Decreto-Lei 195-A/92
de 8 de Setembro
O Teatro Nacional de S. Carlos afirmou-se, ao longo dos seus quase 200 anos de vida, como uma instituição ímpar no panorama lírico nacional e uma das mais prestigiadas salas de ópera da Europa.
Durante os últimos anos, porém, tem vindo a assistir-se a uma progressiva degradação do número e qualidade das produções, traduzida no decréscimo da afluência de público e na acumulação de prejuízos. Em consequência, a empresa que gere o Teatro Nacional de S. Carlos tem sobrevivido na total dependência do apoio financeiro do Estado, através de subsídios e dotações de capital, apoio esse que totaliza, a preços de 1991, cerca de 12 milhões de contos.
A responsabilidade por esta situação é imputável, em grande parte, a natureza jurídica de empresa pública que este Teatro assumiu em 1980, na medida em que os critérios de gestão que tal estrutura tendencialmente propicia não se revelam adequados a uma actividade em que é delicada a ponderação entre os critérios económico-financeiros e os objectivos de promoção e difusão cultural.
A prossecução conjugada de tais objectivos passa, pois, pela criação de uma entidade dotada de adequada natureza jurídica que, privilegiando a criação de uma cultura lírica, a formação e defesa de intérpretes nacionais e a captação de novos públicos, disponha de mecanismos flexíveis de gestão que permitam a optimização de meios humanos e materiais e a obtenção de níveis aceitáveis de rentabilidade.
A extinção da actual empresa pública, a que agora se procede, surge como iniciativa preliminar e necessária à criação de uma nova entidade para a gestão do Teatro Nacional de S. Carlos, a qual condiciona, aliás, todo o regime estabelecido para a liquidação.
Simultaneamente, devolve-se à Companhia Nacional de Bailado a autonomia que havia perdido em 1985, aquando da sua integração, por via legislativa, no Teatro Nacional de S. Carlos, E. P. Pretende-se, deste modo, devolver o Teatro à sua pureza de instituição lírica e libertar a Companhia das peias a que um espaço físico inapropriado e uma programação secundarizada pela vertente operária do Teatro a haviam sujeito.
Foram ouvidas as entidades representativas dos trabalhadores da empresa.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
1 - É extinta a empresa pública que gere o Teatro Nacional de S. Carlos, adiante designado por TNSC, criada pelo Decreto-Lei 259/80, de 5 de Agosto.
2 - A empresa pública que gere o TNSC mantém a sua personalidade, para efeitos de liquidação, até à aprovação final das contas apresentadas pelo administrador liquidatário.
Artigo 2.º
Efeitos
A extinção da empresa pública que gere o TNSC produz os seguintes efeitos:
a) Dissolução imediata dos órgãos sociais;
b) Vencimento imediato de todas as dívidas;
c) Cessação dos vínculos laborais;
d) Incapacidade de contracção de novos encargos, exceptuados os necessários às operações de liquidação;
e) Autonomização da Companhia Nacional de Bailado.
Artigo 3.º
Administrador liquidatário
1 - É nomeado administrador liquidatário o licenciado Manuel Joaquim Barata Frexes, o qual é, para o efeito, requisitado aos Telefones de Lisboa e Porto (TLP), S. A.
2 - O administrador liquidatário tem direito à remuneração de presidente do conselho de administração de empresa pública do grupo C, nível 3.
3 - O administrador liquidatário exerce as suas funções no edifício do Teatro Nacional de S. Carlos, ficando afectos à sua actividade os meios humanos e materiais da empresa em liquidação.
Artigo 4.º
Competências do administrador liquidatário
Compete ao administrador liquidatário, dentro dos limites legalmente fixados e atentas as orientações emitidas pela tutela, praticar todos os actos necessários à liquidação da empresa pública que gere o TNSC, designadamente:
a) Assegurar a administração corrente do património, podendo autorizar a prestação de serviços que rentabilizem os meios humanos e materiais existentes;
b) Representar a empresa pública que gere o TNSC em juízo ou fora dele, podendo constituir mandatários e confessar, desistir ou transigir em processo judicial;
c) Promover a publicação, em pelo menos dois dos jornais mais lidos de Lisboa, do anúncio de liquidação da empresa pública que gere o TNSC;
d) Notificar os credores conhecidos, por carta registada com aviso de recepção, da liquidação da empresa pública que gere o TNSC;
e) Proceder, em conformidade com a lei, à graduação dos créditos verificados ou reconhecidos e elaborar o mapa dos créditos reclamados;
f) Elaborar o inventário de todos os bens da empresa pública que gere o TNSC e submetê-lo à apreciação do membro do Governo responsável pela área da cultura e do Ministro das Finanças;
g) Liquidar o activo patrimonial da empresa;
h) Submeter à aprovação da tutela o relatório e contas do exercício de 1992, na parte referente ao 1.º semestre;
i) Pagar aos credores, em conformidade com a graduação estabelecida.
Artigo 5.º
Reclamação de créditos
O prazo para a reclamação de créditos é de 60 dias contado a partir da data do aviso de recepção da notificação a que se refere a alínea d) do artigo anterior ou da publicação dos anúncios previstos na alínea c) do mesmo artigo.
