de anos anteriores), a previsão de saldos estruturais positivos nos próximos anos, a inclusão do serviço da dívida nas despesas estruturais e os compromissos relativos ao investimento apontam para que, assegurados compromissos de contenção do endividamento para todo o período do empréstimo, a operação de saneamento financeiro é susceptível de permitir a recuperação do equilíbrio financeiro.

Tanto basta para que se possa aplicar ao caso o disposto no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais.

II.3.4 - Conclusão

Em face do que antecede, considera-se que:

A eventual insuficiência de um Plano de Saneamento Financeiro pode conduzir à não verificação dos pressupostos conducentes à caracterização da situação financeira de um dado município como sendo de desequilíbrio financeiro conjuntural. Em consequência, improcede a conclusão 10.ª das alegações de recurso;

Os dados constantes deste concreto processo, incluindo os que entretanto foram trazidos aos autos, são suficientes para, em face do disposto no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, caracterizar a situação do município de Lisboa como de desequilíbrio financeiro conjuntural.

II.4 - Da (in)suficiência do plano de saneamento financeiro Analisemos agora mais detalhadamente as eventuais insuficiências do Plano de Saneamento Financeiro apresentado pelo município de Lisboa e as respectivas consequências.

II.4.1 - Objectivo e conteúdo do Plano de Saneamento Financeiro Definimos atrás uma acção de saneamento financeiro como aquela que corrige uma situação de desequilíbrio financeiro, transformando-a numa situação financeira equilibrada, que respeite os princípios e leis financeiras aplicáveis.

O Acórdão recorrido referiu-se ao Plano de Saneamento Financeiro como "um instrumento recuperador do equilíbrio das finanças do município (...) no período de vigência do empréstimo", que permita" concluir que, no prazo do empréstimo, não se irão criar novas situações de desequilíbrio e que, ao invés, no mesmo período temporal, serão gerados saldos orçamentais bastantes para amortizar o empréstimo contraído e para sanar o desequilíbrio anterior".

Mais referiu o Acórdão:

"Para se sanearem as finanças de um qualquer município, necessário é que sejam tomadas medidas estruturais, adequadas a discipliná-las, o que acarretará a tomada de decisões capazes de reduzir as despesas e de obter aumento de receitas, sem que, com elas, se prejudique, de forma sensível, a eficiência e a eficácia da actividade administrativa autárquica."

O recorrente arguiu na 11.ª conclusão da sua petição de recurso:

"O acórdão recorrido violou o artigo 40.º da Lei das Finanças Locais por ter apreciado a sustentabilidade do plano de saneamento financeiro com base nos requisitos fixados pelo legislador para os planos de reequilíbrio financeiro, ou seja, o Tribunal acabou por fundar o juízo de legalidade no artigo 41.º da Lei das Finanças Locais, quando reconhece tratar-se de uma situação de desequilíbrio financeiro conjuntural."

Como fundamento desta conclusão, o recorrente, nas suas alegações, a fls. 5 e seguintes dos autos, defendeu a seguinte perspectiva:

O legislador não forneceu qualquer indicação precisa quanto ao conteúdo dos planos de saneamento financeiro;

O acórdão recorrido pretendeu atribuir ao plano de saneamento financeiro um conteúdo que a Lei das Finanças Locais associa aos planos de reequilíbrio financeiro;

Só no quadro do reequilíbrio financeiro é que o legislador precisou o conteúdo dos planos, ao indicar que estes devem conter: as medidas específicas necessárias para atingir uma situação financeira equilibrada, nomeadamente no que respeita à libertação de fundos e à contenção de despesas; as medidas de recuperação da situação financeira e de sustentabilidade do endividamento municipal, durante o período de vigência do referido contrato, designadamente o montante do empréstimo a contrair; os objectivos a atingir no período do reequilíbrio e seu impacte anual no primeiro quadriénio;

Historicamente (cf. Decreto-Lei 258/79), o saneamento financeiro é uma operação de obtenção de liquidez, nos casos de insuficiência das cobranças de receitas previstas para fazer face a compromissos assumidos, de reprogramação de dívidas para dilatar o prazo de empréstimos cujo vencimento se aproxime em altura de falta de recursos ou de consolidação de passivos quando se mostre conveniente substituir empréstimos por outros em condições menos onerosas;

Historicamente (cf. Decreto-Lei 322/85), o reequilíbrio financeiro supõe uma situação de desequilíbrio financeiro estrutural ou de ruptura financeira, definida pelo esgotamento da capacidade de endividamento do município e pelo não cumprimento atempado das obrigações assumidas para com terceiros, em virtude da insuficiência de recursos financeiros, e é aplicado depois de esgotada a utilização de todos os instrumentos legais possíveis;

A expressão "saneamento financeiro" aponta para a ideia de restabelecimento de "situações financeiras sãs" e não para a ideia de "recuperação financeira" de municípios em situações de insolvência;

O que se visa alcançar através de um plano de saneamento financeiro é apenas e tão só a reprogramação da dívida e a consolidação de passivos financeiros, subjacente a uma situação de desequilíbrio financeiro conjuntural, tratando-se de uma operação que se limita a converter passivos de curto prazo em passivos de médio e longo prazo, substituindo dívida administrativa por dívida financeira, sem aumentar o endividamento líquido do município;

