de 13 de agosto
A empresa Estaleiros Navais de Viana do Castelo, S. A. (ENVC, S. A.), em atividade desde 1944, foi nacionalizada pelo Decreto-Lei 478/75, de 1 de setembro, e instituída como empresa pública através do Decreto-Lei 850/76, de 17 de dezembro. A ENVC, S. A., resulta da transformação da Estaleiros Navais de Viana do Castelo, E. P., em sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos, operada pelo Decreto-Lei 55/91, de 26 de janeiro.
Neste enquadramento, a ENVC, S. A., na qualidade de empresa operadora na área da reparação e construção naval, é atualmente uma pessoa coletiva de direito privado, com o estatuto de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, que integra, desde 2005, a carteira de participações sociais da EMPORDEF - Empresa Portuguesa de Defesa (SGPS), S. A., (EMPORDEF), sociedade holding do Estado para as indústrias da defesa, que detém 100 % das ações da ENVC, S. A.
Em Portugal, a indústria da construção e reparação naval é uma indústria de base, com uma longa tradição. Todavia, a referida indústria necessita de flexibilização e de investimento diversificado, que permitam a modernização adequada ao quadro da livre concorrência do mercado em que se insere, no sentido de ser promovida a manutenção da atividade de construção e reparação naval bem como de outras atividades económicas conexas ou relacionadas com aquelas, em regime de auto sustentação económico-financeira.
Para cumprimento dos aludidos objetivos, e atendendo à urgência imperiosa decorrente da necessidade de viabilização económico-financeira da ENVC, S. A., e do cumprimento dos compromissos assumidos, o Governo, com o presente diploma, pretende aprovar o processo de reprivatização do capital social da ENVC, S. A., cujo modelo integra a realização de uma venda direta pela EMPORDEF a um investidor que venha a tornar-se acionista de referência, nacional ou estrangeiro, com perspetiva de investimento estável e de longo prazo, reservando-se contudo um lote de ações representativas do capital social da ENVC, S. A., para disponibilização aos trabalhadores, nos termos legalmente exigidos.
A venda direta de referência visa permitir a participação e o investimento de um acionista de referência no capital social da ENVC, S. A., sendo intenção do Governo privilegiar a alienação integral do respetivo capital social, com vista à reestruturação e ao desenvolvimento da ENVC, S. A., em termos que contribuam para o desenvolvimento do sector da construção e reparação naval e de atividades económicas conexas ou relacionadas, bem como para uma concorrência efetiva e equilibrada do mesmo.
As modalidades de venda de ações previstas no presente diploma, consubstanciadas na venda direta a um investidor que venha a tornar-se acionista de referência e na oferta pública de venda aos trabalhadores da ENVC, S. A., podem ser, total ou parcialmente, realizadas em simultâneo ou em momentos diferenciados, procedendo-se, nos termos da lei, à fixação das condições concretas e finais da operação de reprivatização mediante resolução do Conselho de Ministros.
É objetivo do Governo que o Estado deixe de ter qualquer participação direta ou indireta no capital social da ENVC, S. A., deixando esta, em consequência, de integrar o Sector Empresarial do Estado. Com a concretização desta operação de reprivatização pretende-se que o capital social da ENVC, S. A., seja alienado por venda direta, porque se considera que, atentas as atuais dificuldades do mercado da construção e reparação naval e atividades económicas conexas ou relacionadas, aliadas à deficitária situação económico e financeira da ENVC, S. A., esta modalidade é a que melhor salvaguarda o interesse nacional na realização deste processo, em condições consideradas apropriadas para o valor do ativo a alienar.
Com efeito, o modelo de reprivatização consagrado no presente diploma permite não só ir ao encontro dos compromissos assumidos no âmbito do Programa de Assistência Financeira, na medida em que a realização de reprivatizações no Sector Empresarial do Estado contribui para o esforço de consolidação orçamental, como ainda promover a flexibilização necessária à sustentabilidade e ao potencial desenvolvimento da ENVC, S. A., incrementando a presença de investidores de diversa natureza no mercado português permitindo, assim, a diversificação das fontes de financiamento das empresas nacionais, o que justifica amplamente a sua adoção.
