de 10 de abril
O aproveitamento de moinhos, azenhas ou outros engenhos hídricos já existentes, adaptando estas infraestruturas à produção de energia elétrica, permitirá reabilitar um valioso património local disperso, ambientalmente integrado, potenciando ainda a dinamização de áreas rurais atualmente abandonadas.
A Lei da Água, aprovada pela Lei 58/2005, de 29 de dezembro, alterada pelos Decretos-Leis 245/2009, de 22 de setembro, 60/2012, de 14 de março e 130/2012, de 22 de junho, e o Regime da Utilização dos Recursos Hídricos, aprovado pelo Decreto-Lei 226-A/2007, de 31 de maio, sujeitam a captação de água para produção de energia elétrica à prévia celebração de um contrato de concessão.
Este regime aplica-se indistintamente, mesmo nos casos de utilização de águas públicas para produção de energia elétrica através de moinhos, azenhas ou outros engenhos hídricos que sejam propriedade privada, que não alterem o regime hidrológico dos rios onde estão inseridos e para os quais não foi previsto um regime especial. As adaptações que venham a ser consideradas como necessárias para reabilitar estas infraestruturas para a produção de energia elétrica têm de garantir a salvaguarda dos valores naturais em presença, especialmente, as condições de conectividade fluvial existentes.
Atendendo a que, nestas situações, estão em causa bens privados, considera-se que o Estado não deve dispor dos mesmos, celebrando contratos de concessão, sem que tenha existido previamente, e caso o interesse público assim o determine, uma expropriação por utilidade pública.
Por outro lado, estão em causa bens que constituem património local e que poderão ser valorizados e recuperados em caso de utilização dos mesmos para a atividade de produção de energia, cujo acesso pressupõe a prévia obtenção do respetivo título de utilização.
Entretanto, a Resolução da Assembleia da República n.º 136/2012, de 7 de novembro, veio recomendar ao Governo que regulamente a produção de energia hidroelétrica por via do aproveitamento de moinhos, azenhas ou outros engenhos hídricos em regime de remuneração não bonificada, com a ligação à rede elétrica de serviço público em baixa tensão, aplicáveis à utilização de águas públicas, adotando soluções simplificadas para a obtenção do título de utilização dos recursos hídricos, quando legalmente exigido.
No seguimento da referida resolução, o presente decreto-lei vem prever um regime simplificado e integrado para a obtenção do título de utilização dos recursos hídricos, quando tal seja legalmente exigido, e acesso à atividade de produção de eletricidade a partir de fontes hídricas com potência de ligação igual ou inferior a 1 MVA.
Tendo em vista o regime integrado de licenciamento, importa assegurar a intervenção articulada entre a Agência Portuguesa do Ambiente, I. P., e a Direção-Geral de Energia e Geologia, enquanto entidades competentes, respetivamente, em matéria de utilização de recursos hídricos e em matéria de acesso à atividade de produção de eletricidade a partir de fontes renováveis, concretizando-se assim os princípios de economia de custos, simplicidade, celeridade de resposta e diminuição do risco administrativo no acesso a esta atividade.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
O presente decreto-lei estabelece o regime especial aplicável à adaptação de moinhos, azenhas ou outras infraestruturas hidráulicas equivalentes para produção de energia hidroelétrica, incluindo os termos e as condições da atribuição do respetivo título de utilização dos recursos hídricos para fins de produção de eletricidade e sua articulação com o regime do acesso à atividade de produção de eletricidade que esteja sujeita aos regimes de comunicação prévia ou de registo prévio para produção destinada ao autoconsumo, nos termos da legislação aplicável.
