de 7 de Julho
Nos últimos anos tem-se vindo a assistir à multiplização de acções de formação profissional e, após a adesão à Comunidade Económica Europeia, de acções de formação profissional financiadas por verbas comunitárias e co-financiadas, portanto, por fundos públicos nacionais.Tal proliferação, em tão curto espaço de tempo, não se verificou sem que tenham surgido algumas questões respeitantes à garantia dos direitos dos formandos, sobretudo dos jovens sem qualquer vínculo laboral. Impunha-se, assim, a tomada de medidas que garantissem o funcionamento, com respeito pelos direitos e expectativas dos participantes, das acções de formação realizadas e acautelasse, portanto, a utilização racional dos dinheiros públicos.
Tal é, fundamentalmente, a intenção do presente diploma, que visa estabelecer o elenco mínimo dos direitos e deveres dos indivíduos não vinculados por relações de trabalho subordinado que frequentem acções de formação profissional de natureza extra-escolar financiadas, directa ou indirectamente, por fundos públicos. Tais direitos e deveres devem ser formalizados através da celebração de um contrato escrito, para que, desde o início das acções, fique bem clara a situação jurídica das partes envolvidas.
Por outro lado, pretende-se também disciplinar a matéria, impondo às entidades formadoras, como contrapartida pela utilização de fundos públicos, a obrigação de participarem aos serviços de emprego as acções de formação a realizar, por forma a não só permitir o mais rigoroso controle da forma como decorrem essas acções, mas também possibilitar a atempada divulgação das disponíveis numa determinada área, o que permitirá, por certo, o melhor aproveitamento dos meios existentes.
Atribui-se ainda aos centros de emprego a tarefa de organização e manutenção de um ficheiro dos formandos, os quais são obrigados, após a conclusão dos cursos de formação, a inscrever-se como candidatos a emprego.
Deste modo se procura evitar que a finalidade do grande esforço financeiro que a formação profissional representa para o País seja desvirtuada, procurando-se que as acções de formação sejam um meio eficaz de aumento da qualificação profissional e, portanto, de um mais perfeito ajustamento entre a oferta e a procura de emprego.
Assim, ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira e nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto e âmbito
1 - O presente diploma regula a situação jurídica do formando que participe em acções de formação profissional não ingerida no sistema educativo, a empreender em território nacional por quaisquer entidades do sector privado, público ou cooperativo, financiadas, total ou parcialmente, por fundos públicos ou comunitários.2 - O presente diploma não abrange os formandos vinculados à entidade formadora ou a terceiros por contrato de trabalho ou qualquer vínculo jurídico-laboral de direito público, salvo quanto ao direito ao certificado previsto na alínea c) do artigo 5.º 3 - Não são abrangidos pelo presente diploma os cursos, regulares ou de actualização, ministrados pelo Ministério da Saúde nem ou cursos de formação agrícola abrangidos pelo Decreto-Lei 79-A/87, de 18 de Fevereiro, nem pelo Programa de Apoio ao Desenvolvimento Agrícola Regional (PADAR).
Artigo 2.º
Conceitos
Para os efeitos deste diploma, entende-se por:a) Formando: qualquer indivíduo que esteja inscrito e participe em acções de formação profissional promovidas ou realizadas por entidades formadoras mediante um contrato de formação;
b) Acção de formação profissional: qualquer modalidade de formação organizada, a ser ministrada com o fim de proporcionar a aquisição de conhecimentos, capacidades práticas, atitudes e formas de comportamento requeridos para o exercício de uma profissão ou grupo de profissões;
c) Entidade formadora: qualquer entidade do sector privado, público ou cooperativo que organize e realize acções de formação profissional;
d) Contrato de formação: acordo escrito celebrado entre uma entidade formadora e um formando, mediante o qual este se obriga a frequentar uma acção de formação profissional determinada, com vista à apreensão de um conjunto de conhecimentos e de técnicas de execução das tarefas inerentes a uma profissão ou grupo de profissões, e aquela se obriga a facultar, nas suas instalações ou nas de terceiros, os ensinamentos e meios necessários a tal fim.
Artigo 3.º
Candidatos à formação profissional
1 - Os candidatos à frequência de acções de formação profissional podem inscrever-se nos centros de emprego, nos centros de formação profissional ou directamente junto das entidades formadoras ou de outras entidades previstas nos respectivos programas.2 - Os candidatos à frequência de acções de formação profissional devem satisfazer os requisitos de idade e habilitações literárias ou qualificação profissional exigidos para as mesmas.
3 - Quando o solicitem, devem os candidatos ser informados e orientados profissionalmente pelos serviços de emprego, tendo em conta as necessidades do mercado de emprego, as acções de formação disponíveis e as suas aptidões.
