de 1 de Março
1. A aceleração do progresso técnico ultimamente verificado na actividade dos transportes marítimos, com as consequentes e profundas repercussões sobre as condições de trabalho e de vida dos trabalhadores, justificaria, só por si, a necessidade de revisão do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho do Pessoal da Marinha de Comércio.Acresce que se mostra desactualizada a legislação que até agora regia essa matéria e que constava fundamentalmente do Decreto-Lei 45968, de 15 de Outubro de 1964, e do Regulamento de Inscrição Marítima, Matrícula e Lotações dos Navios da Marinha Mercante e da Pesca, aprovado pelo Decreto 45969, da mesma data.
Estes diplomas apresentavam ainda o grave inconveniente de não permitir a renovação da regulamentação colectiva do trabalho no sector.
Entendeu, por isso, o Governo ser urgente proceder à revisão da citada legislação, tarefa de que foi incumbida a Comissão Nacional para o Estudo dos Problemas da Marinha de Comércio, criada pela Portaria 143/70, de 12 de Março, na qual estão representados, além dos departamentos governamentais interessados, o Grémio dos Armadores da Marinha Mercante e a União dos Sindicatos dos Oficiais, Mestrança e Marinhagem da Navegação Marítima. O presente diploma é produto do labor dessa Comissão.
2. Diversas e profundas são as inovações e aperfeiçoamentos que este decreto-lei contém, referindo-se aqui apenas os que se mostram mais significativos.
3. Pela primeira vez adopta-se entre nós, nesta matéria, uma técnica precisa de codificação, incluindo-se no diploma quase toda a regulamentação referente ao contrato individual do trabalho no sector da marinha de comércio.
Sem esquecer as especialidades próprias deste tipo de trabalho, não se perdeu de vista um justo equilíbrio e uniformidade entre os vários sectores de trabalho subordinado Por esta razão, e pela vantagem de aproveitar os ensinamentos já recolhidos nesse diploma legal, procurou-se, tanto quanto possível, adaptar o regime aprovado pelo Decreto-Lei 49408, de 24 de Novembro de 1969. Tomaram-se também em consideração as orientações de carácter internacional e a mais moderna legislação europeia neste campo.
4. Sob o ponto de vista de conteúdo do diploma, a mais importante inovação é a que respeita ao próprio conceito de contrato de trabalho para o pessoal da marinha de comércio.
Até agora, o chamado «contrato de matrícula» era celebrado entre o comandante e o tripulante, para um determinado navio, por uma ou mais viagens ou pelo prazo máximo de três anos.
Pelo presente diploma, o contrato passa a ser celebrado entre a entidade armadora e o tripulante, sendo obrigatoriamente reduzido a escrito. Deixa, assim, de ser elemento essencial do contrato o chamado rol de matrícula.
É admitido o contrato sem prazo, presumindo-se que a actividade profissional do tripulante será prestada a bordo de qualquer embarcação do armador, salvo convenção das partes em contrário.
Este sistema, além de estar de acordo com a Recomendação 139, adoptada na 55.ª Sessão (Marítima) da Conferência Internacional do Trabalho, permite a constituição de quadros permanentes de tripulantes nas empresas e visa garantir a estabilidade de emprego para o trabalhador marítimo. Tem, por outro lado, a vantagem de assegurar às empresas a formação de pessoal tecnicamente qualificado para navios cada vez mais automatizados.
5. No respeitante ao recrutamento do pessoal, restringem-se as classes da categoria da marinhagem, em relação às quais o recrutamento é feito por escala.
Mesmo nas categorias em que a escala subsiste possibilita-se ao armador o recrutamento por livre escolha, desde que o contrato seja celebrado sem prazo certo ou com prazo superior a seis meses. Permite-se assim maior liberdade de escolha às empresas armadoras para o recrutamento de tripulantes contratados por tempo indeterminado e em qualquer dos seus navios.
Passam os sindicatos a ter agora importante intervenção no recrutamento do pessoal e as cédulas marítimas, independentemente do local da emissão, a ter validade em todo o território nacional para efeito de inscrição para embarque.
6. Outra significativa inovação do presente diploma (que vem de encontro à necessidade de reorganização do trabalho marítimo) reside na consagração do princípio da polivalência das funções a bordo, sem que daí advenha prejuízo monetário para o trabalhador.
7. Para ocorrer à grave situação que resulta para os trabalhadores marítimos de despedimento colectivo ou tecnológico determinado pela venda ou abate de navios ou pela reorganização ou fusão de empresas armadoras, estabeleceu-se a aplicação a tais situações do regime definido no Decreto-Lei 44506, de 10 de Agosto de 1962.
8. Finalmente, passa a ser da exclusiva competência dos tribunais de trabalho a apreciação dos litígios emergentes das relações de trabalho do pessoal da marinha de comércio, independentemente do valor das questões.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
Artigo 1.º É aprovado o Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho do Pessoal da Marinha de Comércio, que se publica em anexo ao presente decreto-lei e dele faz parte integrante.
Art. 2.º - 1. O Regime Jurídico a que se refere o artigo anterior não é aplicável ao pessoal das embarcações do Estado ou dependentes de administrações de carácter autónomo, nem ao das embarcações de comércio de tráfego local.
2. O mesmo Regime Jurídico é aplicável aos rebocadores e embarcações auxiliares costeiras e do alto.
Art. 3.º Ficam sujeitos ao Regime aprovado por este diploma os contratos individuais celebrados antes da entrada em vigor do mesmo, salvo na parte em que prescrevam regime mais favorável ao pessoal abrangido.
Art. 4.º Para os efeitos deste diploma, as expressões abaixo indicadas, contidas em disposições legais também aplicáveis ao pessoal por ele abrangido, passarão a entender-se da forma seguinte:
a) «Rol de matrícula» ou «rol de equipagem»: rol de tripulação;
b) «Matrícula» ou «contrato de matrículas»: inscrição no rol de tripulação.
Art. 5.º As disposições que constam deste diploma podem ser introduzidas noutra legislação marítima, por portaria do Ministro da Marinha.
Art. 6.º Este diploma entra em vigor em 1 de Abril de 1973.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Marcello Caetano - Manuel Pereira Crespo - Baltasar Leite Rebelo de Sousa.
Promulgado em 16 de Fevereiro de 1973.
Publique-se.O Presidente da República, AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ.
Para ser presente à Assembleia Nacional.
REGIME JURÍDICO DO CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO DO PESSOAL
DA MARINHA DE COMÉRCIO
CAPÍTULO I
SECÇÃO I
Do contrato individual de trabalho
Artigo 1.º
(Noção e âmbito)
1. O contrato individual de trabalho do pessoal da marinha de comércio é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade profissional marítima a um armador da marinha de comércio, sob a sua autoridade e direcção ou do seu representante legal.2. O pessoal da marinha de comércio está sujeito a inscrição marítima, nos termos da legislação em vigor.
3. O presente diploma é aplicável ao pessoal da marinha de comércio a bordo das suas embarcações ou quando for colocado pelo armador em terra, temporariamente e no exercício de funções específicas da sua profissão marítima.
4. Para efeitos deste diploma:
a) A expressão «contrato» ou «contrato de trabalho» significa o contrato individual de trabalho do pessoal da marinha de comércio;
b) A expressão «comandante» significa o tripulante que desempenha ou as funções de comandante ou as de mestre;
c) A expressão «tripulante» significa o marítimo que faz parte da tripulação de uma embarcação ou está contratado para fazer parte dessa tripulação.
Artigo 2.º
(Tipos de contrato)
1. O contrato de trabalho admite as seguintes modalidades:a) Contrato de trabalho sem prazo, quando celebrado por tempo indeterminado;
b) Contrato de trabalho com prazo certo, quando celebrado por tempo determinado;
c) Contrato de trabalho com prazo incerto, quando celebrado por uma ou mais viagens ou para substituição de um tripulante.
2. O contrato com prazo; certo ou incerto, superior a três anos considera-se um contrato por tempo indeterminado.
3. O contrato de trabalho considera-se celebrado sem prazo na falta de estipulação escrita em contrário.
4. Sem prejuízo do disposto no artigo 82.º, o contrato com prazo passará a considerar-se sem prazo, salvo estipulação escrita em contrário, quando o marítimo continuar ao serviço do armador para além do prazo certo ou incerto de duração do mesmo contrato.
5. A estipulação do prazo será nula se tiver por fim iludir as disposições que regulam os contratos sem prazo.
Artigo 3.º
(Forma)
O contrato de trabalho será reduzido a escrito.
Artigo 4.º
(Promessa de contrato de trabalho)
1. A promessa de contrato de trabalho só é válida se constar de documento assinado pelos promitentes, no qual se exprima, em termos inequívocos, a vontade de se obrigar a espécie de trabalho a prestar e a respectiva retribuição.2. Na falta de cláusula penal, o não cumprimento da promessa de contrato de trabalho dá lugar a responsabilidade nos termos gerais de direito.