Artigo 6.º
Funcionários e trabalhadores da empresa pública que gere o TNSC
Os funcionários a que se refere o n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei 259/80, de 5 de Agosto, ingressam no quadro de efectivos interdepartamentais, a partir de 1 de Setembro de 1992, para efeitos do disposto no Decreto-Lei 43/84, de 3 de Fevereiro.
Artigo 7.º
Transferências para a Caixa Geral de Aposentações
A Caixa Geral de Aposentações assume a responsabilidade com os encargos relativos à aposentação do pessoal da empresa pública que gere o TNSC subscritor daquela instituição.
2 - O administrador liquidatário transferirá para a Caixa Geral de Aposentações o montante global das quotas arrecadadas após a entrada em vigor do Decreto-Lei 259/80, de 5 de Agosto, capitalizadas à taxa de desconto do Banco de Portugal.
3 - A Caixa Geral de Aposentações será ainda indemnizada de uma quantia igual à resultante da aplicação do número anterior, a título de contribuição da empresa pública que gere o TNSC para o financiamento das pensões do pessoal aposentado e a aposentar.
Artigo 8.º
Liquidação do passivo
1 - Apurado o montante total dos créditos, incluindo as indemnizações a pagar aos trabalhadores, o administrador liquidatário elaborará o mapa final do passivo, que submeterá à apreciação do membro do Governo responsável pela área da cultura e do Ministro das Finanças.
2 - O Estado reserva para si a titularidade de todos os direitos da empresa pública que gere o TNSC, além dos já previstos nos artigos 29.º e 30.º do respectivo Estatuto, nos termos do Decreto-Lei 260/76, de 8 de Abril.
3 - Aprovado o mapa final do passivo, o administrador liquidatário procederá ao pagamento dos credores, segundo a graduação estabelecida.
Artigo 9.º
Apresentação e aprovação de contas
1 - O administrador liquidatário apresentará contas ao membro do Governo responsável pela área da cultura e ao Ministro das Finanças, sempre que estes o solicitem.
2 - A conta final da liquidação será submetida, até ao termo do prazo fixado no artigo 10.º, à aprovação do membro do Governo responsável pela área da cultura e do Ministro das Finanças, devendo ser apresentada em forma de conta corrente e acompanhada de todos os elementos comprovativos.
Artigo 10.º
Prazo de liquidação
1 - O prazo para a liquidação da empresa pública que gere o TNSC termina em 31 de Dezembro de 1992.
2 - Por despacho conjunto do membro do Governo responsável pela área da cultura e do Ministro das Finanças, o prazo referido no número anterior poderá ser prorrogado até 31 de Maio de 1993, mediante solicitação devidamente fundamentada do administrador liquidatário.
Artigo 11.º
Companhia Nacional de Bailado
A Companhia Nacional de Bailado, adiante designada por CNB, integrada na empresa pública que gere o TNSC por força do Decreto-Lei 271/85, de 16 de Julho, reassume plena personalidade jurídica e autonomia.
2 - É repristinado o Decreto-Lei 460/82, de 26 de Novembro, para vigorar com as devidas adaptações, nomeadamente:
a) A presidência da comissão instaladora compete ao director-geral dos Espectáculos e das Artes;
b) Não há lugar à constituição do conselho consultivo;
c) Os trabalhadores da CNB mantêm o estatuto laboral que detém na empresa pública que gere o TNSC;
d) A CNB fica sujeita ao regime de instalação durante o período de um ano a contar da entrada em vigor do presente diploma.
3 - Os encargos com o financiamento da CNB no ano de 1992 são satisfeitos, além das receitas próprias, pelas respectivas verbas de pessoal inscritas no orçamento da empresa pública que gere o TNSC, a transferir, e por verbas do Fundo de Fomento Cultural.
4 - A CNB sucede na titularidade dos direitos transferidos para a empresa pública que gere o TNSC por força do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei 271/85, de 16 de Julho, bem como na daqueles posteriormente adquiridos pela referida empresa pública em função da actividade da CNB.
5 - Para efeitos do disposto no número anterior, o administrador liquidatário identificará devidamente no inventário a que se refere a alínea f) do artigo 4.º os direitos a transferir para a CNB.
Artigo 12.º
Cessão da posição contratual
1 - O Estado, através da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, sucede, na data da entrada em vigor do presente diploma, à empresa pública que gere o TNSC, como parte nos contratos por esta celebrados e referentes às obras a efectuar no edifício do Teatro, durante os meses de Julho de 1992 a Janeiro de 1993.
2 - O disposto no número anterior constitui título suficiente para todos os efeitos legais.
Artigo 13.º
Norma revogatória
São revogados os Decretos-Leis 259/80, de 5 de Agosto, 123/81, de 25 de Maio, 179/85, de 23 de Maio e 271/85, de 16 de Julho.
Artigo 14.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 4 de Junho de 1992. - Aníbal António Cavaco Silva - Jorge Braga de Macedo - Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Promulgado em 29 de Agosto de 1992.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 4 de Setembro de 1992.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.