Decreto-Lei 317/88
de 8 de Setembro
O acentuado nível de desenvolvimento atingido nas tecnologias e equipamentos de electrónica, dos sistemas espaciais e das telecomunicações, e nestas, em especial, das comunicações via satélite, tornou possível a expansão recente de estações terrenas para recepção individual ou colectiva de radiodifusão televisiva.
O movimento atingiu já Portugal, como seria de esperar.
A publicação do Decreto-Lei 147/87, de 24 de Março, relativo às radiocomunicações em geral, revogou legislação muito antiga e permite acolher no País os avanços tecnológicos neste domínio. Concretamente no n.º 5 do artigo 9.º estabeleceu-se que as antenas para a recepção individual ou colectiva de programas via satélite obedeceria a legislação própria.
A recepção privada de televisão por satélite constitui uma realidade crescente e plenamente estabelecida.
Em prazo relativamente curto prevê-se que venham a ser utilizados satélites de difusão directa (conhecidos por direct broadcast satellites ou pela sigla DBS) dispondo de potência de emissão suficiente para permitirem a recepção televisiva com alta qualidade através de estações terrenas individuais servidas por antenas de pequenas dimensões e equipamento complementar de custo acessível.
Todavia, actualmente, em Portugal, são as emissões de radiotelevisão retransmitidas por satélites de telecomunicações de uso individual (telefone, telex, dados), captadas pelas antenas parabólicas facilmente disponíveis no mercado.
Daí ser imperativo atender às disposições da Convenção Internacional de Telecomunicações, instrumento fundamental da União Internacional das Telecomunicações, que o Estado Português ratificou recentemente. Há que atender, nomeadamente, à obrigação de assegurar o sigilo das comunicações internacionais ao cumprimento do Regulamento das Radiocomunicações anexo à Convenção.
Por outro lado, o Governo Português, como signatário dos Acordos de Exploração INTELSAT, aprovado pelo Decreto-Lei 169/72, de 16 de Maio, e EUTELSAT, aprovado pelo Decreto 36/85, de 25 de Setembro, através da Companhia Portuguesa Rádio Marconi (CPRM), não poderá esquecer os deveres daí resultantes.
As telecomunicações individualizáveis de uso público são exploradas em regime de exclusivo por empresas para o efeito instituídas (CTT/TLP e CPRM).
Impõe-se, pois, uma proibição legal quanto ao uso de meios tecnológicos que possam afectar tais exclusivos.
Pela Convenção de Bruxelas de 21 de Maio de 1974, relativa à distribuição de sinais portadores de programas transmitidos por satélites, ficam os Estados subscritores, entre os quais Portugal, adstritos a obrigação de envidar todos os seus esforços e promover as diligencias que se encontrem no seu alcance para impedir que no seu território sejam difundidos sinais emitidos por satélite, portadores de programas televisivos cuja difusão se destina à entidade diferente da que os recebe.
A Convenção não se aplica, porém, quando os sinais emitidos pelo organismo de origem, ou por conta do mesmo, se destinam a recepção directa pelo público em geral a partir do satélite.
Demonstra-se, assim, a necessidade de introduzir algumas restrições e condicionamentos à instalação e utilização de antenas destinadas à recepção de emissões de radiotelevisão retransmitidas via satélite.
No que se refere à retransmissão, por via hertziana, de programas captados pelas estações terrenas RTVS, ainda que sem fins lucrativos, manter-se-ão os impedimentos e restrições resultantes da lei e das normas inerentes ao espectro radioeléctrico consagradas em regulamentações nacionais, assim como das estabelecidas nas convenções e acordos internacionais que tenham sido ratificados por Portugal.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo único. - 1 - É aprovado o Regulamento das Estações de Recepção de Sinais de Televisão de Uso Privativo Transmitidos por Satélites, que consta em anexo ao presente diploma, do qual faz parte integrante.
2 - Até à implementação do Instituto das Comunicações de Portugal, as suas funções no âmbito do Regulamento agora aprovado são transitoriamente asseguradas pela empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 3 de Junho de 1988. - Aníbal António Cavaco Silva - João Maria Leitão de Oliveira Martins - António Fernando Couto dos Santos.
Promulgado em 24 de Agosto de 1988.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 26 de Agosto de 1988.
Pelo Primeiro-Ministro, Eurico Silva Teixeira de Melo, Vice-Primeiro-Ministro.
ANEXO
Regulamento das Estações de Recepção de Sinais de Televisão de Uso Privativo Transmitidos por Satélites
CAPÍTULO I
Parte geral
Artigo 1.º
Conceitos
No presente Regulamento entende-se por:
a) Estação terrena de recepção de sinais de televisão para uso privativo (estação terrena RTVS - estação radioeléctrica destinada exclusivamente à recepção, para uso privativo, de sinais de televisão transmitidos através de satélites utilizados para a transmissão de programas de televisão, destinados à recepção pelo público em geral, abrangendo o conjunto de todos os equipamentos necessários a este fim;
b) Recepção para uso privativo - a recepção de sinais a que se refere a alínea anterior, para utilização limitada à propriedade individual ou colectiva, desde que esta esteja integrada no mesmo imóvel ou condomínio sem qualquer utilização das vias públicas e sem lugar a remuneração;
c) Entidade fiscalizadora - órgão a quem, nos termos da lei, compete a fixação e fiscalização das condições de utilização do espectro radioeléctrico.
d) Retransmissão - emissão, após recepção de sinais seguida ou não de conversão de frequência.
