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Parecer 95/2000, de 18 de Dezembro

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Texto do documento

Parecer 95/2000. - Concurso público - ANA - Aeroportos de Portugal - Agrupamento de empresas - Princípio da concorrência - Princípio do "favor" ao concurso e ao concorrente - Critério de avaliação - Efeito directo vertical - Revogação de acto ilegal - Recurso contencioso urgente:

1.ª Atento o disposto no n.º 19.3, alínea a), do programa do concurso público n.º 04/01/DIA - AS2000 - Piers e busgates - Túneis e corpo central da aerogare - Viaduto de ligação entre curbsides - basta, para qualificar tecnicamente um agrupamento, seja qual for a sua composição, que pelo menos duas das empresas que o compõem respeitem os requisitos de idoneidade referenciados: uma dessas empresas tem de ser, necessariamente, de capacidade técnica genérica e tem de demonstrar observar o requisito geral previsto na alínea a); a outra empresa pode ser de capacidade técnica genérica ou uma empresa de instalações técnicas, sendo que neste último caso ela terá de cumprir o requisito específico de capacidade técnica fixado na segunda parte da nota à referida alínea;

2.ª Quando relevante, a avaliação da capacidade técnica de empresas de instalações técnicas deverá fazer-se à luz do requisito fixado na segunda parte da nota à alínea a) do n.º 3 do n.º 19 do programa do concurso, em função da apresentação de lista de três obras de instalações eléctricas e três de instalações mecânicas, que podem ser repartidas por duas empresas em conformidade com a sua especialidade;

3.ª Da interpretação conjugada da segunda parte da norma da alínea a) do n.º 19.3 com a alínea f) do n.º 15.1 do programa do concurso, conclui-se que, na hipótese da conclusão anterior, as empresas de instalações técnicas devem apresentar a sua lista de obras acompanhada de certificados de boa execução, com as menções exigidas na parte final da alínea f) do n.º 15.1;

4.ª Nos casos em que as disposições de uma directiva comunitária se apresentam, pelo seu conteúdo, como incondicionais e suficientemente precisas, podem os particulares invocá-las contra o Estado - efeito directo vertical - quer quando este se abstém de transpor nos prazos a directiva para o direito nacional quer quando faz uma transposição incorrecta;

5.ª Em conformidade com a conclusão anterior, estava a comissão de abertura do concurso obrigada a convidar os concorrentes em causa a completar os certificados e documentos apresentados, nos termos do disposto no artigo 28.º da Directiva n.º 93/37/CEE, de 14 de Junho;

6.ª O facto de um concorrente não ter reclamado oportunamente, do acto de exclusão praticado no âmbito do procedimento pré-contratual, implica a preclusão da possibilidade de recorrer contenciosamente desse acto, mas não interfere com o dever que impende sobre a Administração de revogar (anular), por sua iniciativa, os actos que repute ilegais;

7.ª O prazo de revogação (anulação) é de um ano, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 141.º, n.º 2, do CPA, e 28.º, n.º 1, alínea c), da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (LPTA), na medida em que sendo o recurso urgente previsto no Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio, especialmente dirigido aos particulares concorrentes, não preclude a possibilidade de o Ministério Público recorrer contenciosamente, nos termos gerais previstos na LPTA para o recurso contencioso de anulação.

Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação:

Excelência:

I - No âmbito do concurso público n.º 04/01/DIA - ASC 2000 - Piers e busgates - Túneis técnicos e corpo central da aerogare - Viaduto de ligação entre curbsides, o conselho de administração da ANA, entidade responsável pelo concurso, dirigiu a V. Ex.ª o memorando n.º 34/2002, com o seguinte conteúdo:

"1 - O concurso público em referência é uma iniciativa de grande impacte, pelo volume de obras a adjudicar (valor base: Euro 136 171 525,89) e pelo que significa para o objectivo de tornar o Aeroporto Francisco Sá Carneiro como a infra-estrutura aeroportuária de referência do Noroeste da Península Ibérica. As obras em causa inserem-se ainda no conjunto de adaptações necessárias para a viabilização do evento EURO 2004.

2 - O decurso deste significativo processo concursal tem evidenciado algumas vicissitudes e actuações reclamatórias de interessados, culminando com decisões, quer da respectiva comissão de abertura, quer da Administração da ANA, S. A., enquanto órgão recorrido, que levaram, em vários momentos, à exclusão e readmissão ulterior de concorrentes.

3 - Por outro lado, como transmitimos a V. Ex.ª através do memorando n.º 27/2002, de 15 de Julho de 2002, o conselho de administração decidiu substituir a comissão de análise de propostas, com o intuito de reforçar a componente técnica de especialidades de engenharia e de lhe dar cunho mais abrangente, fazendo-a incorporar também por técnicos exteriores à empresa, de competência e experiência reconhecidas nas respectivas áreas de conhecimento e ou especialização.

4 - Mais recentemente, como também é do conhecimento de V. Ex.ª, o conselho de administração, preocupado com a defesa de princípios que permitam a subsistência de regras de sã concorrência e de igualdade de oportunidades entre todos os interessados, decidiu obter um parecer jurídico sobre a exclusão de um agrupamento concorrente, o único a ficar excluído na fase de qualificação.

5 - Fundamentando-se no parecer obtido, favorável à não exclusão do referido agrupamento (SOMAGUE, S. A., EDIFER, S. A., ZAGOPE, S. A., Alberto Martins de Mesquita, S. A., ABB Gebäudetechnik, Tomás de Oliveira, S. A.), o conselho de administração deliberou em 12 de Setembro 2002 a sua readmissão, indo, em consequência, ser considerada a respectiva proposta em sede de análise comparativa.

6 - Contra esta específica readmissão, estão já a reagir alguns interessados concorrentes, naturalmente preocupados com a sua posição final no concurso.

7 - A dimensão deste procedimento concursal e as circunstâncias atrás assinaladas levam-nos, neste momento, a acolher como vantajosa a possibilidade de ser solicitada a intervenção da Procuradoria-Geral da República, no sentido de se aferir da bondade das soluções e decisões tomadas, em particular quanto à readmissão de concorrentes."

Sobre tal memorando recaiu despacho de concordância de V. Ex.ª no sentido de ser solicitado parecer com carácter de urgência ao conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República.

Cumpre, assim, emiti-lo, com a urgência que vem solicitada.

II - Para melhor compreensão e delimitação do pedido de parecer, importa encetar breve excurso tendente a captar os momentos procedimentais já ocorridos através da análise da documentação que nos foi facultada.

a) A ANA - Aeroportos de Portugal, S. A., através de anúncio publicado de acordo com as normas legais aplicáveis, lançou o concurso público n.º 04/01/DIA, para adjudicação da empreitada designada por ASC 2000 - Piers e busgates - Túneis técnicos e corpo central da aerogare - Viaduto de ligação entre curbsides.

b) A este concurso, regulado pelo Decreto-Lei 59/99, de 2 de Março, apresentaram-se cinco concorrentes, os quais foram todos admitidos, bem como as respectivas propostas, conforme consta da acta do "acto público" realizado em 13 de Julho de 2001.

c) Entre outras entidades concorrentes, apresentaram proposta no referido concurso:

O concorrente n.º 1, agrupamento integrado por empresas com capacidade técnica genérica - a Somague Engenharia, S. A., a EDIFER, Construções Pires e Fernandes, S. A., a ZAGOPE, Construções e Engenharia, S. A., a Alberto Martins de Mes quita e Filhos, S. A., a Tomás de Oliveira Empreiteiros, S. A., e a ABB Gebäudetechnik, S. A. (empresa de instalações técnicas);

O concorrente n.º 3, agrupamento integrado por empresas com capacidade técnica genérica, a ENGIL, Sociedade de Construção Civil, S. A., e a Soares da Costa Construções, S. A.

d) Em 26 de Novembro de 2001, a comissão de abertura do concurso elaborou o primeiro relatório de avaliação da capacidade financeira, económica e técnica dos concorrentes, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 98.º do Decreto-Lei 59/99.

No n.º 6 desse relatório, sob a epígrafe "Capacidade técnica", pode ler-se o seguinte:

"A avaliação da capacidade técnica dos concorrentes foi efectuada com base nos documentos de referência solicitados nas alíneas l), n), o) e q) do n.º 1 do artigo 67.º do Decreto-Lei 59/99, de 2 de Março, bem como nas alíneas e) a h) do n.º 15.1, a) e b) do n.º 15.2 e g) e h) do n.º 15.3 do artigo 15.º do programa de concurso.

Na avaliação da capacidade técnica dos concorrentes para a execução da obra posta a concurso, atendeu-se ao critério estabelecido nas alíneas a), b) e c) do n.º 19.3 do respectivo programa de concurso.

Da análise efectuada aos mencionados documentos, a comissão constatou o seguinte:

Relativamente ao critério exigido na alínea a), do conjunto de empresas, Somague Engenharia, S. A., EDIFER - Construções Pires Coelho e Fernandes, S. A., ZAGOPE, Construções e Engenharia, S. A., Alberto Martins de Mesquita e Filhos, S. A., ABB Gebäudetechnik, S. A., e Tomás Oliveira, S. A., que constituem o concorrente n.º 1, verifica-se que a ABB Gebäudetechnik - relativamente à qual se considerou o valor de obras a que se refere a nota ao n.º 19.3 do programa - apresenta cinco certificados autenticados por donos de obra sem que, no entanto, deles conste o valor das obras executadas, e faltando também em alguns deles o respectivo prazo de execução; o valor das obras aparece unicamente referido em documentos emitidos pela própria empresa.

Deste modo, o concorrente não cumpre, no seu conjunto, os requisitos exigidos.

[...]

Do conjunto das empresas ENGIL, Sociedade de Construção Civil, S. A., e Soares da Costa, Construções, S. A., que constituem o concorrente n.º 3, nenhuma delas cumpre o exigido, documentando cada uma apenas duas obras de acordo com o solicitado [...]".

Neste sentido, a referida Comissão concluiu considerar não aptos os concorrentes n.os 1 e 3.

e) O concorrente n.º 1 apresentou, primeiro, reclamação desse primeiro relatório e, posteriormente, considerando tacitamente indeferida a reclamação, interpôs recurso hierárquico para o conselho de administração da ANA, em 23 de Janeiro de 2002.

f) O concorrente n.º 3 não apresentou qualquer reclamação.

g) Entretanto, em 31 de Janeiro de 2002, a comissão de abertura do concurso elaborou relatório de análise e apreciação das reclamações apresentadas, indeferindo expressamente a reclamação do concorrente n.º 1.

h) Por deliberação do conselho de administração de 5 de Fevereiro de 2002, foi deferido parcialmente o recurso hierárquico, na parte relativa à possibilidade de ser solicitado aos concorrentes que completem e ou explicitem os certificados e ou documentos apresentados, numa interpretação conforme ao direito comunitário, com base no artigo 28.º da Directiva n.º 93/37/CEE, de 14 de Junho.

i) Ao dar cumprimento ao deliberado pelo conselho de administração, entendeu a comissão, por unanimidade, enviar às sociedades que integram o agrupamento concorrente n.º 3, uma notificação para, no prazo de cinco dias úteis, apresentarem, querendo, os documentos que, em face do exigido no programa de concurso, completassem ou explicitassem os certificados e ou documentos já apresentados.

j) Em 22 de Fevereiro de 2002, o concorrente n.º 1 apresentou diversos documentos e o concorrente n.º 3 procedeu de igual modo em 25 do mesmo mês e ano.

l) Em 19 de Março de 2002, a comissão elaborou um segundo relatório de avaliação da capacidade financeira, económica e técnica, tendo deliberado considerar novamente não apto o concorrente n.º 1, em virtude de ter apresentado documentação nova que não completa documentos anteriormente exibidos e de mencionar obras concluídas em 2001, deliberação que foi objecto de reclamação apresentada em 4 de Abril de 2002.

Por sua vez, o concorrente n.º 3 foi considerado apto, revogando-se parcialmente a deliberação de 26 de Novembro de 2001, que aprovou o primeiro relatório de qualificação no que respeita à consideração do referido concorrente como não apto.

m) Entretanto, foi apresentada também reclamação pelo concorrente n.º 4, em 9 de Abril de 2002, alegando que não se deveria dar oportunidade ao concorrente n.º 1 para completar/esclarecer documentos anteriormente apresentados.

n) Em 17 de Abril de 2002, a comissão elaborou relatório de análise e apreciação das reclamações, tendo concluído pelo indeferimento das mesmas.

o) No seguimento da deliberação da comissão, foi interposto recurso hierárquico pelos concorrentes n.os 1 e 4.

p) O conselho de administração da ANA deliberou em 22 de Maio de 2002 indeferir os recursos hierárquicos com base nos fundamentos constantes da informação n.º 0123/DJUCON/MP.

q) Em 3 de Junho de 2002, o concorrente n.º 1 solicitou esclarecimentos das anteriores deliberações do conselho de administração, consequente admissão incondicional e sem reservas, bem como emissão de certidão da acta do conselho de administração da qual consta a deliberação do mesmo.

r) Em 12 de Julho de 2002, o conselho de administração da ANA deliberou indeferir o requerimento do concorrente n.º 1, na parte referente ao pedido para admissão incondicional e sem reservas, confirmando as deliberações anteriores.

s) De seguida, o concorrente n.º 1 apresenta, no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, requerimento de medidas provisórias, em 19 de Agosto de 2002.

t) Finalmente, em 12 de Setembro de 2002, o conselho de administração deliberou revogar (em parte) as deliberações anteriores de 22 de Maio e 12 de Julho de 2002, admitindo o concorrente n.º 1 e respectiva proposta, com base num parecer jurídico, por considerar bastante que duas empresas (empreiteiros gerais) preencham os requisitos exigidos no programa de concurso.

III - 1 - O excurso acabado de fazer permite-nos recortar um conjunto de questões suscitadas ao longo do presente concurso que se reportam fundamentalmente ao sentido e alcance a dar ao preceito constante do n.º 19.3, alínea a), do artigo 19.º do programa do concurso.

Mais concretamente, o problema central, a propósito deste preceito, respeita à determinação do critério que deve ser usado para avaliar a capacidade técnica de um agrupamento de empresas concorrente, para efeitos da sua qualificação, sobretudo quando integre empresas de instalações técnicas.

1.1 - Vejamos de perto o conteúdo dessas normas.

Na avaliação da capacidade técnica dos concorrentes para a execução da obra posta a concurso, deverão ser observados os critérios fixados no n.º 19.4 da Portaria 104/2001, de 21 de Fevereiro (ver nota 1).

No entanto, refere o n.º 19.5 da mesma portaria que, se a complexidade técnica, especialização e dimensão da obra o justificarem, tais critérios podem ser alterados, não tendo as entidades adjudicantes de observar os limites referenciados.

Em face da complexidade técnica, elevada especialização e dimensão da obra em causa, entendeu a ANA, com base no mencionado n.º 19.5 da Portaria 104/2001, fixar critérios de avaliação técnica mais exigentes, no n.º 19.3 do artigo 19.º do programa de concurso.

É o seguinte o conteúdo do mencionado preceito:

"19.3 - Na avaliação da capacidade técnica dos concorrentes para a execução da obra posta a concurso, o critério é o seguinte:

a) Possuir na lista de obras executadas nos últimos três anos (1998, 1999 e 2000) pelo menos três obras de valor igual ou superior a 3 000 000 000$ e de natureza idêntica à da obra colocada a concurso, acompanhadas de certificado autenticado de boa execução, passado pelo respectivo dono de obra."

Em nota à alínea a) do n.º 19.3, acrescentou-se que "no caso de se apresentarem ao concurso associações de empresas, deverão ser observados, no mínimo por duas das empresas concorrentes que constituem a associação, o requisito acima referenciado, excepto se a associação de empresas envolver empresas de instalações técnicas, relativamente às quais, e apenas a estas, aquele requisito não será exigido. Às empresas de instalações técnicas será então exigido possuir na lista de obras executadas nos últimos três anos, a que se refere a alínea f) do n.º 15.1 do artigo 15.º, pelo menos três obras de valor igual ou superior a 500 000 000$ para a especialidade de instalações eléctricas e de igual número e valor para a especialidade de instalações mecânicas".

1.2 - A resposta ao problema que vem posto exige que se convoque também o conteúdo das seguintes normas do programa do concurso:

"Artigo 15.º

Documentos de habilitação dos concorrentes

15.1 - Documentos a apresentar por todos os concorrentes:

a) ...

...

f) Lista das obras executadas da mesma natureza da que é posta a concurso, acompanhada de certificados de boa execução, relativos às obras mais importantes; os certificados devem referir o montante, data e local de execução das obras e se as mesmas foram executadas de acordo com as regras de arte e regularmente concluídas;

..."

"Artigo 9.º

Modalidade jurídica de associação de empresas

9.1 - Ao concurso poderão apresentar-se agrupamentos de empresas, sem que entre elas exista qualquer modalidade jurídica de associação, desde que todas as empresas do agrupamento satisfaçam as disposições legais relativas ao exercício da actividade de empreiteiro de obras públicas e comprovem, em relação a cada uma das empresas, os requisitos exigidos no artigo 15.º deste programa de concurso.