Assim:
No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei 11/90, de 5 de abril, alterada pela Lei 102/2003, de 15 de novembro, e pela Lei 50/2011, de 13 de setembro, e nos termos das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
É aprovado o processo de reprivatização do capital social da Estaleiros Navais de Viana do Castelo, S. A., doravante abreviadamente designada por ENVC, S. A., o qual é regulado pelo presente diploma e pelas resoluções do Conselho de Ministros que estabelecerem as condições finais e concretas das operações necessárias à sua execução.
Artigo 2.º
Processo
1 - O processo de reprivatização do capital social da ENVC, S. A., integra:
a) Uma operação de venda direta a um investidor que venha a tornar-se acionista de referência da ENVC, S. A., de um bloco indivisível de ações representativas do capital social da referida sociedade, doravante abreviadamente designada por venda direta de referência;
b) Uma oferta pública de venda dirigida aos trabalhadores da ENVC, S. A.
2 - O processo de reprivatização da ENVC, S. A., que integra as modalidades referidas no número anterior, incide sobre ações representativas do capital social da ENVC, S. A., até ao montante de 100 % do respetivo capital social.
3 - As operações previstas no n.º 1 podem ser efetuadas total ou parcialmente, simultaneamente ou em momento anterior ou posterior entre si.
4 - A EMPORDEF procede às alienações das ações da ENVC, S. A., de acordo com as regras estabelecidas no presente diploma.
Artigo 3.º
Venda direta de referência
1 - As ações a alienar por venda direta de referência são objeto de operação de venda junto de investidor, nacional ou estrangeiro, que pode concorrer individualmente ou em agrupamento, com perfil de investidor e com uma perspetiva de investimento estável e de longo prazo, com vista ao desenvolvimento estratégico da ENVC, S. A.
2 - As condições finais e concretas das operações necessárias à concretização da venda direta de referência são estabelecidas pelo Conselho de Ministros, mediante a aprovação de uma ou mais resoluções.
3 - Nas resoluções referidas no número anterior, o Conselho de Ministros, nomeadamente:
a) Aprova o caderno de encargos que define as condições específicas a que obedece a venda direta de referência, podendo sujeitar as ações adquiridas ao regime de indisponibilidade previsto no artigo 5.º;
b) Determina os critérios para a alienação de ações no âmbito das operações que concretizem a venda direta de referência;
c) Fica autorizado a estabelecer a exigência de uma prestação pecuniária, em montante a determinar, para a celebração de cada contrato respeitante à compra e venda de ações objeto da venda direta de referência;
d) Identifica o investidor de referência para o qual são transmitidas as ações objeto da venda direta de referência;
e) Fixa a quantidade de ações a transmitir pela EMPORDEF para o investidor de referência;
f) Fixa o preço unitário da alienação de ações no âmbito da venda direta de referência.
4 - Fica à disposição do Conselho de Ministros a possibilidade de condicionar a aquisição das ações à celebração ou plena eficácia de quaisquer instrumentos jurídicos destinados a assegurar a concretização da venda direta de referência e dos objetivos decorrentes dos critérios enunciados no n.º 2 do artigo seguinte e outros definidos mediante resolução do Conselho de Ministros, os quais podem ser redigidos numa língua de uso corrente nos mercados financeiros internacionais.
5 - As competências referidas nas alíneas b) a f) do n.º 3 e no número anterior podem ser delegadas no Ministro de Estado e das Finanças e no Ministro da Defesa Nacional, com a faculdade de subdelegação no Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças e no Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional.
Artigo 4.º
Processo de alienação
1 - O processo destinado à alienação das ações objeto da venda direta de referência pode ser organizado em diferentes fases, incluindo uma fase preliminar de recolha de intenções de aquisição junto de potenciais investidores de referência.