Por isso, é muito duvidoso que o legislador tenha pretendido associar ao plano de saneamento financeiro um conteúdo equivalente ou que se possa preencher por analogia com o previsto no quadro do reequilíbrio financeiro municipal;

O Plano de Saneamento Financeiro tem de ser compreendido como suporte do empréstimo e como uma obrigação de resultado: gerar um saldo efectivo do orçamento compatível com o serviço da dívida assim contraída;

É manifestamente desadequado considerar, nesse contexto, como exigência legal de suficiência ou sustentabilidade do Plano de Saneamento Financeiro, a concretização, caracterização e quantificação das medidas a tomar, as quais apenas são exigidas no quadro do reequilíbrio financeiro.

O recorrente vem, em suma, considerar que o objectivo da operação de saneamento financeiro consiste apenas na consolidação dos passivos existentes e na reprogramação da correspondente dívida, operadas pelo empréstimo.

Mas, num contexto destes, cabe perguntar como se justifica a exigência legal de o empréstimo que procede a essa consolidação e reprogramação ser acompanhado de um plano de saneamento financeiro.

No parecer junto aos autos pelo recorrente, a fls 97 e seguintes, subscrito por Manuel Porto e outros, responde-se a esta questão nos seguintes termos:

"Em primeiro lugar, terá o legislador querido evitar uma tentação de fraude à lei por parte do município: impedido de contrair empréstimos a não ser para financiar investimentos em concreto, o município poderia endividar-se por via do não pagamento a fornecedores, colocando-se voluntariamente na situação prevista no artigo 40.º, pelo que a lei não poderia facultar a possibilidade deste empréstimo sem que o município assumisse obrigações complementares de gestão.

Em segundo lugar, a lei claramente pretendeu que o empréstimo para saneamento não seja uma situação recorrente, e proíbe a realização de novos empréstimos de saneamento na vigência do empréstimo, pelo que procurou garantir que a necessidade não voltasse a ocorrer, exigindo este plano de saneamento.

Assim, o plano tem que ser compreendido, por um lado, enquanto suporte de uma medida (o empréstimo) que tem em si efeitos positivos, e não negativos, sobre a situação financeira, independentemente de qualquer saneamento; e, por outro, essencialmente como uma obrigação de resultado: gerar um saldo efectivo do orçamento compatível com o serviço da dívida assim contraída."

"(...) o plano de saneamento é um documento vinculativo para o município, ou pelo menos para a actuação do executivo municipal, prevendo a lei sanções para o seu incumprimento. O plano de saneamento vincula assim a actuação da Câmara Municipal, nas futuras propostas de orçamento e na respectiva execução."

Vital Moreira, em parecer também junto e assumido pelo recorrente, a fls. 190 e seguintes do processo, diz:

"O plano de saneamento, ao contrário, supõe essa questão resolvida, enunciando as medidas necessárias para superar o desequilíbrio das finanças municipais. O estudo define a situação; o plano enuncia as soluções"

"(...) as situações de saneamento financeiro, ao abrigo dos artigo 39.º e 40.º da LFL, envolvem vários controlos e severos impedimentos, tendentes a assegurar o equilíbrio financeiro e o cumprimento dos encargos resultantes do contrato de empréstimo."

"O plano de saneamento financeiro constitui um instrumento, legalmente obrigatório, de autovinculação dos municípios (...). O plano obriga os municípios a fazer ordenamento e planeamento orçamental de longo prazo, ao mesmo tempo que confere à assembleia municipal um poderoso instrumento de fiscalização do executivo municipal."

"Cabe aos próprios municípios definir livremente no plano de saneamento, com mais ou menos pormenor, as vias para superar o desequilíbrio e satisfazer os necessários compromissos financeiros, incluindo o empréstimo contratado para o efeito. A única coisa que automaticamente se sabe é que a satisfação desses encargos não pode ser efectuada recorrendo a novo endividamento, porque a lei proíbe expressamente a contratação de novo empréstimo para saneamento financeiro (LFL, artigo 40.º). Por isso, o município terá de gerar um excedente orçamental efectivo para pagar o empréstimo e os seus encargos."

O próprio recorrente referiu, a fls. 58 e 59:

"(...) o plano consiste no modo de aplicação das verbas e na demonstração da capacidade financeira do município para restaurar o equilíbrio financeiro (...)";

"(...) sendo o plano de saneamento financeiro um instrumento de controlo da aplicação das verbas provenientes do empréstimo para saneamento financeiro, uma vez que lhe está subjacente um conjunto de pressupostos que hão-de sustentar a produção de saldos orçamentais positivos, necessários à amortização do empréstimo contraído e ao reequilíbrio das finanças municipais (...)"