3. Não é aplicável à promessa de que trata este preceito o disposto no artigo 830.º do Código Civil.
Artigo 5.º
(Período experimental)
1. Nos contratos de trabalho sem prazo haverá um período experimental de seis meses, podendo o mesmo, por escrito, ser reduzido ou eliminado.2. O período experimental é sempre contado para efeitos de antiguidade.
Artigo 6.º
(Cédula marítima)
1. A falta de cédula marítima ou de licença especial para embarque importa nulidade do contrato.2. Se, por decisão que já não admite recurso, a cédula marítima ou a licença especial vier a ser cancelada posteriormente à celebração do contrato, este caduca logo que as partes sejam notificadas do facto pela entidade competente.
3. Para efeitos do n.º 2, poderão as partes ser notificadas pela entidade competente através dos respectivos organismos corporativos.
Artigo 7.º
(Invalidade parcial)
Serão nulas as condições de trabalho constantes de contratos de trabalho ou inscritas no rol de tripulação que sejam menos favoráveis que as estabelecidas neste diploma e em convenções colectivas ou portarias de regulamentação do trabalho marítimo.
SECÇÃO II
Da admissão
Artigo 8.º
(Competência)
1. É da competência do armador celebrar os contratos de trabalho com os marítimos, qualquer que seja a sua categoria.2. O armador pode delegar no comandante do navio a sua competência para celebrar com os tripulantes contratos de trabalho, com prazo certo ou incerto, mediante a assinatura de uma credencial na qual declare ter-lhe entregue o comando da embarcação e nele delegado tal competência.
3. Fora do porto de armamento é sempre da competência do comandante contratar os tripulantes necessários para completar a lotação da sua embarcação por uma só viagem.
Artigo 9.º
(Formas de recrutamento)
O recrutamento é efectuado por escolha ou por escala e recai sobre todo o indivíduo habilitado com cédula marítima, independentemente da capitania ou delegação marítima que a tenha passado.
Artigo 10.º
(Inscrição e oferta para embarque)
1. Todo o marítimo que não seja obrigatoriamente recrutado por escolha tem de estar inscrito numa única escala para embarque, na sede ou delegação do respectivo sindicato, independentemente do local de emissão da sua cédula.2. Só podem ser escolhidos para embarque os marítimos que, não sendo obrigatoriamente recrutados por escolha, figurem numa das escalas de embarque referidas no número anterior.
3. A fim de facilitar o recrutamento dos marítimos obrigatoriamente recrutados por escolha, deverão existir, na sede ou delegação do respectivo sindicato, listas onde figurem o nome e categoria profissional dos marítimos que tenham comunicado o seu desejo de figurar nessas listas.
4. Sempre que lhes seja solicitado, os sindicatos deverão colaborar no recrutamento.
Artigo 11.º
(Recrutamento por escolha)
1. Por escolha, são obrigatoriamente recrutadas todas as categorias dos oficiais e da mestrança.2. Poderão ainda ser recrutados por escolha os seguintes elementos da marinhagem:
a) Os contratados sem prazo ou com prazo certo superior a seis meses;
b) Os contratados para a primeira viagem de embarcação;
c) Os contratados para viagens de inauguração de carreiras e cruzeiros;
d) Os contratos para embarcações que façam viagens em sistema de racionalização do trabalho a bordo;
e) Os contratados para embarcações de assistência a outras embarcações;
f) Os contratados para navios frigoríficos, navios-tanques de carga líquida ou liquefeita, navios costeiros e navios especiais com risco, responsabilidades ou arduidades anormais, tais como dragas, embarcações com menos de 300 t de arqueação bruta e rebocadores ou equiparáveis;
g) Os paioleiros de máquinas de câmaras e de convés;
h) Os marinheiros de 1.ª classe;
i) Os cozinheiros, ajudantes de cozinheiro para a pastelaria e pasteleiros;
j) Os chefes de mesa;
l) Os encarregados de câmara nos navios de passageiros ou de carga;
m) Os frigorifeiros e ajudantes de frigorifeiros;
n) Os botequineiros e copeiros em navios de passageiros;
o) Os encarregados de lavandaria;
p) Os empregados de câmara dos serviços de mesa da marinhagem;
q) Os padeiros;
r) Os telefonistas;
s) Os cabeleireiros, barbeiros e manicuras;
t) Os empregados de câmara do sexo feminino.
Artigo 12.º
(Recrutamento por escala)
1. Excepto no caso de tripulantes nacionais para embarcações estrangeiras, cujo recrutamento é sempre por escolha, todos os elementos de marinhagem podem ser recrutados por escala, sistema de recrutamento que é, no entanto, só obrigatório, em embarcações nacionais, para os elementos não referidos no n.º 2 do artigo anterior.2. Para fins do disposto no número anterior, existirão, em cada sede ou delegação dos competentes sindicatos, tantas escalas de embarque quantas as categorias de marítimos a inscrever.
3. O recrutamento por escala efectua-se mediante requisição numérica, segundo a ordem de antiguidade de inscrição na escala da respectiva categoria existente na localidade onde o navio se encontra.
4. No caso de haver necessidade de um ou mais tripulantes obrigatoriamente recrutados por escala e na localidade onde o navio se encontra não houver na escala qualquer tripulante da necessária categoria ou de categoria que a possa legalmente substituir, o recrutamento far-se-á nas escalas das localidades sucessivamente mais próximas.
5. O armador requisitante tem o direito de recusar a celebração do contrato com o inscrito marítimo que tenha averbado no registo disciplinar e criminal da sua cédula punições disciplinares graves ou delito de direito comum punido com pena maior, sem que resulte para o mesmo inscrito marítimo a perda da sua posição na escala.
6. O inscrito marítimo requisitado tem direito a recusar a celebração de contrato com o armador requisitante, desde que apresente motivos que se considerem justificativos, não implicando isso a perda da sua posição na escala.
7. O marítimo nas condições do número anterior, a quem não seja aceite o motivo da recusa, será excluído da escala e terá, para voltar a ingressar nela, de requerer nova inscrição, reentrando pelo fim.
SECÇÃO III
Do embarque dos tripulantes
Artigo 13.º
(Apresentação de documentos)
1. O tripulante só poderá embarcar se tiver a sua cédula marítima e restante documentação em ordem, nos termos do Regulamento de Inscrição Marítima, Matrícula e Lotações dos Navios da Marinha Mercante e da Pesca.2. As cédulas marítimas, os certificados de aptidão física, as licenças militares e quaisquer outros documentos eventualmente necessários para o embarque serão apresentados ao armador ou ao comandante da embarcação.
3. A documentação dos tripulantes deve ser presente à autoridade marítima ou consular do porto onde efectuarem o embarque com uma antecedência não inferior a quarenta e oito horas, salvo casos de força maior.
4. Uma vez assinado o rol de tripulação, e até o desembarque, as cédulas ficarão em poder e à responsabilidade do comandante.
Artigo 14.º
(Recusa por parte do comandante)
1. Ao comandante da embarcação assiste a faculdade de recusar o embarque de um tripulante contratado pelo armador, desde que, para tanto, lhe apresente motivo justificado, ainda que não decorrente dos averbamentos constantes da cédula marítima do tripulante.2. A recusa a que se refere o número anterior em nada afecta a validade do contrato de trabalho celebrado entre armador e tripulante.
Artigo 15.º
(Rol de tripulação)
1. O rol de tripulação de uma embarcação é a relação nominal oficial de todos os marítimos que constituem a sua tripulação, feita pela autoridade marítima ou consular, segundo modelo a aprovar por portaria do Ministro da Marinha, e deverá conter:a) Nomes da embarcação, do armador e do comandante;
b) Indicação da viagem ou viagens completas para que o rol de tripulação é válido, com discriminação dos portos de escala previstos;
c) Por cada tripulante: nome, idade, categoria, porto de inscrição, número da respectiva cédula marítima, funções que vai desempenhar e licença militar, se necessária;
d) Datas de embarque do tripulante e do respectivo desembarque, quando este se realizar;
e) As condições que a autoridade marítima ou consular entenda dever incluir no rol de tripulação;
f) As assinaturas do comandante e restantes tripulantes e da autoridade marítima ou consular.
2. As condições constantes do rol de tripulação serão lidas aos interessados na presença da autoridade marítima ou consular.
3. Uma cópia dos contratos de trabalho dos tripulantes que constam do rol de tripulação deverá ficar apensa a este.
4. As licenças especiais de embarque passadas nos termos do Regulamento de Inscrição Marítima, Matrícula e Lotações dos Navios da Marinha Mercante e da Pesca deverão ser apensas ao rol de tripulação, depois de especificado o prazo da sua validade.
