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Acórdão 563/2024, de 6 de Novembro

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Sumário

Decide, com respeito às contas anuais do Partido Unido dos Reformados e Pensionistas (PURP) referentes a 2015, julgar parcialmente procedentes os recursos interpostos pelo PURP e pelo seu responsável financeiro da decisão da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos e, em consequência, decide admoestar cada um dos arguidos pela prática de contraordenação.

Texto do documento

Acórdão 563/2024 Processo 553/21 Aos vinte e três dias do mês de julho de dois mil e vinte e quatro, achando-se presentes o Juiz Conselheiro Presidente José João Abrantes e os Juízes Conselheiros Afonso Patrão, António José da Ascensão Ramos, João Carlos Loureiro, Rui Guerra da Fonseca, Maria Benedita Urbano, José Teles Pereira, Carlos Medeiros Carvalho, Gonçalo de Almeida Ribeiro, Dora Lucas Neto, Mariana Canotilho e Joana Fernandes Costa, foram trazidos à conferência, em sessão plenária do Tribunal Constitucional, os presentes autos. Após debate e votação, foi, pelo Ex.mo Conselheiro Vice-Presidente, por delegação do Ex.mo Conselheiro Presidente, nos termos do artigo 39.º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional, ditado o seguinte: I. Relatório 1 - Nos presentes autos de recurso jurisdicional em matéria de contas dos partidos políticos, vindos da ENTIDADE DAS CONTAS E FINANCIAMENTOS POLÍTICOS (doravante designada por "ECFP"), em que são recorrentes o PARTIDO UNIDO DOS REFORMADOS E PENSIONISTAS (PURP) e JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES, na qualidade de responsável financeiro daquele partido político para as contas anuais de 2015, foram interpostos recursos da decisão daquela Entidade, de 21 de abril de 2021, que sancionou contraordenacionalmente os recorrentes. 2 - Por decisão de 3 de janeiro de 2019, tomada no âmbito do PA 21/CA/15/2018 (doravante designado somente por "PA"), a ECFP julgou prestadas, com irregularidades, as contas anuais do PURP, referentes a 2015 (v. artigo 26.º, n.º 2, da Lei 19/2003, de 20 de junho [Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais, referida adiante pela sigla "LFP"] e artigo 32.º, n.º 1, alínea c), da Lei Orgânica 2/2005, de 10 de janeiro [Lei da Organização e Funcionamento da ECFP, referida adiante pela sigla "LEC"]). 3 - Na sequência dessa decisão, a ECFP levantou um auto de notícia e instaurou processo contraordenacional contra o PURP e contra JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES, este na qualidade de responsável financeiro do PURP nas contas anuais de 2015, pela prática das irregularidades verificadas naquela decisão. Os arguidos foram notificados do processo de contraordenação, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 44.º, n.os 1 e 2, da LEC e no artigo 50.º do Decreto-Lei 433/82, de 27 de outubro (Regime Geral das Contraordenações, referido adiante pela sigla "RGCO"), tendo o arguido JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES apresentado a sua defesa. 4 - Por decisão de 21 de abril de 2021, a ECFP aplicou: a) Ao PURP, a sanção de coima no valor de 10 (dez) vezes o salário mínimo nacional (SMN) de 2008, o que perfaz a quantia de €4.260,00 (quatro mil duzentos e sessenta euros), pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 29.º, n.º 1, da LFP; b) A JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES, a sanção de coima no valor de 5 (cinco) vezes o salário mínimo nacional (SMN) de 2008, o que perfaz a quantia de €2.130,00 (dois mil cento e trinta euros), pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 29.º, n.os 1 e 2, da LFP. 5 - O arguido PURP recorreu desta decisão para o Tribunal Constitucional, nos termos dos artigos 23.º e 46.º, n.º 2, da LEC, e do artigo 9.º, alínea e), da Lei de Organização, Funcionamento e Processo no Tribunal Constitucional (doravante designada por "LTC"), tendo concluído as suas alegações nos seguintes termos: "[...] Como é possível um Partido com cerca de 115 Filiados, a pagarem quotas de 12€/anuais, e com um ativo imobilizado a rondar uma centena de euros [...] pode suportar uma barbaridade de uma coima de 4.260€? Trata-se de uma injustiça, que considero demasiado punitiva e cruel. [...] Acabo este texto simples, mas significativo do meu estado de alma, reiterando e, mais uma vez, apelando a V. Excelências para que nos deixe sonhar e não nos castigue com coimas, de que não temos como cumprir [...]". 6 - O arguido JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES recorreu daquela decisão para o Tribunal Constitucional, nos termos dos artigos 23.º e 46.º, n.º 2, da LEC, e do artigo 9.º, alínea e), da LTC, tendo concluído as suas alegações nos seguintes termos: "1) O Partido foi constituído em de julho de 2015 e só promoveu o seu 1° Congresso Nacional a 29 de novembro de 2015. 2) No período de julho até 31 de dezembro de 2015, os responsáveis pelo Partido foram os respetivos fundadores. 3) O Partido tinha ao tempo a sua sede provisória na Rua Tenente Ferreira Durão, n.º 56 - R/C - Dtº, em Campo de Ourique, Lisboa. 4) Porque nenhum dos fundadores tivesse conhecimentos de “contabilidade dos partidos”, o Partido contratou uma empresa, vizinha do partido e da sua confiança, para elaborar a contabilidade. 5) Na data de 29 de novembro de 2015, no 1.º Congresso Nacional do Partido, o arguido foi eleito Secretário-Geral. da primeira CPN do Partido para o triénio de 2016 a 2019 e iniciou funções a 1 de janeiro de 2016. 