9.2 - A constituição jurídica dos agrupamentos não é exigida na apresentação da proposta, mas as empresas agrupadas serão responsáveis solidariamente, perante o dono de obra, pelo pontual cumprimento de todas as obrigações emergentes da proposta."

2 - Antes de iniciarmos a interpretação das normas pertinentes ao programa do concurso, impõe-se realçar que essa interpretação não pode deixar de ser influenciada pela natureza própria do procedimento de concurso em causa e os princípios que o regem.

Em direito administrativo vigora a regra segundo a qual os contratos administrativos devem ser precedidos de concurso público (ver nota 2).

"Por concurso público na celebração do contrato administrativo deve entender-se", nas palavras de Marcelo Rebelo de Sousa, "um procedimento administrativo visando escolher o co-contraente com base em simultâneos, proposta contratual e convite a contratar, dirigido a um elenco não predeterminado ou indeterminável de destinatários, em regime de concorrência, procedimento aquele que conclui com a adjudicação ou a recusa em adjudicar, mas de que decorre, de forma necessária - quanto ao concorrente escolhido e ao conteúdo essencial da proposta preferida - a celebração do contrato" (ver nota 3).

Também como ficou consignado no parecer 19/2002 (ver nota 4), "O concurso público constitui um processo complexo finalisticamente ordenado à escolha, em regime de concorrência, da proposta e do concorrente que se apresente em melhores condições para contratar, tendo em vista a melhor realização do interesse público que a administração pretende promover.".

Uma das principais funções apontada ao concurso público pela doutrina será a de permitir conciliar o interesse público que norteia a decisão de contratar e o legítimo interesse dos particulares em acederem, desta forma, às prestações de serviços ou execução das obras que constituem objecto do respectivo contrato (ver nota 5).

Do mesmo modo, a própria estrutura e tramitação do concurso asseguram a obtenção de decisões eficientes e racionais determinadas apenas pelo interesse público.

Neste sentido, constitui peça fundamental para a concretização destas funções a obrigatoriedade de a administração ponderar e tornar públicos, no programa do concurso e no caderno de encargos, os termos e condições em que ela aceita contratar (ver nota 6), nomeadamente os critérios de escolha dos candidatos e as regras que hão-de presidir à outorga do contrato.

Como este corpo consultivo já teve oportunidade de ponderar, "a realização do interesse público que a administração pretende promover através do contrato condiciona os termos e o conteúdo deste e a posição da administração face aos concorrentes, na definição das condições em que pretende contratar, como nos procedimentos de selecção e na prévia delimitação do conteúdo e dos termos do contrato".

"A função de fixação dos termos de vinculação da administração, tanto nas condições de aceitação e de escolha do contraente, como relativamente ao conteúdo do contrato, é realizada através do programa do concurso e do caderno de encargos, que integram a regulamentação dos procedimentos do concurso e das condições jurídicas e técnicas do contrato: a chamada norma do concurso (ver nota 7)."

Na doutrina, o programa de concurso é tratado como um regulamento (ver nota 8), uma vez que nele se inscrevem, de forma imperativa, os termos e as formalidades do procedimento adjudicatório e o seu regime fundamental.

Por sua vez, o caderno de encargos aparece definido na lei como o "documento que contém, ordenadas por artigos numerados, as cláusulas jurídicas e técnicas, gerais e especiais, a incluir no contrato a celebrar" (ver nota 9).

Ao conter normas "onde se vazam, dentro das margens consentidas por normas imperativas de categoria superior, as finalidades e os interesses particulares de cada concurso", tem também a natureza de regulamento (ver nota 10).

Temos, desta forma, que as disposições contidas no programa de concurso e no caderno de encargos, depois de patenteados ou publicitados, estes funcionam como um parâmetro normativo-regulamentar (ver nota 11) que vincula o dono da obra (ver nota 12) a proceder em concreto em conformidade com o estipulado até à adjudicação, sob pena de gerar a invalidade dos actos que as violem.

Deste parâmetro normativo-regulamentar faz parte integrante um conjunto de princípios que regem o concurso público e vinculam não apenas a autoridade adjudicante ao longo do concurso como estão igualmente presentes sempre que o intérprete seja chamado a eleger o sentido que deve prevalecer para determinada norma no caso concreto.

3 - Enquanto procedimento administrativo que é, o concurso público compreende uma sucessão ordenada e concatenada de actos e trâmites finalisticamente pré-ordenada à celebração do contrato administrativo, para a realização do interesse público que a administração tem em vista promover.

É sabido que a administração desfruta de lata margem de discricionaridade, enquanto projecção do princípio da autonomia pública, em matéria de concursos, nomeadamente no que concerne à abertura e adjudicação mas também na elaboração do programa e caderno de encargos.

No entanto, o exercício desse poder discricionário encontra-se limitado pela vinculação que impende sobre a administração derivada do conjunto de princípios gerais e específicos que enformam todo o procedimento de concurso desde a elaboração das suas próprias regras (ver nota 13).

A doutrina tem enunciado e construído esses princípios como princípios gerais de toda a actividade da Administração Pública (ver nota 14) com projecção no concurso público, tais como o da igualdade, a imparcialidade, a objectividade, ou como princípios específicos e típicos do concurso, a saber, os da publicidade, da concorrência e da estabilidade.

A estes princípios acresce, segundo a óptica de Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, "o princípio do 'favor' do concurso e dos concorrentes" (ver nota 15).

Não sendo este o lugar adequado nem oportuno para proceder à análise desenvolvida do conteúdo dos mencionados princípios, destacaremos aqueles que se nos afiguram pertinentes a uma resposta, devida, ao caso em apreço.

Relevantes para a decisão perfilam-se, desde logo, os princípios da igualdade e da imparcialidade.

Trata-se de dois princípios jurídicos fundamentais, com assento constitucional (cf. n.º 2 do artigo 266.º da CRP) (ver nota 16) e que norteiam toda a actividade da Administração Pública, ainda que regulada pelo direito privado.

Enquanto princípio estrutural da actividade administrativa, o princípio da igualdade projecta-se em todas as fases do procedimento adjudicatório, desde a fixação das condições do concurso, passando pelo acto público do concurso até à fase de apreciação e classificação das propostas, e "impõe à administração uma conduta estritamente igual para todos os concorrentes, impedindo-a de adoptar medidas (directas ou indirectas) de discriminação (jurídica ou fáctica) que possam beneficiar ou prejudicar qualquer ou quaisquer deles" (ver nota 17) (ver nota 18).

Importa, assim, realçar que a entidade adjudicante se encontra vinculada ao referido princípio não apenas na tomada de decisões concretas mas logo ao nível da elaboração do programa do concurso que não pode conter normas que conduzam a tratamento discriminatório entre os concorrentes.

Em relação ao princípio da imparcialidade, apesar das zonas de confluência com o princípio da igualdade, que levam vozes autorizadas a considerá-lo mero corolário deste (ver nota 19), a doutrina pronuncia-se, porém, pela consideração autónoma da imparcialidade (ver nota 20), caracterizando um espaço de densidade operativa mesmo no plano contratual.

O princípio da imparcialidade exige a prossecução objectiva de interesses públicos específicos predeterminados na lei, impondo à administração o dever de actuar exclusivamente com base em critérios próprios, lógico-racionais e estritamente jurídicos, não tolerando a sua substituição ou distorção por influência de interesses alheios às suas funções específicas ou considerações de natureza subjectiva.

Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, "o princípio da imparcialidade não impõe só a igualdade de tratamento, como ainda, e de modo especial, o dever por parte da Administração Pública de ponderar todos os interesses públicos secundários e os interesses privados equacionáveis para o efeito de certa decisão antes da sua adopção" (ver nota 21).

É desta forma possível analisar o princípio segundo duas vertentes: a negativa e a positiva.

No plano da vertente negativa, "proíbe-se à Administração Pública que actue de acordo com objectivos que não correspondem à prossecução dos interesses postos por lei a seu cargo [...]." Por outro lado, "no plano da vertente positiva, devem considerar-se parciais os actos ou comportamentos que manifestamente não resultem de uma exaustiva ponderação de interesses juridicamente protegidos" (ver nota 22) (ver nota 23).

Quanto ao princípio da concorrência, podemos dizer, no sentido da doutrina, que ele constitui, juntamente com os princípios da igualdade e da publicidade, a estrutura de referência básica do processo de contratação.

O conteúdo e alcance deste princípio, bem como a estreita associação entre os princípios mencionados, já foi objecto de análise por este corpo consultivo, tendo ficado consignado no parecer 19/2002 (ver nota 24) que se trata de um princípio "conatural ao concurso, que é, por essência, um procedimento que faz apelo à concorrência, sendo da natureza do procedimento que vários interessados disputem ('concorram') a escolha da administração e a celebração do contrato. O princípio pode ser considerado numa projecção externa, impondo que sejam admitidos ao concurso público todos aqueles que reúnam determinados requisitos de carácter geral previamente estabelecidos, com a maior abertura possível, ligando-se ao princípio da publicidade; e numa acepção processual, impondo um tratamento que não permita discriminações entre os concorrentes, nem limitações excessivamente formais na consideração das propostas, ligando-se e sendo integrado pelos princípios da imparcialidade e objectividade" (ver nota 25).

Finalmente, um procedimento adjudicatório dominado pelos princípios da formalidade e da concorrência não deixa grande espaço para a aplicação do princípio do "favor" ao concurso e ao concorrente, cujo alcance prático releva em situações limite de dúvida insanável sobre os resultados da interpretação da lei e da aplicação dos princípios gerais do concurso.

Na verdade, "Se valores jurídico-fundamentais - como o da adequação valorativa e da unidade interior do ordenamento jurídico-adjudicatório - não funcionarem, ou (noutra perspectiva) se anularem reciprocamente, então deve dar-se primazia aos valores sócio-administrativos inerentes à abertura do concurso e aos sacrifícios e incómodos, muitas vezes desmesurados, que apresentar uma candidatura ou proposta envolve" (ver nota 26).

Podemos em suma concluir que, além de comandar funcionalmente a administração, se trata de um princípio instrumental "da concorrência: na dúvida sobre a actuação ou sobre a interpretação das regras procedimentais, a administração deve escolher a solução que mantenha a integridade do concurso e a maior base de escolha" (ver nota 27).

IV - Como já adiantámos, a questão formulada radica essencialmente num problema de interpretação de normas do programa do concurso que, sendo um regulamento administrativo, há-de convocar a aplicação das regras gerais de hermenêutica jurídica, enquadradas pela adequada ponderação e consideração dos princípios mencionados e que regem o procedimento de concurso (ver nota 28).

1 - Interpretar uma norma não é mais do que fixar o sentido e alcance com que há-de valer, determinando o sentido decisivo (ver nota 29).

A letra ou o texto da norma é, naturalmente, o ponto de partida de toda a interpretação, constituindo a apreensão literal do texto já interpretação, embora incompleta, tornando-se sempre necessária uma "tarefa de interligação e valoração que escapa ao domínio literal" (ver nota 30).

Pode dizer-se que na actividade interpretativa, a letra da lei funciona simultaneamente como ponto de partida e limite de interpretação, sendo-lhe assinalada uma dimensão negativa que é a de eliminar tudo quanto não tenha qualquer apoio ou correspondência ao menos imperfeita no texto.

Note-se porém que a lei é antes de mais "um ordenamento de relações que mira a satisfazer certas necessidades e deve interpretar-se no sentido que melhor responda a essa finalidade, e portanto em toda a plenitude que assegure tal tutela".

Por conseguinte, para determinar o alcance de uma lei, o intérprete não pode limitar-se ao "sentido aparente e imediato que resulta da conexão verbal; é indagar com profundeza o pensamento legislativo, descer da superfície verbal ao conceito íntimo que o texto encerra e desenvolvê-lo em todas as direcções possíveis [...]. A missão do intérprete é justamente descobrir o conteúdo real da norma jurídica, determinar em toda a amplitude o seu valor, penetrar o mais que é possível [...] na alma do legislador, reconstruir o pensamento legislativo. Só assim a lei realiza toda a sua força de expansão e representa na vida social uma verdadeira força normativa" (ver nota 31).

Desta forma, na tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal intervêm elementos sistemáticos, históricos, racionais e teleológicos (ver nota 32).

O elemento sistemático compreende a consideração de outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretada, isto é, que regulam a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam questões paralelas; compreende ainda o lugar sistemático que compete à norma interpretada no ordenamento geral, assim como a sua concordância com o espírito ou a unidade intrínseca do sistema.

O elemento racional ou teleológico consiste na razão de ser da norma (ratio legis), no fim visado pela edição da norma, nas soluções que tem em vista e que pretende realizar.

Na função de interpretação, socorrendo-se dos instrumentos dogmáticos referidos, o intérprete não se deve restringir a uma leitura imediatista do texto da norma, aceitando o sentido que, aparentemente, daí imediatamente decorre mas deve combinar todos esses elementos numa tarefa de conjunto de modo a descobrir o sentido decisivo da norma (ver nota 33).

2 - De todo o modo, como vimos, a primeira referência de interpretação deve ser, pois, a letra, o texto da norma.

Cumpre desta forma tentar averiguar qual o sentido da norma constante do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa do concurso, tendo presentes as regras de hermenêutica jurídica referenciadas e à luz dos princípios aplicáveis ao concurso público.

Recorde-se que no mencionado preceito se estabelece o critério geral que preside à avaliação da capacidade técnica dos concorrentes, nos seguintes termos:

Os concorrentes têm de comprovar ter executado nos últimos três anos (1998, 1999 e 2000) pelo menos, três obras de valor igual ou superior a 3 000 000 000$ e de idêntica natureza da obra colocada a concurso, devendo, para o efeito, juntar certificado autenticado de boa execução.

Afigura-se que seja este o critério geral definido, desde logo, para empresas que se candidatem isoladamente.

Para o caso de se apresentarem a concurso associações de empresas, prevê o programa de concurso que, nesta situação, este critério geral tenha de ser preenchido pelo menos por duas empresas.

Até aqui o preceito parece não levantar dúvidas.

A nota à alínea a) do n.º 19.3, diz taxativamente que "no caso de se apresentarem ao concurso associações de empresas, deverão ser observados, no mínimo por duas empresas concorrentes que constituem a associação o requisito acima mencionado".

As dúvidas começam precisamente a partir da expressão "excepto se a associação de empresas envolver empresas de instalações técnicas, relativamente às quais, e apenas a estas, aquele requisito não será exigido. Às empresas de instalações técnicas será então exigido possuir na lista de obras executadas nos últimos três anos, a que se refere a alínea f) do n.º 15.1 do artigo 15.º, pelo menos três obras de valor igual ou superior a 500 000 000$ para a especialidade de instalações eléctricas e de igual número e valor para a especialidade de instalações mecânicas".

O preceito parece querer estabelecer uma excepção para o caso de um agrupamento integrar empresas de instalações técnicas, residindo a questão precisamente na determinação do sentido e âmbito dessa excepção.

No caso em apreço, entendeu a comissão de abertura do concurso considerar não apto, para a execução da obra posta a concurso, o concorrente n.º 1, porquanto uma das empresas que integra o agrupamento - a ABB, empresa de instalações técnicas - não demonstrou possuir na lista de obras executadas "pelo menos três obras de valor igual ou superior a 500 000 000$ para a especialidade de instalações eléctricas e de igual número e valor para a especialidade de instalações mecânicas" (2.ª parte da nota à alínea a) do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa do concurso).

Se se tiver em conta que o agrupamento em causa integra duas empresas com capacidade técnica genérica, que demonstram possuir o requisito geral previsto na primeira parte do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa, tal significa, na óptica da comissão, que desde que um agrupamento associe empresas de instalações técnicas estas deverão também demonstrar observar o requisito de capacidade técnica, sob pena de o mesmo se considerar inapto.

Segundo este modo de ver as coisas, o artigo 19.º do programa estabeleceria:

Um requisito geral [(constarem da lista de obras executadas nos últimos três anos (1998, 1999 e 2000) pelo menos três obras de valor igual ou superior a 3 000 000 000$ e de natureza equivalente à da obra colocada a concurso, acompanhadas de certificado autenticado de boa execução, passado pelo respectivo dono de obra], aplicável às empresas que entendessem concorrer isoladamente e aos agrupamentos que integrassem apenas empresas com capacidade técnica genérica. Sendo que neste caso o requisito geral teria de ser observado pelo menos por duas empresas qualquer que fosse o número de empresas agrupadas;

Um requisito especial aplicável aos agrupamentos em cuja composição participassem empresas de instalações técnicas.

Com efeito, neste caso, segundo o ponto de vista da comissão, não seria suficiente que pelo menos duas empresas com capacidade genérica demonstrassem observar o requisito geral. Havendo empresas de instalações técnicas, estas teriam também de fazer demonstração da capacidade técnica, de acordo com o requisito específico previsto na parte final da nota à alínea a) do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa.