Artigo 16.º
(Bilhete de desembarque)
1. O bilhete de desembarque é um documento que o comandante deverá entregar ao tripulante no acto de desembarque, de modelo a fixar por portaria do Ministro da Marinha, e, na parte comum ao rol de tripulação, deverá ser uma transcrição deste.2. Quando houver desembarque de um tripulante para gozo de férias ou qualquer outro motivo, o comandante entregará a cédula com o respectivo bilhete de desembarque à autoridade marítima; esta, depois de registar na cédula o conteúdo do referido bilhete e de a conferir, entregá-la-á ao tripulante, contra a apresentação do duplicado do mesmo bilhete, sendo este enviado à entidade emissora da cédula para ser transcrito no registo respectivo.
3. Quando o desembarque de um tripulante tiver lugar em porto estrangeiro, o averbamento do bilhete de desembarque na respectiva cédula marítima será feito pelo comandante da embarcação de que o tripulante desembarcou e visado pela respectiva autoridade consular, que, em seguida, entregará a cédula ao interessado; o duplicado do bilhete será enviado à entidade emissora da cédula pelo comandante, para ser feito no respectivo registo o competente averbamento.
4. O armador comunicará à autoridade marítima ou consular o desembarque do comandante e preencherá o respectivo bilhete de desembarque.
5. Pela falta de entrega, em devido tempo, à autoridade marítima ou consular dos bilhetes de desembarque, nos termos do Código Comercial português e do presente diploma, pagará o comandante por cada bilhete não entregue a multa de 50$00.
CAPÍTULO II
Direitos, deveres e garantias das partes
Artigo 17.º
(Deveres do armador)
São deveres do armador:a) Tratar com urbanidade e lealdade o marítimo, respeitando-o como seu colaborador;
b) Pagar-lhe pontualmente a retribuição que lhe é devida;
c) Instalar os marítimos em boas condições de salubridade e higiene, especialmente no que respeita a ventilação dos locais de trabalho, sua iluminação e, quanto possível, climatização, observando os indispensáveis requisitos de segurança;
d) Observar as convenções internacionais ratificadas pelo Estado Português sobre a segurança e as condições de trabalho a bordo;
e) Contribuir para a elevação do nível de produtividade do marítimo;
f) Indemnizar os marítimos dos prejuízos resultantes de acidentes de trabalho e doenças profissionais, nos termos legais ou convencionais;
g) Facilitar aos marítimos o exercício de cargos para que sejam nomeados em organismos corporativos, instituições de previdência comissões corporativas e outros a estes inerentes;
h) Cumprir todas as demais obrigações decorrentes das leis em vigor e do respectivo contrato de trabalho.
Artigo 18.º
(Deveres do marítimo)
São deveres do marítimo:a) Respeitar e tratar com urbanidade e lealdade o armador, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as demais pessoas que estejam ou entrem em relações com a embarcação;
b) Comparecer ao serviço com assiduidade e realizar o trabalho com zelo e diligência;
c) Obedecer aos superiores hierárquicos em tudo quanto respeita à execução e disciplina do trabalho;
d) Não divulgar informações referentes à organização e métodos de trabalho a bordo, com ressalva das que deva prestar às entidades competentes;
e) Zelar pela conservação e boa utilização da embarcação e seu equipamento;
f) Fazer sempre quanto em si couber em defesa do que transporta a embarcação;
g) Colaborar com os superiores hierárquicos e companheiros de trabalho no sentido da melhoria da produtividade e da racionalização do trabalho;
h) Cumprir as demais obrigações decorrentes das leis em vigor e do respectivo contrato de trabalho.
Artigo 19.º
(Garantias do marítimo)
É proibido ao armador:a) Opor-se, por qualquer forma, a que o marítimo exerça os seus direitos, bem como despedi-lo ou aplicar-lhe sanções por causa desse exercício;
b) Exercer pressões sobre o marítimo para que actue no sentido de influir desfavoralmente nas suas condições de trabalho ou nas dos seus companheiros;
c) Diminuir a retribuição, salvo nos casos de transferência de embarcações de diferentes classes e, bem assim, quando o marítimo volta a desempenhar as suas funções anteriores depois de interinidade em função superior ou quando cessem as circunstâncias que determinaram o pagamento da subvenção a que se refere a alínea e) do artigo 70.º ou deixar de estar isento de horário de trabalho;
d) Obrigar o marítimo a adquirir bens ou a utilizar serviços fornecidos pelo armador ou por pessoa por ele indicada;
e) Explorar, com fins lucrativos, quaisquer cantinas, refeitórios, economatos ou outros estabelecimentos, directamente relacionados com o trabalho, para fornecimento de bens ou prestação de serviços aos marítimos;
f) Despedir e readmitir o marítimo, mesmo com o acordo deste, havendo o propósito de o prejudicar em direitos ou garantias decorrentes da antiguidade.
Artigo 20.º
(Direitos e deveres do comandante para com os tripulantes e vice-versa)
1. Os direitos e deveres do comandante da embarcação para com os tripulantes, e vice-versa, começam com a sua assinatura no rol de tripulação e cessam com a entrega do bilhete de desembarque.
2. A bordo da embarcação os tripulantes estão sob a autoridade e direcção do seu comandante, como legal representante do armador.
Artigo 21.º
(Natureza dos serviços prestados)
1. O marítimo deve exercer a actividade correspondente à categoria para que foi contratado, sem prejuízo dos direitos e deveres decorrentes das categorias a que posteriormente ascender, mas pode desempenhar as funções correspondentes a qualquer das categorias que tenha possuído.2. Ouvido, sempre que possível, o sindicato respectivo e mediante acordo com o marítimo, reduzido a escrito e sancionado pela autoridade marítima competente, pode o mesmo, por tempo ou número de viagens fixado, desempenhar funções não correspondentes à sua categoria desde que possua as habilitações necessárias para o efeito.
3. Quando, a navegar, se verifique o impedimento de um tripulante e o comandante considere imperioso preencher o seu lugar, poderá utilizar para o efeito outro tripulante de categoria diferente, mas só até à chegada ao próximo porto nacional.
4. As mudanças a que se referem os dois números anteriores não implicam diminuição na retribuição nem modificação na posição do marítimo, e sempre que às tarefas desempenhadas corresponder um tratamento e retribuição mais favoráveis, o marítimo terá direito a esse tratamento e retribuição.
Artigo 22.º
(Transferência de embarcação)
1. Presume-se que a actividade profissional do pessoal da marinha de comércio será prestada a bordo de qualquer embarcação do mesmo armador, salvo se as partes, por escrito, outra coisa acordarem.2. Se o tripulante, ao abrigo do disposto na parte final do número anterior, tiver sido contratado para prestar serviço em determinada embarcação, só com o seu acordo, reduzido a escrito, poderá ser transferido para outra embarcação do mesmo armador.
3. Na falta de acordo, assiste ao tripulante a faculdade de rescindir o contrato, com direito à indemnização fixada nos artigos 90.º ou 91.º
Artigo 23.º
(Transmissão da empresa armadora)
1. A posição que dos contratos de trabalho decorre para o armador transmite-se ao adquirente da empresa, salvo se, antes da transmissão, o contrato houver deixado de vigorar nos termos legais.2. O adquirente da empresa armadora é solidariamente responsável pelas obrigações do transmitente vencidas nos seis meses anteriores à transmissão, ainda que respeitem a marítimos cujos contratos hajam cessado, desde que reclamados no prazo de trinta dias após terem tomado conhecimento da transmissão.
Artigo 24.º
(Liberdade de trabalho)
1. São nulas as cláusulas dos contratos de trabalho que, por qualquer forma, possam prejudicar o exercício do direito ao trabalho, após a cessação do contrato.2. São proibidos quaisquer acordos entre armadores no sentido de, reciprocamente, limitarem a admissão de marítimos que lhes tenham prestado serviço.
Artigo 25.º
(Privilégios creditórios)
Os créditos emergentes do contrato de trabalho ou de violação ou cessação deste contrato pertencentes ao marítimo gozam do privilégio que a lei geral consigna.
Artigo 26.º
(Prescrição de créditos)
1. Os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, quer pertencentes ao tripulante, quer pertencentes ao armador, extinguem-se por prescrição decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato, salvo nos casos que envolvam responsabilidade criminal.2. Só poderão ser exigidos créditos vencidos nos últimos cinco anos de vigência do contrato de trabalho.
Artigo 27.º
(Indemnização por perda de haveres dos tripulantes)
1. O armador, directamente ou por intermédio da companhia seguradora, indemnizará o tripulante pela perda total ou parcial dos seus haveres pessoais que se encontrarem a bordo e que resulte de avaria ou sinistro marítimo.
2. O montante da indemnização a que se refere o número anterior será fixado em convenção colectiva de trabalho.
3. Da indemnização atribuída será deduzido o valor dos haveres pessoais que sejam salvos ou recuperados, assim como o valor que os tripulantes venham a obter por outra via como compensação por tais perdas.