6) O arguido não tinha e ainda hoje não tem quaisquer conhecimentos sobre “contabilidade dos partidos”. 7) As contas foram feitas pelo Escritório de Contabilidade contratado, foram analisadas e aprovadas pelo Conselho de Jurisdição Nacional e aprovadas em reunião do Conselho Geral, os órgãos do Partido. 8) Em maio de 2016, o arguido assinou de boa fé as contas do Partido relativas ao exercício de 2015, porque estava convicto que as contas “estavam bem feitas” e não tinha razões para duvidar do profissionalismo dos responsáveis do Escritório de Contabilidade. 9) No dia 29 de abril de 2017, duas dúzias de filiados, mediante um “golpe interno” organizaram (sem qualquer convocatória aos filiados, ordem de trabalhos, local de realização, etc.), um pretenso Congresso dito Extraordinário, demitiram a CPN e o único titular que ainda restava na CJN e autoelegeram-se titulares dos órgãos do Partido. 10) Houve impugnação deste Congresso dito Extraordinário e dos seus pretensos resultados para o TC (Processo 383/17 - 3.ª Secção). 11) O TC não aceita a impugnação e remete os impugnantes para a CJN do Partido... eleita no pretenso Congresso dito Extraordinário e contra a qual a impugnação também se insurgia. 12) Em conclusão: o arguido e os outros titulares da legítima CPN e único titular da também legítima CJN viram-se ‘alijados borda fora’ por um bando de arruaceiros e o ‘alijamento’ mesmo que indiretamente, foi confirmado. 13) Durante os meses de maio e junho de 2017 são muitos os filiados, diga-se, os melhores filiados, que apresentam a desfiliação. 14) Houve um sentimento de ‘não valer a pena’ continuar no Partido e o arguido desfiliou-se igualmente em meados de junho/2017. 15) Depois desta data, os órgãos do Partido nunca permitiram ou facilitaram ao arguido a consulta de livros contabilísticos, documentos, etc., assim como o Escritório de Contabilidade nunca lhe forneceu quaisquer elementos. 16) Assim como, depois desta data, os órgãos do Partido nunca entregaram ao arguido qualquer documentação que lhe fosse endereçada e que a este assunto se refira, nunca tendo o arguido recebido a carta registada que foi remetida pela ENTIDADE em 04/01/2019 para a morada: Rua de Pedrouços, n.º 27 - Gabinete 11 - E - Lisboa (sede atual do Partido como é público) e que foi recebida pela senhora Lucília Monteiro. 17) Daria esta carta registada a oportunidade ao arguido de corrigir o que assinou de boa-fé? Não sabemos: os presentes autos são de 2020. 18) A ENTIDADE não aceitou a prova por testemunhas, mas também não fundamentou de facto e de direito a sua decisão violando as normas dos artigos 43.º e 266.º, n.º 1, do RGCO e da CRP, respetivamente: “a autoridade administrativa, ao não aceitar as diligências de prova, terá de fundamentar a sua decisão”... 19) Alegando “porque se mostram inócuas e sem qualquer pertinência ou utilidade e são dilatórias”, o que configura uma apreciação e não uma fundamentação. 20) Alegando “porque os elementos documentais junto aos autos são suficientes e aptos a proferir uma decisão” mais uma vez do ponto de vista da ENTIDADE, o que configura uma apreciação e não uma fundamentação. 21) A falta de fundamentação nesta matéria, porque ofende norma imperativa, gera nulidade da decisão no seu todo. 22) Finalmente, só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência. 23) A afirmação da existência do elemento intelectual do dolo exige que o agente tenha conhecimento da ilicitude. 24) O arguido não tinha consciência de que nas circunstâncias concretas e determinadas estivesse a cometer um ilícito, quando assinou as contas do Partido de boa-fé e na pressuposição do exato cumprimento da lei. 25) Com efeito... os factos alegados nas presentes conclusões (1.ª a 17.ª) são demonstrativos desta realidade: no contexto não se verifica consciência da ilicitude e dolo, mesmo que eventual, o que fere de nulidade toda a decisão. Nestes termos, deve a decisão da ENTIDADE ora impugnada ser declarada nula e de nenhum efeito, por ofensa a normas imperativas no âmbito da defesa do arguido, e/ou falta da consciência da ilicitude e/ou por inexistência de dolo, mesmo eventual que seja, absolvendo-se o arguido da coima a que foi condenado". 7 - Por deliberação de 9 de junho de 2021, tomada ao abrigo do artigo 46.º, n.º 5, da LEC, a ECFP sustentou a decisão recorrida e determinou a remessa dos autos ao Tribunal Constitucional. 8 - Recebidos os autos no Tribunal Constitucional, foi proferido despacho, datado de 4 de novembro de 2021, pelo qual se admitiram os recursos interpostos. O Ministério Público pronunciou-se, nos termos do artigo 103.º-A, n.º 1, da LTC, no sentido de ser negado provimento aos recursos. Notificado, o PURP apresentou resposta ao parecer do Ministério Público, reiterando os argumentos que já aduzidos no processo. II. Fundamentação A. Considerações gerais 9 - A Lei Orgânica 1/2018, de 19 de abril, veio alterar, entre outras, a LFP e a LEC, introduzindo profundas modificações no regime de apreciação e fiscalização das contas dos partidos políticos e no regime de aplicação das respetivas coimas. Considerando que, à data de entrada em vigor desta lei - 20 de abril de 2018 (artigo 10.º) -, os presentes autos aguardavam julgamento respeitante à legalidade e regularidade das contas, tal regime é-lhes aplicável, nos termos da norma transitória do artigo 7.