Posto isto, ficaria por apurar, dentro destas últimas, como melhor será analisado mais adiante, o número e o tipo de empresas que deveriam, então, demonstrar a capacidade técnica.

Vejamos, então, se procede a interpretação sustentada pela comissão.

2.1 - Regressando ao teor literal do preceito, indaguemos se a expressão "excepto", em causa, pretende referir-se ao número de empresas que terão de observar o requisito de capacidade técnica ou se dirige apenas ao requisito geral que as empresas têm de observar.

A conclusão mais próxima do texto vai no sentido de a referida expressão se reportar imediatamente ao requisito geral estabelecido na primeira parte do preceito.

Repare-se que tal expressão afigura-se estar naturalmente ligada ao requisito geral a que se refere a primeira parte do preceito, ligação acentuada, depois, com o enunciado de um novo requisito feito às empresas de instalações técnicas.

Parece claro que se pretendeu afastar das empresas de instalações técnicas a aplicação do requisito geral feito às demais empresas, estabelecendo-se, para aquelas, algo adequado à sua própria natureza.

Com efeito, não poderia ser exigida àquele tipo de empresas a apresentação de uma lista de obras equivalentes da que é levada a concurso quando, tecnicamente, elas não se encontram habilitadas a satisfazê-la (ver nota 34).

O que se extrai do texto é que, tratando-se de associações de empresas, o requisito geral deve ser observado, no mínimo, por duas empresas concorrentes mas, se o agrupamento envolver empresas de instalações técnicas, em relação a estas a capacidade técnica será aferida com base na apresentação da lista de obras constante da segunda parte da nota à alínea a) do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa (requisito de capacidade especial).

Se o preceito pretendesse referir-se ao número de empresas que têm de observar os requisitos de capacidade técnica, então teria muito simplesmente mencionado esse número em vez de proceder ao enunciado de um requisito especial para as empresas de instalações técnicas.

Acresce que interpretar o preceito no sentido de imputar a expressão "excepto" ao número de empresas levanta outro problema.

Com efeito, no caso de um agrupamento integrar empresas técnicas, coloca-se a questão de saber quantas e em relação a quais seria de exigir a observância dos requisitos de idoneidade técnica.

Será que tal exigência haveria de ser dirigida apenas às empresas de instalações técnicas? Mais ainda: sempre faltaria, aqui, determinar o número de empresas obrigadas a demonstrar a idoneidade técnica. Estariam todas elas obrigadas a tal demonstração ou bastaria que apenas algumas a fizessem?

Cremos que seria excessivo interpretar o programa de concurso no sentido de que, apresentando-se ao concurso agrupamentos integrando empresas de instalações técnicas, fosse exigido a todas elas o cumprimento do requisito da idoneidade técnica.

Por outro lado, como melhor será analisado em seguida, a demonstração da capacidade técnica não pode limitar-se às empresas de instalações técnicas, dada a sua manifesta incapacidade para executarem a totalidade da obra.

Fica de todo o modo evidenciado que a interpretação da comissão, além de não ter acolhimento no teor literal do preceito, se depara com os obstáculos apontados, aos quais o programa do concurso não dá resposta.

Torna-se, pois, necessário lançar mão de outros critérios relevantes de interpretação, designadamente a finalidade da norma e os interesses a cuja realização se destina, sem descurar, porém, que o texto da norma desempenha sempre uma função limite: não pode valer com um sentido que não tenha na expressão literal um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expressa - artigo 9.º do Código Civil.

2.2 - Vejamos, então, se a mencionada interpretação é ou não confortada pela razão de ser do preceito.

Ao fixar os critérios de idoneidade ou capacidade técnica, o fim visado pela entidade adjudicante é o de garantir que a obra, objecto do concurso, seja executada por quem demonstre ter capacidade para o fazer.

Atenta a complexidade técnica, a especialização e a dimensão da obra, compreende-se que a entidade adjudicante tenha sido mais exigente na fixação dos critérios.

Mas a questão que se coloca é a de saber se subsistem ou não razões para impor mais exigências aos agrupamentos que associem empresas de instalações técnicas.

Segundo a entidade adjudicante, havendo empresas deste tipo, o objectivo seria responsabilizá-las também.

"Efectivamente", refere aquela entidade, "a presença de empresas de instalações técnicas em associações de empresas concorrentes significa que serão essas empresas as responsáveis pela execução dos trabalhos inerentes às instalações que se integram no objecto da presente empreitada. Ora, nesse caso, não pode deixar de se reconhecer a necessidade de se proceder à avaliação da capacidade técnica específica dessas mesmas empresas, sob pena de se permitir a realização de avultados trabalhos de instalações técnicas por empresas cuja capacidade técnica não havia sido avaliada" (ver nota 35).

Ora, em primeiro lugar, a presença de empresas de instalações técnicas, em caso de concorrentes em associação de empresas, não significa necessariamente que tenham de ser elas a assumir a responsabilidade pela execução dos trabalhos inerentes às instalações técnicas que se integram no objecto da obra em causa.

Note-se que nos termos do n.º 6.2 do programa as empresas com capacidade técnica genérica têm de estar habilitadas a executar as instalações técnicas, uma vez que o respectivo certificado tem de conter a classificação como empreiteiro geral de obras públicas da 1.ª categoria - edifícios (ver nota 36) -, da 3.ª categoria - vias de comunicação, obras de urbanização e outras infra-estruturas -, da 5.ª categoria - instalações eléctricas e mecânicas (ver nota 37) - e da 6.ª categoria - outros trabalhos -, todas mencionadas no n.º 1.º da Portaria 412-I/99.

Por outro lado, nos termos do programa do concurso, como ficou dito, para que se considere qualificada uma empresa de capacidade técnica genérica ela tem de demonstrar possuir experiência em obras de natureza da obra posta a concurso, o que abrange todos os trabalhos de empreitada, incluindo os de instalações técnicas.

Temos, por conseguinte, que o facto de um agrupamento integrar empresas técnicas, cuja capacidade não seja demonstrada, tal não significa que o mesmo não dê garantias de idoneidade para a execução da obra, desde que associe empresas com capacidade genérica que provem estar habilitadas tecnicamente para o efeito.

O que não seria concebível era considerar qualificável como apto um agrupamento que integrasse unicamente empresas de instalações técnicas, uma vez que as mesmas não podem dar garantias de boa execução da totalidade da obra.

Assim sendo, ainda que segundo uma interpretação estritamente literal tal fosse possível, como pretende a comissão, essa solução seria frontalmente contrária à rácio da norma que estabelece os requisitos de capacidade técnica.

Acresce que, segundo o artigo 9.º do programa, "ao concurso poderão apresentar-se agrupamentos de empresas, sem que entre elas exista qualquer modalidade jurídica de associação, desde que todas as empresas do agrupamento satisfaçam as disposições legais relativas ao exercício da actividade de empreiteiro de obras públicas" (ver nota 38).

Tal possibilidade significa que, a par de entidades que se apresentem individualmente, podem concorrer conjuntamente várias empresas associadas para o efeito, numa posição concertada e conjunta.

No presente concurso, os concorrentes, cientes da complexidade técnica, especialização e dimensão da obra e para melhor responderem às exigências do concurso, optaram por se constituir em agrupamentos de empresas.

No entanto, o normativo do concurso não exige que os concorrentes em associação de empresas integrem necessariamente empresas de instalações técnicas nem sequer exige, quando estas existam, que devam ser elas a assumir a responsabilidade pela execução da parte técnica das obras.

Por outro lado, ainda segundo o programa do concurso, "a constituição jurídica dos agrupamentos não é exigida na apresentação da proposta, mas as empresas agrupadas serão responsáveis solidariamente, perante o dono da obra, pelo pontual cumprimento de todas as obrigações emergentes da proposta" (n.º 9.2 do artigo 9.º do programa).

Assim sendo, um agrupamento sem empresas técnicas tem legitimidade para concorrer e terá de considerar-se tecnicamente qualificado se duas empresas de construção civil cumprirem os requisitos da primeira parte do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa de concurso.

É precisamente o que se verifica, no caso sub judicio, em relação ao concorrente n.º 5 (ver nota 39).

O referido concorrente, cujo agrupamento não integra empresas de instalações técnicas, foi qualificado tecnicamente como apto pela comissão pelo facto de as duas empresas de construção civil que o integram cumprirem o requisito da primeira parte do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa de concurso.

Ora, aqui chegados, cumpre questionar por que razão há-de considerar-se este agrupamento apto e o agrupamento que integra o concorrente n.º 1 como não apto se ambos integram duas empresas de capacidade genérica que demonstram reunir o critério geral de idoneidade técnica?

Na óptica da comissão, como o agrupamento do concorrente n.º 1 integra empresas de instalações técnicas, sobre elas recai também pura e simplesmente a obrigação de fazer a demonstração do requisito específico de idoneidade técnica.

Ora, a verdade é que não se vêem razões fundadas e razoáveis para exigir que nesta situação as empresas técnicas tenham também de demonstrar os requisitos de idoneidade.

A seguir-se outro entendimento, estaríamos a ser mais exigentes com os agrupamentos que integram empresas de instalações técnicas, e a introduzir um factor discriminatório entre agrupamentos consoante a sua composição (ver nota 40).

2.3 - Com efeito, como vimos, o princípio da igualdade obriga a entidade adjudicante a tratar todos os efectivos concorrentes nas mesmas condições, concedendo-lhes as mesmas oportunidades sem fazer qualquer discriminação entre eles.

Constitui exigência básica deste princípio, num primeiro momento, que as condições de admissibilidade ao concurso sejam rigorosamente as mesmas para todos os potenciais candidatos.

De seguida, o referido princípio impõe que a entidade adjudicante trate todos os efectivos concorrentes nas mesmas condições, concedendo-lhes as mesmas oportunidades sem fazer qualquer discriminação entre eles.

Referindo-se ao iter cognitivo que deve ser seguido com vista a averiguar se uma medida administrativa é ou não discriminatória, Freitas do Amaral pondera que se deve começar por perscrutar, através da interpretação, o fim visado por essa medida; "depois, isolam-se as categorias que, para realizar tal fim, são, nessa medida, objecto de tratamento idêntico ou diferenciado; finalmente, questiona-se se, para a realização do fim tido em vista, é ou não razoável, à luz dos valores dominantes do ordenamento, proceder àquela identidade ou distinção de tratamento: se é razoável, não há violação do princípio da igualdade; se não é, então há violação do princípio da igualdade" (ver nota 41).

Concomitantemente, o princípio da concorrência priva a administração de proibir ou obstacularizar o acesso de determinados candidatos ao concurso, a fim de assegurar a competição entre o maior número possível.

Este princípio assume aqui uma particular vinculação normativa se se tiver em conta que a possibilidade de apresentação de candidaturas conjuntas em concursos públicos teve em vista garantir precisamente o incremento de uma efectiva concorrência no sector das empreitadas de obras públicas, e possibilitar a abertura do mercado a pequenas empresas ou, quando menos, às de média dimensão (ver nota 42).

Vimos também que, se por um lado constitui exigência do princípio da imparcialidade a actividade administrativa desenvolver-se unicamente a partir dos interesses públicos específicos que lhe incumbe prosseguir, de modo que não "haja qualquer discriminação no tratamento que dê favores ou cause prejuízos a algum dos outros interesses concorrentes no caso" (ver nota 43), temos, por outro lado, que fere igualmente o princípio, uma decisão não resultante de uma ponderação que considere todos os interesses concretos presentes, no caso, e juridicamente relevantes (ver nota 44).

Ora, no caso sub judicio, afigura-se claro que a interpretação da comissão tem subjacente um défice de ponderação de um dos interesses específicos prosseguidos pelo concurso público e que é o de permitir a satisfação do interesse público concreto da forma mais vantajosa possível através da concorrência.

Neste sentido, é sabido que quanto maior for o número de ofertas contratuais, mais possibilidades de escolha tem a administração, sem esquecer que, sendo maior o número de ofertas mais procurarão os concorrentes optimizar as suas propostas, (ver nota 45) com reflexos positivos na economicidade das decisões administrativas.

Assim, em caso de dúvida sobre o sentido e alcance das normas do concurso, desde que respeitados os princípios da formalidade (ver nota 46) e da concorrência e, neste caso, até para benefício do princípio da concorrência na perspectiva da realização do interesse público, a solução deveria reverter também em favor do concorrente, por força do princípio do "favor" ao concurso e aos concorrentes.

Finalmente, a violação do ónus que impende sobre a administração de elaborar programas contendo normas claras e precisas (ver nota 47), não pode acabar por recair sobre os candidatos prejudicando-os.

Por tudo quanto vai exposto, considerando os elementos literal e lógico-racional e, à luz dos princípios da igualdade, da imparcialidade, da concorrência e do "favor" ao concurso e aos concorrentes, para qualificar tecnicamente um agrupamento, seja qual for a sua composição, basta, de acordo com a norma do n.º 19.3, alínea a), do artigo 19.º do programa do concurso, que pelo menos duas das empresas que o compõem observem os requisitos de idoneidade referenciados: uma dessas empresas tem de ser, necessariamente, de capacidade técnica genérica e tem de observar o requisito geral previsto na alínea a); a outra empresa pode ser de capacidade técnica genérica ou uma empresa de instalações técnicas, sendo que neste último caso ela terá de observar o requisito específico de idoneidade fixado na segunda parte da nota à referida alínea.

Assim sendo, no caso em apreço, encontrando-se preenchido o requisito previsto na primeira parte do n.º 19.3 do artigo 19.º por duas empresas de construção civil, que integram o agrupamento que corresponde ao concorrente n.º 1, deverá dar-se por verificado o critério geral de qualificação técnica, sendo irrelevante verificar se as empresas de instalações técnicas observam ou não o requisito específico.

V - A propósito da qualificação da capacidade técnica dos agrupamentos contendo empresas de instalações técnicas, distingam-se ainda dois problemas relacionados com o sentido e alcance do n.º 19.3, alínea a), do artigo 19.º do programa do concurso.

1 - Em primeiro lugar, coloca-se a questão de saber se a lista das obras executadas, da mesma natureza daquela que é posta a concurso, acompanhada de certificados de boa execução, mencionada na alínea f) do n.º 15.1 do artigo 15.º do programa do concurso e para a qual remete a nota à alínea a) do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa de concurso, é ou não extensível, nos mesmos termos, às empresas de instalações técnicas.

O problema foi suscitado em relação ao concorrente n.º 1, cujo agrupamento integra uma empresa técnica (a ABB Gebäudetechnik), que apresentou "cinco certificados por donos de obra sem que, no entanto, deles conste o valor das obras executadas e faltando também em alguns deles o respectivo prazo de execução; o valor das obras aparece unicamente referido em documentos emitidos pela própria empresa".

A segunda parte da nota à alínea a) do n.º 19.3 do artigo 19.º do programa do concurso dispõe que "Às empresas de instalações técnicas será então exigido possuir na lista de obras executadas nos últimos três anos a que se refere a alínea f) do n.º 15.1 do artigo 15.º pelo menos três obras de valor igual ou superior a 500 000 000$ para a especialidade de instalações eléctricas e de igual número e valor para a especialidade de instalações mecânicas".

Recordando o teor do n.º 15.1 do programa relativo aos documentos de apresentação obrigatória para aferir a capacidade, verifica-se conter, na alínea f), que os concorrentes devem apresentar "lista das obras executadas da mesma natureza da que é posta a concurso, acompanhada de certificados de boa execução, relativos às obras mais importantes; os certificados devem referir o montante, data e local de execução das obras e se as mesmas foram executadas de acordo com as regras de arte e regularmente concluídas".

Já vimos que em relação às empresas de instalações técnicas não pode ser exigida a apresentação de "lista das obras executadas da mesma natureza da que é posta a concurso", mas sim a lista a que faz referência a parte final da nota à alínea a).

A mencionada remissão não pode, por conseguinte, interpretar-se no sentido de uma remissão global ou genérica para o n.º 15.1 do artigo 15.º, alínea f), do programa.

Impõe-se, deste modo, determinar o seu âmbito, devendo a remissão processar-se com as devidas adaptações, de forma a alcançar-se algum sentido útil que cumpra ou satisfaça o fim visado e subjacente à exigência da apresentação do documento em causa.

Já sabemos que, para a avaliação da sua capacidade técnica, devem as empresas de instalações técnicas apresentar documento contendo lista de obras da sua especialidade ("pelos menos três obras de valor igual ou superior a 500 000 000$ para a especialidade de instalações eléctricas e de igual número e valor para a especialidade de instalações mecânicas").

O que se questiona é se essa lista de obras deverá ser acompanhada de certificados de boa execução, contendo menção do montante, data e local de execução das obras, tal como é exigido às empresas de capacidade genérica.

Ora, em primeiro lugar, é preciso ter em conta que está em causa a avaliação da capacidade técnica das empresas, o que pressupõe que sejam dadas garantias à entidade adjudicante de boa execução da obra objecto do concurso.

Para esse efeito, quanto maior informação contiver a lista apresentada, maiores são as possibilidades de a administração proceder a uma avaliação correcta das empresas.