Artigo 2.º
Entidade fiscalizadora
A entidade fiscalizadora é o instituto das comunicações de Portugal (ICP).
CAPÍTULO II
Condições de instalação e de utilização
Artigo 3.º
Condições de instalação
1 - É livre a instalação de estações terrenas RTVS de diâmetro inferior a 3 m que se destinem a recepção para uso privativo desde que se verifiquem os requisitos do número seguinte.
2 - A faculdade estabelecida no número anterior pressupõe:
a) O respeito das normas de protecção de pessoas e bens referidas no artigo 12.º;
b) A verificação de outras disposições aplicáveis constantes do Decreto-Lei 147/87, de 24 de Março, e do Regulamento de Radiocomunicações da Convenção Internacional de Telecomunicações, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 3/87, de 30 de Janeiro, adiante designado por Regulamento de Radiocomunicações.
3 - A entidade utilizadora de uma estação terrena RTVS é responsável, perante terceiros, pelo cumprimento das obrigações decorrentes de eventuais direitos de autor relativos a programas recebidos.
Artigo 4.º
Licenciamento
1 - A instalação e utilização das estações terrenas RTVS que não se destinem à recepção para uso privativo será objecto de regulamentação adequada.
2 - Está sujeita a licenciamento a instalação de estações terrenas RTVS, mesmo que se destinem à recepção para uso privativo, desde que o diâmetro da antena seja igual ou superior a 3 m.
Artigo 5.º
Projecto de instalação
1 - No caso a que se refere o n.º 2 do artigo anterior é obrigatória a apresentação de um projecto de instalação à entidade fiscalizadora.
2 - O projecto de instalação deve conter uma memória descritiva, a localização da antena, a infra-estrutura de ligação aos pontos de distribuição e os materiais empregues, em termos a definir pela entidade fiscalizadora.
3 - O projecto de instalação terá também de respeitar as regras que vierem a ser estabelecidas para as antenas colectivas em geral.
Artigo 6.º
Aprovação de projecto
1 - O projecto referido no artigo anterior deve ser entregue à entidade fiscalizadora, que sobre ele se pronunciará no prazo de 30 dias, findo o qual, não havendo posição expressa, é considerado aprovado.
2 - Em caso de indeferimento, a entidade fiscalizadora deve comunicar ao requerente as razões que o motivaram.
3 - Se após indeferimento o requerente entregar novo projecto, a entidade fiscalizadora dispõe do prazo de quinze dias para se pronunciar, findo o qual, não havendo posição expressa, o projecto é considerado aprovado.
Artigo 7.º
Intervenção correctiva da fiscalização
1 - A entidade fiscalizadora pode, em qualquer altura, verificar as condições de instalação e de funcionamento das estações terrenas RTVS de uso privativo.
2 - Nos casos em que se verifique não terem sido respeitados os pressupostos referidos no n.º 2 do artigo 3.º, a entidade fiscalizadora determinará as correcções indispensáveis, as quais devem ser introduzidas no prazo máximo de 60 dias.
3 - Quando a fiscalização verificar que o projecto aprovado não está a ser cumprido, determinará as correcções necessárias, as quais devem ser introduzidas no prazo máximo de 30 dias.
Artigo 8.º
Cessação da licença
1 - Nos casos licenciados ao abrigo do n.º 2 do artigo 4.º, a entidade fiscalizadora pode retirar a licença nas seguintes condições:
a) Quando o Governo o determinar, em execução do disposto no artigo 8.º do Decreto-Lei 147/87, de 24 de Março;
b) Nos casos previstos no Regulamento das Radiocomunicações e, nomeadamente:
Se o licenciamento não observar as condições particulares que lhe foram impostas pela entidade fiscalizadora quanto à utilização da sua estação terrena;
Se a estação terrena RTVS originar interferências no serviço de outros utilizadores do espectro radioeléctrico;
Se a estação terrena for utilizada para fins diferentes dos previstos, nomeadamente se interceptar indevidamente comunicações que não está autorizada a receber ou se violar o segredo das comunicações que receber, divulgando-as.
2 - A cassação de uma licença não confere direito ao reembolso de quaisquer taxas já liquidadas ou a indemnizações de natureza alguma.
Artigo 9.º
Desmontagem de equipamentos
1 - Nos casos previstos no n.º 1 do artigo anterior, todos os detentores de estações terrenas RTVS, quer estejam nas condições do artigo 3.º quer nas do n.º 2 do artigo 4.º, devem proceder de imediato à desmontagem das suas estações.