Artigo 2.º
Âmbito
1 - O regime previsto no artigo anterior é aplicável desde que se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições:
a) Tratar-se da adaptação de moinhos, azenhas ou outras infraestruturas hidráulicas, localizadas em terrenos, leitos e margens privados, tendo por finalidade a produção de energia hidroelétrica;
b) As infraestruturas previstas na alínea anterior utilizarem águas do domínio público hídrico do Estado;
c) A recuperação e utilização das infraestruturas previstas na alínea a) não provocar alterações no regime fluvial do curso de água onde estão localizadas, nem implicar a implantação de novas infraestruturas hidráulicas ou o represamento de água;
d) A potência elétrica instalada ou a injetar na Rede Elétrica de Serviço Público (RESP) ser inferior ou igual a 1 MVA;
e) A energia elétrica produzida nos moinhos, azenhas ou outras infraestruturas hidráulicas não ser remunerada no âmbito do regime de remuneração garantida ou através de tarifa bonificada;
f) O cumprimento do disposto no Decreto-Lei 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis 115/2011, de 5 de dezembro e 265/2012, de 28 de dezembro, em matéria de sujeição prévia a parecer da administração cultural, da adaptação, com vista à produção de energia hidroelétrica, sempre que os tipos de imóveis a que se refere o presente decreto-lei se encontrem classificados ou abrangidos por zona de proteção, ou a apresentação pelo interessado de comprovativo de consulta à Direção-Geral do Património Cultural sobre a existência de eventuais condicionantes sobre o património cultural.
2 - Para efeitos do disposto no presente decreto-lei, considera-se «moinho ou azenha», um engenho que, sem condicionar a livre circulação da água, utilize a energia cinética da sua movimentação, podendo ser adaptado para produzir eletricidade.
Artigo 3.º
Condições de utilização de recursos hídricos para fins de produção de eletricidade
1 - A captação de água para fins de produção de eletricidade ao abrigo do regime previsto nos artigos anteriores está sujeita a licença prévia, a atribuir nos termos do disposto no Regime da Utilização dos Recursos Hídricos, aprovado pelo Decreto-Lei 226-A/2007, de 31 de maio, com as adaptações estabelecidas no presente decreto-lei.
2 - Têm legitimidade para requerer o título de utilização dos recursos hídricos para os fins previstos no número anterior, os proprietários ou os titulares de outro direito que os habilite, com base em título jurídico válido e eficaz, a usufruírem das infraestruturas enunciadas na alínea a) do artigo anterior.
3 - O exercício da atividade de produção de eletricidade obedece aos regimes simplificados da comunicação prévia ou de registo prévio para produção destinada ao autoconsumo, nos termos da portaria prevista no n.º 3 do artigo 33.º-E do Decreto-Lei 172/2006, de 23 de agosto, ou no Decreto-Lei 153/2014, de 20 de outubro, respetivamente, consoante a finalidade do pedido seja a injeção na RESP da totalidade da energia produzida ou a produção em autoconsumo.
4 - É requisito do exercício da atividade de produção de eletricidade referida no número anterior a titularidade da licença de utilização de água, obtida ao abrigo do Regime da Utilização dos Recursos Hídricos, aprovado pelo Decreto-Lei 226-A/2007, de 31 de maio.
Artigo 4.º
Apresentação do pedido para atribuição de licença de utilização dos recursos hídricos e de comunicação prévia ou registo prévio para produção de eletricidade
1 - O pedido para a atribuição da licença para utilização da água e a comunicação prévia ou registo prévio para a produção de eletricidade a partir de fontes hídricas são efetuados através de um requerimento único, contendo os elementos instrutórios respeitante à utilização da água e à produção de eletricidade, nos termos dos números seguintes.
2 - No respeitante à utilização da água, os elementos instrutórios do pedido são os constantes do artigo 14.º do Regime de Utilização dos Recursos Hídricos, aprovado pelo Decreto-Lei 226-A/2007, de 31 de maio, com as adaptações estabelecidas no anexo I ao presente decreto-lei.
3 - No respeitante à produção de eletricidade, os elementos instrutórios do pedido são os constantes da portaria prevista no n.º 3 do artigo 33.º-E do Decreto-Lei 172/2006, de 23 de agosto, ou no Decreto-Lei 153/2014, de 20 de outubro, respetivamente, consoante a finalidade do pedido seja a injeção na RESP da totalidade da energia produzida, ou a produção em autoconsumo.
4 - Os elementos instrutórios referidos nos números anteriores devem ser publicitados nos respetivos sítios na Internet da Agência Portuguesa do Ambiente, I. P. (APA, I. P.), e da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG).