Em segundo lugar, se uma empresa de instalações técnicas pode concorrer em igualdade de condições com as empresas de capacidade genérica para o número de duas empresas que é exigido como critério geral de qualificação, não se vêem razões para se ser menos exigente quanto ao conteúdo da informação que é preciso obter para concretizar essa avaliação.

Por outro lado, excluir-se do âmbito da remissão em análise a referência aos certificados e respectivas menções, o mesmo é dizer que tal remissão fica desprovida de qualquer sentido útil.

Assim, tendo presente a finalidade visada pelos preceitos em causa e por exigência dos princípios da igualdade e da concorrência, da interpretação conjugada da segunda parte da norma da alínea a) do n.º 19.3 do artigo 19.º, com a alínea f) do n.º 15.1 do artigo 15.º do programa do concurso, deve concluir-se que o sentido útil da remissão operada é o de determinar os termos em que as empresas de instalações técnicas devem apresentar a sua lista de obras, quais sejam, os de vir acompanhada de certificados de boa execução, com as menções exigidas na parte final da alínea f).

2 - Em segundo lugar, ainda a propósito da qualificação da capacidade técnica das empresas de instalações técnicas, põe-se o problema de saber qual o sentido e alcance da parte final da nota à alínea a) do n.º 19.3 do programa de concurso, quando refere que na lista de obras executadas devam constar "pelo menos três obras de valor igual ou superior a 500 000 000$ para a especialidade de instalações eléctricas e de igual número e valor para a especialidade de instalações mecânicas".

Mais concretamente, pergunta-se se o requisito tem de ser observado por cada empresa de instalações técnicas, que nesse caso teria de apresentar no seu currículo seis obras (três de instalações eléctricas e três de instalações mecânicas) ou se essas seis obras podem ser repartidas por duas empresas (uma de instalações eléctricas e outra de instalações mecânicas), contribuindo cada uma delas com três obras em conformidade com a respectiva especialidade.

Já vimos que uma empresa de instalações técnicas pode contribuir, associada a uma empresa de capacidade genérica, para a qualificação de um agrupamento como apto.

O que se retira com segurança, do normativo do concurso, quanto à qualificação da capacidade técnica dos agrupamentos contendo empresas de instalações técnicas, segundo uma interpretação mais próxima do teor literal, corroborada pela utilização da conjunção copulativa "e", vai no sentido de, neste caso, as empresas técnicas terem de apresentar lista de seis obras, sendo três de instalações eléctricas e três de instalações mecânicas.

A administração terá erigido, como critério adequado à avaliação da capacidade técnica destas empresas, a apresentação de uma lista de seis obras, três de cada especialidade.

Mas não parece resultar de forma inequívoca da letra do preceito que cada uma das empresas de instalações técnicas seja obrigada a apresentar, necessariamente, a referida lista de seis obras.

Por conseguinte, se um agrupamento se candidata com duas empresas de instalações técnicas que conseguem apresentar no seu conjunto a lista das seis obras, afigura-se preenchida a razão de ser e o objectivo prático do normativo do programa quanto à exigência de garantias de idoneidade técnica.

Por outro lado, repare-se que não obstante as instalações eléctricas e as instalações mecânicas integrarem a 5.ª categoria prevista na Portaria 421-I/99, as subcategorias (ver nota 48) que nela se incluem dizem respeito a trabalhos especializados de natureza e complexidade muito diferentes, o que leva a que se encontrem muito poucas empresas que desenvolvam, cumulativamente, trabalhos substancialmente tão diferentes (ver nota 49).

Tal significa, em termos práticos, ser muito difícil encontrar, por força da especialização que isso implica, empresas de instalações técnicas aptas a apresentarem lista de três obras de especialidades mecânicas e três de especialidades eléctricas, com implicações negativas na concorrência.

É também de realçar que a exigência de cada empresa apresentar certificados de seis obras das especialidades solicitadas, executadas nos últimos três anos, de valor igual ou superior a 500 mil contos cada, pode revelar-se em concreto um critério desproporcionado, atendendo à contribuição do trabalho das empresas de instalações técnicas para o valor global da obra em causa.

Com efeito, seis obras no valor de 500 000 000$ acaba por perfazer um valor equivalente ao montante que é exigido para as empresas de capacidade técnica genérica, quando se sabe, à partida, que a participação das empresas de instalações técnicas é sempre menor do que a das primeiras.

Podemos desta forma concluir que uma interpretação do segmento normativo em causa, no sentido de se exigir que seja a mesma empresa a apresentar certificados de seis obras das especialidades solicitadas, além de desadequada, tendo em conta a realidade que rodeia o desenvolvimento da actividade das empresas em causa, pode revelar-se em concreto desproporcionada.

De todo o modo, afigura-se evidente que mais uma vez a administração não adoptou, como estava obrigada, normas claras e precisas com eventuais reflexos negativos em princípios basilares do concurso como o da igualdade e da concorrência.

Assim sendo, considerando a razão de ser do preceito, e os princípios mencionados, propende-se, nesta fase de análise de documentos que permitem a qualificação técnica dos candidatos, para a adopção de uma interpretação mais favorável aos concorrentes, em conformidade com o princípio do "favor" ao concurso e aos concorrentes.

Neste sentido, deve entender-se que a norma em causa não exclui que se qualifique como apto um agrupamento composto por duas empresas de instalações técnicas (uma de instalações eléctricas e outra de instalações mecânicas), quando cada uma delas disponha de lista de três obras em conformidade com a sua especialidade (ver nota 50).

VI - Resta agora analisar uma segunda ordem de questões que já não têm a ver com a interpretação de normas do programa do concurso.

1 - Um primeiro problema prende-se com a aplicação, no presente concurso, da Directiva Comunitária n.º 93/37/CEE, de 14 de Junho, mais propriamente da norma constante do artigo 28.º

1.1 - O Decreto-Lei 59/99 distingue entre "habilitação" (ou admissão) de concorrentes e "qualificação" dos mesmos (cf. artigos 92.º e 98.º, respectivamente).

Para serem admitidos a um concurso de empreitada de obras públicas, estão os concorrentes obrigados a apresentar um conjunto de documentos destinados a comprovar a sua idoneidade (cf. n.º 3 do artigo 67.º), bem como a sua capacidade económica e financeira (cf. n.º 4 do artigo 67.º) e técnica (cf. n.º 5 do artigo 67.º), nos termos do disposto nos artigos 67.º e seguintes do mesmo diploma.

A habilitação dos concorrentes resulta exclusivamente da verificação de todos os documentos cuja apresentação é exigida nos termos da lei (cf. artigo 67.º do Decreto-Lei 59/99) e do programa de concurso, e tem lugar na sessão do "acto público" do concurso (ver nota 51).

Depois de terminada a sessão do "acto público" do concurso, a comissão de abertura do concurso vai de seguida averiguar se os concorrentes, apesar de habilitados a participarem no concurso, possuem as condições financeiras, económicas e técnicas exigidas para o efeito da sua "qualificação" (cf. artigos 98.º e seguintes do Decreto-Lei 59/99) (ver nota 52).

Os documentos destinados à comprovação da capacidade técnica e financeira, para além de uma função de habilitação dos concorrentes, são também chamados para o efeito da "qualificação" dos mesmos, o que pressupõe um juízo de avaliação por parte da comissão, destinado a verificar a sua aptidão (ver nota 53).

Se um candidato não apresentar algum documento exigido por lei ou pelo programa do concurso, quer diga respeito à comprovação da idoneidade quer respeite à comprovação da capacidade técnica e financeira, ele será excluído por falta de habilitação (cf. artigo 92.º do Decreto-Lei 59/99).

No entanto, se a comissão entender, após a análise dos documentos destinados a avaliar a capacidade técnica e financeira dos candidatos que estes não cumprem os critérios preestabelecidos, a decisão será igualmente de exclusão mas agora por falta de qualificação (cf. artigo 98.º, n.º 3, do Decreto-Lei 55/99).

Nos termos do n.º 2 do artigo 92.º do Decreto-Lei 59/99, são excluídos na fase de habilitação, os concorrentes:

"a) Que não tenham apresentado todos os documentos de habilitação de apresentação obrigatória ou que apresentem qualquer deles depois do termo do prazo fixado para a apresentação das propostas;

b) Que não apresentem os documentos redigidos em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada ou, não o sendo, com declaração por parte do concorrente de que aceita a sua prevalência nos termos do n.º 1 do artigo 71.º;

c) Cujos documentos careçam de algum elemento essencial cuja falta não possa ser suprida nos termos do n.º 3."

Por sua vez, o n.º 3 do mesmo preceito estatui:

"3 - A comissão admite, condicionalmente, os concorrentes cujos documentos sejam apresentados com preterição de formalidades não essenciais, devendo, porém, tais irregularidades ser sanadas no prazo de dois dias, sob pena de ficar sem efeito a admissão e serem excluídos do concurso."

Temos, por conseguinte, que se encontra expressamente prevista a admissão condicional para os casos de preterição de formalidades não essenciais nos documentos respeitantes à habilitação dos concorrentes.

Observe-se, porém, que em relação à avaliação da capacidade técnica, o Decreto-Lei 59/99 não contempla semelhante hipótese (ver nota 54).

Com efeito, neste caso, apenas se admite que o concorrente reclame da decisão de exclusão ou admissão de um concorrente (cf. n.º 6 do artigo 98.º do Decreto-Lei 59/99).

1.2 - Na situação em apreço, no âmbito da qualificação dos concorrentes, a Comissão deliberou considerar não apto o concorrente n.º 1, porque, ao analisar os documentos por ele apresentados, verificou que uma empresa do agrupamento (a ABB Gebäudetechnik) apresentava cinco certificados autenticados por donos de obra sem mencionar o valor das obras executadas nem, em alguns casos, o respectivo prazo de execução, sendo que a referência aos valores em falta é feita em documentos emitidos pela própria empresa (ver nota 55).

Notificado da decisão de exclusão, o concorrente n.º 1 começou por reclamar, e, posteriormente, recorreu hierarquicamente do indeferimento tácito da reclamação (ver nota 56).

Entre os fundamentos apresentados, argumentou o recorrente que a comissão poderia ter feito apelo ao disposto na Directiva Comunitária n.º 93/37/CEE, de 14 de Junho, por efeito directo vertical, "convidando o empreiteiro a completar os certificados e documentos apresentados ou a explicitá-los" (ver nota 57).

O conselho de administração da ANA, por deliberação de 5 de Fevereiro de 2002 (ver nota 58), deferiu parcialmente o recurso hierárquico na parte em que decidiu que fosse notificado o empreiteiro para completar os certificados com as menções em falta, com fundamento no artigo 28.º da Directiva n.º 93/37/CEE, de 14 de Junho.

Importa, pois, analisar, num primeiro momento, se a referida deliberação, no aspecto mencionado, merece ou não algum reparo.

1.3 - O artigo 28.º da Directiva n.º 93/37/CEE tem o seguinte conteúdo:

"A entidade adjudicante pode, dentro dos limites dos artigos 24.º a 27.º, convidar o empreiteiro a completar os certificados e documentos apresentados ou a explicitá-los".

Verifica-se que o referido preceito se integra no capítulo 2, que tem como epígrafe "Critérios de selecção qualitativa" e que os artigos 25.º a 27.º se referem aos critérios de avaliação da capacidade financeira, económica e técnica.

Atenta a inserção sistemática do artigo 28.º, não se oferecem dúvidas de que na economia da directiva se aponta de forma clara para a possibilidade de a entidade adjudicante, relativamente à avaliação da capacidade económica, financeira e técnica, poder "convidar o empreiteiro a completar os certificados e documentos apresentados ou a explicitá-los".

O Decreto-Lei 59/99 procedeu à transposição da mencionada directiva para a ordem interna mas, como já tivemos oportunidade de adiantar, não acolheu tal possibilidade (ver nota 59).

Se se tiver em conta que a finalidade da consagração do mecanismo em causa se funda essencialmente em não "precludir abrupta e irremediavelmente a admissão de propostas por razões de mera forma e que radica na essência de um dos pilares da ordem jurídica comunitária - o da abertura e estímulo à concorrência" (ver nota 60) -, somos levados a concluir tratar-se da omissão de um expediente vocacionado para acautelar de forma rápida e simples não só os interesses dos concorrentes como o interesse público.

O Tribunal de Justiça das Comunidades tem vasta jurisprudência reiterada sobre os critérios de aplicabilidade directa de normas comunitárias, que têm essencialmente a ver com a natureza e conteúdo da norma, a saber (ver nota 61):

a) A positividade da norma, no sentido de que se trate de uma regra de direito positivo, de uma norma preceptiva e não meramente programática;

b) A suficiência da norma, o que significa que se trate de uma disposição normativa que contenha todos os elementos necessários para ser efectivamente aplicada à situação concreta sub judice, dispensando quaisquer medidas regulamentares ou legislativas destinadas a completá-la;

c) A incondicionalidade, o que pressupõe uma norma clara, no sentido de impor aos Estados uma obrigação irrestrita;

d) A precisão da norma, o que supõe que a obrigação imposta pela norma seja inequívoca;

e) Finalmente, aponta-se ainda a vocação ou aptidão da norma para conferir direitos subjectivos.

Ora, no que respeita às normas constantes das directivas, verifica-se que nestas não ocorrem, normalmente, as características da incondicionalidade e da precisão, "pelo que tais actos não são, em princípio, susceptíveis de produzir um efeito directo na esfera jurídica individual, traduzido na atribuição de um direito subjectivo" (ver nota 62).

A directiva comunitária "vincula o Estado membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios" (ver nota 63).

A directiva impõe, deste modo, uma obrigação de resultado, deixando aos Estados destinatários a liberdade de escolha dos meios que lhe pareçam mais apropriados para adaptarem a respectiva legislação e regulamentação de acordo com os objectivos de interesse comum que se pretendem atingir.

Esta característica das directivas não impediu, porém, a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), designadamente com os Acórdãos de 6 de Outubro de 1970 (caso Franz Gard) (ver nota 64) e de 4 de Dezembro de 1974 (caso van Duyn) (ver nota 65) (ver nota 66), de passar a admitir, em certas condições, a susceptibilidade de as directivas comunitárias produzirem efeito directo vertical na ordem interna dos Estados membros (ver nota 67).

A partir dos mencionados acórdãos, consolidou-se uma jurisprudência firme no sentido da admissibilidade do efeito directo das directivas (ver nota 68), desde que preenchidos os pressupostos que o próprio Tribunal fixou.

Em primeiro lugar, exige-se que as disposições das directivas se qualifiquem como suficientemente claras, precisas e incondicionais, o que implica a exclusão de qualquer poder de mediação por parte do Estado destinatário.

Na verdade, a incondicionalidade e precisão da norma significam que neste caso o Estado deixa de ter certa margem de apreciação (ver nota 69) e intervenção, limitando-se a escolher a forma jurídica da medida de execução (lei ou decreto-lei, etc.).

Em segundo lugar, as directivas serão susceptíveis de produzir efeitos directos na ordem interna quando o Estado destinatário se tenha abstido de adoptar para o seu direito nacional a directiva dentro do prazo previsto, ou quando tenha procedido a uma adaptação incorrecta (ver nota 70).

Podemos dizer, em síntese, que em todos os casos em que as disposições de uma directiva aparecem como sendo - do ponto de vista do seu conteúdo - incondicionais e suficientemente precisas, os particulares estão autorizados a invocá-las contra o Estado quer quando este se abstém de transpor, nos prazos, a directiva para o direito nacional quer quando faz uma transposição incorrecta (ver nota 71).

Este entendimento tem sido acolhido na jurisprudência portuguesa, como resulta do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2 de Julho de 2002 (ver nota 72), que se reporta precisamente ao efeito directo vertical da Directiva n.º 93/37/CEE, do Conselho, embora ainda na vigência do Decreto-Lei 405/93, de 10 de Dezembro.

Este corpo consultivo também já teve oportunidade de se pronunciar pelo efeito directo das "directivas comunitárias, incluindo as relativas aos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas, nas suas disposições claras, precisas e incondicionais" (ver nota 73).

Aplicando a doutrina acabada de expor, ao caso vertente, afigura-se poder concluir que os termos em que se verifica a clareza, precisão e incondicionalidade da norma do artigo 28.º não oferecem dúvidas, podendo um particular invocá-la em face do Estado, em virtude de não ter sido transposta para o direito interno de forma eficiente.

A referida directiva teve por missão principal codificar as disposições das Directivas n.os 71/304, 71/305 e 89/440, que versavam matérias dedicadas, na terminologia comunitária, aos "mercados públicos" (ver nota 74). Em 1993, o Decreto-Lei 405/93, de 10 de Dezembro, veio substituir o Decreto-Lei 235/86, de 18 de Agosto, ajustando o regime de empreitadas de obras públicas às exigências comunitárias, em especial derivadas da Directiva n.º 89/440.