CAPÍTULO III
Da formação profissional
Artigo 28.º
(Formação profissional)
1. O armador facilitará a todos os marítimos o seu aperfeiçoamento profissional, podendo, para tanto, criar cursos e ainda facultar, dentro das conveniências do seu serviço e, sempre que possível, por ordem de antiguidade, a frequência de cursos relacionados com a sua profissão.2. A faculdade referida na parte final do número anterior será concedida nas seguintes condições:
a) Assumir o marítimo, por escrito, a obrigação de prestar serviço à empresa armadora por um período máximo de três anos, após a conclusão do respectivo curso;
b) Receber durante o curso a média ponderada dos vencimentos base referentes ao ano civil do ingresso no curso.
3. O não cumprimento do estabelecido na alínea a) do número anterior, sempre que não determinado por caso de força maior ou justa causa de rescisão, constitui o marítimo na obrigação de pagar ao armador, a título de indemnização, a totalidade ou a parte proporcional da quantia que tiver recebido nos termos da alínea b) do mesmo número.
4. Fora dos casos previstos nos números anteriores, o marítimo tem sempre direito à suspensão do contrato pelo período de tempo necessário à frequência de cursos oficiais relacionados com a sua profissão, aplicando-se à suspensão do contrato o regime estabelecido nos artigos 63.º e seguintes.
CAPÍTULO IV
Da prestação do trabalho e das condições de vida a bordo
SECÇÃO 1
Do modo da prestação do trabalho e da sua duração
Artigo 29.º
(Competência do armador)
1. Dentro dos limites decorrentes das disposições legais em vigor, compete ao armador fixar os termos em que deve ser prestado o trabalho a bordo.2. Para o efeito, poderá o armador elaborar regulamentos internos, aos quais dará a necessária publicidade para o devido conhecimento dos tripulantes, não podendo deles constar condições de trabalho menos favoráveis do que as estabelecidas neste diploma e em convenções colectivas ou portarias de regulamentação de trabalho.
Artigo 30.º
(Período normal de trabalho)
1. Denomina-se período normal de trabalho o número de horas de trabalho que o tripulante se obrigou a prestar.2. A duração máxima do período normal de trabalho é de oito horas por dia e de quarenta e oito horas por semana, quer a navegar, quer em porto.
3. Nas embarcações costeiras de arqueação bruta inferior a 500 t a duração máxima do período normal de trabalho é de um total de vinte e quatro horas em dois dias consecutivos, sem, no entanto, poder exceder a média do horário semanal de quarenta e oito horas de trabalho em quatro semanas consecutivas.
Artigo 31.º
(Horário de trabalho)
1. O trabalho compreendido no período normal pode ser prestado:a) Em serviços ininterruptos, a quartos corridos;
b) Em serviços intermitentes, por períodos de trabalho que não poderão ter início antes das 5 nem terminar depois das 22 horas.
2. A duração dos quartos em serviços ininterruptos e a duração dos períodos de trabalho em serviços intermitentes serão reguladas em convenção colectiva de trabalho.
Artigo 32.º
(Isenção do horário de trabalho)
1. Poderá ser estabelecida em convenção colectiva de trabalho isenção de horário para tripulantes que exerçam determinadas funções.2. A isenção do horário de trabalho confere direito a uma retribuição especial.
Artigo 33.º
(Trabalho extraordinário)
1. Considera-se trabalho extraordinário:a) O trabalho prestado, quer em serviços ininterruptos, quer em serviços intermitentes, que exceda o período normal de trabalho;
b) O trabalho prestado em serviços intermitentes compreendido entre as 22 e as 5 horas;
c) O trabalho prestado em dia de descanso.
2. O trabalho extraordinário, quando prestado por pessoal não isento de horário de trabalho, confere direito a remuneração extraordinária, de acordo com o estabelecido em convenção colectiva de trabalho.
3. Exceptuam-se os seguintes trabalhos, que todos os tripulantes são obrigados a executar sem direito a remuneração extraordinária:
a) O trabalho ordenado pelo comandante com vista à segurança da embarcação, da carga ou das pessoas que se encontrem a bordo, quando circunstâncias de força maior o imponham, o que deve ficar registado no respectivo Diário de Navegação;
b) O trabalho ordenado pelo comandante com o fim de prestar assistência a outras embarcações, aeronaves ou pessoas em perigo, sem prejuízo da comparticipação a que o tripulante tenha direito em indemnização ou salários de salvamento e assistência;
c) Os exercícios de salva-vidas, de extinção de incêndios e outros similares previstos pela Convenção Internacional para Salvaguarda da Vida Humana no Mar ou determinados pelas autoridades marítimas;
d) O trabalho exigido por formalidades aduaneiras, quarentena ou outras disposições sanitárias;
e) A determinação do ponto da embarcação pelos praticantes de piloto;
f) A normal rendição dos quartos.
Artigo 34.º
(Movimentação de carga e mantimentos)
Quando em porto se tornar necessário, por falta de pessoal especializado em terra, que os tripulantes exerçam funções de movimentação e arrumação de cargas a bordo e movimentação de mantimentos fora da embarcação, tal trabalho será remunerado como extraordinário, mesmo quando executado no período normal de trabalho.
Artigo 35.º
(Trabalho ininterrupto em porto)
Em porto, o trabalho ininterrupto a bordo que vise a segurança da embarcação e a manutenção e regularidade dos serviços é assegurado pelo pessoal que for designado para o efeito, em regime de quartos, não devendo a permanência a bordo, por efeito de serviço, ser inferior a quatro horas por dia em porto de escala e a oito horas por dia em porto de armamento nem exceder vinte e quatro horas seguidas.
Artigo 36.º
(Folgas por trabalho ininterrupto em porto)
1. O trabalho prestado nas condições do artigo anterior confere direito a folga igual ao dobro do tempo de permanência a bordo por efeito de serviço.
2. O tempo de folga adquirido ao abrigo do número anterior que, por razões ponderosas, não possa ser concedido seguidamente a ter sido adquirido o respectivo direito sê-lo-á no porto de armamento no final da viagem ou acrescido às férias respeitantes a esse ano, ou será remido a dinheiro.
3. Para as embarcações costeiras, e mediante acordo do tripulante, a folga poderá ser gozada em qualquer porto nacional.
Artigo 37.º
(Caderneta do registo de trabalho)
1. Cada tripulante possuirá uma caderneta individual, de modelo a aprovar por portaria do Ministro das Corporações, a cujo registo diário ficará obrigado.2. A caderneta referida no número anterior será visada diariamente pelo chefe do respectivo serviço de bordo ou por quem o substitua, e semanalmente, pelo comandante, de modo a ficar constituindo elemento de prova bastante para efeito de aplicação do que constar de leis e contratos em vigor.
3. Para efeitos do registo diário do trabalho efectivo dos tripulantes, a fracção mínima a registar é a de um quarto de hora.
SECÇÃO II
Das condições de vida a bordo
Artigo 38.º
(Disciplina, segurança, higiene e moralidade do trabalho)
1. O trabalho a bordo deve ser sempre organizado e executado em condições de disciplina, segurança, higiene e moralidade.
2. Quer os locais de trabalho, quer os alojamentos dos tripulantes devem ser providos dos meios necessários à obtenção dos objectivos referidos no número anterior.
Artigo 39.º
(Alimentação)
1. A alimentação do tripulante em viagem é fornecida pelo armador, em conformidade com as disposições legais em vigor.2. Poderá qualquer refeição ser servida no local de trabalho ou no camarote quando houver motivo que o justifique e o comandante o autorize.
3. Estando a embarcação no porto de armamento, o tripulante que, por motivo de serviço, seja impedido de vir a terra nas horas normais das refeições tem direito a fornecimento da alimentação ou a receber, em dinheiro, as rações que forem convencionadas.
4. Tratando-se de embarcações empregadas na navegação costeira, nacional ou internacional, o tripulante a quem não seja fornecida alimentação a bordo tem direito a receber, em dinheiro, as rações que forem convencionadas.
CAPÍTULO V
Da previdência e da assistência médica e medicamentosa
Artigo 40.º
(Assistência médica e medicamentosa)
1. Todo o marítimo que adoecer ou adquirir lesão durante a viagem, quer se encontre a bordo, quer em terra, ou sofrer acidente de trabalho ou adquirir doença ao serviço do armador, quer se tenha ou não iniciado viagem, será pago da sua retribuição por todo o tempo que durar o seu impedimento e terá, além disso, curativos, assistência médica e medicamentosa por conta do armador, salvo os casos previstos no artigo 42.º 2. Se a doença tiver sido adquirida ou o acidente tiver sido sofrido em serviço para a salvação da embarcação, as despesas de tratamento serão à custa desta e da carga.3. Se o tratamento for feito em terra, sendo desembarcado o doente, e se a embarcação tiver de prosseguir viagem sem esse tripulante, o comandante entregará à autoridade marítima ou consular a quantia precisa para esse tratamento e para o regresso do tripulante ao porto de recrutamento; em porto estrangeiro onde não haja agente consular o comandante promoverá que o tripulante seja admitido em algum hospital ou casa de saúde, mediante o adiantamento que for necessário ao seu curativo, garantindo-lhe de igual modo as despesas de regresso; se, no porto considerado, houver agente ou consignatário da embarcação, poderá este ficar responsável pela liquidação de todas as referidas despesas.
