Decreto-Lei 256/86
de 27 de Agosto
Conforme se estabelece no Plano Nacional de Turismo, o turismo deverá contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população portuguesa, mediante, entre outras medidas, o fomento do turismo rural e o incremento do turismo de habitação nas zonas rurais, modalidades que, simultaneamente, deverão visar a protecção e valorização do património cultural, de que a arquitectura regional é expressão de grande interesse turístico.
A evolução recente dos hábitos e preferências dos turistas, em particular dos países europeus que constituem os principais mercados geradores de turismo para Portugal, mostra cabalmente que existem condições psicológicas e sociais favoráveis ao desenvolvimento destas modalidades.
Por sua vez, a experiência colhida com o lançamento, em 1979, do turismo de habitação, regulamentado pelo Decreto-Lei 251/84, de 25 de Julho, permite confirmar que o turismo no espaço rural exerce uma significativa atracção sobre a procura interna e externa.
Acresce que a Comissão das Comunidades Europeias, ao definir as primeiras orientações para uma política comunitária do turismo, acolhidas favoravelmente pela resolução do Conselho de 10 de Abril de 1984, se compromete a tomar em consideração os projectos de desenvolvimento do agro-turismo que lhe forem apresentados pelos Estados membros para financiamento pelo FEOGA.
Assim, o presente diploma visa criar as condições legais para o desenvolvimento das várias formas de turismo no espaço rural e permitir-lhes o acesso aos esquemas de apoio financeiro existentes ou de que venha a dispor-se, aproveitando-se ainda para precisar o âmbito do turismo de habitação em função da experiência vivida.
Nestes termos:
O Governo decreta, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º A actividade de interesse para o turismo, com natureza familiar, que consiste na prestação de hospedagem em casas que sirvam simultaneamente de residência aos seus donos e preencham as condições requeridas no presente diploma pode revestir a forma de «turismo de habitação», «turismo rural» ou «agro-turismo».
Art. 2.º O turismo de habitação define-se pelo aproveitamento de casas antigas, solares, casas apalaçadas ou residências de reconhecido valor arquitectónico, com dimensões adequadas, mobiliário e decoração de qualidade, que satisfaçam os requisitos exigidos ao abrigo deste decreto-lei.
Art. 3.º Reveste a forma de turismo rural o exercício da actividade a que se refere o artigo 1.º em casa rústica com características próprias do meio rural em que se insere, situando-se em aglomerado populacional ou não longe dele e satisfazendo os demais condicionalismos aplicáveis.
Art. 4.º Designa-se por agro-turismo o exercício da actividade enunciada no artigo 1.º em casas de habitação ou seus complementos integrados numa exploração agrícola, caracterizando-se por algum modo de participação dos turistas nos trabalhos da própria exploração ou em formas de animação complementares, e desde que a unidade obedeça às condições legalmente exigíveis.
Art. 5.º A Direcção-Geral do Turismo manterá um registo nacional actualizado das propriedades privadas afectas à prática de turismo de habitação, turismo rural e agro-turismo.
Art. 6.º A prévia inscrição no registo de Direcção-Geral do Turismo condiciona o uso das designações «turismo de habitação», «turismo rural» e «agro-turismo».
Art. 7.º - 1 - A inscrição de uma propriedade privada nos registos de turismo de habitação, turismo rural ou agro-turismo deverá ser requerida pelo seu proprietário ou representante à Direcção-Geral do Turismo.
2 - A inscrição é gratuita e o seu pedido feito em impresso próprio, fornecido pela Direcção-Geral do Turismo.
3 - O requerente deve especificar todos os elementos que forem exigíveis para o efeito ao abrigo do presente diploma e quaisquer outros que considere de interesse, nomeadamente parecer do órgão local ou regional de turismo da área.
4 - A inscrição na categoria correspondente atenderá à natureza da construção do edifício, à integração no meio ambiente, à localização, aos acessos e aos demais requisitos exigíveis.
Art. 8.º - 1 - O requerimento, com a documentação que o instrua, será apreciado pelo director-geral do Turismo, podendo ser liminarmente indeferido, no prazo de 30 dias, se o processo não tiver condições para vir a ser apreciado favoravelmente.