Note-se, porém, que este diploma, além de não ter transposto correctamente esta última directiva, também não teve em conta as disposições da directiva n.º 93/37/CEE, de tal modo que um dos objectivos visados pelo Decreto-Lei 59/99 foi o de assegurar a "adequação da transposição da Directiva n.º 93/37/CE" (ver nota 75), o que não significa que todas as deficiências de adaptação tenham sido ultrapassadas.

2 - Como já tivemos oportunidade de referir, para além do concorrente n.º 1, a comissão de abertura considerou igualmente não apto o concorrente n.º 3.

Acontece que este candidato, ao contrário do concorrente n.º 1, não deduziu qualquer reclamação.

De todo o modo, como os fundamentos que estiveram na base da exclusão dos dois concorrentes foram, no essencial, os mesmos, entendeu a comissão que os dois concorrentes se encontravam em circunstâncias formalmente equivalentes e, por força do princípio da igualdade, na sequência da deliberação do conselho de administração da ANA de 5 de Fevereiro de 2002, decidiu notificar também o concorrente n.º 3 para apresentar e complementar a documentação e certificados com as menções em falta (ver nota 76).

Em face da documentação apresentada, foi de novo avaliada a capacidade técnica do concorrente n.º 3, tendo a comissão deliberado:

"a) Revogar parcialmente a deliberação de 28 de Novembro de 2001 que aprovou o primeiro relatório de qualificação unicamente no que respeita à consideração do concorrente n.º 3 como não apto;

b) Atento o que prescreve o artigo 98.º do Decreto-Lei 59/99, de 2 de Março, considerar apto do ponto de vista financeiro, económico e técnico para a execução da empreitada [...] o concorrente n.º 3 (ver nota 77)."

O facto de o concorrente n.º 3 não ter reclamado oportunamente significa que ele viu precludida a possibilidade de recorrer contenciosamente da decisão de exclusão.

No entanto, como o acto permanece ilegal, tal circunstância não afecta o poder que assiste à administração de anular (revogar) por sua iniciativa as decisões que repute ilegais.

"Na verdade", nas palavras de Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, "o caso resolvido (administrativo) respeita a um determinado acto ou efeito jurídico que não foi tempestivamente impugnado, pelo que, em vista dos interesses da estabilidade e segurança das relações jurídicas administrativas, aqueles que não cumprirem esse seu ónus já não podem mais pôr em causa a validade de tal acto ou efeito - sem prejuízo, porém, de se manter o poder administrativo de o revogar e, mesmo, a possibilidade de outros eventuais interessados o impugnarem"(ver nota 78).

A dúvida que pode suscitar-se é se a comissão ainda estava em tempo para proceder à revogação anulatória da deliberação de 28 de Novembro de 2001, problemática que será a seguir discutida a propósito da oportunidade da deliberação do conselho de administração da ANA de 12 de Setembro de 2002.

3 - Impõe-se, assim, por último, analisar, no que respeita à deliberação do conselho de administração de 12 de Setembro de 2002, que procedeu à revogação (em parte) das deliberações anteriores de 22 de Maio e 12 de Julho de 2002, admitindo o concorrente n.º 1 e a respectiva proposta a sua eventual extemporaneidade.

3.1 - Tal deliberação fundou-se num parecer jurídico (ver nota 79) que concluiu pela ilegalidade da exclusão do concorrente n.º 1 e, consequentemente, pela ilegalidade das deliberações que se tinham pronunciado no sentido da exclusão.

No nosso ordenamento jurídico, a regra geral que vigora sobre a revogabilidade (anulação) dos actos inválidos, consta do artigo 141.º do Código do Procedimento Administrativo, e tem o seguinte conteúdo:

"1 - Os actos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida.

2 - Se houver prazos diferentes para o recurso contencioso, atender-se-á ao que terminar em último lugar."

O prazo-regra para efectivar a revogação do acto inválido é, por conseguinte, de um ano - por referência ao (maior) prazo actual do recurso contencioso do acto anulável, que é o conferido ao Ministério Público, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º da Lei de Processo (ver nota 80).

Restrito à matéria do contencioso dos actos administrativos relativos à formação dos contratos de empreitadas de obras públicas, de pres tação de serviços e de fornecimento de bens, o Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio, que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 89/665/CEE, veio estabelecer um regime jurídico específico, do qual se destaca a previsão de um prazo de 15 dias para a interposição do recurso contencioso.

Posto isto, na ausência da previsão de outro prazo de recurso, no âmbito do Decreto-Lei 134/98, pode suscitar-se, na situação em apreço, a dúvida sobre o prazo aplicável para a revogação de actos administrativos ilegais pela administração, tendo em conta a remissão inserta no artigo 141.º do Código do Procedimento Administrativo.

3.2 - Antes de responder à questão, impõe-se analisar os aspectos pertinentes à referida directiva bem como ao diploma que assegurou a sua transposição para a ordem interna.

3.2.1 - Constituem objectivos da Directiva n.º 89/665/CEE, do Conselho, de 21 de Dezembro, como pode ler-se no preâmbulo, instituir mecanismos que garantam "o respeito das disposições comunitárias, sobretudo numa fase em que as violações podem ainda ser corrigidas", no âmbito de matérias a que se reportam as Directivas n.os 71/305/CEE, do Conselho, (ver nota 81) de 26 de Julho, relativamente à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas e 77/62/CEE, relativa à coordenação dos processos de celebração dos contratos de fornecimento, no direito público.

Mais adiante pode ler-se que "dada a brevidade dos processos de adjudicação dos contratos de direito público, as instâncias de recurso competentes devem nomeadamente estar habilitadas a tomar medidas provisórias para suspender um processo dessa natureza ou a execução de decisões eventualmente tomadas pela entidade adjudicante [...]

É necessário assegurar que, em todos os Estados membros, procedimentos apropriados permitam a anulação das decisões ilegais e a indemnização das pessoas lesadas por uma violação".

Por outro lado, "sempre que as empresas não interponham recurso, determinadas infracções apenas podem ser corrigidas mediante o accionamento de um mecanismo específico".

Diz-se, ainda, no preâmbulo, importa assegurar, "sempre que considerar ter havido infracção clara e manifesta no decorrer de um processo de adjudicação de um contrato de direito público, a Comissão possa intervir junto das autoridades competentes do Estado membro e da entidade adjudicante em questão a fim de que sejam tomadas medidas apropriadas com vista à correcção rápida de qualquer alegada violação."

Para esse efeito dispõe o artigo 1.º:

"1 - Os Estados membros tomarão as medidas necessárias para garantir que, no que se refere aos processos de adjudicação de contratos de direito público abrangidos pelo âmbito de aplicação das Directivas n.os 71/305/CEE e 77/62/CEE, as decisões tomadas pelas entidades adjudicantes possam ser objecto de recursos eficazes e, sobretudo, tão rápidos quanto possível, nas condições previstas nos artigos seguintes e, nomeadamente, no n.º 7 do artigo 2.º, com base em que essas decisões tenham violado o direito comunitário em matéria de contratos de direito público ou as normas nacionais que transpõem esse direito".

O artigo 2.º tem o seguinte conteúdo:

"1 - Os Estados membros velarão por que as medidas tomadas para os efeitos dos recurso referidos no artigo 1.º prevejam os poderes que permitam:

a) Tomar o mais rapidamente possível, através de um processo de urgência, medidas provisórias destinadas a corrigir a alegada violação ou a impedir que sejam causados outros danos aos interesses em causa, incluindo medidas destinadas a suspender ou a fazer suspender o processo de adjudicação do contrato de direito público em causa ou a execução de qualquer decisão tomada pelas entidades adjudicantes;

b) Anular ou fazer anular as decisões ilegais, incluindo suprimir as especificações técnicas, económicas ou financeiras discriminatórias que constem dos documentos do processo de adjudicação em causa;

c) Conceder indemnizações às pessoas lesadas por uma violação.

...

8 - ..."

No artigo 3.º estabelece-se:

"1 - A Comissão pode invocar o processo previsto no presente artigo sempre que, antes da celebração de um contrato, considerar que houve infracção clara e manifesta das disposições comunitárias em matéria de contratos de direito público no decorrer de um processo de adjudicação de contrato abrangido pelo campo de aplicação das Directivas n.os 71/305/CEE e 77/62/CEE.

2 - A Comissão notificará ao Estado membro e à entidade adjudicante em questão as razões pelas quais considera ter sido cometida uma infracção clara e manifesta e solicitará a sua correcção.

3 - Nos 21 dias que se seguem à recepção da notificação referida no n.º 2, o Estado membro em questão comunicará à Comissão:

a) A confirmação de que a infracção foi corrigida; ou

b) Uma conclusão fundamentada, explicando as razões por que não foi efectuada qualquer correcção; ou

c) Uma notificação indicando que o processo de adjudicação do contrato em causa foi suspenso seja por iniciativa da entidade adjudicante, seja no âmbito do exercício dos poderes previstos no n.º 1, alínea a), do artigo 2.º

4 - ...

5 - ..."

3.2.2 - Na nossa ordem interna, como já ficou dito, o Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio, procedeu à transposição da mencionada directiva, instituindo uma forma de recurso, de natureza urgente, contra actos administrativos lesivos, em matéria de procedimento pré-contratual dos contratos de empreitada de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens (cf. artigo 1.º).

Mas a novidade introduzida por este instrumento normativo reside, porém, na possibilidade de serem decretadas medidas provisórias (ver nota 82) (ver nota 83).

Neste sentido, o artigo 2.º, que tem como epígrafe "Âmbito do recurso", estabelece:

"1 - Todos os actos administrativos relativos à formação do contrato que lesem direitos ou interesses legalmente protegidos são susceptíveis de recurso contencioso, independentemente da sua forma.

2 - Com o pedido de anulação ou declaração de nulidade ou inexistência jurídica de actos administrativos relativos à formação do contrato, ou previamente à dedução do pedido, poderão ser requeridas medidas provisórias destinadas a corrigir a ilegalidade ou a impedir que sejam causados outros danos aos interesses em causa, incluindo medidas destinadas a suspender o procedimento de formação do contrato."

Importa ainda considerar o artigo 3.º sobre legitimidade e prazo, que tem o seguinte conteúdo:

"1 - Os recursos contenciosos de actos administrativos relativos à formação do contrato podem ser interpostos por quem se considerar titular de direito subjectivo ou interesse legalmente ofendido (ver nota 84) pelo acto recorrido ou alegar interesse directo, pessoal e legítimo no provimento do recurso.

2 - O prazo para a interposição do recurso é de 15 dias a contar da notificação dos interessados ou, não havendo lugar à notificação, a partir da data do conhecimento do acto."

3.3 - O excurso acabado de fazer habilita-nos a ensaiar algumas considerações sobre a razão de ser e finalidade da directiva em causa e principais interesses envolvidos.

A Directiva n.º 89/665/CEE "teve em vista - segundo Carlos Cadilha - assegurar a abertura dos contratos de direito público à concorrência comunitária através da implementação nos Estados membros de meios de recurso rápidos e eficazes e de medidas provisórias destinadas a corrigir a ilegalidade e a impedir a produção de danos em relação aos concorrentes lesados" (ver nota 85) (ver nota 86).

A garantia de maior transparência e não discriminação dos particulares, na fase pré-contratual dos concursos públicos abrangidos pela directiva, aparece desta forma indissociável da necessidade de instituição de mecanismos contenciosos que permitam aos concorrentes reagir, de forma célere e eficaz, contra actos que, se não forem atempadamente impugnados e resolvidos pelas instâncias judiciais, acabam por não ter qualquer relevância prática ou utilidade.

Esta preocupação encontrava já eco na doutrina que permitiu autonomizar actos administrativos destacáveis na formação procedimental dos contratos da Administração Pública, para efeitos de impugnação contenciosa (ver nota 87).

A teoria dos actos destacáveis surgiu em França precisamente ligada à ideia de protecção dos concorrentes preteridos nos concursos pela Administração Pública (ver nota 88).

Acontece que a morosidade do recurso contencioso de anulação, associada à ausência de medidas cautelares especificadas, adequadas, concorriam para que, no momento em que fosse proferida a sentença final o contrato já estivesse, em muitas situações, totalmente executado, transformando eventuais sentenças de anulação em meras declarações platónicas.

A falência desta teoria deveu-se, para além de outras razões que não cabe neste contexto aprofundar, à sistemática irrelevância das sentenças de anulação de actos destacáveis, e consequente sobreposição de situações de "facto consumado" em detrimento da tutela efectiva do concorrente.

O Decreto-Lei 134/98 ao definir, na sequência da directiva, um regime especial para o recurso de actos administrativos relativos à formação dos contratos, recurso com carácter urgente, a par da instituição da possibilidade de serem decretadas medidas provisórias, pode ser, nas palavras de Maria João Estorninho, "um instrumento fundamental para assegurar utilidade prática à impugnação jurisdi cional de actos procedimentais e para obviar a muitas das dificuldades que o sistema até agora existente acarreta" (ver nota 89).

A razão de ser da preocupação do Decreto-Lei 134/98, na senda da directiva em que se apoia, é, por conseguinte, essencialmente a garantia e protecção dos concorrentes preteridos, pondo à sua disposição meios de defesa eficientes (ver nota 90).

Neste sentido, os destinatários privilegiados do diploma são inequivocamente os particulares concorrentes, o que ressalta, desde logo, da definição do âmbito do recurso e da legitimidade.

Trata-se de um meio destinado a defender os direitos e interesses legalmente protegidos de eventuais lesados com o procedimento de formação do contrato de empreitada de obras públicas, prestação de serviços e de fornecimento de bens (cf. artigos 2.º e 3.º do Decreto-Lei 134/98).

3.3.1 - Uma primeira observação que a sumária análise acabada de fazer merece é a ausência de qualquer referência à possibilidade de recurso contencioso por parte do Ministério Público.

Afigura-se, porém, não haver razões para interpretar tal omissão como excluindo essa possibilidade.

No âmbito das relações jurídico-administrativas a intervenção processual do Ministério Público é delimitada finalisticamente pela defesa da legalidade e pela promoção do interesse público (ver nota 91), dispondo para o efeito, como refere Vieira de Andrade, "de legitimidade para oficiosamente interpor recursos contenciosos contra actos administrativos e para a impugnação de normas 'acção pública' (artigos 24.º e 28.º da LPTA, 46.º do RSTA e 821.º do CA: artigos 63.º e 66.º da LPTA - incluindo os respectivos meios acessórios [...] e demais poderes próprios da parte recorrente" (ver nota 92) (ver nota 93).

Ao caracterizar a legitimidade processual activa do Ministério Público, Filomena Vieira pondera que ela "não depende da invocação, por parte deste órgão, de uma qualquer realidade ou facto relativamente aos quais se posicione subjectivamente, mas antes da simples manifestação da vontade de interpor recurso, sendo bastante a alegação de que o faz para defesa da legalidade ou para promoção do interesse público" (ver nota 94).

Argumentar-se-á que na fase procedimental de formação dos contratos estão em causa essencialmente interesses privados dos concorrentes, não havendo lugar para a intervenção do Ministério Público.

Admitindo que assim seja em tese geral, a verdade é que, em abstracto, se afigura difícil concluir pela ilegitimidade pura e simples de o Ministério Público arguir a invalidade de actos que desrespeitem regras relativas ao procedimento pré-contratual no âmbito dos contratos abrangidos pela directiva (ver nota 95).

Com efeito, é de realçar que, se a finalidade específica da Directiva n.º 89/665/CEE foi proporcionar aos concorrentes meios de defesa rápidos e eficazes, não é menos verdade que tal finalidade não se dirige apenas ao interesse privado dos mesmos mas visa de igual modo a protecção de interesses gerais ligados à garantia da "abertura dos contratos de direito público à concorrência comunitária" e à prevenção da "violação do direito comunitário em matéria de contratos de direito público ou das normas nacionais que transpõem esse direito" (cf. preâmbulo da directiva).

Desta forma, não é de excluir a possibilidade de o Ministério Público intervir neste domínio perante ilegalidades lesivas de relevantes interesses públicos.

Por outro lado, também não se pode retirar, nem da economia da directiva nem do diploma que a transpõe, a intenção de pôr em causa o papel de relevo que o Ministério Público assume no nosso sistema de contencioso actual.

Posto isto, uma primeira conclusão que pode extrair-se é que toda a interpretação no sentido de excluir de plano e em abstracto a possibilidade de o Ministério Público intervir, neste domínio, em defesa da legalidade e do interesse público, não tem apoio nem na letra nem na razão de ser dos diplomas em causa.

A questão a ser colocada é a de saber se o pode fazer nos termos do regime geral estabelecido para o recurso contencioso de anulação.

Com efeito, uma vez identificados os destinatários do Decreto-Lei 134/98 e a razão de ser do mesmo, na sequência do visado pela directiva que ele transpõe, afigura-se poder afirmar que o recurso previsto nos artigos 2.º e 3.º do diploma não foi pensado para o Ministério Público.

Em especial, no que concerne propriamente ao prazo de interposição de recurso, ao dizer-se que é de "15 dias a contar da notificação" (ver nota 96), é manifesto que o legislador está a dirigir-se aos concorrentes e não ao Ministério Público, pois não sendo este interessado directo não é notificado.