Artigo 4.º
Contrato de formação
1 - Antes do início das acções de formação profissional devem as entidades formadoras celebrar com cada formando um contrato de formação, obrigatoriamente reduzido a escrito, do qual constarão:a) A descrição da acção que o formando vai frequentar;
b) A indicação do local e horário em que se realiza a acção;
c) O montante do subsídio de formação a atribuir;
d) A obrigatoriedade de realização de seguro contra acidentes pessoais;
e) Outros direitos e deveres das partes.
2 - O contrato de formação é feito em duplicado, destinando-se um exemplar a cada outorgante.
3 - O contrato de formação não gera nem titula relações de trabalho subordinado e caduca com a conclusão da acção de formação para que foi celebrado.
Artigo 5.º
Direitos do formando
1 - O formando tem direito a exigir da entidade formadora o cumprimento dos deveres previstos no n.º 1 do artigo 7.º 2 - O formando tem ainda direito a:a) Receber os ensinamentos de harmonia com os programas estabelecidos;
b) Receber pontualmente os subsídios de formação previstos no respectivo contrato;
c) Obter gratuitamente, no final da acção, um certificado comprovativo da frequência e do aproveitamento obtido;
d) Beneficiar de um seguro contra acidentes pessoais nas suas actividades de formação;
e) Receber informação e orientação profissional por parte dos serviços competentes do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) ou das entidades em quem este delegue ou que tenham competência própria em matéria de formação profissional, sempre que o solicite;
f) Recusar a prestação de trabalho subordinado no decurso da acção de formação.
Artigo 6.º
Deveres do formando
1 - São deveres do formando:a) Frequentar com assiduidade e pontualidade a acção de formação, visando adquirir os conhecimentos teóricos e práticos que lhe forem ministrados;
b) Tratar com urbanidade a entidade formadora e seus representantes;
c) Guardar lealdade à entidade formadora, designadamente não transmitindo para o exterior informações sobre equipamentos e processos de fabrico de que tome conhecimento por ocasião da acção de formação;
d) Utilizar com cuidado e zelar pela boa conservação dos equipamentos e demais bens que lhe sejam confiados para efeitos de formação;
e) Cumprir os demais deveres emergentes do contrato de formação.
2 - Finda a acção de formação, se o formando não dispuser de colocação, deve inscrever-se como candidato a emprego no centro de emprego da área da sua residência, apresentando o certificado de aproveitamento.
Artigo 7.º
Deveres da entidade formadora
1 - São deveres da entidade formadora:a) Ministrar a formação programada com respeito pelas condições de concessão do apoio financeiro obtido;
b) Cumprir o contrato de formação;
c) Facultar aos formandos o acesso aos benefícios e equipamentos sociais que sejam compatíveis com a acção frequentada e sua duração;
d) Respeitar e fazer respeitar as condições de higiene e segurança no trabalho;
e) Celebrar um contrato de seguro de acidentes pessoais que proteja os formandos contra riscos e eventualidades que possam ocorrer durante e por causa das actividades de formação;
f) Passar gratuitamente ao formando um documento comprovativo da frequência da acção, em que se certifique a acção concluída, a sua duração e o aproveitamento obtido.
2 - É proibido à entidade formadora recorrer, directa ou indirectamente, aos formandos para satisfazer necessidades normais ou transitórias de mão-de-obra.
3 - A entidade formadora que tenha sido notificada da aprovação de qualquer apoio financeiro público ou comunitário para a realização de acções de formação profissional deve comunicar ao centro de emprego da área da realização das acções, no prazo de oito dias a contar daquela notificação, a natureza, programa, duração, horário, local, número de formandos, requisitos de habilitações e qualificações profissionais e de idade mínima, identificação dos monitores e respectivos currículos, número de vagas disponíveis e subsídios de formação concedidos nas acções a realizar, devendo ainda fazer referência nominal a um responsável para contactos com o referido centro.
4 - A mesma entidade promoverá a oportuna divulgação das acções disponíveis, por meios idóneos, com indicação da natureza da acção e respectivos programas, duração, horário, local e requisitos exigidos.
5 - Nos trinta dias posteriores ao início da acção deve a entidade formadora comunicar ao centro de emprego da área da sua realização a relação dos formandos participantes, com nomes e moradas, indicando os que se encontram vinculados por contrato de trabalho à entidade formadora ou a terceiro, bem como a relação dos monitores e suas disciplinas, e os locais e horários em que são realizadas as acções.
6 - Nos quinze dias posteriores ao termo das acções, a entidade formadora comunicará igualmente ao mesmo centro de emprego a relação dos formandos que as concluíram com aproveitamento, sem aproveitamento e dos desistentes.
7 - Sempre que lhe for solicitado pelas entidades financiadoras e pelos serviços de emprego, deve a entidade formadora prestar informações escritas acerca da formação ministrada, dos formandos e dos monitores, bem como acerca da aplicação do apoio financeiro ou técnico concedido, facultando a observação directa do funcionamento das acções.
8 - A entidade formadora deve colaborar com os serviços de emprego na colocação dos formandos que não venham a celebrar, consigo ou com uma entidade previamente determinada, um contrato de trabalho.