2 - Nos demais casos a apreciação do processo prosseguirá com as necessárias vistorias e inspecções ao local, devendo o director-geral do Turismo, no prazo de 60 dias, determinar a inscrição, a rejeição ou, quando for o caso, a comunicação ao requerente das obras e melhoramentos a que a inscrição fica condicionada.
Art. 9.º Serão indeferidos os requerimentos em relação aos quais se verifique que a unidade não apresenta interesse turístico ou não satisfaz os requisitos enunciados no presente diploma ou definidos em sua execução.
Art. 10.º Do indeferimento cabe sempre recurso para o membro do Governo com tutela sobre o turismo, a interpor no prazo de 30 dias, contados da data da comunicação ao requerente.
Art. 11.º Aos interessados a quem for autorizada a inscrição no registo de turismo de habitação, turismo rural ou agro-turismo será entregue certificado que legitima a utilização da designação correspondente e das insígnias que a identifiquem e comunicada a qualificação atribuída.
Art. 12.º Os investimentos necessários às obras e melhoramentos de propriedades consideradas pela Direcção-Geral do Turismo aptas para inscrição em turismo de habitação, turismo rural ou agro-turismo, bem como os relativos à conservação das casas inscritas, poderão ser financiados pelo Fundo de Turismo, de harmonia com as disposições legais que regulam o seu funcionamento.
Art. 13.º - 1 - A inscrição nos registos de turismo de habitação, turismo rural e agro-turismo pode ser cancelada, a pedido do proprietário da unidade ou seu representante, mediante solicitação escrita dirigida à Direcção-Geral do Turismo com a antecedência mínima de 90 dias em relação à data em que pretende desistir do exercício de actividade.
2 - A inscrição pode ser cancelada pelo director-geral do Turismo, por sua iniciativa ou mediante proposta do órgão local ou regional de turismo da área, quando se verifique alguma das seguintes situações:
a) Incumprimento de requisitos essenciais à inscrição;
b) Violação reiterada dos deveres a que se acha vinculado o titular;
c) Falta reiterada de cumprimento das disposições vigentes quanto ao exercício da actividade.
3 - O cancelamento da inscrição determina a cessação dos apoios financeiros e outros benefícios.
4 - Do cancelamento da inscrição, determinado pelo director-geral do Turismo, cabe recurso para o membro do Governo com tutela sobre o turismo.
Art. 14.º Os responsáveis pelas unidades devem prestar à Direcção-Geral do Turismo todas as informações atinentes ao exercício da sua actividade turística, nomeadamente as de natureza estatística, que não poderão ser divulgadas de forma individualizada.
Art. 15.º - 1 - Considera-se dono da casa para os fins previstos no presente diploma o seu proprietário ou representante adequado para manter na vida da unidade nível social e de serviço correspondente.
2 - A residência do dono da casa pode ocorrer, em casos aceites pela Direcção-Geral do Turismo, em edificação contígua ou muito próxima, desde que permita assegurar a hospitalidade devida.
Art. 16.º O dono da casa é responsável pelo rigoroso exercício, por si e pelos familiares e demais pessoal, das normas de acolhimento, conforto e bem-estar que caracterizam a tradicional hospitalidade portuguesa.
Art. 17.º A Direcção-Geral do Turismo, em colaboração com os órgãos locais e regionais de turismo e com as associações de proprietários, promoverá um sistema expedito de reservas e informações sobre o alojamento em turismo de habitação, turismo rural e agro-turismo.
Art. 18.º - 1 - O dono da casa é responsável pelos objectos de valor que lhe sejam entregues, para depósito, pelos clientes, podendo transferir essa responsabilidade mediante contrato de seguro.
2 - O cliente é civilmente responsável pelos prejuízos ou danos que cause à propriedade, seu equipamento, mobiliário e decoração ou à pessoa do dono da casa e seus colaboradores.
Art. 19.º - 1 - Para o bom exercício da exploração de unidade, o dono da casa tem o direito de recusar a admissão ou a prestação de serviços quando o julgar conveniente, designadamente nos casos previstos na legislação sobre alojamento turístico.