Assim sendo, a solução mais lógica e coerente com a unidade do sistema, tendo em conta os interesses envolvidos, aponta no sentido de se entender o recurso consagrado no Decreto-Lei 134/98 como um meio especialmente instituído para os particulares concorrentes, não precludindo a possibilidade de o Ministério Público impugnar actos administrativos relativos à formação dos contratos abrangidos pelo diploma, nos termos gerais consagrados para o recurso contencioso de anulação, mormente quanto ao prazo (ver nota 97).

A única objecção, com alguma consistência, que esta solução pode levantar, reside no facto de o prazo alargado de recurso de que dispõe o Ministério Público (um ano) poder de alguma forma colidir com a celeridade e eficácia que se pretendeu conferir ao mecanismo consagrado no Decreto-Lei 134/98.

Afigura-se que tal argumento não deverá, porém, ser sobrevalorizado se se tiver em conta, em primeiro lugar, que a intervenção do Ministério Público só encontrará razão de ser em situações pontuais de ilegalidade grave (ver nota 98).

Um prazo mais alargado para o Ministério Público acabaria, desta forma, por não se consubstanciar numa limitação desproporcionada da celeridade e eficácia que se pretendeu imprimir ao mecanismo processual do Decreto-Lei 134/98.

Acresce que se discute se o recurso urgente recebido no Decreto-Lei 134/98 deve ser entendido como um meio processual único, exclusivo e, por conseguinte, imperativamente aplicável à impugnação de actos lesivos na fase pré-contratual dos contratos de empreitada de obras públicas, de prestação de serviços ou de fornecimentos, ou um meio processual alternativo, que não impede a utilização do recurso contencioso normal nos termos do regulado na Lei de Processo dos Tribunais Administrativos e Fiscais (LPTA).

A jurisprudência do STA tem-se pronunciado no sentido de se tratar de um regime único e exclusivo e não mera faculdade dos interessados (ver nota 99).

Um prazo de recurso excessivamente curto (ver nota 100) e esta orientação jurisprudencial têm-se conjugado para conduzir, na prática, a resultados pouco favoráveis aos particulares concorrentes que vêem, sistematicamente, os seus recursos rejeitados por extemporaneidade, sem poderem lançar mão de qualquer outro meio contencioso (ver nota 101).

Verifica-se, desta forma, que há sérios riscos de um mecanismo que se pretendia vir reforçar as garantias de defesa dos concorrentes acabar, na prática, por não significar qualquer melhoria (ver nota 102).

Neste sentido, para alguma doutrina, a solução mais consentânea ao princípio da tutela judicial efectiva e que tem em conta os princípios da segurança jurídica e da economia processual vai no sentido de que o recurso urgente deverá entender-se como um meio processual alternativo (ver nota 103).

Em artigo recente, Carlos Cadilha adere a esta orientação ponderando que "a interposição, para além do prazo de 15 dias, deve determinar, não a rejeição por intempestividade, mas a conversão da tramitação processual, fazendo seguir os termos do recurso comum regulado na LPTA, com o consequente aproveitamento dos articulados" (ver nota 104).

Também Bernardo de Ayala já havia sustentado que "o mecanismo do Decreto-Lei 134/98 representa uma faculdade do particular e não uma imposição ou um ónus, em primeiro lugar, porque o legislador não teve o cuidado de o especificar e, por outro, esta é a interpretação que melhor se coaduna com a própria lógica do surgimento do diploma: reforço das garantias dos particulares no domínio da contratação pública" (ver nota 105).

Tudo isto para salientar que não se encontra ainda devidamente consolidado o verdadeiro alcance do meio processual urgente regulado no Decreto-Lei 134/98 e que esta tese reforça a interpretação no sentido de que a adopção deste mecanismo não implica a preclusão da intervenção do Ministério Público, nos termos do estabelecido para o recurso contencioso de anulação.

Assim, mesmo que fosse de aplicar, no âmbito do recurso urgente regulado no Decreto-Lei 134/98, a remissão do artigo 141.º do Código do Procedimento Administrativo, tal remissão teria sempre de entender-se ajustada ao prazo de recurso do Ministério Público e não ao prazo de 15 dias fixado para os recorrentes, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito.

3.3.2 - Acontece, porém, que a invocação de tal remissão não faz qualquer sentido no contexto do referido diploma, como passamos a demonstrar.

Em primeiro lugar, resulta claramente da economia da Directiva n.º 89/665/CEE que ela não teve qualquer intenção de alterar ou sequer harmonizar o prazo que o direito interno dos Estados membros confere às autoridades adjudicantes para revogarem, por ilegalidade, os actos preparatórios que pratiquem durante o procedimento de formação dos contratos que cabem no seu âmbito. E o mesmo se pode dizer do Decreto-Lei 134/98.

A dúvida que vem suscitada quanto ao prazo de revogação deve-se, como está bem de ver, apenas à peculiar circunstância de, na nossa ordem jurídica, esse prazo andar tradicionalmente associado ao do recurso contencioso. Ela é totalmente alheia à finalidade do regime de recurso urgente visado pelos diplomas em causa.

Acontece que esta relação entre revogação (ver nota 106) e prazo de recurso contencioso tem sido objecto de ampla contestação pela doutrina por não fazer actualmente sentido.

Tendo presente os interesses conflitantes que subjazem à revogação anulatória, de um lado o interesse público da restauração da legalidade e o interesse público substancial que o acto visa prosseguir e, por outro, a estabilidade das situações jurídicas e a protecção da confiança dos particulares interessados, refere Vieira de Andrade que "no artigo 141.º, relativamente a este conflito, optou-se por um modelo que podemos designar por 'modelo francês': admite-se em geral a revogação anulatória dos actos, embora apenas dentro do prazo para o recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida. Quer isto dizer que, até essa data, se admite sempre a anulação administrativa do acto, e que, depois dessa data, se deixa pura e simplesmente de admitir a possibilidade de a ilegalidade vir a ser reconhecida pela própria Administração Pública" (ver nota 107).

E o mesmo autor critica esta opção, desde logo, por se tratar de uma solução que é meramente temporal e não tem em consideração aspectos relevantes de certas situações que mereceriam diferenças de regime.

Com esta remissão formal para o prazo de recurso contencioso, o legislador acaba por tratar por igual todas as situações, sem atender, por exemplo, à diferença entre actos constitutivos e não constitutivos de direitos, à boa ou má fé do administrado, ao facto de, por vezes, a ilegalidade poder resultar de dolo, corrupção activa ou coacção exercida por ele, etc. (ver nota 108)

Por outro lado, constitui hoje doutrina assente que o decurso do prazo de recurso contencioso não determina a sanação objectiva do vício do acto lesivo que permanece inválido na ordem jurídica, compreendendo-se mal que a administração fique impossibilitada de o anular.

Segundo Robin de Andrade, "não há razões de justiça material ou de carácter dogmático que impeçam genericamente a anulação administrativa de actos ilegais depois do decurso do prazo de recurso contencioso"(ver nota 109), ressalvados os actos administrativos constitutivos de direitos.

O mesmo autor tem dúvida se hão-de ser igualmente ressalvados os actos administrativos constitutivos de meros interesses legalmente protegidos.

Se é em geral criticável e insustentável que a administração fique amarrada a uma remissão formal que a impede de rever os seus actos ilegais decorrido o prazo do recurso contencioso, muito menos se percebe quais os interesses fundamentais que podem justificar a invocação de tal remissão na situação em apreço, quando, a admitir-se, funcionaria de forma totalmente automática, pois não se pode dizer sequer que seja o resultado de qualquer opção, ainda que mal ponderada, do legislador.

É verdade que pode questionar-se se a revogação das deliberações do conselho de administração da ANA de 22 de Maio e 12 de Julho é susceptível de pôr em causa eventuais interesses, legalmente protegidos, de terceiros concorrentes na manutenção da estabilidade da relação contratual.

Mas ainda que assim se entenda, cabe perguntar se será legítimo proteger à outrance a manutenção da estabilidade da relação contratual obstacularizando a administração de revogar actos preparatórios (ver nota 110) com fundamento em invalidade, sendo que sobre a mesma impende o dever de corrigir os seu actos.

Na verdade, impor à administração um prazo de 15 dias significa pura e simplesmente aniquilar qualquer possibilidade de ela rever os seus actos, por mais graves que sejam as ilegalidades praticadas, sendo que impende sobre ela o dever de corrigir os seus actos (ver nota 111).

Por outro lado, cabe realçar que a defesa da estabilidade da relação pré-contratual não é, como vimos, a única finalidade prosseguida pela directiva, pois destaca-se igualmente a necessidade de garantir os princípios de direito comunitário e as normas nacionais que transpõem esse direito (ver nota 112).

Neste contexto, podemos dizer que a letra e a razão de ser da directiva são favoráveis à intervenção das autoridades adjudicantes no sentido de corrigirem, elas próprias, as ilegalidades antes da formação dos contratos.

A finalidade nuclear da directiva não é tanto garantir o interesse dos concorrentes na estabilidade da relação contratual mas, sobretudo, evitar que as eventuais violações de regras comunitárias (ou nacionais) sejam sancionadas unicamente depois da celebração do contrato e, neste caso, apenas pela via do arbitramento de uma indemnização (ver nota 113) (ver nota 114).

Assim, afigura-se que, na economia da directiva, o que releva não será estritamente o prazo dentro do qual devem ser sanadas as irregularidades (quer pela via do tribunal quer por parte da administração) (ver nota 115) mas, essencialmente, o momento temporal até ao qual os actos ilegais podem ser anulados: desde que a administração (ou o tribunal) corrijam as ilegalidades dos actos preparatórios praticados na fase do procedimento pré-contratual até à adjudicação ou celebração do contrato, não será posta em causa a celeridade e finalidade específica da directiva.

Por tudo quanto é exposto e tendo em conta os dados do processo, propende-se para concluir que nem a deliberação da comissão de 19 de Março de 2002 nem a do conselho de administração de 12 de Setembro de 2002 são de considerar extemporâneas.

VII - Termos em que se formulam as seguintes conclusões:

1.ª Atento o disposto no n.º 19.3, alínea a), do artigo 19.º do programa do concurso público n.º 04/01/DIA - AS2000 - Piers e busgates - Túneis e corpo central da aerogare - Viaduto de ligarão entre curbsides, basta, para qualificar tecnicamente um agrupamento, seja qual for a sua composição, que pelo menos duas das empresas que o compõem respeitem os requisitos de idoneidade referenciados: uma dessas empresas tem de ser, necessariamente, de capacidade técnica genérica e tem de demonstrar observar o requisito geral previsto na alínea a); a outra empresa pode ser de capacidade técnica genérica ou uma empresa de instalações técnicas, sendo que neste último caso ela terá de cumprir o requisito específico de capacidade técnica fixado na segunda parte da nota à referida alínea;

2.ª Quando relevante, a avaliação da capacidade técnica de empresas de instalações técnicas deverá fazer-se, à luz do requisito fixado na segunda parte da nota à alínea a) do n.º 3 do n.º 19 do programa do concurso, em função da apresentação de lista de três obras de instalações eléctricas e três de instalações mecânicas, que podem ser repartidas por duas empresas em conformidade com a sua especialidade;

3.ª Da interpretação conjugada da segunda parte da norma da alínea a) do n.º 19.3 fo artigo 19.º com a alínea f) do n.º 15.1 do artigo 15.º do programa do concurso, conclui-se que, na hipótese da conclusão anterior, as empresas de instalações técnicas devem apresentar a sua lista de obras acompanhada de certificados de boa execução, com as menções exigidas na parte final da alínea f) do n.º 15.1;

4.ª Nos casos em que as disposições de uma directiva comunitária se apresentam, pelo seu conteúdo, como incondicionais e suficientemente precisas, podem os particulares invocá-las contra o Estado - efeito directo vertical - quer quando este se abstém de transpor nos prazos a directiva para o direito nacional quer quando faz uma transposição incorrecta;

5.ª Em conformidade com a conclusão anterior, estava a comissão de abertura do concurso obrigada a convidar os concorrentes em causa a completar os certificados e documentos apresentados, nos termos do disposto no artigo 28.º da Directiva n.º 93/37/CEE, de 14 de Junho;

6.ª O facto de um concorrente não ter reclamado oportunamente do acto de exclusão praticado no âmbito do procedimento pré-contratual, implica a preclusão da possibilidade de recorrer contenciosamente desse acto, mas não interfere com o dever que impende sobre a administração de revogar (anular), por sua iniciativa, os actos que repute ilegais;

7.ª O prazo de revogação (anulação) é de um ano, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 141.º, n.º 2, do CPA, e 28.º, n.º 1, alínea c), da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (LPTA), na medida em que sendo o recurso urgente previsto no Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio, especialmente dirigido aos particulares concorrentes, não preclude a possibilidade de o Ministério Público recorrer contenciosamente, nos termos gerais previstos na LPTA para o recurso contencioso de anulação.

(nota 1) Cujo conteúdo é o seguinte: "a) Comprovação da execução de, pelo menos, uma obra de idêntica natureza da obra posta a concurso, de valor não inferior a [...] (indicar um valor não superior a 60% do valor estimado do contrato);

b) Adequação do equipamento e da ferramenta especial a utilizar na obra, seja próprio, alugado ou sob qualquer outra forma, às suas exigências técnicas;

c) Adequação dos técnicos e dos serviços técnicos, estejam ou não integrados na empresa, a afectar à obra."

(nota 2) Dispõe o artigo 183.º do Código do Procedimento Administrativo: "Com ressalva do disposto nas normas que regulam a realização de despesas públicas ou em legislação especial, os contratos devem ser precedidos de concurso público."

(nota 3) Cf. O Concurso Público na Formação do Contrato Administrativo, Lex, Lisboa, 1994, pp. 42 e 43.

(nota 4) Do Conselho Consultivo de 17 de Abril de 2002.

(nota 5) Pode ler-se em Margarida Olazabal Cabral, O Concurso Público nos Contratos Administrativos, Almedina, Coimbra, 1997, p. 111, que uma das primeiras funções do concurso público "será a de possibilitar a celebração de um contrato que satisfaça o mais amplamente possível as exigências do interesse público e simultaneamente corresponda aos interesses de um determinado particular".

(nota 6) No sentido da necessidade de as normas que regulam o processo de concurso e até mesmo as que definam o objecto do mesmo estarem publicadas antes da abertura do concurso, por força do princípio da legalidade, cf. Fausto de Quadros, "O concurso público na formação do contrato administrativo", Revista da Ordem dos Advogados, ano 47, Lisboa, 1987, pp. 705 e segs.

(nota 7) Cf. o já citado parecer 19/2002, bem como os pareceres n.os 40/87, de 9 de Junho, e 126/96, de 5 de Novembro de 1997.

(nota 8) Cf., entre outros, Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e Outros Procedimentos de Adjudicação Administrativa, Coimbra, 1998, pp. 134-142; Margarida Olazabal Cabral, ob. cit, pp. 240 e 241.

(nota 9) Cf. o artigo 64.º do Decreto-Lei 59/99. No artigo 66.º do mesmo diploma pode ver-se uma definição de programa de concurso. A Portaria 104/2001, de 21 de Fevereiro, aprovou os programas de concurso tipo e os cadernos de encargos tipo, para serem adoptados nas empreitadas de obras públicas.

(nota 10) Tem sido o entendimento deste Conselho. Cf. o parecer 80/89, de 15 de Fevereiro de 1990, Diário da República, 2.ª série, n.º 158, de 11 de Julho de 1990.

(nota 11) Cf. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, ob. cit., p. 136.

(nota 12) "Depois de patenteadas ou publicitadas, as disposições do programa do concurso - e outros documentos que o integram - tornam-se vinculantes para a autoridade procedimental, bem como para todos os intervenientes no mercado concursal", cf. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, ob. cit., p. 135. No sentido de que a vinculação da administração não resulta apenas da lei mas também das regras a que ela se auto-vincula, cf. Margarida Olazabal Cabral, ob. cit., pp. 79 e segs.

(nota 13) O Decreto-Lei 197/99, de 8 de Junho, diploma que aprova o regime jurídico de realização de despesas públicas e da contratação pública relativa à locação e aquisição de bens móveis e serviços, com o "objectivo de explicitar, ainda que sinteticamente, o sentido dos princípios que mais frequentemente têm vocação para se aplicar no domínio da contratação pública, que é uma área em que, muitas vezes, as regras são insuficientes e dificilmente aplicáveis sem o recurso aos referidos princípios", incluiu uma secção "dedicada aos princípios gerais da contratação pública e que traduz uma novidade no panorama legislativo português" (do preâmbulo). Nos artigos 7.º a 15.º enunciam-se os seguintes princípios: da legalidade e da prossecução do interesse público; da transparência e da publicidade; da igualdade; da concorrência; da imparcialidade; da proporcionalidade; da boa fé; da estabilidade; e da responsabilidade.

