de 23 de Dezembro
1. O Governo e a população em geral têm conhecimento de todo um conjunto de situações a necessitarem de urgente correcção de acordo com os limites do actual contexto sócio-económico-laboral português, de empresas que, sem contrapartida relevante de produção de riqueza, em bens ou serviços, ou com contrapartida que fica muito aquém daquilo que consome o seu funcionamento, vivem artificialmente à custa do orçamento do Estado, ao abrigo de intervenção ou de recebimento sistemático do que só formalmente se pode chamar «avales» do Estado, já que o respectivo reembolso se mostra ou impossível ou de difícil exequibilidade.2. Por outro lado, verifica-se, por dados indesmentíveis, que certos sectores públicos ou nacionalizados representam no conjunto da economia portuguesa estatutos laborais que podem considerar-se privilegiados relativamente aos do sector privado com que coexistem e do funcionalismo público, cujo preço é pago em larga medida igualmente pelo orçamento do Estado, assim desviado da sua função de contributo para a recuperação da economia nacional.
3. Quanto às situações detectáveis nos sectores público ou nacionalizado, o Governo está consciente de que a solução para o problema apontado reside fundamentalmente na afirmação da autonomia de gestão e de correspondente responsabilização daqueles a quem a mesma é cometida e que a aceitam, nos termos, aliás, que virão a ser consagrados no estatuto do gestor público, em vias de elaboração.
De igual modo, e pelas mesmas razões, terão de ser encaradas, a prazo, as restantes situações em que o Estado garante a perdurabilidade das empresas.
4. De imediato, a fim de energicamente pôr cobro às situações já referidas, algumas delas ofensivas do povo português, por beneficiarem exclusivamente minorias insignificantes de estratos bem determináveis, prevê-se no presente diploma a possibilidade de declaração da situação de crise económica das empresas em causa, com sucedâneo de medidas correctoras, assegurando-se a consulta aos representantes dos trabalhadores interessados.
5. Espera-se que o presente diploma constitua motivo de reflexão por parte dos responsáveis pelas empresas que venham a ser visadas, por forma a decidirem consciente e responsavelmente na sequência das medidas previstas.
Certo é que o Governo, na medida em que disponha de meios para tal, entende não dever nem poder sancionar, à custa da bondade das soluções e dos interesses da economia nacional, a sobrevivência ou manutenção dos níveis artificiais de condições de trabalho das empresas que não possuam situação económico-financeira capaz de as suportar. Recusar-se-á, sempre que seja caso disso, a manter a subvenção para cobertura de prejuízos de gestão originados ou agravados pela existência de estatutos laborais elevados. Na matéria só um duplo limite se imporá o Governo: o da remuneração mínima garantida e o da estabilidade de postos de trabalho minimamente viáveis.
Por forma a dar cumprimento aos princípios consignados na Constituição tomaram parte na elaboração do presente diploma comissões de trabalhadores e associações sindicais, que para o efeito foram ouvidas pelo Ministério do Trabalho, sendo diversas das sugestões por eles apresentadas incorporadas no texto final.
Nestes termos:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º - 1. As entidades patronais e os conselhos de gerência ou órgãos equiparados de empresas ou daquelas em que se verifique a intervenção do Estado ou a quem por este hajam sido concedidos avales poderão requerer, aos Ministros do Trabalho e da Tutela ou responsável pelo sector de actividade respectiva, a declaração da empresa em situação de crise económica.
2. O requerimento será obrigatoriamente acompanhado de descrição circunstanciada e fundamentada da situação económico-financeira da empresa e das medidas consideradas necessárias à superação da crise.
3. Os Ministros a quem for dirigido o requerimento declararão, se for caso disso, a empresa em situação de crise económica, através de despacho conjunto, precedendo consulta às associações sindicais interessadas e à Comissão Interministerial criada pelo Decreto-Lei 822/76, de 12 de Novembro.
4. O requerimento de declaração da situação de crise económica prevista nos números anteriores não tem efeito suspensivo da obrigatoriedade de cumprimento da lei e regulamentação colectiva vigentes, salvo se acompanhado de declaração expressa dos representantes dos trabalhadores interessados de aceitação da produção desse efeito suspensivo.
Art. 2.º - 1. Declarada a empresa em situação de crise económica, nos termos do artigo anterior, os Ministros competentes podem, através de despacho conjunto:
a) Isentar as entidades patronais, conselhos de gerência ou órgãos equiparados da obrigação do pagamento das remunerações mínimas garantidas;
b) Isentar as entidades patronais, conselhos de gerência ou órgãos equiparados da obrigação de darem cumprimento às condições de trabalho fixadas em instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho;
c) Fixar condições de trabalho sucedâneas das isenções previstas nas alíneas anteriores;
d) Estabelecer um regime de reconversão obrigatória.
2. Em caso algum poderão ser fixadas ou praticadas remunerações inferiores à remuneração mínima garantida que vigorar nem preterido o direito às prestações da segurança social do trabalhador e seus familiares.
3. O despacho conjunto previsto no n.º 1 especificará sempre o prazo de vigência das medidas adoptadas, a entidade que, substituindo-se à entidade patronal, assegurará as condições mínimas garantidas aos trabalhadores afectados, bem como a forma como esta o fará, e definirá o regime transitório das condições de trabalho que ficarem prejudicadas.
4. Para os efeitos do disposto no n.º 1, os Ministros competentes deverão consultar as associações sindicais interessadas e a Comissão Interministerial criada pelo Decreto-Lei 822/76, de 12 de Novembro.
Art. 3.º Fica revogado o Decreto-Lei 530/76, de 17 de Julho.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Mário Soares.
Promulgado em 9 de Dezembro de 1976.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.