º da referida Lei Orgânica. A respeito do novo regime legal, quer quanto à competência de fiscalização, quer quanto ao regime processual, foram desenvolvidas algumas considerações no Acórdão 421/2020 (acessível, assim como os demais acórdãos adiante citados, a partir da hiperligação http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/), para o qual se remete, salientando-se aqui que a alteração mais significativa diz respeito à competência para apreciar a regularidade e legalidade das contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, bem como aplicar as respetivas coimas, que, até abril de 2018, pertencia ao Tribunal Constitucional e passou agora a ser atribuída à ECFP (artigos 9.º, n.º 1, alínea d), da LEC, e 24.º, n.º 1, da LFP). Assim, nos termos do novo regime legal, cabe ao Plenário do Tribunal Constitucional apreciar, em recurso de plena jurisdição, as decisões daquela Entidade em matéria de regularidade e legalidade das contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, incluindo as decisões de aplicação de coimas (artigo 9.º, alínea e), da Lei 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla "LTC"). No referido Acórdão 421/2020 esclareceu-se ainda, relativamente à competência do Tribunal em matéria de regularidade e legalidade das contas, que a apreciação deverá obedecer a critérios de legalidade, centrados na ordem de valores que o regime de financiamento dos partidos pretende tutelar, não se resumindo a uma aplicação mecânica de critérios de natureza estritamente financeira e contabilística (v., entre outros, os Acórdãos n.os 979/1996 e 563/2006). B. Questões a decidir 10 - Em face do teor das alegações, as questões a decidir a respeito do recurso da decisão sancionatória da ECFP, de 21 de abril de 2021, são as seguintes: a) Nulidade da decisão recorrida; b) Subsunção dos factos dados como provados aos ilícitos imputados; c) Imputação subjetiva dos factos a título doloso ou negligente; d) Espécie e medida das coimas. C. Questão prévia 11 - Nulidade por falta de fundamentação da decisão de indeferimento de diligência de produção de prova requerida pelo recorrente O recorrente JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES entende que a decisão sancionatória recorrida é nula por não ter fundamentado o indeferimento da diligência de produção de prova testemunhal por si requerida ("não aceitou a prova por testemunhas, mas também não fundamentou de facto e de direito a sua decisão, violando as normas dos artigos 43.º e 266.º, n.º 1, do RGCO e da CRP"), em violação do princípio da legalidade. Vejamos. Em primeiro lugar, importa notar que a ECFP, enquanto entidade competente para dirigir a investigação e tramitação do processo de contraordenação, não está obrigada deferir todas as diligências de produção de prova requeridas pelo arguido, devendo inclusivamente recusar a produção de prova que não seja legalmente admissível, necessária ou adequada em função do objeto do processo. A decisão de indeferimento produzida pela ECFP é, assim, admissível em abstrato, mediante decisão fundamentada. Como se escreveu no Acórdão 261/2022, "[n]a fase de investigação e instrução, que incumbe à entidade administrativa, o arguido, no exercício do seu direito de defesa, pode apresentar provas e requerer diligências, mas a entidade administrativa não é obrigada a realizar todas as diligências de prova que lhe sejam requeridas", sendo certo que a entidade administrativa, "[c]aso não aceite as diligências de prova requeridas pelo arguido, terá de fundamentar a sua decisão, em obediência ao princípio da legalidade (cf. artigos 43.º do RGCO e 266.º, n.º 1, da CRP)". Em segundo lugar, verifica-se que o juízo de indeferimento realizado pela ECFP é, em concreto, adequado. O recorrente, no contexto do exercício do seu direito de audição e defesa (v. o artigo 44.º, n.º 2, da LEC), veio requerer a inquirição de quatro testemunhas, indicando que a diligência se destinava à prova dos factos alegados nos pontos 1.º a 13.º do requerimento, todos relativos às relações do recorrente com o PURP. Ora, a factualidade que se pretende provar com a diligência requerida não revela a mínima aptidão para influenciar o juízo de atribuição de responsabilidade contraordenacional ao recorrente. Por um lado, a matéria relativa ao "golpe interno" no PURP (v. ponto 9 a 13. das alegações) não é objeto do presente processo de contraordenação, tendo, no mais, sido decidido em definitivo pelo Tribunal Constitucional no Acórdão 241/2021, de 21 de abril. Por outro lado, os factos relativos à responsabilidade material pela elaboração das contas anuais do PURP, que o recorrente atribui a um escritório de contabilidade (v. ponto 1 a 8. das alegações), sendo embora relevantes para aferir da responsabilidade contraordenacional do recorrente, não são aptos a ser provados por via testemunhal. Com efeito, a prova testemunhal não é adequada a formar a convicção do julgador quanto à contratação de um escritório de contabilidade para a elaboração das contas anuais apresentadas pelo PURP, tratando-se de matéria de facto que, sem prejuízo da eventual relevância complementar da prova testemunhal, deverá ser demonstrada essencialmente através prova documental. Neste sentido, o recorrente foi notificado pelo Tribunal Constitucional para juntar aos autos elementos demonstrativos da intervenção de escritório de contabilidade na elaboração das contas anuais apresentadas, sobre isto nada tendo dito (fls. 147 a 149 dos autos). Finalmente, importa saber se a decisão de indeferimento da ECFP carece de fundamentação. A este propósito, sublinhe-se que não bastaria à ECFP, sob pena de incorrer em petição de princípio, limitar-se