4. No caso de internamento em hospital ou casa de saúde não são devidas rações.
5. Todo o tripulante que sofra acidente ou contraia doença em serviço, e por motivo do mesmo, ficará, a partir do dia imediato ao do seu desembarque em território nacional, sujeito ao regime estabelecido na lei reguladora das doenças profissionais e acidentes de trabalho vigente no porto de recrutamento.
(Cessação da responsabilidade do armador)
A responsabilidade atribuída ao armador no n.º 1 do artigo anterior cessa logo que:
a) O marítimo esteja curado ou a sua lesão esteja consolidada e possa retomar o trabalho normal;
b) A responsabilidade haja transitado para a Caixa de Previdência do Pessoal da Marinha Mercante Nacional, de harmonia com o estabelecido no respectivo regulamento.
Artigo 42.º
(Doença ou lesão culposas)
1. Se a doença ou a lesão resultar de acto ou omissão intencional ou falta indesculpável do marítimo a bordo ou em terra, as despesas com os tratamentos serão de sua conta, obrigando-se o comandante a adiantar as importâncias respectivas, se o marítimo o exigir, devendo, ainda, quando o marítimo tenha de desembarcar para receber tratamento, proceder pela forma determinada no artigo 40.º, sem prejuízo do direito ao reembolso, observando-se o mesmo em caso de simulação por parte do marítimo.2. No caso previsto no número anterior, as retribuições serão devidas somente pelo tempo que o tripulante tiver feito serviço, mas terá direito à alimentação de bordo até ao seu desembarque.
Artigo 43.º
(Subsídios e pensões complementares)
Em caso de doença ou acidente de trabalho, e nos casos de invalidez e reforma, o armador atribuirá ao marítimo os subsídios que já são de uso conceder na empresa como complementos dos atribuídos pela previdência social ou entidade seguradora.
Artigo 44.º
(Falecimento do marítimo)
1. Falecendo algum marítimo, os seus sucessores têm direito à respectiva retribuição até ao último dia do mês seguinte àquele em que tiver ocorrido o falecimento.2. Se o marítimo morrer em serviço para o salvamento da embarcação, a retribuição é devida por inteiro e por toda a viagem, se ela se prolongar para além do prazo estabelecido no número anterior.
3. As despesas com o funeral serão de conta do armador e deste e da carga se o marítimo tiver falecido em serviço para a salvação da embarcação.
CAPÍTULO VI
Da suspensão de prestação do trabalho
SECÇÃO I
Do descanso semanal e feriados
Artigo 45.º
(Dias de descanso)
1. Os domingos e os feriados obrigatórios preceituados na lei portuguesa são considerados dias de descanso.2. Para efeitos do número anterior, considera-se como dia de descanso no mar aquele em que o tripulante está livre de todo o serviço e, encontrando-se a embarcação em porto, aquele em que permaneça em terra ou a bordo por sua livre vontade.
Artigo 46.º
(Trabalho prestado em dia de descanso)
1. O trabalho prestado em dia de descanso pelo marítimo não isento de horário de trabalho dá direito a remuneração extraordinária e, quando igual ou superior a três horas, confere ainda direito a folga.2. O trabalho prestado em dia de descanso pelo marítimo isento de horário de trabalho dá apenas direito a folga, independentemente da sua duração.
3. Exceptuam-se do disposto nos números anteriores os trabalhos a que se referem as alíneas b), e) e f) do n.º 3 do artigo 33.º
Artigo 47.º
(Folgas por trabalho prestado em dia de descanso)
1. O trabalho prestado nas condições do artigo anterior confere direito a um dia de folga.
2. O tempo de folga adquirido ao abrigo do número anterior que, por razões ponderosas, não possa ser concedido seguidamente a ter sido adquirido o respectivo direito sê-lo-á em porto de armamento no final da viagem ou acrescido às férias respeitantes a esse ano.
3. Para as embarcações costeiras, e mediante acordo do marítimo, a folga poderá ser gozada em qualquer porto nacional.
4. Com o acordo do marítimo, poderá a folga ser remida a dinheiro, segundo as circunstâncias em que o respectivo direito tiver sido adquirido.
SECÇÃO II
Das férias
Artigo 48.º
(Direito a férias)
1. O marítimo tem direito a gozar férias remuneradas em cada ano civil em virtude do trabalho prestado ao armador.2. A expressão «férias» significa o tempo de dispensa absoluta de prestação de trabalho pelo marítimo com direito a remuneração.
3. O direito a férias vence-se no dia 1 de Janeiro do ano civil subsequente.
4. Cessando o contrato de trabalho, o armador pagará ao marítimo uma retribuição correspondente ao período de férias vencido, salvo se o marítimo as já tiver gozado, bem como a retribuição correspondente a um período de férias proporcional ao tempo de serviço prestado no próprio ano da cessação, a não ser que, neste último caso, a cessação tenha ocorrido por despedimento com justa causa por parte do armador ou sem justa causa por parte do marítimo.
5. Os períodos de férias não gozados por motivo de cessação do contrato contam-se sempre para efeitos de antiguidade.
Artigo 49.º
(Indisponibilidade do direito a férias)
O direito a férias é irrenunciável e não pode ser substituído, fora dos casos expressamente previstos na lei, por remuneração suplementar ou qualquer outra vantagem, ainda que o marítimo dê o seu consentimento.
Artigo 50.º
(Duração das férias)
1. O período mínimo de férias a gozar em cada ano civil é de vinte e quatro ou trinta e seis dias, incluindo domingos e feriados, consoante o tripulante não esteja ou esteja isento de horário de trabalho.2. Para o tripulante em serviço nos navios-tanques, petroleiros e butaneiros, porém, os períodos mínimos referidos no número anterior são, respectivamente, de trinta e dois e quarenta e oito dias.
3. No ano civil subsequente ao da admissão o tripulante terá direito a gozar um período de férias proporcional ao tempo de serviço prestado no ano anterior.
4. A contagem dos períodos de férias não se pode iniciar em dia de domingo ou de feriado obrigatório.
5. A falta de prestação de serviço efectivo no decurso do ano a que as férias respeitam regular-se-á pelo disposto nos artigos 61.º e 62.º
Artigo 51.º
(Remuneração durante as férias)
1. A remuneração devida ao marítimo durante as férias não pode ser inferior à média ponderada das prestações referidas nas alíneas a), b), c) e e) do artigo 70.º no período em que adquiriu o direito às férias, acrescida de um subsídio nos termos e condições a fixar em convenção colectiva de trabalho.2. A remuneração e subsídio a que se refere o número anterior deverão ser pagos antes do início das férias.
Artigo 52.º
(Escolha da época de férias)
1. A época de férias deve ser estabelecida de comum acordo entre o armador e o marítimo.2. Na falta de acordo, compete ao armador fixar a época de férias nos períodos de 1 de Maio a 31 de Outubro ou de 1 de Novembro a 30 de Abril, do que dará conhecimento ao marítimo com uma antecedência não inferior a trinta dias, não podendo, porém, fixar a época de férias no mesmo período em dois anos consecutivos.
3. O marítimo que por motivo de doença estiver impedido de gozar as férias na época convencionada ou fixada pelo armador terá direito a gozá-las imediatamente após a sua apresentação ao serviço.
Artigo 53.º
(Férias seguidas e interpoladas)
1. As férias deverão ser gozadas seguidamente, podendo, porém, por mútuo acordo das partes, ser gozadas interpoladamente no decurso do ano a que digam respeito.2. Nas férias gozadas interpoladamente, um dos períodos não poderá ser inferior a metade do número total de dias a gozar.
Artigo 54.º
(Cumulação de férias)
No mesmo ano, o armador apenas pode cumular as férias dos marítimos relativas a dois anos, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 52.º e no artigo 58.ºArtigo 55.º
(Local de concessão de férias)
1. Salvo acordo das partes em contrário, as férias serão concedidas pelo armador no porto de armamento, na localidade da sede do armador, ou no porto de recrutamento.2. O marítimo tem direito às passagens para e do local de férias, por conta do armador, em meio de transporte à escolha deste.
3. A duração das viagens não será incluída no período de férias, salvo se o marítimo utilizar meio de transporte mais demorado do que o escolhido pelo armador.
Artigo 56.º
(Exercício de actividade remunerada durante as férias)
1. O marítimo não pode exercer durante as férias qualquer actividade remunerada, salvo se expressamente autorizado pelo armador.
2. A contravenção do disposto no número anterior dá ao armador o direito de reaver a retribuição correspondente às férias.