2 - Nos casos previstos nos n.os 2 e 3 do artigo 7.º, se os prazos fixados para a correcção das deficiências existentes não forem respeitados, a entidade fiscalizadora procederá à desmontagem dos equipamentos.
Artigo 10.º
Obrigatoriedade de homologação dos equipamentos
1 - Por portaria do membro do Governo que tutela as comunicações serão definidas as condições de homologação dos equipamentos.
2 - Nenhuma estação terrena RTVS poderá ser vendida sem que as suas partes constituintes tenham sido objecto de homologação, após um ano da entrada em vigor da respectiva portaria regulamentadora.
Artigo 11.º
Transacção de equipamentos de estação terrena RTVS
Com vista a poder garantir o estipulado no artigo 13.º do Acordo com a INTELSAT e no artigo 15.º do Acordo com a EUTELSAT, os fabricantes, importadores, vendedores ou locadores de equipamentos de estações RTVS que vendam, aluguem ou cedam quaisquer desses equipamentos são obrigados a enviar à entidade fiscalizadora, no prazo de 30 dias a contar da data em que se realizou a transacção, os seguintes elementos:
a) A data e a natureza da transacção;
b) O nome, a morada e outros elementos identificativos do novo detentor desses equipamentos;
c) A marca, o tipo e o número de série dos equipamentos;
d) O número de aprovação dos equipamentos.
Artigo 12.º
Protecção de pessoas e bens
1 - Na instalação e utilização de uma estação terrena RTVS devem ser observadas todas as normas regulamentares vigentes para as instalações eléctricas no que respeita a isolamento e segurança de pessoas e bens.
2 - A instalação de uma estação terrena RTVS não pode impedir a passagem de pessoas e os acessos a chaminés e a outras partes de edifícios.
3 - Na instalação de uma estação terrena RTVS devem ser observados todos os preceitos estabelecidos no Regulamento das Solicitações em Edifícios e Pontes.
4 - Nenhuma estação terrena RTVS pode originar perturbações noutros serviços de radiocomunicações.
5 - A instalação deve respeitar todos os regulamentos urbanísticos existentes e ter em conta os aspectos arquitectónicos.
Artigo 13.º
Fiscalização das estações RTVS
1 - A fiscalização das estações terrenas RTVS, a realizar pela entidade fiscalizadora, incide sobre as condições de instalação e utilização dos equipamentos.
2 - Caso se verifique qualquer infracção às disposições do presente Regulamento, a fiscalização levantará o respectivo auto para efeitos de execução.
3 - Para fiscalização e execução dos preceitos contidos neste Regulamento podem os agentes para tal designados solicitar a colaboração de outras entidades.
Artigo 14.º
Protecção da recepção
1 - A entidade fiscalizadora não garante a protecção da recepção de programas contra interferências de origem industrial, bem como produzidas por outros serviços radioeléctricos, existentes ou futuros.
2 - As reclamações das entidades afectadas devem ser dirigidas à entidade fiscalizadora, que as estudará, caso a caso, e emitirá as soluções a adoptar para a reposição das condições satisfatórias de recepção.
CAPÍTULO III
Contraprestações
Artigo 15.º
Contraprestações pecuniárias
As contraprestações pecuniárias aplicáveis ao licenciamento previsto no n.º 2 do artigo 4.º e às homologações referidas no artigo 10.º são as que constam de tarifário aprovado por portaria do membro do Governo com a tutela das comunicações.
CAPÍTULO IV
Contra-ordenações
Artigo 16.º
Coimas
1 - Sem prejuízo das sanções previstas na lei respeitantes às radiocomunicações, a violação das prescrições constantes do presente Regulamento constitui ilícito de mera ordenação social, passível da aplicação das seguintes coimas:
a) De 30000$00 a 600000$00, no caso de violação do disposto nos artigos 4.º, n.º 2, e 10.º;
b) De 20000$00 a 400000$00, no caso de violação do disposto nos artigo 11.º;
c) De 10000$00 a 200000$00, no caso de violação do disposto nos artigos 3.º, n.os 1 e 2, 5.º, 7.º, n.os 2 e 3, 8.º, n.º 1, alínea b), 9.º, n.º 1, e 12.º
2 - A negligência é punível.
3 - No caso previsto na alínea a) do número anterior será aplicada, como sanção acessória, a apreensão dos equipamentos utilizados e a sua perda em favor da entidade fiscalizadora.
Artigo 17.º
Competência
Incumbe à entidade fiscalizadora o processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas previstas no presente Regulamento.
CAPÍTULO V
Disposições transitórias e finais
Artigo 18.º
Período transitório
Às entidades detentoras de estações terrenas RTVS nas condições definidas no n.º 2 do artigo 4.º existentes à data de entrada em vigor do presente Regulamento é fixado um prazo de 90 dias para a sua legalização.
Artigo 19.º
Normas subsidiárias
Em tudo o que não estiver expressamente previsto no presente Regulamento é aplicável, subsidiariamente, o disposto na lei em matéria de radiocomunicação.