a afirmar a falta de pertinência ou utilidade da diligência, com isso concluindo pelo seu carácter dilatório, quando é precisamente a ausência de pertinência ou utilidade da diligência que se teria de demonstrar. Caberia à ECFP fundamentar a decisão de indeferimento em termos tais que dela resultasse, com nitidez, a compreensão precisa das razões para o indeferimento. Foi isso que fez. No essencial, a ECFP fez repousar a sua fundamentação na inutilidade da diligência probatória requerida, por considerar que "tal diligência probatória, face às concretas questões suscitadas nos autos, mostra-se inócua e não tem qualquer pertinência ou utilidade, conforme infra explanaremos, pelo que constitui diligência probatória que, por isso, não será realizada", acrescentando que "atendendo a que os elementos documentais juntos aos autos são suficientes e aptos a proferir a decisão, não se considera existir qualquer utilidade na inquirição das testemunhas arroladas, pelo que vai a requerida diligência indeferida". Não se verifica, pois, nulidade alguma. D. Mérito da decisão sancionatória 12 - Matéria de facto 12.1 - Factos provados Com relevo para a decisão, provou-se que: 1 - O PURP é um partido político português constituído em 13 de julho de 2015, encontrando-se registado no Tribunal Constitucional. 2 - Por comunicação eletrónica de 31 dezembro de 2015, o PURP identificou João Manuel de Assunção Fernandes como responsável financeiro pelas contas anuais de 2015. 3 - O PURP apresentou, em 8 de abril de 2016, as contas anuais de 2015. 4 - O PURP não entregou o Balanço, a Demonstração dos Resultados por Naturezas ou por Funções, a Demonstração dos Fluxos de Caixa e o Anexo. 5 - Ao agir conforme descrito no ponto 4. dos factos provados, os Arguidos representaram como possível a inobservância de deveres legais suscetível de punição, conformando-se com essa possibilidade e apresentando as contas nessas condições. 6 - Os Arguidos sabiam que a sua conduta era proibida e contraordenacionalmente sancionável, tendo agido livre, voluntária e conscientemente. 7 - Nas contas de 2015, o PURP registou receitas no valor de €8.950,40 e despesas no valor de €10.073,46. 8 - Por referência aos anos de 2015 e 2019, o PURP não recebeu subvenção estatal. 12.2 - Factos não provados Com relevância para a decisão, não há factos não provados. 12.3 - Motivação da decisão sobre a matéria de facto A decisão sobre a matéria de facto resulta da análise conjugada da prova documental junta aos presentes autos, das regras da experiência e de inferências lógicas. Note-se que o recorrente PURP não questiona a prática dos factos imputados, nem a imputação da sua conduta a título de dolo, limitando-se a contestar a medida da coima aplicada. Para prova do facto 1. foi consultado o sítio público da Internet do Tribunal Constitucional - http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/partidos.html − do qual a mesma se extrai. A prova do facto mencionado em 2. resulta do teor de fls. 3 do PA. A prova do facto mencionado em 3. resulta do teor de fls. 4 do PA. A prova da matéria factual elencada no ponto 4. teve por base as contas apresentadas no âmbito do PA, concretamente o teor dos documentos contabilísticos e dos documentos de suporte apresentados, de cuja análise se extrai a ausência de entrega dos sobreditos elementos. A prova da factualidade enunciada em 5. extrai-se da matéria objetiva dada como provada, de acordo com as regras de experiência comum e inferência lógicas. Tratando-se de estados mentais dos agentes, a prova dos factos que os consubstanciem pode ser alcançada, na ausência de confissão, através da interpretação exterior dos factos internos, que se realiza por meio de inferências, assentes em presunções judiciais apoiadas nas regras da experiência comum ou em abduções baseadas em factos apurados através de prova direta. O recorrente JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES, não questionando a prática dos factos imputados, contesta, no entanto, que a infração lhe possa ser subjetivamente imputada a título de dolo, controvertendo a factualidade descrita no ponto 5. dos factos provados. Para tanto, afirma que "não tinha e ainda hoje não tem quaisquer conhecimentos sobre “contabilidade dos partidos" (v. ponto 6 das alegações), tendo "assinado de boa fé as contas do Partido relativas ao exercício de 2015, porque estava convicto que as contas “estavam bem feitas” e não tinha razões para duvidar do profissionalismo dos responsáveis do Escritório de Contabilidade" (v. ponto 8 das alegações). Não lhe assiste razão. Por um lado, está por demonstrar que as contas anuais do PURP, referentes a 2015, tenham sido elaboradas por um escritório de contabilidade. Trata-se esta de uma alegação que não vem sustentada em qualquer elemento de prova, tendo os recorrentes sido notificados pelo Tribunal Constitucional para juntar aos autos elementos demonstrativos da intervenção de escritório de contabilidade na elaboração das contas anuais apresentadas, nada tendo dito (v. fls. 147 a 149 dos autos). Não resulta provado, pois, que se tenha recorrido à contratação de serviços especializados em contabilidade para elaborar as contas anuais. Por outro lado, o que vem alegado pelo recorrente em nenhum caso afasta o dolo do tipo contraordenacional, servindo, aliás, para o confirmar. É que o recorrente não só não contesta que tenha representado e se tenha conformado com o facto descrito no tipo contraordenacional, como afirma a sua incapacidade para sindicar a