Considerando o disposto na lei e todas as considerações acima referidas, concluímos então o seguinte:

Ainda que admitindo que uma autarquia que se encontre numa situação de desequilíbrio financeiro conjuntural a possa resolver com recurso a um empréstimo que consolide passivos e reprograme a sua dívida, a lei, no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, exigiu que a aprovação e contracção desse empréstimo fosse acompanhada de um plano de saneamento financeiro a aprovar pela Assembleia Municipal. Logo, o objectivo da operação não se esgota com a conversão dos passivos de curto prazo em passivos de médio e longo prazo, a qual se operaria pela simples contratação e aplicação do empréstimo;

O plano de saneamento financeiro deve abranger o período a que respeita o empréstimo, nos termos do n.º 2 do referido artigo 40.º No caso que nos ocupa esse período é de 12 anos;

O plano não pode, assim, limitar-se a ser um mero instrumento de controlo da aplicação das verbas provenientes do empréstimo, já que a utilização do crédito é efectuada no prazo de 3 meses (cf. cláusula segunda do contrato), e se esgota de imediato;

Não há-de também ser um simples suporte do empréstimo, com o respectivo plano de amortização. Esse plano faz parte do próprio empréstimo e, por outro lado, como refere Vital Moreira, a fls. 211, "Ao contrair um empréstimo - qualquer empréstimo -, os municípios ficam obrigados a inscrever nos seus orçamentos futuros as verbas necessárias para satisfazer os respectivos encargos. Como já se disse, isso decorre dos princípios gerais da constituição financeira da Constituição, que obriga o orçamento do Estado a "ter em conta as obrigações decorrentes de lei ou de contrato" (cf. artigo 105.º-2, in fine), regra que não pode deixar de valer também para os orçamentos das entidades dotadas de independência orçamental, como é o caso dos municípios". Como reconhece o próprio recorrente na petição de recurso, a fls. 65 dos autos, isso decorre necessariamente do próprio contrato de empréstimo, que obriga juridicamente o município. O plano há-de, então, ser algo mais;

A obrigação de resultado inerente ao plano de saneamento financeiro só pode, pois, ser o restabelecimento do equilíbrio financeiro. O objectivo dos mecanismos previstos nos artigos 40.º e 41.º da Lei das Finanças Locais é, consequentemente, o mesmo: transformar situações de desequilíbrio financeiro em situações de equilíbrio financeiro. A finalidade é, então, sempre atingir uma situação financeira equilibrada, que respeite os princípios e as leis financeiras aplicáveis;

Nos termos do mesmo artigo 40.º, os órgãos executivos ficam, durante o período do empréstimo, obrigados a cumprir o plano de saneamento financeiro, a prestar contas da sua execução e, em caso de incumprimento, o município fica sujeito a sanções legais até à correcção das causas que tenham dado origem a esse incumprimento. O plano, enquanto instrumento vinculativo tem, então, de conter compromissos cuja realização seja controlável;

A necessária "controlabilidade" do plano e dos compromissos nele estabelecidos impõe, tal como referem Manuel Porto e outros no seu parecer, a fls. 99, que ele contenha "objectivos quantificados (...) cujo cumprimento se impõe aos órgãos autárquicos, na elaboração e na execução dos orçamentos posteriores" e "a descrição (...) dos meios a usar para atingir as metas quantitativas";

Só as circunstâncias de cada caso poderão ditar a severidade e extensão das medidas necessárias para superar o desequilíbrio financeiro. Cabe, indubitavelmente, aos órgãos autárquicos definir as vias e os meios para o fazer.

Só que o plano deve consagrá-las. Torna-se, assim, necessário que o plano contenha o elenco desses meios;

O escopo legalmente fixado exige que o plano integre a demonstração de que o equilíbrio financeiro é atingido durante o período de vigência do empréstimo.

Essa demonstração há-de ser feita de acordo com os indicadores legal e financeiramente previstos e disponíveis e em função das áreas críticas identificadas no diagnóstico financeiro da autarquia. Essa demonstração não consegue ser feita sem as projecções orçamentais e patrimoniais, em especial no que se refere à evolução dos saldos orçamentais e do endividamento;

O facto de a lei exigir que o plano de saneamento financeiro abranja a totalidade do período a que respeita o empréstimo e de proibir a celebração de novos empréstimos de saneamento financeiro durante esse período, só pode significar que, ainda que a situação de equilíbrio financeiro seja atingida mais cedo, a autarquia tem de assumir os compromissos necessários à sua manutenção durante todo o período (31).

A estas conclusões se chega por interpretação, sem que tenha sido necessário invocar uma lacuna e o seu preenchimento analógico por recurso ao disposto no n.º 4 do artigo 41.º da Lei das Finanças Locais, que define o conteúdo do plano de reequilíbrio financeiro regulamentares de leis financeiras locais já revogadas ou conceitos por eles utilizados (32).

Se, por comparação, este conteúdo mínimo não difere muito do que é estabelecido naquele artigo 41.º, certamente é porque o objectivo a atingir é idêntico. O que difere é a situação de partida, a eventual severidade das medidas necessárias, os instrumentos possíveis e, sobretudo, o grau de controlo e tutela sobre o processo.

Aliás, o teor do Decreto-Lei 38/2008, entretanto publicado, vem confirmar o acerto da interpretação.