(nota 14) Marcelo Rebelo de Sousa distingue entre princípios comuns a todo o chamado poder administrativo, no exercício da função administrativa e princípios específicos do concurso público. Entre os primeiros inclui o da legalidade, da tutela dos direitos e interesses legítimos, da prossecução do interesse público, do dever de boa administração, da autonomia pública, da imparcialidade e da transparência. Nos segundos, inscrevem-se os princípios da objectividade, da publicidade, da concorrência e da estabilidade das regras, cf. ob. cit., pp. 54 e segs. Sobre os princípios aplicáveis ao concurso público, cf. os pareceres n.os 40/99, de 9 de Março de 2000, Diário da República, 2.ª série, n.º 247, de 25 de Outubro, 19/2002, e 43/2002, de 14 de Agosto.

(nota 15) Cf. ob. cit., pp. 125 e 126 e Margarida Olazabal Cabral, ob. cit., pp. 82 e segs.

(nota 16) Este preceito tem o seguinte conteúdo: "Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé".

(nota 17) Cf. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, ob. cit., p. 117.

(nota 18) Para que "a igualdade seja real e para que não existam efectivamente discriminações nos contratos administrativos, não basta estabelecer critérios objectivos de participação e de adjudicação, mas é necessário também que a regra da publicidade presida à sua aplicação desde o anúncio do concurso, passando pelo caderno de encargos e terminando com o processo de selecção propriamente dito". Cf. conclusões apensas do advogado-geral Ruiz-Jarabo, apresentadas, no Tribunal, em 5 de Junho de 2001, Colectânea da Jurisprudência, 2001, pp. I-09233. Na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, sobre a aplicação dos princípios da igualdade, imparcialidade e concorrência, cf., entre outros, os Acórdãos de 9 de Abril de 2002 e 4 de Junho de 1998, recurso n.º 33 742, apêndice ao Diário da República de 26 de Abril de 2002.

(nota 19) Para uma análise aprofundada das relações entre os dois princípios, cf. Teresa de Melo Ribeiro, O Princípio da Imparcialidade da Administração Pública, Almedina, Coimbra, 1996, pp. 206 e segs. Ao princípio da imparcialidade liga-se uma exigência de neutralidade por parte da administração, ou seja, uma proibição de "favores e ódios". Para maiores desenvolvimentos, cf. David Duarte, Procedimentalização, Participação e Fundamentação: para Uma Concretização do Princípio da Imparcialidade Administrativa como Parâmetro Decisório, Almedina, Coimbra, 1996, pp. 277 e segs.

(nota 20) "A igualdade", refere Vieira de Andrade, "A imparcialidade da Administração como princípio constitucional", separata do vol. XLIX, 1974, do Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1975, p.14, "diz respeito aos destinatários dos efeitos de um acto e configura-se num direito definido em termos gerais e abstractos. A imparcialidade dirige-se ao agente e tem como objectivo uma actividade concreta, não criando qualquer direito para o destinatário da mesma".

(nota 21) Cf. ob. cit., p. 59. V., igualmente, no mesmo sentido, Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, 2001, vol. II, p. 140.

(nota 22) Cf. Marcelo Rebelo de Sousa, ibidem. No mesmo sentido, cf. Vieira de Andrade, ob. cit., p. 16, e o parecer 40/99. Para uma análise do princípio da imparcialidade enquanto limite interno da discricionaridade, cf. Sérvulo Correia, Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Almedina, Coimbra, 1987, p. 499.

(nota 23) O princípio da imparcialidade nos procedimentos adjudicatórios é, para Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, ob. cit, p. 121, "um princípio de valor reforçado, de observância estrita por parte da entidade adjudicante".

(nota 24) Ver também o parecer 89/98, de 17 de Dezembro.

(nota 25) Para Margarida Olazabal Cabral "o primeiro princípio em matéria de concurso público será o da livre concorrência ou competição aberta: é essa a própria essência deste procedimento", cf. ob. cit., p. 84. Sobre a estreita ligação entre os princípios da igualdade, livre concorrência e transparência, cf. a mesma autora e local citados, pp. 82 e segs., e André de Laubadère/ Frank Moderne/ Pierre Delvolvé, Traité des Contrats Administratifs, 2.ª ed., L.G.D.J., Paris, tome 1, 1983, pp. 597 e segs. A este propósito cf. também o parecer 40/99.

(nota 26) Cf. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, ob. cit., p. 125.

(nota 27) Cf. parecer 19/2002.

(nota 28) Cf., entre outros, o parecer deste Conselho n.º 66/94, de 12 de Dezembro.

(nota 29) A questão de interpretação da lei tem ocupado com frequência a atenção deste Conselho. Cf., entre outros, o parecer 328/2000, de 16 de Agosto, que refere variados pareceres anteriores sobre a matéria.

(nota 30) Cf. parecer 61/91, de 14 de Maio de 1992 (Diário da República, 2.ª série, n.º 274, de 26 de Novembro de 1992) e parecer 62/97, de 26 de Fevereiro de 1998 (Diário da República, 2.ª série, n.º 193, de 31 de Julho de 1998). Sobre a interpretação da lei, cf., entre outros, os pareceres n.os 66/95, de 20 de Março de 1996, 8/98, de 7 de Outubro (Diário da República, 2.ª série, n.º 64, de 17 de Março de 1999), 70/99, de 27 de Janeiro de 2000 (Diário da República, 2.ª série, n.º 115, de 18 de Maio de 2000), 328/2000, de 16 de Agosto, 36/2002, de 2 de Maio, e 326/2000, de 29 de Maio de 2002.

(nota 31) Cf. Francesco Ferrara, Interpretação e Aplicação das Leis, 4.ª ed., Arménio Amado, Coimbra, 1989, traduzido por Manuel de Andrade, p. 128.

(nota 32) Cf. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra, 1987, 2.ª reimpressão, p. 182, e Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, 4.ª ed. 1987, pp. 345 e segs.

(nota 33) Cf. os pareceres deste Conselho n.os 62/97 e 19/2002.

(nota 34) Estas empresas são detentoras de certificado de empreiteiro geral de obras públicas que as habilita a executar trabalhos correspondentes à 5.ª das categorias previstas no artigo 1.º da Portaria 412-I/99, de 4 de Junho. Por conseguinte, tais empresas só se encontram habilitadas a executar parte da obra objecto do concurso e não a totalidade das obras da mesma natureza daquela que é posta a concurso.

(nota 35) V. informação n.º 036/02/DJUCON/MP, fls. 10 e 11.

(nota 36) Incluídas as seguintes subcategorias: 1.ª, 2.ª, 3.ª, 6.ª, 9.ª, 10.ª, 11.ª, 13.ª e 14.ª - a que correspondem, respectivamente, as designações de estruturas de betão armado; estruturas de betão pré-esforçado; estruturas metálicas; reparação, alteração e reconstrução de coberturas; pinturas; revestimentos cerâmicos e de materiais pétreos; revestimentos de pavimentos em madeira; serralharias, caixilharias e vidros; tectos e pavimentos falsos e divisórias.

(nota 37) Nas seguintes subcategorias: 1.ª, 5.ª, 6.ª, 7.ª, 8.ª e 12.ª a que correspondem, respectivamente, as designações de instalações eléctricas de baixa tensão, ascensores, escadas mecânicas e tapetes rolantes, redes de comunicações e instalações de electrónica, sistemas de segurança e de detecção, instalações de águas e esgotos em edifícios e redes de ar comprimido e vácuo.

(nota 38) A apresentação de candidaturas conjuntas em concursos públicos por "agrupamentos temporários", como são denominados na praxis administrativa e na doutrina, foi admitida a partir da Directiva n.º 71/305/CEE e encontra-se acolhida na legislação nacional quer em matéria de concursos de empreitadas de obras públicas (artigo 57.º do Decreto-Lei 59/99), quer em geral no domínio da contratação pública (artigo 32.º do Decreto-Lei 197/99). Para maiores desenvolvimentos sobre a natureza jurídica do acordo de constituição do agrupamento para efeitos do concurso, cf. o parecer 19/2002.

(nota 39) Constituído pelas empresas de capacidade genérica Necso Entrecanales Cubietas, S. A., e o Grupo Dragados, S. A.

(nota 40) Repare-se que o programa do concurso começa logo por fazer distinção em matéria de qualificação técnica conforme os concorrentes sejam empresas singulares ou agrupamentos. Acontece que o n.º 19.5 da Portaria 104/2001 admite que a entidade adjudicante estabeleça critérios mais exigentes, tendo em conta a complexidade da obra, mas no caso estabelecem-se critérios diferentes consoante o tipo de candidatos.

(nota 41) Cf. ob. cit, p. 126.

(nota 42) Cf. parecer 19/2002.

(nota 43) Cf. Vieira de Andrade, ob. cit., p. 11.

(nota 44) Cf. ibidem, pp. 21-22. Para Aldo Sandulli, serão ilegítimos, por violação do princípio da imparcialidade, "os actos da administração que não obedeçam a uma ponderação dos diversos interesses públicos implicados e não tenham em conta os interesses privados em jogo" (cf. Manuale di Diritto Amministrativo, XV Ed., Jovene Editore, Nápoles, 1989, pp. 587 e 588). No sentido de o princípio exigir da administração a ponderação dos vários interesses públicos e privados em jogo, cf. Giannini, Diritto Amministrativo, 3.ª ed., Giuffrè Editore, Milão, 1993, pp. 89 e segs.

(nota 45) Cf. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, ob. cit., p. 101.

(nota 46) No concurso público a sequência procedimental encontra-se bem circunscrita e desenhada na lei, cf. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, ob. cit., pp. 88 e segs.

(nota 47) O artigo 13.º, n.º 2, do Decreto-Lei 197/99 estabelece o seguinte: "os programas de concurso, cadernos de encargos e outros documentos que servem de base ao procedimento, bem como os contratos, devem conter disposições claras e precisas".

(nota 48) A 5.ª categoria - instalações eléctricas e mecânicas, compreende as seguintes subcategorias: instalações eléctricas de baixa tensão; instalações eléctricas de média e alta tensão e instalações de produção até 50 MW; instalações para alimentação de tracção eléctrica; ascensores, escadas mecânicas e tapetes rolantes; redes de comunicações e instalações de electrónica; sistemas de segurança e de detecção; aquecimento, ventilação e ar condicionado; instalações de tratamento de água, águas residuais e resíduos sólidos; instalações de águas e esgotos em edifícios; redes de distribuição e instalações de gás em edifícios; redes de ar comprimido e vácuo; instalações de equipamento a incorporar em obras hidráulicas; instalações de apoio e sinalização em sistemas de transportes e outras instalações mecânicas e electromecânicas.

(nota 49) Cf. informação n.º 042/02/DJUCON/MP.

(nota 50) É o que se passa com o concorrente n.º 4, composto por uma empresa de construção civil e duas empresas de instalações técnicas. Este agrupamento, apesar de as empresas de instalações técnicas só reunirem no conjunto a lista das seis obras exigidas, foi qualificado como apto pela comissão de abertura.

(nota 51) Cf. os artigos 86.º e segs. do Decreto-Lei 55/99.

(nota 52) Os documentos destinados a comprovar a idoneidade dos concorrentes e bem assim a sua capacidade técnica e financeira são entregues em conjunto num invólucro que acompanha o que encerra a proposta (por sua vez encerrado num terceiro invólucro, ou "invólucro exterior") (cf. artigo 84.º e n.º 2 do artigo 90.º do Decreto-Lei 59/99).

(nota 53) A este propósito, cf. Mário Esteves de Oliveira/ Rodrigo Esteves de Oliveira, ob. cit., pp. 304 e segs., em especial, pp. 336 e 338, e Jorge Andrade da Silva, Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas, Almedina, Coimbra, 2001, p. 253.

(nota 54) Na situação em apreço, considera-se prejudicada a análise da questão de saber se haveria ou não aqui lugar à aplicação do normativo previsto no artigo 92.º, n.º 3, do Decreto-Lei 59/99, uma vez que acabou por ser dada oportunidade ao concorrente n.º 1, e, também ao n.º 3, para completarem os documentos.

(nota 55) Cf. relatório de avaliação da capacidade financeira, económica e técnica, de 26 de Novembro de 2001.

(nota 56) A reclamação veio a ser expressamente desatendida, conforme pode ler-se no relatório de análise e apreciação das reclamações apresentadas, de 31 de Janeiro de 2002.

(nota 57) Cf. alegações de recurso hierárquico de 23 de Janeiro de 2002.

(nota 58) Deliberação tomada com base na informação n.º 036/02/DJUCON/MP.

(nota 59) Repare-se que em relação à qualificação da situação económica e financeira o n.º 20.1 da Portaria 104/2001 prevê: "sempre que, na fase de qualificação dos concorrentes, a entidade que preside ao concurso tenha dúvidas sobre a real situação económica e financeira de qualquer dos concorrentes, poderá exigir deles e solicitar de outras entidades todos os documentos e elementos de informação, inclusive de natureza contabilística, indispensáveis para o esclarecimento dessas dúvidas". Situação que torna mais estranho não se prever semelhante hipótese no que respeita à qualificação técnica.

(nota 60) Cf. parecer 58/92, de 29 de Outubro.

(nota 61) Cf. João Mota de Campos, Manual de Direito Comunitário, 2.ª ed., Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2001, pp. 359 e segs.

(nota 62) Cf. João Mota de Campos, ob. cit., p. 360.

(nota 63) Cf. artigo 249.º do Tratado da União Europeia.

(nota 64) Processo 9/70, de 6 de Outubro, publicado na Colecção de Acórdãos do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, pp. 825 e segs.

(nota 65) Processo 41/74, de 4 de Dezembro, publicado na Colecção de Acórdãos do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, pp. 1337 e segs.

(nota 66) Sobre estes casos e os pressupostos do efeito directo das directivas, cf. Moitinho de Almeida, Direito Comunitário. A Ordem Jurídica Comunitária. As Liberdades Fundamentais na C. E. E., Centro de Publicações do Ministério da Justiça, 1985, pp. 74 e segs.; Araceli Mangas Martín, Derecho Comunitario Europeo y Derecho Español, Tecnos, Madrid, 1987, pp. 73 e segs.; Lucía Millán, La Armonizacion de Legislaciones en La C. E. E., Centro de Estudos Constitucionais, 1986, pp. 292 e segs.; Jean-Victor Louis, A Ordem Jurídica Comunitária, 5.ª ed., Comissão Europeia, Perspectivas Europeias, Luxemburgo, 1993, pp. 152 e segs. e Paula Quintas, Da Problemática do Efeito Directo nas Directivas Comunitárias, Dixit Editora, Porto, 2000, pp. 108 e segs.

(nota 67) Sobre o alcance dos citados arestos, cf., para maiores desenvolvimentos, o parecer 56/99, de 23 de Março de 2000.

(nota 68) Sobre a distinção entre aplicação directa de regulamentos e efeito directo para os particulares das directivas, cf. Cruz Vilaça, "A propósito dos efeitos das directivas na ordem jurídica dos Estados membros", Cadernos de Justiça ~ Administrativa, n.º 30, 2001, pp. 4 e segs.

(nota 69) Trata-se de situações em que "o conteúdo do acto comunitário não deixa qualquer margem de apreciação aos Estados quanto às medidas a adoptar" (cf. Moura Ramos, Das Comunidades à União Europeia, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1999, p. 97).

(nota 70) No parecer 56/99 faz-se análise desenvolvida de vários acórdãos sobre esta jurisprudência.

(nota 71) Cf. processo 152/84, publicado na Colecção de Acórdãos do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, pp. 723 e segs.

(nota 72) Nesse acórdão ficou consignada a seguinte jurisprudência:

"Estabelecendo as directivas normas prescritivas, claras, completas, precisas e incondicionais são susceptíveis de produzir efeitos directos verticais, ou seja, criam a possibilidade dos particulares as invocarem contra as autoridades públicas, verificando-se essas condições na referida directiva, que, por isso, se aplica directamente na nossa ordem jurídica interna, prevalecendo as suas disposições sobre as do também referenciado decreto-lei (direito comunitário como direito supranacional)."

(nota 73) Cf. o parecer 58/92, de 29 de Outubro. Sobre o efeito directo das directivas, v., também, o parecer 85/92, de 13 de Abril de 1993.

(nota 74) A par das empreitadas de obras públicas são igualmente regulamentados os processos de adjudicação dos contratos públicos de fornecimento, através da Directiva n.º 93/36/CEE, e dos contratos relativos aos sectores da água, energia, transportes e telecomunicações, através da Directiva n.º 93/38/CEE. Para uma análise das alterações introduzidas por estes diplomas e a sua transposição para o direito interno, cf. José Flamínio Roza, "O novo regime de empreitadas de obras públicas", Novas Perspectivas de Direito Público, IGAT, 1999, pp. 1 e segs.

(nota 75) Cf. o respectivo preâmbulo. O Decreto-Lei 59/99 assegurou também a adaptação da Directiva n.º 97/52/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro.

(nota 76) Cf. acta de reunião da comissão de abertura de 18 de Fevereiro de 2002.

(nota 77) Cf. segundo relatório de avaliação da capacidade financeira, económica e técnica de 19 de Março de 2002.