2 - Constituem critérios de seleção das intenções de aquisição para integração dos potenciais investidores de referência em subsequentes fases do processo de alienação:
a) A percentagem das ações representativas do capital social da ENVC, S. A., a adquirir objeto da venda direta de referência, sendo que se privilegia na presente operação de reprivatização, a alienação integral do capital social da ENVC, S. A.;
b) O preço indicativo apresentado para a aquisição das ações representativas do capital social da ENVC, S. A., objeto da venda direta de referência;
c) A apresentação de um adequado projeto estratégico para a ENVC, S. A., tendo em vista o desenvolvimento das suas atividades nos mercados nacional e internacional, que maximize a manutenção dos atuais recursos humanos da ENVC, S. A., bem como a promoção da concorrência e competitividade do sector da construção e reparação naval e de atividades económicas conexas ou relacionadas, e o desenvolvimento da economia nacional;
d) A contribuição para a sustentabilidade económico-financeira da ENVC, S. A.;
e) A ausência ou mitigação de condicionantes jurídicas, laborais ou económico-financeiras do interessado para a concretização da venda direta de referência em prazo, condições de pagamento e demais termos que sejam adequados para a salvaguarda dos interesses patrimoniais do Estado ou para o funcionamento e desenvolvimento do sector naval nacional;
f) A respetiva idoneidade, capacidade financeira, técnica e de execução, assim como as garantias eventualmente prestadas para cumprimento dos critérios constantes das alíneas anteriores.
3 - A seleção dos interessados que integram as subsequentes fases do processo de alienação é realizada mediante resolução do Conselho de Ministros.
4 - A competência referida no número anterior pode ser delegada no Ministro de Estado e das Finanças e no Ministro da Defesa Nacional com a faculdade de subdelegação no Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças e no Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional.
Artigo 5.º
Regime de indisponibilidade das ações adquiridas
1 - As ações adquiridas no âmbito das modalidades de venda referidas no n.º 1 do artigo 2.º podem ser sujeitas ao regime de indisponibilidade previsto nos n.os 3 a 7, por um prazo máximo de cinco anos a contar, respetivamente, da data de publicação da resolução do Conselho de Ministros que determine o investidor que adquira as aludidas ações ou do dia de realização da sessão especial de bolsa destinada a apurar os resultados da oferta, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 6.º
2 - O Conselho de Ministros determina as situações em que as ações objeto da venda direta de referência e ou da oferta pública de venda aos trabalhadores ficam sujeitas ao regime de indisponibilidade, caso em que não podem ser oneradas nem ser objeto de negócios jurídicos que visem a transmissão da respetiva titularidade, ainda que com eficácia futura, nomeadamente contratos-promessa e contratos de opção.
3 - Não podem ser celebrados negócios pelos quais o titular das ações se obrigue a exercer os direitos de voto inerentes às ações em determinado sentido.
4 - Os direitos de voto inerentes às ações sujeitas ao regime de indisponibilidade não podem ser exercidos por interposta pessoa.
5 - Caso o Conselho de Ministros venha a sujeitar ao regime de indisponibilidade as ações adquiridas no âmbito da venda direta de referência e ou da oferta pública de venda aos trabalhadores, são nulos os negócios celebrados em violação do disposto nos n.os 2 a 4, ainda que antes de iniciado o período de indisponibilidade.
6 - Na situação prevista no número anterior, as nulidades podem ser judicialmente declaradas a requerimento do Ministério Público, sem prejuízo da sua invocação, nos termos gerais de direito, por qualquer interessado, incluindo a EMPORDEF ou a ENVC, S. A.
7 - Em casos devidamente justificados, o Ministro de Estado e das Finanças e o Ministro da Defesa Nacional podem, mediante despacho, a requerimento dos interessados, autorizar a celebração dos negócios previstos nos n.os 3 a 5, desde que não seja prejudicada a realização dos objetivos da reprivatização.