Artigo 8.º
Violação dos deveres do formando
1 - A violação grave ou reiterada dos deveres do formando confere à entidade formadora o direito de rescindir o contrato de formação, cessando imediatamente todos os direitos dele emergentes.2 - A rescisão é feita por escrito, devendo ser indicados os factos que a motivaram.
3 - A faculdade prevista no n.º 1 deve ser precedida de uma advertência, por escrito, ao formando, sempre que a entidade formadora considere que a mesma pode obstar a nova violação e que a permanência do contrato é ainda viável.
4 - Da advertência ou da rescisão do contrato de formação deve a entidade formadora dar conhecimento, no prazo de cinco dias, ao centro de emprego competente.
5 - O disposto neste artigo não prejudica a eventual responsabilidade civil ou criminal do formando.
Artigo 9.º
Violação dos deveres da entidade formadora - contra-ordenações
1 - A violação dos deveres previstos no n.º 1 do artigo 7.º ou a infracção ao disposto no n.º 2 do mesmo artigo constitui contra-ordenação punível com coima de 5000$00 a 100000$00 por cada formando relativamente ao qual se verifique.
2 - A violação dos deveres previstos nos n.os 3 a 8 do artigo 7.º constitui contra-ordenação punível com coima de 50000$00 a 200000$00.
3 - Simultaneamente com a coima, pode a entidade formadora ser privada, total ou parcialmente, do apoio público concedido, com o consequente reembolso, se a este houver lugar.
4 - A privação do direito a apoio público para formação profissional pode ser determinada por período que não exceda dois anos.
5 - O processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas e das sanções acessórias competem à entidade pública financiadora, para a qual reverterá o produto das coimas aplicadas.
6 - De todas as coimas e sanções aplicadas será dado conhecimento ao centro de emprego da área, salvo se a entidade pública financiadora for o IEFP.
7 - No caso de co-financiamento por fundos comunitários, a competência prevista no n.º 5 é atribuída ao IEFP.
8 - Sempre que as entidades obrigadas ao reembolso dos apoios concedidos o não façam voluntariamente no prazo para o efeito indicado, será o mesmo obtido através de execução fiscal.
9 - O pedido de execução fiscal, a promover pelo Ministério Público, será instruído com base em cópia do despacho que determina o reembolso, identificando o devedor, a origem e o montante da dívida, e servirá de título executivo para todos os efeitos legais.
Artigo 10.º
Atribuições dos centros de emprego
1 - Compete aos centros de emprego:a) Manter actualizados e facultar à consulta dos interessados os registos das entidades formadoras co-financiadas por fundos públicos que operem na respectiva área, bem como das acções programadas e das vagas disponíveis, com indicação da sua natureza e finalidade, programas, início e termo, local e requisitos de frequência;
b) Promover a divulgação das acções de formação programadas na respectiva área e fazer a necessária articulação com as entidades públicas e privadas potencialmente interessadas, com vista ao melhor aproveitamento da capacidade formativa existente;
c) Prestar informações acerca do regime definido neste diploma e dos elementos a que se refere a alínea a);
d) Orientar profissionalmente os candidatos que o solicitem;
e) Aceitar os pedidos de inscrição para frequência de acções de formação;
f) Manter actualizado o registo dos candidatos à formação profissional, dos que se encontram a frequentar acções e dos que as concluíram com aproveitamento;
g) Acompanhar, por si ou recorrendo a outras entidades, a realização das acções de formação profissional;
h) Solicitar à Inspecção-Geral do Trabalho a fiscalização do cumprimento das disposições do presente diploma;
i) Transmitir ao Departamento para os Assuntos do Fundo Social Europeu ou a outras entidades públicas promotoras ou financiadoras as irregularidades detectadas na organização e funcionamento das acções;
j) Apoiar a colocação dos formandos que tenham terminado a acção com aproveitamento;
l) Elaborar relatórios semestrais sobre as acções de formação profissional realizadas na respectiva área, a remeter, pelas vias competentes, ao Ministério do Emprego e da Segurança Social e aos ministérios com competência nas áreas de formação.
2 - Os centros de emprego da rede nacional do IEFP adoptarão uma organização interna que permita a especialização do tratamento e acompanhamento da formação profissional na respectiva área, à luz do regime jurídico previsto neste diploma.
Regiões autónomas
O presente diploma aplica-se às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, com as alterações decorrentes das transferências de competências do Governo para os governos regionais.
Artigo 12.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor decorridos 90 dias sobre a data da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 12 de Maio de 1988. - Aníbal António Cavaco Silva - Vasco Joaquim Rocha Vieira - Lino Dias Miguel - Joaquim Fernando Nogueira - Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto - Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares - José Albino da Silva Peneda.
Promulgado em 22 de Junho de 1988.
Publique-se.O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 23 de Junho de 1988.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.