O disposto nos seus artigos 4.º e 11.º determina uma larga coincidência entre o conteúdo mínimo dos planos de saneamento e de reequilíbrio financeiro. Ambos devem incluir:

A previsão do período temporal necessário à recuperação da situação financeira do município, em respeito pelas regras presentes na LFL;

A apresentação das medidas específicas necessárias para atingir uma situação financeira equilibrada, nomeadamente no que respeita à contenção da despesa com o pessoal durante o período de saneamento/reequilíbrio financeiro, respeitando o princípio de optimização na afectação dos recursos humanos do município;

A apresentação de medidas de contenção da despesa corrente, a qual não pode ultrapassar a taxa global de evolução fixada pela lei do Orçamento do Estado para as rubricas da mesma natureza;

Um plano de redução do endividamento até aos limites legais;

Previsão da despesa de investimento;

Medidas de maximização de receitas;

A previsão de impacte orçamental, por classificação económica, das medidas adoptadas, para o período de vigência do plano de saneamento/reequilíbrio financeiro.

Na perspectiva do recorrente, o Decreto-Lei 38/2008 tem uma natureza estritamente regulamentar, não sendo aplicável ao caso em análise (33).

Mas, uma vez que, enquanto diploma regulamentar, este Decreto-Lei não poderia ir além da lei que regulamentou, há-de, pelo menos, concluir-se que ele demonstra com clareza que o legislador do artigo 40.º da Lei das Finanças Locais nunca pretendeu que o empréstimo de saneamento financeiro fosse um estrita operação de consolidação e reprogramação de passivos, que o plano de saneamento financeiro que o deve acompanhar fosse um instrumento com outro objectivo que não o da recuperação do equilíbrio financeiro municipal ou que o conteúdo do referido plano fosse radicalmente diferente do conteúdo dos planos de reequilíbrio financeiro.

II.4.2 - O Plano de Saneamento Financeiro apresentado Retomemos, à luz do que se concluiu, o teor do ponto III.9.3 do Acórdão recorrido, onde se identificaram as debilidades do Plano de Saneamento Financeiro apresentado pelo município de Lisboa que sustentaram a conclusão da sua insuficiência e falta de sustentabilidade, fundamento da decisão de recusa de visto.

Consideremos, em particular, o que se referiu na sua alínea b):"Com excepção da previsão da receita estrutural, da previsão da despesa estrutural e da previsão dos saldos estruturais para o período que decorre de 2008 a 2012, não constam do Plano os balanços previsionais anuais - por forma a identificar, designadamente, a evolução dos saldos anuais das contas dos fornecedores - as demonstrações de resultados anuais, mapas de fluxos financeiros e ainda as peças contabilísticas previsionais anuais que lhes servem de suporte, de acordo com as rubricas/contas do POCAL, para o período de vigência do empréstimo (34)."

Admite-se que o equilíbrio orçamental se obterá a partir do equilíbrio estrutural, único previsto no Plano de Saneamento Financeiro, e do compromisso nele implícito de que o investimento será função das margens estruturais anuais acrescidas de eventuais financiamentos adicionais.

No entanto, o equilíbrio financeiro não se esgota no equilíbrio orçamental nem no equilíbrio orçamental estrutural. O cumprimento das regras financeiras aplicáveis implica também equilíbrios patrimoniais e, em particular, o cumprimento dos limites legais de endividamento.

Como já referimos atrás, a recuperação do equilíbrio financeiro municipal, considerando as normas financeiras aplicáveis, implica a demonstração de que, designadamente, as receitas vão cobrir as despesas dos respectivos exercícios, as obrigações da autarquia com terceiros serão pontualmente cumpridas, inexistindo endividamento ou atrasos de pagamento junto de fornecedores ou outros credores e que o endividamento será mantido dentro dos limites legais, tanto em termos de passivos financeiros como de endividamento líquido.

O recorrente vem invocar (vd. fls. 32 dos autos):

"RR) Não foi elaborado um balanço previsional que permita identificar a evolução - no período de 2008 a 2012- das contas de fornecedores porque o controlo da dívida a fornecedores será efectuado, em primeira linha, através da redução do orçamento municipal para níveis realistas de realização de receita em cada ano (de 831,7 milhões de euros, em 2007, para 546 milhões de euros, em 2008) concretizando, desse modo, uma das suas principais funções - limitar o volume máximo de realização de despesas pelos serviços municipais aos montantes da receita cobrados em cada ano;

SS) O limite estabelecido, tendo como pressuposto base um cenário conservador e prudente de previsão das fontes de financiamento da actividade municipal, confere desse modo um elevado grau de confiança na execução da receita orçamental e garante, assim, a total cobertura das despesas realizadas pelas receitas cobradas em cada ano;

TT) Estabelecendo como limite máximo das despesas a realizar em cada ano, valores de receita com elevada probabilidade de cobrança, não será possível a acumulação de saldos de fornecedores que excedam os prazos normais de pagamento das correspondentes facturas - 30 a 60 dias, respectivamente, para fornecimento de bens e serviços e para empreitadas;

UU) Para além desta medida de controlo, de carácter geral, estabeleceu-se, igualmente, como medida específica de controlo das despesas de investimento, o bloqueio das correspondentes dotações orçamentais, assegurando que a sua autorização e realização será efectuada em consonância e à medida da execução orçamental das receitas de capital que as financiam, uma vez que estas envolvem maior incerteza quanto à respectiva concretização da sua cobrança;

VV) Os elementos de suporte ao controlo da dívida de fornecedores serão, assim, essencialmente constituídos pelos mapas de execução orçamental previstos no POCAL, assegurando que o cabimento global das despesas de investimento não exceda o saldo estrutural previsto em cada ano, enquanto não forem cobradas receitas de capital destinadas ao seu financiamento;

WW) Por outro lado, deverão ser regularmente comparados os saldos das contas do razão, que evidenciam as dívidas a fornecedores e outros credores do Município, com o valor das disponibilidades de tesouraria e estabelecidos orçamentos de tesouraria trimestrais, com os plafonds necessários aos pagamentos dentro dos prazos acordados com os fornecedores."