Artigo 6.º
Oferta pública de venda
1 - Os trabalhadores da ENVC, S. A., têm direito à aquisição, mediante oferta pública de venda, de um lote de ações cuja dimensão e regime são definidos por resolução do Conselho de Ministros, podendo atender-se, para o efeito, ao tempo de serviço efetivo por eles prestado na ENVC, S. A.
2 - O investidor de referência adquirente das ações representativas do capital social da ENVC, S. A., em resultado da venda direta de referência mencionada no artigo 3.º, fica obrigado a adquirir a totalidade das ações da ENVC, S. A., não colocadas no âmbito da oferta pública de venda aos trabalhadores, pelo preço unitário de aquisição das ações objeto da venda direta de referência.
3 - A existência de um lote de ações reservada a trabalhadores não prejudica a aplicação do disposto no artigo 490.º do Código das Sociedades Comerciais.
Artigo 7.º
Regulamentação da venda direta de referência e da oferta pública de venda
1 - As condições finais e concretas das operações necessárias à concretização da venda direta de referência e da oferta pública de venda são estabelecidas pelo Conselho de Ministros, mediante a aprovação de uma ou mais resoluções.
2 - Compete ao Conselho de Ministros, nomeadamente:
a) Fixar a quantidade de ações destinadas à venda direta de referência, privilegiando-se a alienação integral do capital social da ENVC, S. A.;
b) Fixar a quantidade de ações destinadas à oferta pública de venda aos trabalhadores.
3 - Relativamente à oferta pública de venda, o Conselho de Ministros deve:
a) Fixar a quantidade de ações a oferecer aos trabalhadores;
b) Determinar os critérios, quantidade máxima a subscrever por cada trabalhador, modos de fixação do preço de venda e do preço unitário de venda das ações;
c) Fixar as condições especiais de aquisição de ações de que beneficiam os trabalhadores, designadamente o desconto no preço, caso venham a existir;
d) Estabelecer os critérios de rateio, caso venha a ser estipulado;
e) Prever a transferência de ações que não venham a ser adquiridas pelos trabalhadores para a venda direta de referência.
Artigo 8.º
Suspensão ou termo do processo de reprivatização
1 - O Governo reserva-se o direito de, em qualquer momento e mediante resolução do Conselho de Ministros, suspender ou dar sem efeito o processo de reprivatização, desde que razões de interesse público o justifiquem.
2 - No caso de se verificar a suspensão ou o termo do processo de reprivatização ao abrigo do disposto no número anterior, os potenciais interessados e ou proponentes não têm direito, por algum desses factos, a qualquer indemnização ou compensação, independentemente da sua natureza.
Artigo 9.º
Publicidade de participações
No prazo máximo de 60 dias contados desde a data do apuramento da oferta pública de venda aos trabalhadores, a ENVC, S. A., publica, nos termos do artigo 5.º do Código dos Valores Mobiliários, a lista dos acionistas cuja participação social seja superior a 1 % do respetivo capital social, indicando a quantidade de ações de que cada um dos referidos acionistas seja titular.
Artigo 10.º
Delegação de competências
Para a realização da operação de reprivatização regulada no presente diploma, e sem prejuízo do disposto nos artigos 3.º a 8.º, são delegados no Ministro de Estado e das Finanças e no Ministro da Defesa Nacional, com a faculdade de subdelegação no Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças e no Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional, poderes bastantes para determinar as demais condições acessórias que se afigurem convenientes e para praticar os atos de execução que se revelarem necessários à concretização da operação.
Artigo 11.º
Isenções de taxas e emolumentos
Estão isentos de taxas e emolumentos todos os atos relativos à alienação de ações que decorram ao abrigo do disposto no presente diploma.
Artigo 12.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no 1.º dia útil após a sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 12 de julho de 2012. - Pedro Passos Coelho - Vítor Louçã Rabaça Gaspar - José Pedro Correia de Aguiar-Branco.
Promulgado em 7 de agosto de 2012.
Publique-se.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendado em 9 de agosto de 2012.
Pelo Primeiro-Ministro, Vítor Louçã Rabaça Gaspar, Ministro de Estado e das Finanças.