(nota 78) Cf. ob. cit, p. 620.

(nota 79) Parecer da autoria de José Manuel Galvão Teles e Isabel Mayer Martinha.

(nota 80) Cf. Mário Esteves de Oliveira/ Pedro Gonçalves/Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 1997, p. 683.

(nota 81) Posteriormente alterada pelas Directivas n.os 89/440/CEE e 93/37/CEE.

(nota 82) Novidade que não deixa, apesar de tudo, de ser relativa uma vez que mesmo na ausência do Decreto-Lei 134/98 havia a possibilidade, por via de aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, decretada no artigo 1.º da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, de lançar mão de providências cautelares não especificadas de conteúdo semelhante às agora vertidas no artigo 2.º, n.º 2, do Decreto-Lei 134/98. Neste sentido, cf. Bernardo de Ayala, "A tutela contenciosa dos particulares em procedimentos de formação de contratos da Administração Pública", Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 14, 1999, p. 14. De todo o modo, como refere Pedro Gonçalves, "isso não significa porém que possa ser desvalorizada a importância das novas medidas" (cf. "Apreciação do Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio, que estabelece o regime jurídico da impugnação contenciosa dos actos administrativos relativos à formação de certos 'contratos públicos'", Revista de Ciência e Cultura da Universidade Lusíada, n.º 1, 1989, p. 58).

(nota 83) Sobre o alcance destas medidas provisórias, cf. Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, 3.ª ed., Almedina, Coimbra, 2000, p. 190.

(nota 84) Deve pretender significar protegido.

(nota 85) Cf. "Contratos públicos: do Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio, à reforma de contencioso administrativo. Uma análise da jurisprudência", Scientia Iuridica, Janeiro-Abril 2002, t. LI, n.º 292, p. 52.

(nota 86) Lê-se no preâmbulo da directiva que "a abertura dos contratos de direito público à concorrência comunitária requer um aumento substancial das garantias de transparência e de não discriminação e que convém, para que dessa abertura resultem efeitos concretos, que existam meios de recurso eficazes e rápidos em caso de violação do direito comunitário em matéria de contratos de direito público ou das normas nacionais que transpõem esse direito" e, mais adiante, acrescenta-se que "em determinados Estados membros, a ausência de meios de recurso eficazes ou o número insuficiente dos meios de recurso existentes desencorajam as empresas a tentar a sua sorte no Estado da entidade adjudicante em causa".

(nota 87) Sobre a importância da autonomização de "actos administrativos, considerados 'destacáveis' em relação ao contrato e ao próprio procedimento pré-contratual, para efeitos de impugnação contenciosa", cf. Maria João Estorninho, "A propósito do Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio, e das alterações introduzidas ao regime de contencioso dos contratos da Administração Pública", Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 11, 1998, pp. 4 e segs.

(nota 88) Cf. Maria João Estorninho, ibidem.

(nota 89) Cf. "A propósito do Decreto-Lei 134/98 [...]", ob. cit., p. 6.

(nota 90) Segundo jurisprudência do STA, constitui escopo do diploma favorecer, na medida do possível, que só se passe à fase do contrato depois de juridicamente estabilizada a escolha do co-contratante, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de Fevereiro de 2002, processo 48 316, e de 16 de Abril de 2002, processo 278/02.

(nota 91) Como resulta das normas constitucionais e legais aplicáveis [artigo 219.º, n.º 1, da CRP, artigo 69.º, n.º 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), artigo 3.º, n.º 1, do Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei 47/86, de 15 de Outubro, e alterado, por último, pela Lei 60/98, de 27 de Agosto, que procedeu à sua republicação].

(nota 92) Cf. A Justiça Administrativa, p. 118. No sentido da manutenção dos amplos poderes do Ministério Público no âmbito da acção pública, na reforma do contencioso administrativo, constantes das Leis 13/2002, de 19 de Fevereiro e 15/2002, de 22 de Fevereiro, cf. Diogo Freitas do Amaral e Mário Aroso de Almeida, Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo, Almedina, Coimbra, 2002, pp. 15 e segs.

(nota 93) Os amplos poderes do Ministério Público, no âmbito do contencioso administrativo, são manifestação da dimensão objectivista assinalada ao recurso de anulação, cf. Miguel Teixeira de Sousa, "Arguição de vícios pelo Ministério Público no recurso de anulação", anotação ao Acórdão do STA de 12 de Dezembro de 1996, processo 38 511, Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 5, 1997, pp. 28 e segs. e Vasco Pereira da Silva, Para um Contencioso Administrativo dos Particulares, Almedina, Coimbra, 1989, pp. 202 e segs.

(nota 94) Cf. "Suspensão da eficácia e legitimidade do Ministério Público para recorrer", anotação ao Acórdão do STA de 14 de Agosto de 1996, processo 40 824, Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 3, 1997, p. 27. No mesmo sentido, cf. Miguel Teixeira de Sousa, ob. cit., p. 29.

(nota 95) Do mesmo modo, estará o Ministério Público impedido de prosseguir o recurso em caso de desistência do recorrente ou de arguir a ilegalidade de normas constantes do programa do concurso ou do caderno de encargos?

(nota 96) Cf. n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei 134/98.

(nota 97) O Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei 15/2002, de 22 de Fevereiro, ao regular o "contencioso pré-contratual" nos artigos 100.º e seguintes estabelece de forma clara a aplicação subsidiária do disposto na secção I do capítulo II do título III, onde se regula a legitimidade [artigo 55.º, n.º 1, alínea b)] e o prazo [cf. artigo 58.º, n.º 2, alínea a)] para o Ministério Público impugnar actos administrativos.

(nota 98) Em casos, por exemplo, de violação flagrante de princípios do concurso que a administração tem de observar como o da imparcialidade ou da igualdade, etc. De acordo com a circular n.º 8/90, de 27 de Julho, dirigida a racionalizar a intervenção do Ministério Público no contencioso administrativo dispõe-se, no n.º 2, que "a interposição de recurso contencioso é obrigatória nos casos de actos nulos por disposição da lei." No n.º 3, acrescenta-se: "Devem ainda ser impugnados: a) os actos que violem direitos fundamentais e os que afectem interesses difusos ou colectivos; b) os actos que violem princípios de justiça e imparcialidade da actividade administrativa." Finalmente, no n.º 4, diz-se "que fora dos casos previstos nos n.os 2 e 3, a impugnação depende da ponderação que o Ministério Público realize sobre a gravidade do interesse público concretamente lesado".

(nota 99) Existe abundante jurisprudência no sentido da rejeição do recurso previsto no n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei 134/98, quando interposto para além do prazo de 15 dias. Neste sentido, cf., entre outros, os Acórdãos do STA de 16 de Abril de 2002, processo 278/2002, de 19 de Fevereiro, processo 48 316, e de 14 de Dezembro de 1999, processo 44 269.

(nota 100) No Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei 15/2002, o artigo 101.º estabelece o prazo de um mês.

(nota 101) Já foi inclusivamente suscitada a inconstitucionalidade do prazo de recurso por violação do direito à tutela judicial efectiva, que não teve acolhimento do Tribunal Constitucional. Neste sentido, cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 92/2001, Diário da República, 2.ª série, de 22 de Maio de 2001.

(nota 102) Uma visão pessimista sobre os efeitos práticos deste mecanismo, tendo em conta a orientação restritiva que tem sido sufragada pelos tribunais, em especial o STA, pode ver-se em Maria João Estorninho, que enumera um elenco de dificuldades que a aplicação do decreto-lei tem suscitado (cf. "Contencioso dos contratos da Administração Pública", Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 16, 1999, p. 31, e da mesma autora, "A propósito do Decreto-Lei 134/98, de 15 de Maio [...]", ob. cit., pp. 8 e segs.). No mesmo sentido, também Carlos Cadilha considera que a eficácia do novo meio de reacção impugnaria terá ficado aquém do desejável no plano da tutela substantiva, em especial devido à interpretação demasiado rígida dos tribunais (cf. ob. cit., pp. 59 e segs).

(nota 103) Vieira de Andrade considera a situação complexa, ponderando "que devem encontrar-se soluções intermédias que tenham em conta a existência (ou não) de uma confiança digna de protecção jurídica do impugnante, embora, em qualquer caso, concordemos que nunca pode estar em causa a protecção judicial efectiva dos titulares de posições jurídicas substantivas que a mereçam" [cf. Justiça Administrativa, p. 162, n. 67].

(nota 104) De seguida, o mesmo autor acrescenta que "a liberdade de escolha de tramitação conferida ao interessado não deve, porém, pôr em causa a estabilidade da decisão de adjudicação: optando pelo meio processual comum (ou interpondo o recurso urgente para além do prazo previsto na lei especial), o recorrente não pode aspirar a obter, por efeito da anulação contenciosa, a reconstituição específica (designadamente quando o contrato tenha sido entretanto executado), mas conserva a possibilidade de realizar, por essa mesma via processual, o equivalente pecuniário dos danos resultantes do acto ilícito, o que por si justifica o prosseguimento da instância" (cf. ob. cit., p. 56).

(nota 105) Cf. ob. cit., p. 12.

(nota 106) Para uma distinção entre revogação propriamente dita, com fundamento em oportunidade e efeitos ex nunc e revogação com fundamento em ilegalidade e efeitos ex tunc (revogação anulatória), cf. Vieira de Andrade, "Revogação do acto administrativo", separata da Revista Direito e Justiça, vol. VI, 1992, pp. 54 e segs.; Robin de Andrade, "Revogação administrativa e a revisão do Código do Procedimento Administrativo", Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 28, 2001, pp. 37 e segs., e Mário Esteves de Oliveira/Pedro Gonçalves/Pacheco de Amorim, ob. cit., pp. 676 e segs. V. também parecer 135/2001, de 2 de Maio.

(nota 107) Cf. "Revogação do acto administrativo", separata da Revista Direito e Justiça, vol. VI, 1992, pp. 58 e 59.

(nota 108) No mesmo sentido, a doutrina também não vê razões para, no caso de recurso contencioso, excluir a possibilidade de a administração anular o acto para além do momento da resposta da entidade recorrida. No novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no artigo 64.º, admite-se que na pendência do processo seja proferido acto revogatório com efeitos retroactivos do acto impugnado.

(nota 109) Cf. ob. cit., p. 48.

(nota 110) Repare-se que os actos de exclusão são finais para os destinatários mas na perspectiva da administração são substantivamente actos preparatórios.

(nota 111) No sentido de que sendo os actos ilegais recai sobre a administração o dever de anular ou sanar os vícios nos termos da lei, cf. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, Coimbra, 1998, pp. 258 e 259; Mário Aroso de Almeida, Anulação de Actos Administrativos e Relações Jurídicas Emergentes, Almedina, Coimbra, 2002, pp. 237 e segs.; Rui Medeiros, A Decisão de Inconstitucionalidade, Universidade Católica Editora, Lisboa, 1999, pp. 201 e 202; Paulo Otero, O Poder de Substituição em Direito Administrativo, Lex, Lisboa, vol. II, 1995, pp. 581 e segs., e Robin de Andrade, A Revogação dos Actos Administrativos, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pp. 255 e segs.

(nota 112) Recorde-se que em relação ao concorrente n.º 3, a comissão, por deliberação de 19 de Março de 2002, revogou (anulou) a sua deliberação de 26 de Novembro de 2001, fazendo apelo a uma interpretação conforme ao direito comunitário e ao efeito directo de uma norma da Directiva n.º 89/665/CEE, mais precisamente o seu artigo 28.º

(nota 113) Neste sentido, cf. Olga Papadopoulou, "La Directive 'Recours': 89/665/CEE", Revue Europeenne de Droit Public, vol. 9, n.º 3, p. 922.

(nota 114) Daí a consagração de um mecanismo específico de acompanhamento das infracções ao Direito Comunitário por parte da Comissão, no artigo 3.º da Directiva n.º 89/665/CEE. V., no mesmo sentido, o disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei 134/98, cujo n.º 1 tem o seguinte conteúdo: "1 - No caso de a Comissão das Comunidades Europeias notificar o Estado Português e a entidade adjudicante de que considera existir violação clara e manifesta de disposições comunitárias em matéria de contratos referidos no artigo anterior à sua celebração, deve o Estado, no prazo de 20 dias, comunicar à Comissão que a violação foi rectificada ou responder em exposição de que constem os fundamentos por entender não haver lugar a rectificação".

(nota 115) A jurisprudência francesa é muito incisiva no sentido de rejeitar um recurso interposto depois de celebrado o contrato, cf. Bernard Pacteau, "Vers une protection juridictionnelle Commune en Europe" (Revue Europeenne de Droit Public, vol. 9.º, n.º 3, 1997, pp. 756 e segs).

Este parecer foi votado na sessão do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República de 24 de Outubro de 2002. - José Adriano Machado Souto de Moura - Maria Fernanda dos Santos Maçãs (relatora) - Eduardo de Melo Lucas Coelho - António Silva Henriques Gaspar - Alberto Esteves Remédio - Carlos Alberto Fernandes Cadilha - João Manuel da Silva Miguel - Mário António Mendes Serrano.

(Este parecer foi homologado por despacho do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação de 5 de Novembro de 2002.)

Está conforme.

20 de Novembro de 2002. - O Secretário, Jorge Albino Alves Costa.

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  • Tem documento Em vigor 1986-08-18 - Decreto-Lei 235/86 - Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

    Aprova o novo regime jurídico das empreitadas e fornecimento de obras públicas, transpondo para a ordem jurídica interna as regras de concorrência constantes das Directivas da Comunidade Económica Europeia 71/304/CEE (EUR-Lex) e 71/305/CEE (EUR-Lex). Dispõe sobre a celebração e formas de contrato, modalidades de concurso, adjudicação e consignação da obra, fiscalização, pagamentos, contencioso dos contratos, rescisão e resolução convencional da empreitada. O presente diploma entra em vigor 60 dias após a da (...)

  • Tem documento Em vigor 1986-10-15 - Lei 47/86 - Assembleia da República

    Aprova a orgânica do Ministério Público.

  • Tem documento Em vigor 1993-12-10 - Decreto-Lei 405/93 - Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

    Aprova o novo regime de empreitada de obras públicas, promovidas pela administração estadual, directa ou indirecta, e administração regional e local, transpondo assim para a ordem jurídica interna o disposto na Directiva 89/440/CEE (EUR-Lex), do Conselho, de 18 de Julho. Define os diversos tipos de empreitadas, bem como diversas normas sobre a formação e celebração do contrato e seus requisitos sobre o concurso público, seus procedimentos e formas e sobre o ajuste directo. Dispõe de igual modo sobre os conc (...)

  • Tem documento Em vigor 1998-05-15 - Decreto-Lei 134/98 - Ministério da Justiça

    Estabelece o regime jurídico do recurso contencioso dos actos administrativos relativos à formação dos contratos de empreitadas de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimentos de bens.

  • Tem documento Em vigor 1998-08-27 - Lei 60/98 - Assembleia da República

    Altera a orgânica do Ministério Público, aprovada pela Lei nº 47/86 de 15 de Outubro passando a denominar-se Estatuto, e procede à sua republicação.

  • Tem documento Em vigor 1999-02-26 - Decreto-Lei 55/99 - Ministério do Trabalho e da Solidariedade

    Regulamenta a Lei nº 14/98, de 20 de Março, onde se consagra o direito de antecipação da idade de pensão de velhice das bordadeiras da casa da madeira.

  • Tem documento Em vigor 1999-03-02 - Decreto-Lei 59/99 - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território

    Aprova o novo regime jurídico das empreitadas de obras públicas

  • Tem documento Em vigor 1999-06-04 - Portaria 412-I/99 - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território

    Fixa as categorias e subcategorias relativas ao acesso e permanência na actividade de empreiteiro de obras públicas e industrial de construção civil, enumera as obras ou trabalhos especializados, agrupa-os quando relacionados e enuncia os termos em que será concedida a classificação em empreiteiro e construtor geral.

  • Tem documento Em vigor 1999-06-08 - Decreto-Lei 197/99 - Ministério das Finanças

    Transpõe para a ordem jurídica interna as Directivas nºs 92/50/CEE (EUR-Lex), do Conselho, de 18 de Junho, 93/36/CEE (EUR-Lex), do Conselho, de 14 de Junho, e 97/52/CE (EUR-Lex), do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Outubro, e estabelece o regime de realização de despesas públicas com locação e aquisição de bens e serviços, bem como da contratação pública relativa à locação e aquisição de bens móveis e serviços.

  • Tem documento Em vigor 2002-02-19 - Lei 13/2002 - Assembleia da República

    Aprova o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, altera o regime jurídico das empreitadas de obras públicas, o Código de Processo Civil, o Código das Expropriações e a Lei de Bases do Ambiente.

  • Tem documento Em vigor 2002-02-22 - Lei 15/2002 - Assembleia da República

    Aprova o Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPPTA) e procede a algumas alterações sobre o regime jurídico da urbanização e edificação estabelecido no Decreto-Lei nº 555/99 de 16 de Dezembro.

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