2 - Se, pelo seu comportamento, o cliente se tornar indesejável, pode o dono de casa compeli-lo a abandonar os quartos, sem efectuar o reembolso dos dias pagos antecipadamente, e ainda recorrer, se necessário, à autoridade policial competente.
Art. 20.º - 1 - Em cada quarto deverá existir tabela dos preços de todos os serviços prestados.
2 - Poderá ser exigido pelo dono da casa o pagamento antecipado dos serviços ajustados.
3 - Os serviços, incluindo bebidas, refeições, utilização de equipamentos complementares ou tratamento de roupas do cliente, serão facturados discriminadamente.
4 - Quando o cliente não pagar a factura dos serviços prestados, e para garantir o respectivo pagamento, pode o dono da casa usar o direito de retenção dos bens que o cliente tiver tranportado para a propriedade.
Art. 21.º - 1 - Os clientes devem pautar o seu comportamento pelas regras gerais de cortesia, urbanidade e decoro, bem como pagar pontualmente as facturas que lhes forem apresentadas pelos serviços prestados.
2 - Os clientes têm ainda os seguintes deveres:
a) Não se fazerem acompanhar de animais, excepto se autorizados;
b) Não penetrarem nas áreas da propriedade de acesso vedado;
c) Não perturbarem o ambiente familiar do dono da casa;
d) Não fazerem lume ou cozinharem nos quartos;
e) Não excederem a lotação dos quartos nem alojarem terceiros sem autorização do dono da casa.
Art. 22.º - 1 - O dono da casa deve manter um livro de registo de hóspedes actualizado e facultar o livro de reclamações aos clientes que o exigirem, bem como exibi-lo, sempre que solicitado pelos serviços de inspecção turística.
2 - As reclamações deverão ser tidas em conta pelo dono da casa e, sempre que se justifique, ou quando lhe for solicitado, deve o seu conteúdo ser transmitido no prazo de 48 horas à Direcção-Geral do Turismo.
Art. 23.º - 1 - O licenciamento e fiscalização das unidades afectas ao exercício das actividades turísticas que se contemplam no presente diploma cabe exclusivamente à Direcção-Geral do Turismo.
2 - Ao licenciamento das mesmas unidades e, uma vez inscritas no registo correspondente da Direcção-Geral do Turismo, à sua fiscalização não se aplica a competência que a lei confere às autoridades administrativas e policiais relativamente ao licenciamento e fiscalização de casas de hóspedes e outras actividades afins.
3 - Em relação às mesmas unidades não é exigível alvará de abertura nem qualquer outra licença policial, sem prejuízo da obrigação de registo dos hóspedes e posterior comunicação às entidades competentes.
4 - A Direcção-Geral do Turismo dará conhecimento ao governo civil e à câmara municipal das unidades autorizadas.
Art. 24.º Não cabem no âmbito da qualificação e disciplina previstas no presente decreto-lei a mera actividade de exploração de alojamento de hóspedes em casa particular, bem como a locação ou sublocação de quartos.
Art. 25.º A Direcção-Geral do Turismo poderá estabelecer protocolos com os órgãos locais e regionais de turismo no sentido de se prosseguir a execução do presente diploma.
Art. 26.º Em decreto regulamentar serão fixados os termos de execução do presente decreto-lei, nomeadamente quanto aos meios complementares de acolhimento a contemplar dentro dos conceitos definidos, quanto às características dos empreendimentos, aos elementos a especificar no pedido de inscrição, critérios de apreciação dos pedidos e regras para qualificação das unidades.
Art. 27.º Em tudo o que for omisso aplicar-se-á, com as necessárias adaptações, a legislação vigente em matéria de alojamento turístico.
Art. 28.º O presente diploma aplicar-se-á nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, mediante decretos legislativos regionais, que o regulamentará de harmonia com as realidades de cada Região.
Art. 29.º É revogado o Decreto-Lei 251/84, de 25 de Julho.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 3 de Julho de 1986. - Aníbal António Cavaco Silva - Eurico Silva Teixeira de Melo - Luís Francisco Valente de Oliveira - Mário Ferreira Bastos Raposo.
Promulgado em 9 de Agosto de 1986.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 14 de Agosto de 1986.
Pelo Primeiro-Ministro, Eurico Silva Teixeira de Melo, Ministro de Estado.