Não temos dúvidas sobre os mecanismos de controlo que podem ser utilizados para acompanhar e prevenir o eventual endividamento a fornecedores. O que releva, no entanto, é confirmar se o Plano de Saneamento Financeiro garante e demonstra, de forma expressa, que esse endividamento não vai crescer à margem do orçamento, como tantas vezes sucede (35).

Só o cruzamento da perspectiva orçamental com a perspectiva patrimonial permite essa demonstração e essa garantia, em termos susceptíveis de controlo.

Por outro lado, o Plano de Saneamento Financeiro não contém quaisquer previsões, projecções ou garantias quanto ao endividamento global e ao endividamento líquido e à sua redução, contenção e manutenção dentro dos limites legais para todo o período do empréstimo, sem o que não se pode concluir pela realização do equilíbrio financeiro.

Acresce à não inclusão de dados previsionais e compromissos de natureza patrimonial a circunstância de, quer os referenciais orçamentais quer os compromissos relativos ao investimento e a outras medidas, se reportarem exclusivamente ao período de 2008-2012. O próprio plano se designa "Plano de Saneamento Financeiro, 2008- 2012".

A este respeito, refere-se a fls. 30 do processo, na petição de recurso:

"O plano de saneamento financeiro, por seu turno, abarca um horizonte de 5 anos porque o mesmo foi considerado suficiente para demonstrar o saneamento financeiro do Município: ou seja, em 2012, após cinco anos de execução do plano de saneamento financeiro, a autarquia estará em situação de equilíbrio.

De facto, prevendo-se o reequilíbrio financeiro logo no final de 2008, com um saldo estrutural de cerca de 13,4 M (euro) e a respectiva consolidação no final dos 4 anos seguintes (até 2012), os restantes 8 anos corresponderiam apenas a hipóteses de evolução meramente indicativas, na medida em que a sua previsão dependeria de condições macroeconómicas e políticas de longo prazo, e, como tal, de difícil ou pouco credível previsão."

A fls. 217, no seu parecer, diz ainda Vital Moreira: "Seria também manifestamente excessivo exigir que os municípios apresentem estimativas de saldos orçamentais anuais, discriminados até ao limite do prazo do empréstimo, em 2020. Não é democraticamente exigível que um município se autovincule com tanta antecedência a medidas orçamentais que poderiam vir a tolher de forma absolutamente desproporcionada a maioria democrática de cada mandato municipal nos próximos quadriénios."

Referimos já no ponto anterior que se os planos devem conter previsões e estabelecer compromissos para todo o período de vigência do empréstimo a que estão associados, é porque a lei pretende que, ainda que a situação de equilíbrio financeiro seja atingida mais cedo, a autarquia assuma os compromissos necessários à sua manutenção durante todo o período (36).

De qualquer forma, tal exigência resulta directamente da lei. O n.º 2 do artigo 40.º estabelece: "Os pedidos de empréstimos para saneamento financeiro dos municípios são instruídos com um estudo fundamentado sobre a situação financeira da autarquia e um plano de saneamento financeiro para o período a que respeita o empréstimo (37)."

Esta norma legal não foi cumprida.

Tanto basta para se concluir pela insuficiência do Plano de Saneamento Financeiro apresentado pelo município de Lisboa, por incumprimento de um requisito vinculado, expressamente estabelecido na lei, em relação ao qual não existe qualquer margem de livre decisão por parte dos órgãos autárquicos.

A circunstância de o plano de saneamento não estar elaborado para todo o período de vigência do empréstimo, apresentando previsões apenas até 2012, não permite, também por essa via, concluir que o saneamento financeiro é assegurado e mantido até ao termo da vigência da operação.

Fica prejudicada a apreciação das restantes debilidades do Plano invocadas no ponto III.9.3. do Acórdão da 1.ª instância.

II.4.3. Conclusão

Em face do que antecede, conclui-se que:

O Acórdão recorrido não apreciou o Plano de Saneamento Financeiro do município de Lisboa com base nos requisitos fixados pelo legislador para os planos de reequilíbrio financeiro no artigo 41.º da Lei das Finanças Locais, termos em que improcede a conclusão 11.ª das alegações de recurso.

O Plano de Saneamento Financeiro aprovado pelo município de Lisboa é insuficiente para os efeitos previstos no artigo 40.º da Lei das Finanças Locais e, por isso, não se verificam as condições exigidas por esse mesmo artigo para a contracção do empréstimo em apreciação.