Artigo 57.º
(Regresso de férias)
Após o gozo de férias a que tiver direito, o marítimo será considerado ao serviço a partir do dia da sua apresentação ao armador.
Artigo 58.º
(Férias e serviço militar)
O marítimo que não puder gozar as suas férias no ano em que for convocado para prestar serviço militar terá, findo este, direito a gozá-las.
Artigo 59.º
(Violação do direito a férias)
Sem prejuízo da aplicação das sanções em que incorrer por violação das normas reguladoras das relações de trabalho, o arma dor que, salvo caso de força maior ou atraso de viagem que não exceda sete dias, no prazo máximo de dois anos, não conceder as férias a que, nos termos deste diploma, o marítimo tem direito pagar-lhe-á, a título de indemnização, o triplo da retribuição correspondente ao tempo de férias que deixou de gozar.
SECÇÃO III
Das faltas
Artigo 60.º
(Princípio geral)
As faltas podem ser justificadas ou não justificadas.
Artigo 61.º
(Faltas justificadas)
1. Consideram-se faltas justificadas as que, prévia ou posteriormente, forem autorizadas pelo armador, bem como as motivadas por:a) Doença ou acidente de trabalho;
b) Impossibilidade de prestar serviço por qualquer outro facto não imputável ao marítimo, nomeadamente o cumprimento de obrigações legais;
c) Prática de actos necessários e inadiáveis no exercício de funções em organismos corporativos, instituições de previdência ou comissões corporativas;
d) Prestação de provas em exames oficiais;
e) Casamento, até seis dias consecutivos;
f) Falecimento de cônjuge ou de parente ou afim na linha recta, até três dias, e no 2.º grau da linha colateral, por um dia.
2. As faltas referidas nas alíneas e) e f) do número anterior serão autorizadas imediatamente após a ocorrência ou, encontrando-se o tripulante em viagem, logo após a sua chegada ao porto de armamento ou de recrutamento.
3. O armador poderá exigir do marítimo prova da ocorrência dos factos invocados para justificar a falta.
4. As faltas justificadas a que se referem as alíneas b) a f) do n.º 1 não determinam perda de retribuição nem desconto no período de férias.
5. As faltas justificadas a que se refere a alínea a) do n.º 1 regulam-se, no que respeita a retribuição, pelo disposto no capítulo anterior, e até ao limite de cento e vinte dias em cada ano civil não determinam redução no período de férias.
6. As faltas que excedam o limite de cento e vinte dias a que se refere o número anterior serão descontadas no período de férias do ano civil subsequente, à razão de um dia de férias por cada oito dias de faltas.
7. O período de tempo correspondente às faltas justificadas é sempre contado para efeitos de antiguidade.
Artigo 62.º
(Faltas não justificadas)
1. As faltas não justificadas constituem justa causa de rescisão do contrato de trabalho por parte do armador desde que lhe causem sério prejuízo, nomeadamente, atraso na saída de uma embarcação.2. As faltas não justificadas dão direito ao armador a descontar na retribuição a importância correspondente e a diminuir o período de férias imediato, à razão de um dia de férias por cada dois dias de faltas.
3. O período de tempo correspondente às faltas não justificadas não será contado para efeitos de antiguidade.
SECÇÃO IV
Da suspensão da prestação de trabalho por impedimento prolongado
Artigo 63.º
(Impedimento do tripulante)
1. Quando o tripulante desembarcado no porto de armamento ou naquele em que foi recrutado estiver temporariamente impedido por facto que não lhe seja imputável, nomeadamente o serviço militar obrigatório, doença ou acidente, e o impedimento se prolongue por mais de um mês, o contrato suspende-se e cessam os direitos, deveres e garantias das partes, na medida em que pressuponham a efectiva prestação de trabalho, sem prejuízo da observância do disposto no capítulo V deste diploma e demais legislação aplicável sobre previdência e acidentes de trabalho.
2. Quando o tripulante estiver em viagem, a suspensão do contrato só se verifica no caso de o impedimento temporário persistir por mais de um mês após o desembarque no porto de armamento ou naquele em que foi recrutado.
3. O disposto nos números anteriores começa a observar-se, mesmo antes de expirado o prazo de um mês, a partir do momento em que haja a certeza ou se preveja com segurança que o impedimento terá duração superior àquele prazo.
4. O tempo de suspensão conta-se para efeitos de antiguidade, conservando o tripulante o direito ao lugar.
5. Tornando-se certo que o impedimento é definitivo, caduca o contrato de trabalho, sem prejuízo da observância do disposto no capítulo V deste diploma e demais legislação aplicável sobre previdência e acidentes de trabalho.
Artigo 64.º
(Substituição do tripulante)
1. O armador pode contratar um substituto para desempenhar as funções do tripulante cujo contrato se encontre suspenso.2. O contrato celebrado com o substituto caducará logo que cesse a suspensão, mas esta cláusula só lhe será oponível se constar de documento escrito, sem prejuízo do disposto no artigo 82.º
Artigo 65.º
(Regresso do tripulante)
1. Terminado o impedimento, o tripulante deve, dentro de quinze dias, apresentar-se ao armador, sob pena de perder o direito ao lugar, salvo se outro prazo legal for determinado.2. O armador que se oponha a que o tripulante retome o serviço dentro do prazo de quinze dias, a contar da data da sua apresentação, deve indemnizá-lo nos termos dos artigos 90.º ou 91.º
Artigo 66.º
(Suspensão dos contratos com prazo)
Sendo o contrato sujeito a prazo, certo ou incerto, a suspensão não impede a sua caducidade no termo do prazo.
Artigo 67.º
(Rescisão no período de suspensão)
Durante o período de suspensão, pode qualquer das partes rescindir o contrato ocorrendo justa causa.
SECÇÃO V
Da licença sem retribuição
Artigo 68.º
(Licenças sem retribuição)
1. O armador poderá conceder ao marítimo, a pedido deste, licença sem retribuição.2. O período de licença sem retribuição autorizado pelo armador não conta para efeitos de antiguidade, mas não afecta a antiguidade já adquirida.
3. Durante o mesmo período cessam os direitos, deveres e garantias das partes, na medida em que pressuponham a efectiva prestação de trabalho.
CAPÍTULO VII
Artigo 69.º
(Princípio geral)
1. Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o marítimo tem direito como contrapartida do seu trabalho.2. A retribuição compreende o vencimento base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro.
Artigo 70.º
(Prestações incluídas na retribuição)
Fazem parte integrante da retribuição:
a) O vencimento base;
b) As diuturnidades;
c) A retribuição especial por isenção de horário de trabalho;
d) O subsídio de férias;
e) As subvenções recebidas pelos marítimos recrutados na metrópole e prestando serviço nas embarcações em estação nas províncias ultramarinas.
Artigo 71.º
(Prestações não incluídas na retribuição)
Não se consideram retribuição:
a) A remuneração especial por trabalho extraordinário;
b) As importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes;
c) As importâncias recebidas a título de remissão de folgas;
d) As subvenções recebidas por motivo de ausência do porto de armamento;
e) As subvenções recebidas por motivo da especial natureza da embarcação, das viagens e da carga transportada ou dos serviços prestados a bordo;
f) As gratificações extraordinárias concedidas pelo armador como recompensa ou prémio pelos bons serviços dos tripulantes;
g) Os salários de salvação e assistência;
h) A participação nos lucros da empresa armadora.
Artigo 72.º
(Forma do cumprimento)
1. A retribuição deve ser satisfeita em dinheiro.2. Com o acordo do marítimo, o armador poderá efectuar o pagamento por meio de cheque bancário, vale postal ou depósito bancário à ordem daquele.
Artigo 73.º
(Lugar do cumprimento)
A retribuição deve ser satisfeita no porto de armamento ou onde desembarque o tripulante, salvo se outra coisa for acordada.
Artigo 74.º
(Tempo de cumprimento)
A retribuição será paga:a) Aos tripulantes de embarcações de longo curso, no fim de cada viagem e, tanto quanto possível, domingos e feriados exceptuados, dentro de quarenta e oito horas após a chegada ao porto, ou mensalmente, se assim for acordado.
b) Aos tripulantes de embarcações costeiras ou de cabotagem, no fim do mês e no primeiro porto nacional após esse período.
Artigo 75.º
(Documento a entregar ao marítimo)
No acto do pagamento da retribuição, deve ser entregue ao marítimo documento onde constem o nome completo deste, número de inscrição marítima e de beneficiário da instituição de previdência respectiva, período a que a retribuição corresponde, discriminação das importâncias recebidas, descontos e deduções efectuados, bem como o montante líquido a receber.
Artigo 76.º
(Compensações, descontos e deduções)
1. A retribuição em dívida ao marítimo não pode ser compensada com créditos que o armador tenha sobre ele, nem podem no montante dessa retribuição ser feitos quaisquer descontos ou deduções.