Artigo 5.º
Tramitação e decisão
1 - Todos os pedidos, comunicações e notificações efetuados no âmbito dos procedimentos previstos no presente decreto-lei são processados em plataforma eletrónica acessível através do balcão único eletrónico dos serviços referido no artigo 6.º do Decreto-Lei 92/2010, de 26 de julho, ou dos sítios na Internet da APA, I. P., ou da DGEG.
2 - O requerimento único referido no artigo anterior pode ser apresentado através das plataformas eletrónicas da APA, I. P., ou da DGEG.
3 - As decisões sobre a atribuição de título de utilização dos recursos hídricos e sobre a aceitação da comunicação prévia ou do registo prévio para produção de eletricidade são comunicadas ao requerente no prazo máximo de 70 dias.
4 - A contagem do prazo suspende-se quando forem solicitados elementos adicionais ou esclarecimentos ao requerente, os quais só podem ser solicitados uma vez no âmbito dos procedimentos.
5 - As comunicações com o requerente são asseguradas pela entidade em cuja plataforma foi submetido o requerimento único.
Artigo 6.º
Disposições complementares e finais e transitórias
1 - A utilização de águas do domínio público hídrico do Estado ao abrigo do presente decreto-lei está sujeita ao regime previsto no Decreto-Lei 97/2008, de 11 de junho, que estabelece o regime económico e financeiro dos recursos hídricos.
2 - A renovação da licença de utilização dos recursos hídricos pode ser solicitada no prazo de seis meses antes do respetivo termo, desde que se mantenham as condições que determinaram a sua atribuição.
3 - A interoperabilidade das plataformas informáticas prevista no n.º 1 do artigo anterior deve estar concluída no prazo máximo de 90 dias após a publicação do presente decreto-lei.
4 - O disposto no número anterior não prejudica a ligação destas plataformas informáticas à Plataforma de Interoperabilidade da Administração Pública, designadamente para os efeitos previstos no artigo 28.º-A do Decreto-Lei 135/99, de 22 de abril, alterado pelos Decretos-Leis 29/2000, de 13 de março, 72-A/2010, de 18 de junho e 73/2014, de 13 de maio.
5 - Até que esteja assegurada a interoperabilidade ou funcionamento das plataformas informáticas referidas no artigo anterior, os pedidos, incluindo o requerimento único, bem como as comunicações e as notificações efetuados no âmbito dos procedimentos previstos no presente decreto-lei são processados com recurso a qualquer outro meio legalmente idóneo.
Artigo 7.º
Direito subsidiário
1 - Em tudo o que não estiver previsto no presente decreto-lei, no que respeita à utilização de recursos hídricos, é aplicável o disposto no Decreto-Lei 226-A/2007, de 31 de maio.
2 - Em tudo o que não estiver previsto no presente decreto-lei, no respeitante aos procedimentos de aceitação da comunicação prévia ou do registo prévio para a produção de eletricidade, aplica-se o disposto na portaria prevista no n.º 3 do artigo 33.º-E do Decreto-Lei 172/2006, de 23 de agosto, ou no Decreto-Lei 153/2014, de 20 de outubro, respetivamente consoante a finalidade do pedido seja a injeção na RESP da totalidade da energia produzida, ou a produção em autoconsumo.
Artigo 8.º
Regiões autónomas
1 - O presente decreto-lei aplica-se às regiões autónomas dos Açores e da Madeira, sem prejuízo das adaptações a introduzir através de diploma regional próprio.
2 - Os atos e procedimentos necessários a execução ao presente decreto-lei nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira competem às entidades das respetivas administrações regionais com atribuições e competências nas matérias em causa.
3 - O produto das taxas e coimas cobradas nas regiões autónomas constituem receita própria destas.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 19 de fevereiro de 2015. - Pedro Passos Coelho - Maria Luís Casanova Morgado Dias de Albuquerque - Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
Promulgado em 2 de abril de 2015.
Publique-se.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendado em 6 de abril de 2015.
O Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho.