de 23 de Junho
Os prédios urbanos construídos sem prévia licença das câmaras municipais estão, por força da lei, sujeitos a demolição, independentemente de qualquer indemnização aos proprietários. Se, porém, as autoridades competentes reconhecerem que esses imóveis são susceptíveis de vir a satisfazer aos requisitos legais e regulamentares de urbanização, estética, segurança e salubridade, poderá não haver lugar a demolição.Ora, por vezes, verifica-se a existência de edificações não licenciadas que, embora susceptíveis de vir a preencher os referidos requisitos legais e regulamentares, podem ser dotadas das condições mínimas de habitabilidade que desaconselham a respectiva demolição, sobretudo quando já habitadas e até fazendo parte de bairros com apreciável
população.
Todavia, esta tolerância com as construções clandestinas pode obrigar o Estado ou os municípios a subsequentes investimentos de vulto em infra-estruturas, dado que os bairros clandestinos carecem de arruamentos pavimentados, de redes de esgoto e de abastecimento de água e de energia eléctrica, além do equipamento urbanístico indispensável. Uma vez legalizados, as autarquias locais são forçadas a custear essas obras. Mas não é razoável que os infractores venham depois a aproveitar da valorização imediata que daí resulta para os prédios e que especulem com as rendas, impondo actualizações a inquilinos de boa fé, ou arrendando com lucro as habitações vagas. Issoequivaleria a premiar o desrespeito da lei.
Pelas razões expostas, prevê-se no presente diploma que os proprietários de edificações que não sofram a sanção da demolição fiquem sujeitos à expropriação delas.Compreende-se que, em tais condições, a indemnização a que esses proprietários têm direito possa ser inferior à que resultaria dos critérios geralmente aplicáveis na fixação da indemnização devida pela expropriação de quaisquer bens e que o pagamento seja feito em condições suaves para o expropriante. Espera-se, deste modo, conseguir desencorajar a prática da construção clandestina que, em especial nos arredores das grandes cidades, tem
assumido o aspecto de verdadeira praga.
Os prédios expropriados passarão a constituir património do Estado ou da autarquia expropriante, pelo que se torna necessário prever o regime da sua gestão.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:Artigo 1.º - 1. Podem deixar de ser demolidas e ficam sujeitas a expropriação por utilidade pública as edificações construídas sem prévia licença das câmaras municipais, se forem julgadas necessárias para a resolução do problema da habitação e quando se reconheça que são susceptíveis de adquirir as condições mínimas de habitabilidade exigíveis.
2. As condições de habitabilidade referidas no número anterior são fixadas em portaria do
Ministro das Obras Públicas.
Art. 2.º A indemnização será arbitrada com base no valor do terreno e dos materiais na altura da construção, bem como do custo da mão-de-obra empregada, deduzida a quota proporcional do dispêndio previsível com o estabelecimento pela Administração das infra-estruturas requeridas em benefício dos habitantes do prédio expropriado.Art. 3.º - 1. Pertencerá ao Estado, pelo Ministério das Obras Públicas, a iniciativa da expropriação, salvo se o município da situação do prédio declarar que pretende ele próprio
requerê-la.
2. É aplicável às expropriações para os fins previstos no presente diploma o regime definido na Lei 2142, de 14 de Maio de 1969.3. Competirá à entidade que promover a expropriação decidir se os prédios são susceptíveis de adquirir as condições de habitabilidade estabelecidas nos termos do n.º 2 do
artigo 1.º
Art. 4.º - 1. O pagamento da indemnização será sempre feito em vinte anos, por anuidadesiguais sem juro.
2. Quando o Estado for a entidade expropriante poderá efectuar o pagamento com certificados de dívida inscrita amortizáveis, a emitir especialmente para o efeito.3. O Secretário de Estado do Tesouro fica autorizado a mandar emitir, por intermédio da Junta do Crédito Público, os títulos referidos no número anterior, sendo o montante máximo da emissão de cada ano fixado em portaria, a qual obedecerá, na parte aplicável, às normas estabelecidas no § 1.º, alíneas b), d) e f), e no § 2.º do artigo 38.º do Decreto-Lei
n.º 42900, de 5 de Abril de 1960.
Art. 5.º - 1. Se a iniciativa da expropriação tiver pertencido ao Estado, incumbe ao Fundo de Fomento da Habitação a administração e conservação dos prédios.2. O Fundo cobrará as rendas, devendo em regulamento determinar-se a parte que ficará retida para despesas de conservação e a que será entregue ao Tesouro.
Art. 6.º As câmaras municipais poderão criar e eventualmente municipalizar o serviço de administração e conservação dos prédios que adquiram ao abrigo do presente diploma, bem como de quaisquer outros prédios de que sejam proprietárias e que de destinem à
habitação.
Art. 7.º O presente diploma entra imediatamente em vigor e é desde já aplicável aos prédios que à data da sua publicação estejam construídos ou em construção sem prévia licença municipal e cuja situação não haja sido regularizada até essa data.Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Marcello Caetano - António Manuel Gonçalves Rapazote - Mário Júlio Brito de Almeida Costa - João Augusto Dias Rosas -
Rui Alves da Silva Sanches.
Promulgado em 16 de Junho de 1971.
O Presidente da República, AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ.
Para ser presente à Assembleia Nacional.