2. O disposto no número anterior não se aplica:
a) Aos descontos a favor do Estado, da Previdência ou de outras entidades ordenadas por lei, por decisão judicial transitada em julgado ou por auto de conciliação, quando da decisão ou do auto tenha sido notificado o armador;
b) Às indemnizações devidas pelos marítimos, ao armador, quando se acharem liquidadas por decisão judicial transitada em julgado ou por auto de conciliação;
c) Aos custos de fornecimento de géneros;
d) Aos abonos e adiantamentos por conta da retribuição;
e) Aos adiantamentos a que se refere o n.º 1 do artigo 42.º 3. Os descontos referidos nas alíneas b), c) e e) do número anterior não podem exceder no seu conjunto um sexto da retribuição.
Artigo 77.º
(Cálculo do vencimento base diário ou horário)
Sempre que se torne necessário calcular o vencimento base diário ou horário do marítimo, adoptar-se-ão as seguintes regras:
a) Para o cálculo do vencimento base diário, o vencimento base mensal acrescido da diuturnidade, multiplicado por doze e dividido por trezentos e sessenta e cinco;
b) Para o cálculo do vencimento base horário, o vencimento base diário dividido por oito.
Artigo 78.º
(Correspondência entre função e vencimento)
Dentro de cada classe, o vencimento base do tripulante deve coresponder à função desempenhada a bordo, independentemente da categoria de quem a exerce.
CAPÍTULO VIII
Da cessação do contrato de trabalho
Artigo 79.º
(Causas de extinção do contrato de trabalho)
1. O contrato de trabalho cessa:
a) Por mútuo acordo das partes;
b) Por caducidade;
c) Por rescisão de qualquer das partes, ocorrendo justa causa;
d) Sendo o contrato sem prazo, por denúncia com aviso prévio por parte do marítimo.
2. O contrato de trabalho extingue-se, ainda, nos seguintes casos:
a) Quando o armador, unilateralmente, o fizer cessar sem justa causa;
b) Quando o marítimo, unilateralmente, o fizer cessar sem justa causa nem aviso prévio.
3. A cessação do contrato ocorrida nos termos do número anterior constitui o seu autor em responsabilidade para com a outra parte nos termos fixados neste diploma.
4. A declaração de despedimento deve ser comunicada à outra parte por forma inequívoca.
Artigo 80.º
(Revogação por mútuo acordo)
1. É sempre lícito às partes revogar, por mútuo acordo, o contrato de trabalho.2. A revogação deve constar do documento assinado por ambas as partes, sempre que estas acordem em lhe atribuir outros efeitos que não sejam a pura e simples cessação imediata do contrato.
Artigo 81.º
(Caducidade)
O contrato de trabalho caduca nos casos previstos neste diploma e nos termos gerais de direito, nomeadamente:a) Expirado o prazo por que foi estabelecido, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte;
b) Verificando-se a impossibilidade superveniente absoluta e definitiva de o marítimo prestar o trabalho ou de o armador o receber.
Artigo 82.º
(Prorrogação e caducidade dos contratos com prazo) 1. Quando o tripulante tenha sido contratado por um prazo correspondente à duração provável da viagem, o contrato permanece válido, ainda que expirado tal prazo:a) Por todo o tempo que for preciso para, fazendo só as escalas indispensáveis, completar a viagem do contrato;
b) Em caso de naufrágio, até estarem concluídos os trabalhos relativos à salvação de pessoas e bens;
c) Em casos de acidentes ou motivo de força maior, até que a embarcação seja posta em segurança;
d) Até a embarcação estar admitida à livre prática, fundeada, amarrada ou descarregada no porto onde o contrato deva terminar, salvo estipulação em contrário.
2. Caduca, porém, o contrato quando os factos referidos nas alíneas b) e c) do número anterior ocorrerem antes de expirado o prazo convencionado.
3. Quando o contrato com o comandante para uma viagem caduque porque esta não pode realizar-se antes ou depois do seu início, por causa de guerra, bloqueio, embargo ou qualquer outro caso de força maior relativo à embarcação ou à carga, o comandante tem direito a receber os vencimentos ganhos até ao dia em que esse facto ocorreu e mais um mês.
4. Se, no caso previsto no número anterior, os vencimentos do comandante forem fixados por viagem inteira ou de ida e volta, o que lhe é devido é calculado tendo por base a totalidade dos vencimentos, e será pago proporcionalmente aos serviços prestados e à parte da viagem efectuada.
Artigo 83.º
(Rescisão com justa causa)
1. Constitui, em geral, justa causa qualquer facto ou circunstância grave que torne praticamente impossível a subsistência das relações que o contrato de trabalho supõe, nomeadamente a falta de cumprimento dos deveres e garantias previstos nos artigos 17.º, 18.º e 19.º e ainda nos casos previstos nos artigos 21.º e 22.º 2. Ocorrendo justa causa, qualquer das partes pode rescindir imediatamente o contrato, comunicando à outra parte, por forma inequívoca, a vontade de o rescindir.3. Só serão atendidos para fundamentar a rescisão os factos e circunstâncias invocadas na comunicação a que se refere o número anterior.
Artigo 84.º
(Justa causa da rescisão por Iniciativa do armador)
Constituem justa causa para o armador rescindir o contrato, entre outros, os seguintes factos:
a) A condenação do marítimo por crime marítimo;
b) A prática de infracção disciplinar que venha a ser sancionada com alguma das seguintes penas previstas no artigo 49.º do Código Penal e Disciplinar da Marinha Mercante:
1) Detenção ou multa para além de seis dias;
2) Suspensão do exercício de funções;
4) Exclusão;
c) O abuso de confiança, desvio de fundos ou valores que tenham sido confiados ao marítimo;
d) A desobediência às ordens legítimas dos seus superiores hierárquicos, nomeadamente a recusa de prestar qualquer serviço desde que tenha a necessária aptidão para o executar e esse serviço não seja de natureza a ofender a categoria e o brio profissional do marítimo;
e) A condenação por crime infamante não referido nas alíneas a) e c);
f) O desrespeito aos superiores hierárquicos, ainda que não punido nos termos da alínea b);
g) A prática de actos contra a moral;
h) A incompetência profissional ou a manifesta inaptidão para o exercício das funções ajustadas;
i) O mau comportamento ou a conduta irregular susceptível de perturbar a disciplina, o normal rendimento do serviço e o ambiente moral;
j) A falta não justificada, desde que cause ao armador sério prejuízo;
l) O abandono do lugar, entendendo-se como tal a não apresentação ao serviço sem justificação durante dez dias consecutivos ou a não apresentação a bordo até à saída da embarcação;
m) A recusa em embarcar em qualquer embarcação do armador quando o tripulante a tal estiver obrigado contratualmente;
n) A inobservância reiterada das normas de higiene e segurança do trabalho;
o) A lesão culposa de interesses patrimoniais sérios do armador;
p) A ofensa à honra e dignidade do armador ou dos superiores hierárquicos;
q) A conduta intencional do marítimo de forma a levar o armador a pôr termo ao contrato.
Artigo 85.º
(Justa causa de rescisão por iniciativa do marítimo)
Constituem justa causa para o marítimo rescindir o contrato, entre outros, os seguintes factos:
a) A necessidade de cumprir quaisquer obrigações legais incompatíveis com a continuação do serviço;
b) A falta de pagamento pontual da retribuição, na forma devida;
c) A violação das garantias do marítimo, nos casos e termos previstos nos artigos 19.º, 21.º e 22.º;
d) A aplicação de qualquer sanção abusiva por parte dos superiores hierárquicos;
e) A falta de condições de higiene, segurança, moralidade ou disciplina do trabalho;
f) A lesão dos interesses patrimoniais do marítimo;
g) A ofensa à honra e dignidade do marítimo quer por parte do armador, quer por parte dos superiores hierárquicos;
h) A transferência do porto de armamento;
i) A conduta intencional do armador ou dos superiores hierárquicos de forma a levar o marítimo a pôr termo ao contrato.
Artigo 86.º
(Apreciação da Justa causa)
A existência da justa causa será apreciada tendo sempre em atenção o carácter das relações entre o marítimo e o armador ou superiores hierárquicos, a condição social e grau de educação de uns e de outros e as demais circunstâncias do caso.
Artigo 87.º
(Ausência de justa causa)
1. Embora os factos alegados correspondam objectivamente a alguma das situações configuradas nos artigos anteriores, a parte interessada não poderá invocá-los como justa causa de rescisão:a) Quando houver revelado, por comportamento posterior, não os considerar perturbadores das relações de trabalho;
b) Quando houver inequivocamente perdoado à outra parte.
2. Até prova em contrário, presume-se não constituírem os factos alegados justa causa quando, entre o momento em que a parte ofendida teve conhecimento deles e a sua invocação, mediou um intervalo superior ao necessário para evitar os prejuízos de uma interrupção súbita do trabalho.