II.5 - Do montante do empréstimo No ponto II.1.7. deste Acórdão decidiu-se, a requerimento do recorrente, pelo aditamento ao probatório do seguinte facto: "V) Em virtude de, em 2008, se reduzirem as dívidas aos fornecedores em cerca de 20,4 milhões de euros, a utilização dos fundos disponibilizados pelo contrato de abertura de crédito celebrado com a Caixa Geral de Depósitos irá reduzir-se de 360M(euro) para 340M(euro)."

São requisitos legais expressos da contracção dos empréstimos para saneamento financeiro, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 40.º da Lei das Finanças Locais, que os mesmos se destinem à consolidação de passivos e que o resultado da operação não aumente o endividamento líquido do município que a eles recorre.

O produto do empréstimo deve assim servir exclusivamente para satisfazer dívidas existentes ou, de outro modo, desvia-se do seu fim e deixa de ser neutro em termos de endividamento líquido.

Não obstante termos presente o sistema de controlo instituído pela Câmara Municipal de Lisboa para controlo das facturas a satisfazer pelo produto do empréstimo, o facto de parte delas poder estar já paga, em caso de efectiva concretização da previsão avançada, deveria conduzir à redução do montante contratual máximo do empréstimo.

Esta questão está, porém, prejudicada, dado o teor da decisão que se vai proferir.

II.6 - Conclusões

O Plano de Saneamento Financeiro associado ao contrato de empréstimo sujeito a fiscalização prévia é insuficiente por não se reportar a todo o período de vigência do empréstimo, como exige o n.º 2 do artigo 40.º da Lei das Finanças Locais.

É igualmente insuficiente por não conter previsões relativas ao endividamento, nas suas várias vertentes, essenciais à aferição de que é atingido e mantido o equilíbrio financeiro municipal durante o período de vigência do empréstimo.

O plano não permite, assim, concluir e garantir que o saneamento financeiro é realizado e mantido até ao termo da vigência da operação.

Em consequência, não se pode dar por assegurada a finalidade do empréstimo contraído, finalidade que constitui um requisito e pressuposto vinculado do empréstimo, nos termos do n.º 1 do mesmo artigo 40.º O desrespeito dos n.º s 1 e 2 do artigo 40.º da Lei das Finanças Locais constitui violação directa de normas financeiras, o que, nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 44.º da LOPTC, é fundamento de recusa de visto.

III - Decisão

Assim, pelos fundamentos expostos, acorda-se em Plenário da 1.ª Secção em negar provimento ao recurso, mantendo a recusa do visto ao contrato em questão.

São devidos emolumentos nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 16.º do Regime Jurídico dos Emolumentos do Tribunal de Contas, anexo ao Decreto-Lei 66/96, de 31/5.

Publique-se no Diário da República, após trânsito em julgado, nos termos do disposto no artigo 9.º, n.º 2, alínea f), da Lei 98/97, na redacção da Lei 48/2006, de 29 de Agosto.

Lisboa, 16 de Dezembro de 2008. - Os Juízes Conselheiros: Helena Abreu Lopes, relatora - João Figueiredo - Carlos Morais Antunes. - O Procurador-Geral-Adjunto, Jorge Manuel Ferreira da Cruz Leal. (1) Muito embora tenha sido autorizada pela Assembleia Municipal a celebração de um segundo contrato até ao montante de 40.000.000,00 (euro) "se e quando se tornarem certas, líquidas e exigíveis dívidas emergentes de compromissos assumidos em data anterior a 1 de Agosto de 2007", tal possibilidade não consta do clausulado do contrato submetido a visto. O ofício 97/DMF/DAJAF/07, a fls. 4 do processo de visto n.º 1598/2007, esclarece que o município de Lisboa não submeteu esse segundo contrato a fiscalização prévia do Tribunal de Contas, "uma vez que a verificação das condições impostas terão de ser, de novo, submetidas à aprovação da Assembleia Municipal". O Tribunal não emitiu, portanto, qualquer juízo sobre esse eventual contrato.

(2) Lei 2/2007, de 15 de Janeiro, rectificada pela Declaração de Rectificação 14/2007, publicada no D.R. de 15 de Fevereiro de 2007, e alterada pelas Leis n.º s 22-A/2007, de 29 de Junho, e 67-A/2007, de 31 de Dezembro.

(3) Cf. artigo 712.º do Código do Processo Civil (4) Vd., entre outros, Acórdãos da R.P., de 19.9.2000 e de 9.1.2003, da R. C. de 27.6.2002, de 18.3.2003, de 25.3.2003 e de 7.7.2004, da R.L. de 29.4.2004 e do STJ, de 12.1.1999, citados nas Anotações n.º s 48, 88, 109, 118, 125, 127, 155 e 169 ao artigo 712.º do Código de Processo Civil Anotado, Abílio Neto, 19.ª Edição Actualizada, Setembro 2007.

(5) Vd. Anotação n.º 49 ao mesmo artigo e obra (6) Lei 98/97, de 26 de Agosto, com as alterações introduzidas pelas Leis n.º s 87-B/98, de 31 de Dezembro, 1/2001, de 4 de Janeiro, 55-B/2004, de 30 de Dezembro, 48/2006, de 29 de Agosto, e 35/2007, de 13 de Agosto

(7) Vd. fls. 338 e seguintes dos autos.