conformidade das contas anuais apresentadas pelo PURP com as normas que constam da LFP. Ora, a convicção formada pelo recorrente quanto à correção das contas anuais apresentadas ("estava convicto que as contas “estavam bem feitas”") é incompatível com a sua assumida ignorância em matéria contabilística ("não tinha e ainda hoje não tem quaisquer conhecimentos sobre “contabilidade dos partidos"), permitindo afirmar que o recorrente, estando consciente do risco associado à incapacidade para assegurar a conformidade legal das contas anuais apresentadas, se conformou com a possibilidade de as contas anuais apresentadas violarem a LFP. A atuação dolosa dos arguidos − que consiste na atuação com conhecimento de que daí pode resultar, como consequência, o facto punível, conformando-se o agente com tal possibilidade −, resulta, pois, perfeitamente demonstrada na matéria de facto, de acordo com as regras da experiência e inferências lógicas, daí se extraindo que representaram como possível o resultado das suas condutas e que se conformaram com essa possibilidade, encontrando-se verificados, na modalidade de dolo eventual, o conhecimento e a vontade exigidos pelo tipo subjetivo previsto no artigo 29.º, n.os 1 e 2, da LFP. Quanto à consciência da ilicitude, constante do ponto 6. dos factos provados, refere a decisão recorrida que os arguidos sabiam que a conduta praticada era proibida e sancionável como contraordenação, tendo agido livre, voluntária e conscientemente. Vêm indicadas, na motivação da decisão da matéria de facto, as razões para tal juízo, devendo recordar-se que, também aqui, a prova destes factos se faz por via indireta, repousando nas regras da experiência comum e processos inferenciais, designadamente de natureza abdutiva. Note-se, a este propósito, que os elementos cuja não apresentação se imputa, e que integram as demonstrações financeiras do PURP, constituem os mais elementares documentos do processo de prestação de contas anuais dos partidos políticos, sendo razoável assumir que, apesar da pouca experiência do PURP em matéria de financiamento partidário e da inaptidão técnica do seu responsável financeiro para as contas anuais de 2015, a sua apresentação fosse do conhecimento dos recorrentes, em particular considerando o contacto que têm com a ECFP e a circunstância de as recomendações públicas que esta dirige aos partidos políticos incluírem a indicação de que os elementos omitidos eram de apresentação obrigatória. Decorre do artigo 9.º do RGCO que a falta de consciência da ilicitude do facto não exclui o dolo, apenas podendo afastar a culpa quando o erro não for censurável ao agente. Ora, em nenhum caso se poderia admitir que os arguidos desconhecessem, sem censura, o dever de apresentar os documentos omitidos, já que constituíam estes os elementos fundamentais das demonstrações financeiras de um partido político. Recorde-se, no mais, que a exigibilidade da observância dos deveres é um critério essencial para determinar a censurabilidade da falta de consciência da ilicitude dos arguidos, já que não está em causa, neste domínio, a atribuição de um juízo de culpa ética equivalente ao do direito penal, antes a eventual indiferença relativamente aos valores tutelados pelas normas de dever previstas na LFP e na LEC. Como o Tribunal Constitucional tem desde sempre afirmado (v. Acórdãos n.os 77/2011 e 86/2012), estando em causa a observância de regras específicas relativas ao financiamento e apresentação de contas dos partidos políticos, os partidos políticos e os seus responsáveis financeiros não podem, em consciência, deixar de conhecer as normas a que estão vinculados, pelo que a inobservância dos deveres que para eles decorrem da LFP deve, na ausência de motivos justificativos - que, neste caso, não foram apresentados −, ser-lhes imputado a título de dolo. Assim, a prova da consciência da ilicitude (facto 6.) resulta da matéria objetiva dada como provada, de acordo com as regras da experiência comum e de inferências lógicas. A prova do facto mencionado no ponto 7. dos factos provados resulta de fls. 25 do PA. A prova do facto constante do ponto 8. dos factos provados resulta de fls. 9 e 10 do PA e de fls. 6 e 7 dos autos. 13 - Matéria de direito 13.1 - Considerações gerais Nos termos do artigo 28.º, n.º 1, da LFP, "os infratores das regras respeitantes ao financiamento dos Partidos e das campanhas eleitorais previstas nos capítulos II e III ficam sujeitos às sanções previstas nos números e artigos seguintes", sendo que os n.os 2 a 4 do artigo 28.º impõem penas e os artigos 29.º a 32.º impõem coimas, restringindo-se a competência do Tribunal Constitucional à aplicação destas, nos termos previstos no artigo 33.º, n.º 1, do mesmo diploma. O artigo 29.º da LFP (“Não cumprimento das obrigações impostas ao financiamento”) dispõe, no seu n.º 1, que "os partidos políticos que não cumprirem as obrigações impostas no capítulo II são punidos com coima mínima no valor de 10 vezes o valor do IAS e máxima no valor de 400 vezes o valor do IAS, para além da perda a favor do Estado dos valores ilegalmente recebidos" e, no seu n.º 2, que "os dirigentes dos partidos políticos que pessoalmente participem na infração prevista no número anterior são punidos com coima mínima no valor de 5 vezes o valor do IAS e máxima no valor de 200 vezes o valor do IAS". A tipificação acolhida em matéria de infrações ao financiamento dos partidos políticos segue um modelo de remissão expressa para as normas de dever contidas na parte substantiva da LFP: a norma de sanção prevista no artigo 29.