Artigo 88.º
(Responsabilidade da parte que deu causa à rescisão)
1. A parte que rescinde o contrato tem direito a ser indemnizada pela outra sempre que o fundamento da rescisão implique responsabilidade para esta.
2. A indemnização pelos danos ocasionados pelo rompimento do contrato será calculada nos termos dos artigos 89.º, 90.º e 91.º 3. Os outros danos serão indemnizados nos termos gerais de direito.
4. O disposto nos números anteriores não prejudica o exercício da acção penal ou disciplinar se a ela houver lugar.
Artigo 89.º
(Denúncia do contrato sem prazo por parte do tripulante)
1. O contrato de trabalho sem prazo pode ser denunciado pelo tripulante desde que o armador seja avisado com a antecedência mínima de um mês antes da data prevista para a chegada da embarcação ao porto de armamento, não sendo devida qualquer indemnização.
2. Na falta de aviso prévio, o tripulante pagará ao armador, a título de indemnização, o valor correspondente à retribuição de um mês.
Artigo 90.º
(Denúncia do contrato sem prazo por parte do armador)
1. Se o armador, sem justa causa, denunciar um contrato sem prazo, pagará ao marítimo, no mínimo e a título de indemnização, a retribuição por inteiro do mês em que ocorra o despedimento, acrescida da importância correspondente à retribuição de um mês por cada ano completo de antiguidade na empresa.
2. Se a denúncia se verificar nos primeiros seis meses do ano para completar novo ano de antiguidade, não será esse tempo tomado em conta, mas se a denúncia se verificar no 2.º semestre do ano, será contado o ano completo.
3. Qualquer fracção do primeiro ano de trabalho conta-se sempre como um ano completo, sem prejuízo do disposto no artigo 92.º
Artigo 91.º
(Denúncia unilateral dos contratos com prazo)
Nos contratos sujeitos a prazo, certo ou incerto, a extinção por decisão unilateral, sem justa causa, dá à outra parte o direito de exigir indemnização pelos prejuízos sofridos até ao valor das retribuições vincendas.
Artigo 92.º
(Cessação do contrato no período experimental)
Durante o período experimental previsto no artigo 5.º qualquer das partes pode pôr termo ao contrato sem necessidade de aviso prévio ou de alegação de justa causa, não havendo direito a indemnização.
Artigo 93.º
(Regresso ao porto de armamento ou de recrutamento)
1. Cessando o contrato de trabalho, o tripulante tem direito a que lhe sejam fornecidos os meios de transporte necessários para regressar ao porto de armamento ou de recrutamento, incluindo alojamento e alimentação.
2. O disposto no número anterior só não se aplica no caso de despedimento sem justa causa por parte do tripulante.
Artigo 94.º
(Despedimento pelo comandante da embarcação)
O comandante da embarcação que injustificadamente despedir o tripulante é responsável perante o armador pela importância da indemnização eventualmente devida.
Artigo 95.º
(Despedimento em caso de doença)
É considerado nulo, para todos os efeitos, o despedimento sem justa causa do marítimo que esteja com baixa por doença.
Artigo 96.º
(Transmissão e abate de embarcações)
1. A transmissão e o abate de embarcações não constituem justa causa para rescisão dos contratos.
2. A posição que dos contratos de trabalho decorre para o armador transmite-se ao adquirente da embarcação, salvo se, antes da transmissão:
a) Os contratos houverem cessado de vigorar;
b) Os tripulantes continuarem ao serviço do transmitente.
Artigo 97.º
(Despedimento colectivo)
1. Os marítimos abrangidos por despedimento colectivo resultante de reorganização ou fusão de empresas armadoras e venda ou abate de embarcações ficam, na parte aplicável, ao abrigo do regime do Decreto-Lei 44506, de 10 de Agosto de 1962.2. O marítimo poderá optar pelo subsídio resultante da aplicação do diploma referido no número anterior ou pela indemnização por despedimento sem justa causa.
Artigo 98.º
(Falta de recursos do armador)
1. Se o armador que denunciar os contratos de trabalho provar manifesta falta de recursos económicos, poderá ser dispensado de pagar por inteiro as indemnizações referidas neste diploma, por decisão da comissão corporativa, graduando-se aquele pagamento conforme as suas possibilidades económicas.2. Da decisão referida no número anterior cabe recurso para os tribunais do trabalho.
3. O regime do n.º 1 entende-se sem prejuízo da observância das disposições aplicáveis do Decreto-Lei 44506, de 10 de Agosto de 1962, no respeitante a despedimento colectivo.
Artigo 99.º
(Falência)
1. A declaração judicial da falência da empresa armadora não faz caducar os contratos de trabalho.2. O administrador da falência satisfará integralmente as retribuições que se forem vencendo, enquanto a empresa armadora não for encerrada.
CAPÍTULO IX
Da violação das leis do trabalho
Artigo 100.º
(Das Infracções)
As infracções cometidas pelos tripulantes serão punidas nos termos deste diploma e demais legislação em vigor.
Artigo 101.º
(Sanções abusivas)
Consideram-se abusivas as sanções aplicadas pelo facto de o marítimo:a) Haver reclamado legítima e disciplinadamente contra as condições de trabalho;
b) Exercer funções ou candidatar-se a elas em organismos sindicais ou de previdência e em comissões corporativas;
c) Exercer, ter exercido ou pretender exercer ou invocar os direitos ou garantias que lhe assistem.
Artigo 102.º
(Audiência prévia)
Presume-se abusiva a sanção aplicada sem audiência prévia do marítimo.
Artigo 103.º
(Indemnizações por sanções abusivas)
A aplicação de alguma sanção abusiva nos termos dos artigos anteriores, além de responsabilizar o armador por violação das leis do trabalho, dá ao marítimo direito a ser indemnizado nos termos gerais de direito, salvo se a sanção consistiu em despedimento, caso em que a indemnização será o dobro da fixada nos artigos 90.º ou 91.º
Artigo 104.º
(Multas)
1. As infracções aos preceitos deste diploma cometidas pelos armadores serão punidas, por cada marítimo em relação ao qual se verifique a infracção, com a multa de 200$00 a 10000$00, salvo o disposto nos números seguintes.2. Sem prejuízo do disposto no artigo 59.º, o armador que não conceder férias a um marítimo fica sujeito à multa de 1000$00 a 20000$00.
3. A infracção ao disposto no artigo 93.º é punida com a multa de 20000$00 a 50000$00.
4. Os armadores que intervierem nos acordos referidos no n.º 2 do artigo 24.º ficarão sujeitos à multa de 20000$00 a 100000$00.
Artigo 105.º
(Graduação das multas)
1. As multas referidas no artigo anterior serão graduadas pelo julgador em função da gravidade da infracção, da culpabilidade do infractor, das suas possibilidades económicas e do número de marítimos afectados.2. Os limites máximos e mínimos das multas serão elevados para o dobro em caso de reincidência.
Artigo 106.º
(Destino das multas)
As importâncias das multas que forem aplicadas reverterão para o Fundo de Assistência da Caixa de Previdência do Pessoal da Marinha Mercante Nacional e serão destinadas à concessão de subsídios extraordinários por doença ao pessoal da marinha mercante.
Artigo 107.º
(Inconvertibilidade das multas em prisão)
As multas estabelecidas por infracção às normas reguladoras das relações de trabalho são inconvertíveis em prisão, salvo disposição legal em contrário.
CAPÍTULO X
Dos litígios emergentes do contrato individual de trabalho
Artigo 108.º
(Competência)
1. É da competência dos tribunais do trabalho o julgamento dos litígios emergentes do contrato de trabalho do pessoal da Marinha de Comércio.2. Nenhuma acção respeitante a litígios de trabalho terá seguimento sem que o autor prove que se realizou tentativa prévia de conciliação na respectiva comissão corporativa ou, no caso de esta não existir, perante o agente do Ministério Público junto do tribunal competente para a acção.
3. Para efeitos do disposto no número anterior, serão criadas comissões corporativas ao abrigo do Decreto-Lei 43179, de 23 de Setembro de 1960, e demais legislação em vigor aplicável.
CAPÍTULO XI
Disposições finais
Artigo 109.º
(Dúvidas de interpretação)
As dúvidas suscitadas na interpretação e aplicação do presente diploma serão resolvidas por despacho conjunto dos Ministros da Marinha e das Corporações e Previdência Social.
Artigo 110.º
(Normas aplicáveis aos contratos de trabalho)
Os contratos de trabalho estão sujeitos em especial às normas constantes do presente diploma e às convenções colectivas de trabalho segundo esta ordem de precedência.
Artigo 111.º
(Prevalência na aplicação das normas)
As fontes superiores de direito prevalecem sempre sobre as inferiores, salvo na parte em que estas, sem oposição daquelas, estabelecem tratamento mais favorável para o trabalhador.
O Ministro da Marinha, Manuel Pereira Crespo. - O Ministro das Corporações e Previdência Social, Baltasar Leite Rebelo de Sousa.