(8) Conforme informação dada pelo recorrente a fls. 14 das alegações de recurso, a qual, por força da lei aplicável, obedece a um critério diverso do das informações referentes ao ano de 2007.

(9) Conforme informação constante do ofício do Gabinete do SEAAL n.º 784/2007, a fls. 338 e seguintes. Altera-se a data de referência constante do Acórdão recorrido de 31/12/06 para 01/01/07, pois é essa a data constante desse ofício.

(10) Informação constante do processo de visto n.º 1598/07 e do Acórdão recorrido e confirmada pelo recorrente a fls. 15 das alegações de recurso (11) Excluídos os valores em dívida à SIMTEJO e à PARQUE EXPO, objecto de contratos de cessão de créditos.

(12) Conforme informação dada pelo recorrente a fls. 15 e 16 das alegações de recurso, coincidente com a informação da DGAL, conforme ofício a fls. 111, a qual, por força da lei aplicável, obedece a um critério diverso do das informações referentes ao ano de 2007.

(13) Conforme informação constante do ofício do Gabinete do SEAAL n.º 784/2007, a fls. 338 e seguintes. Altera-se a data de referência constante do Acórdão recorrido de 31/12/06 para 01/01/07, pois é essa a data constante desse ofício.

(14) Conforme informação dada pelo recorrente a fls. 16 das alegações de recurso (15) Dados constantes do Acórdão recorrido, com base na informação a fls. 10, 117 e 121 do processo 1598/07. O cálculo do limite baseou-se no montante reportado pelo município relativamente às receitas municipais, a fls. 121 do processo 1598/07, o qual não foi objecto de rectificações.

(16) Conforme informação dada pelo recorrente a fls. 16 das alegações de recurso.

(17) Os aspectos a seguir enunciados correspondem a uma selecção, da nossa responsabilidade, de ideias expostas no referido parecer.

(18) Lei 91/2001, de 20 de Agosto, alterada pela Lei Orgânica 2/2002, de 28 de Agosto, pela Lei 23/2003, de 2 de Julho e pela Lei 48/2004, de 24 de Agosto.

(19) Vd. página 8 do parecer que vem referido (20) Cf. Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, 1988, Vol. II, p. 41, e João Caupers, Introdução ao Direito Administrativo, 2001, p.65, citados por Lia Olema F. V. J. Correia, Dever de Boa Gestão e Responsabilidade Financeira, in Estudos Jurídicos e Económicos em homenagem ao Prof. Doutor António de Sousa Franco, 2006, Coimbra Editora (21) Cf., entre outros, Acórdão do STA no processo 209/02.

(22) Cf., designadamente, Acórdãos do STA nos processos 1283/02, 220/04, 1009/04, 351/07 e 855/07, bem como Fernando Azevedo Moreira, Conceitos Indeterminados: sua sindicabilidade contenciosa, in Revista de Direito Público, n.º 1, Ano I, que em muito os inspirou.

(23) Para os defensores de um conceito unitário e amplo de discricionariedade, não faz sentido distinguir os conceitos indeterminados da discricionariedade.

Estes autores, entre os quais Rogério Soares, Vieira de Andrade, Barbosa de Melo, David Duarte e Francisca Portocarrero, consideram que, nesses casos, a liberdade que os referidos conceitos indeterminados concedem à Administração integra o poder de completar a definição legal dos pressupostos e corresponde a um verdadeiro poder discricionário. Estas teses, que ressurgem no quadro de uma revalorização da discricionariedade administrativa, não se encontram, no entanto, ligadas à ideia de isenção de controlo judicial, atento um reforçado papel dos princípios jurídicos gerais da actuação administrativa, de exigências substanciais de fundamentação, de vícios específicos de ponderação e mesmo de violação de lei pelo mau exercício dos poderes discricionários.

(24) Mário Esteves de Oliveira, Direito Administrativo, Vol. I, Almedina, p. 248.

(25) Os aspectos a seguir enunciados correspondem a uma selecção, da nossa responsabilidade, de ideias expostas no referido parecer (26) A eficácia é um conceito técnico das ciências económico-financeiras. Está, nomeadamente, definida no Manual de Auditoria do Tribunal de Contas (página 137) como o critério que avalia o grau de realização dos objectivos.

(27) Vd. página 24 do Acórdão 26/08 - 19.FEV.08- 1.ª S/SS, ponto 8.2.

(28) Cf. fls. 14 a 85 do processo 1598/2007 (29) Veja-se, aliás, a alínea a) do ponto 9.3. do Acórdão recorrido, que, referindo-se a uma das debilidades do denominado Plano, se reporta, na realidade, à parte relativa aos dados de caracterização da situação financeira passada e actual.

(30) Cf. dados na página 27 do Plano e na página 22 do respectivo Anexo V, de que se salienta um aumento médio na ordem dos 65 % ao ano.

(31) Recuperemos as palavras de Manuel Porto, já acima transcritas: "Em primeiro lugar, terá o legislador querido evitar uma tentação de fraude à lei por parte do município: impedido de contrair empréstimos a não ser para financiar investimentos em concreto, o município poderia endividar-se por via do não pagamento a fornecedores, colocando-se voluntariamente na situação prevista no artigo 40.º, pelo que a lei não poderia facultar a possibilidade deste empréstimo sem que o município assumisse obrigações complementares de gestão.

Em segundo lugar, a lei claramente pretendeu que o empréstimo para saneamento não seja uma situação recorrente, e proíbe a realização de novos empréstimos de saneamento na vigência do empréstimo, pelo que procurou garantir que a necessidade não voltasse a ocorrer, exigindo este plano de saneamento."

(32) Também não se torna necessário, nem se justifica, apelar aos conceitos e regime dos Decretos-Lei s 258/79 e 322/85, que regulamentaram, respectivamente, a Lei 1/79, de 2 de Janeiro, e o Decreto-Lei 98/84, de 29 de Março, já revogados, e que, tal como o recorrente invoca nas suas alegações, se reportam a situações financeiras bem datadas no tempo.

(33) Vd. ponto I.6. deste Acórdão e alegações a fls. 298 e seguintes dos autos.

(34) Sublinhado nosso.

(35) Como, aliás, referiu Manuel Porto, nas palavras já acima transcritas, nomeadamente na Nota n.º 31.

(36) Como referiu Manuel Porto, em passagem já acima transcrita, "a lei (...) procurou garantir que a necessidade não voltasse a ocorrer".

(37) Sublinhado nosso.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/2009/02/27/plain-247077.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/247077.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1979-01-02 - Lei 1/79 - Assembleia da República

    Aprova a lei das finanças locais.

  • Tem documento Em vigor 1979-07-28 - Decreto-Lei 258/79 - Ministério da Administração Interna

    Regulamenta o recurso ao crédito por parte das autarquias locais.

  • Tem documento Em vigor 1984-03-29 - Decreto-Lei 98/84 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministério da Administração Interna

    Aprova o novo regime das finanças locais.

  • Tem documento Em vigor 1985-08-06 - Decreto-Lei 322/85 - Ministério da Administração Interna

    Regulamenta a forma de celebração de contratos de reequilíbrio financeiro entre os municípios e as instituições públicas de crédito.

  • Tem documento Em vigor 1996-05-31 - Decreto-Lei 66/96 - Ministério das Finanças

    Revê o regime jurídico dos emolumentos do Tribunal de Contas.

  • Tem documento Em vigor 1997-08-26 - Lei 98/97 - Assembleia da República

    Aprova a lei de organização e processo do Tribunal de Contas, que fiscaliza a legalidade e regularidade das receitas e das despesas pública, aprecia a boa gestão financeira e efectiva responsabilidade por infracções financeiras exercendo jurisdição sobre o Estado e seus serviços, as Regiões Autónomas e seus serviços, as Autarquias Locais, suas associações ou federações e seus serviços, bem como as áreas metropolitanas, os institutos públicos e as instituições de segurança social. Estabelece normas sobre o f (...)

  • Tem documento Em vigor 1999-02-22 - Decreto-Lei 54-A/99 - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território

    Aprova o Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais (POCAL), definindo-se os princípios orçamentais e contabilísticos e os de controlo interno, as regras provisórias, os critérios de volumetria, o balanço, a demonstração de resultados, bem assim os documentos previsionais e os de prestação de contas.

  • Tem documento Em vigor 2001-08-20 - Lei 91/2001 - Assembleia da República

    Estabelece as disposições gerais e comuns de enquadramento dos orçamentos e contas de todo o sector público administrativo - Lei de enquadramento orçamental.

  • Tem documento Em vigor 2002-08-28 - Lei Orgânica 2/2002 - Assembleia da República

    Aprova a lei da Estabilidade orçamental. Altera a Lei de Enquadramento Orçamental, a Lei de Finanças Locais e a Lei de Finanças das Regiões Autónomas. Republica em anexo a Lei 91/2001 de 20 de Agosto.

  • Tem documento Em vigor 2003-07-02 - Lei 23/2003 - Assembleia da República

    Altera a Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto - Lei de enquadramento orçamental.

  • Tem documento Em vigor 2004-08-24 - Lei 48/2004 - Assembleia da República

    Altera a Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (lei de enquadramento orçamental), republicada em anexo.

  • Tem documento Em vigor 2005-12-30 - Lei 60-A/2005 - Assembleia da República

    Aprova o Orçamento do Estado para 2006.

  • Tem documento Em vigor 2006-08-29 - Lei 48/2006 - Assembleia da República

    Altera (quarta alteração) a Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, aprovada pela Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto. Republicada em anexo.

  • Tem documento Em vigor 2006-12-29 - Lei 53-A/2006 - Assembleia da República

    Aprova o Orçamento do Estado para 2007.

  • Tem documento Em vigor 2007-01-15 - Lei 2/2007 - Assembleia da República

    Aprova a Lei das Finanças Locais.

  • Tem documento Em vigor 2007-02-15 - Declaração de Rectificação 14/2007 - Assembleia da República

    Rectifica a Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro, que aprova a Lei das Finanças Locais.

  • Tem documento Em vigor 2008-03-07 - Decreto-Lei 38/2008 - Presidência do Conselho de Ministros

    Densifica as regras referentes aos regimes de saneamento e de reequilíbrio financeiro municipal, e regulamenta o Fundo de Regularização Municipal, previstos na Lei das Finanças Locais.

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