º da LFP identifica, em função de certo critério de integração sistemática na LFP (em concreto, o Capítulo II), as normas de dever cujo incumprimento é sancionado com coima. Assim, a infração contraordenacional concretiza-se, neste modelo, através da conexão de duas normas: a propriamente sancionatória, que seleciona as condutas substantivas que constituem contraordenação; e as normas substantivas que impõem deveres e definem, a contrario, o comportamento proibido. No caso vertente, o comportamento proibido é concretizado por referência ao artigo 12.º da LFP, aplicável ex vi do artigo 14.º deste diploma, que estabelece, no seu n.º 1, que "os partidos políticos devem possuir contabilidade organizada, de modo que seja possível conhecer a sua situação financeira e patrimonial e verificar o cumprimento das obrigações previstas na presente lei", aqui se prevendo um dever genérico de organização contabilística. Em causa está a verificação de deficiências de organização contabilística que comprometem a fiabilidade das contas apresentadas, impedindo o conhecimento da real situação financeira e patrimonial dos partidos e não possibilitando a verificação do cumprimento das obrigações a que eles estão legalmente adstritos. O conteúdo do dever de organização contabilística é concretizado através dos específicos deveres que resultam, designadamente, dos demais números e alíneas deste artigo; mas a não observância do dever genérico ocorre ainda nos casos em que, não se verificando embora a observância de deveres legais específicos, se verifiquem deficiências ou insuficiências de organização contabilística que comprometam a fiabilidade das contas apresentadas. Neste mesmo sentido, tem o Tribunal Constitucional sublinhado que "o dever de organização contabilística por parte dos partidos reflete-se em diversos factos, que podem implicar quer o incumprimento de específicos deveres impostos pela LFP, quer deficiências ou insuficiências que comprometem a fiabilidade das contas apresentadas" (v., entre outros, os Acórdãos n.os 198/2010, 711/2013, e 246/2021). No Acórdão 81/2021, afirmou-se que "a não apresentação da documentação de suporte dos rendimentos e gastos registados e do extrato bancário relativo à conta de depósitos bancários referentes a 2012 constitui uma violação do dever de organização contabilística que impende sobre os partidos políticos, já que, por força da remissão para o Sistema de Normalização Contabilística, constante do n.º 2 do referido artigo 12.º, a apresentação de tais documentos constitui uma obrigação legal, o mesmo sucedendo, por força da alínea a) do respetivo n.º 7, com os extratos bancários", acrescentando que "constituindo uma insuficiente comprovação das despesas e receitas do partido em violação de um dos deveres impostos no Capítulo II da LFP, tal atuação é subsumível ao tipo objetivo de ilícito previsto no n.º 1 do artigo 29.º da referida Lei, pelo qual o arguido é responsável no plano contraordenacional". A análise dos pressupostos da responsabilidade contraordenacional prevista no artigo 29.º da LFP aconselha uma breve referência à natureza estruturalmente dolosa dos ilícitos tipificados no referido diploma legal, matéria em que se segue de perto o Acórdão 345/2013. Com efeito, sendo certo que "na ausência de uma norma específica de sentido contrário, os tipos-de-ilícito estruturados a partir da violação dos deveres impostos em matéria de financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais e de apresentação das respetivas contas encontram-se sujeitos, conforme repetidamente afirmado por este Tribunal, à incidência da regra geral constante do artigo 8.º, n.º 1, do RGCO, nos termos do qual "só é punível o facto praticado com dolo"», é igualmente seguro que "a responsabilidade contraordenacional prevista na Lei 19/2003 é compatível com qualquer forma de dolo [...] não pressupondo, além do mais, qualquer intenção especial que concorra com o dolo do tipo ou a ele se adicione com autonomia". Por último, e no que respeita à responsabilidade contraordenacional prevista no artigo 29.º, n.º 2, da LFP, vale a pena recordar o disposto no artigo 18.º, n.º 1, da LEC, na parte em que "estabelece um mecanismo de identificação dos responsáveis partidários, primariamente dependente de indicação, pelos próprios partidos, dos indivíduos a quem tenha sido deferida a responsabilidade última pela fidedignidade das contas partidárias, ou seja, aqueles a quem se imponha, em especial, o dever de garante acima referido" (v. o Acórdão 711/2013, citando o Acórdão 301/2011). É sobre estes dirigentes que recai o dever de garantir a observância dos deveres impostos aos partidos políticos em matéria de financiamento e organização contabilística, competindo-lhes adotar, no interior das estruturas partidárias, mecanismos e procedimentos que previnam a violação das normas da LFP, designadamente no que respeita à elaboração e apresentação de contas anuais. 13.2 - Preenchimento do tipo contraordenacional Através da decisão recorrida, a ECFP sancionou os arguidos pela prática da contraordenação prevista no artigo 29.º, n.os 1 e 2, da LFP, com fundamento na inobservância do dever de organização contabilística previsto no artigo 12.º, n.os 1 e 2, da LFP, violação essa consubstanciada na omissão de entrega, nas contas anuais de 2015, do Balanço, a Demonstração dos Resultados por Naturezas ou por Funções, da Demonstração dos Fluxos de Caixa e do Anexo. Nos termos do disposto no artigo 12.º, n.º 2, da LFP, a organização contabilística das contas anuais dos partidos políticos rege-se pelos princípios aplicáveis ao Sistema de Normalização Contabilística (SNC) − em concreto, conforme resulta da Secção I do Regulamento 16/2013, de 10 de janeiro (Regime Contabilístico adaptado aos Partidos Políticos, doravante designado por "RCPP"), do regime da normalização contabilística para o setor não lucrativo, aplicável "com as adaptações e simplificações adequadas à natureza dos partidos político" (v. n.º 2 do artigo 12.º da LFP). Ora, do quadro normativo do Sistema de Normalização Contabilística aplicável aos partidos políticos resulta − concretamente, do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei 158/2009, de 13 de julho, na sua versão originária −, que as entidades sujeitas ao SNC são obrigadas a apresentar elementos contabilísticos que constituem as suas demonstrações financeiras, nos quais se incluem o "Balanço" (v. alínea a) do artigo 11.º daquele diploma), a "Demonstração dos resultados por naturezas" (v. alínea b) do artigo 11.º daquele diploma), a "Demonstração dos fluxos de caixa pelo método direto" (v. alínea d) do artigo 11.º daquele diploma) e o "Anexo" (v. alínea e) do artigo 11.º daquele diploma). Resulta ainda do n.º 3 do artigo 11.º deste diploma que "pode ser apresentada uma demonstração dos resultados por funções". A versão originária do artigo 11.º do Decreto-Lei 158/2009, de 13 de julho, sofreu as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 98/2015, de 02 de junho, passando a constar da alínea d) do n.º 1 deste artigo a referência a "Demonstração dos fluxos de caixa" (v. alínea d) do artigo 11.º daquele diploma, nesta versão) e ainda, do n.º 2 deste artigo, a formulação que, na versão originária desta norma, constava do n.º 3 do artigo. Considerando que o Decreto-Lei 98/2015 é aplicável "aos períodos que se iniciem em ou após 1 de janeiro de 2016" (v. o artigo 15.º deste diploma) e que, embora o tempo da prática da infração se reporte a 31 de maio de 2016 (termo do prazo para apresentação das contas anuais), o período contabilístico a que se referem as contas é anterior a 2016, considera-se aplicável o artigo 11.º, n.os 1 e 3, do Decreto-Lei 158/2009, de 13 de julho, na sua versão originária. A obrigatoriedade de apresentação dos elementos contabilísticos referidos em 4. dos factos provados resulta, assim, do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei 158/2009, na sua versão originária, constituindo um dever legal imposto pelas normas de organização contabilística do SNC cuja inobservância determina a violação do artigo 12.º, n.º 2, da LFP. Importa notar, contudo, que a "Demonstração dos Resultados por Funções" constitui, nos termos do n.º 3 do artigo 11.º daquele diploma, um elemento contabilístico de apresentação facultativa, cuja não entrega não consubstancia a inobservância de um dever legal, termos em que se reduz a relevância contraordenacional dos factos indicados no ponto 4. dos factos provados, na parte que se refere, em formulação disjuntiva, à não entrega da "Demonstração dos Resultados por Naturezas ou por Funções", devendo considerar-se que apenas a não entrega da "Demonstração de Resultados por Naturezas" integra, por violação do artigo 12.º, n.º 2, da LFP, o tipo objetivo de ilícito previsto no artigo 29.º, n.os 1 e 2, da LFP. Em suma, a não apresentação do "Balanço", da "Demonstração dos Resultados por Naturezas", da "Demonstração dos Fluxos de Caixa" e do "Anexo", elementos contabilísticos constitutivos das demonstrações financeiras dos partidos políticos cuja apresentação é obrigatória nos termos do artigo 11.º, n.º 1, do Decreto-Lei 158/2009, viola o dever de organização contabilística previsto no artigo 12.º, n.º 2, da LFP, subsumível ao tipo objetivo de ilícito previsto no artigo 29.º, n.º 1, do mesmo diploma. 13.3 - Consequências jurídicas Pretende o recorrente PURP que não lhe seja aplicada uma sanção de coima, atendendo à dimensão deste partido político e à sua situação financeira. A ECFP aplicou ao arguido PURP uma coima de € 4.260,00 (quatro mil duzentos e sessenta euros e zero cêntimos), equivalente a 10 SMN de 2008, e ao recorrente JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES uma coima de €2.130,00 (dois mil cento e trinta euros e zero cêntimos), equivalente a 5 SMN de 2008, pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 29.º, n.os 1 e 2, da LFP. Nos termos deste preceito legal, a inobservância dos deveres impostos em matéria de financiamento é sancionável, no caso dos partidos, com coima a graduar entre 10 e 400 vezes o valor do SMN de 2008 e, no caso dos responsáveis financeiros, com coima a graduar entre 5 e 200 vezes o valor do SMN de 2008. Segundo o disposto no artigo 51.º, n.º 1, do RGCO, quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifiquem, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação. Assim, são requisitos cumulativos da aplicação da sanção de admoestação: (i) a reduzida gravidade da contraordenação; e (ii) a reduzida gravidade da culpa do agente. Não obstante a elevada importância de que o regime legal do funcionamento e organização das contas dos partidos políticos se reveste no quadro da democracia constitucional, a proporcionalidade das sanções aplicadas implica a ponderação de todas as circunstâncias relevantes. No caso vertente, está em causa a prática de uma infração contraordenacional fundada na verificação de irregularidades de natureza formal, de cuja prática não resultou, para os arguidos, benefício económico algum. Acresce que, conforme resulta dos factos provados, o PURP não recebeu, no ano a que a prática da infração diz respeito, nenhuma subvenção estatal. Na ponderação da culpa, importa considerar a juventude do PURP ao tempo da prática dos factos, tendo as contas anuais de 2015 sido as primeiras que este partido político, constituído em 13 de julho de 2015, elaborou e apresentou; e, ainda, a circunstância de o recorrente JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES ter assumido as funções de responsável financeiro pelas contas anuais referentes a 2015 cerca de 5 (cinco) meses antes da sua apresentação. Assim, encontram-se reunidos os pressupostos de aplicação da sanção de admoestação pela prática da contraordenação, constituindo tal sanção a justa medida reclamada pelo caso concreto. III. Decisão Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo PARTIDO UNIDO DOS REFORMADOS E PENSIONISTAS (PURP) e por JOÃO MANUEL DE ASSUNÇÃO FERNANDES da decisão de 21 de abril de 2021, da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos e, em consequência, admoestar cada um dos arguidos, aqui recorrentes, pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 29.º, n.º 1, da Lei 19/2003, de 20 de junho. Atesto o voto de conformidade da Senhora Conselheira Mariana Canotilho, que participou na sessão por meios telemáticos. Gonçalo Almeida Ribeiro Lisboa, 23 de julho de 2024 - Gonçalo Almeida Ribeiro - Afonso Patrão (vencido quanto à substituição da sanção, nos termos da declaração junta) - António José da Ascensão Ramos - João Carlos Loureiro - Rui Guerra da Fonseca - Maria Benedita Urbano (vencida quanto à aplicação da admoestação ao invés da aplicação da coima pelo mínimo legal) - José Teles Pereira - Carlos Medeiros de Carvalho - Dora Lucas Neto - Joana Fernandes Costa (parcialmente vencida, nos termos da declaração em anexo) - José João Abrantes. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencido quanto à substituição da coima por uma simples admoestação. Em meu juízo, os argumentos mobilizados pelo acórdão (a circunstância de o Partido não ser beneficiário da subvenção estatal no ano da prática da infração e a natureza formal da contraordenação praticada) não conduzem à conclusão da reduzida gravidade da contraordenação. Os partidos políticos são associações privadas com uma função constitucional; e o cumprimento das normas legais de contabilidade - sobretudo em sede da prestação das suas contas anuais - tem importância preponderante, mostrando-se essenciais para que seja possível conhecer a sua situação financeira e patrimonial e verificar o cumprimento das obrigações legais (artigo 12.º/1 da LFP). Nessa medida, a violação das regras formais de organização contabilística aqui em causa - omissão de entrega do "Balanço", da "Demonstração dos Resultados por Naturezas", da "Demonstração dos Fluxos de Caixa" e do "Anexo", elementos contabilísticos constitutivos das demonstrações financeiras dos partidos políticos cuja apresentação é obrigatória nos termos do artigo 11.º, n.º 1, do Decreto-Lei 158/2009 - é, em meu entender, grave, por comprometer a fiabilidade das contas apresentadas e os propósitos inerentes à transparência da contabilidade dos partidos políticos. As circunstâncias ali referidas devem ser (e foram) ponderadas pela ECFP para fixação da coima no seu mínimo legal. Razão pela qual creio, ao contrário do que decidiu a maioria, que a decisão recorrida deveria ter sido mantida e confirmada. Afonso Patrão DECLARAÇÃO DE VOTO Ao contrário da posição que fez vencimento, considero não estarem verificados os pressupostos de que depende a aplicação da admoestação. De acordo com o artigo 51.º, n.º 1, do Decreto-Lei 433/82, de 27 de outubro, tal aplicação apenas pode ter lugar quando forem reduzidas a gravidade da infração e a culpa do agente, o que, não obstante a juventude do partido político na data da ocorrência dos factos, me parece dificilmente conciliável com o nível de incumprimento do regime do financiamento dos partidos políticos evidenciado pela não entrega quer do "Balanço", quer da "Demonstração dos Resultados por Naturezas", quer da "Demonstração dos Fluxos de Caixa", quer ainda do "Anexo", tendo em conta o condicionamento que daí necessariamente advém para a efetiva fiscalização da legalidade das contas dos partidos políticos. Joana Fernandes Costa 318286864

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/5955219.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1982-10-27 - Decreto-Lei 433/82 - Ministério da Justiça

    Institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 2003-06-20 - Lei 19/2003 - Assembleia da República

    Regula o regime aplicável ao financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 2005-01-10 - Lei Orgânica 2/2005 - Assembleia da República

    Regula a organização e funcionamento da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.

  • Tem documento Em vigor 2009-07-13 - Decreto-Lei 158/2009 - Ministério das Finanças e da Administração Pública

    Aprova o Sistema de Normalização Contabilística, publicado em anexo.

  • Tem documento Em vigor 2015-06-02 - Decreto-Lei 98/2015 - Ministério das Finanças

    Transpõe a Diretiva n.º 2013/34/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa às demonstrações financeiras anuais, às demonstrações financeiras consolidadas e aos relatórios conexos de certas formas de empresas

  • Tem documento Em vigor 2018-04-19 - Lei Orgânica 1/2018 - Assembleia da República

    Oitava alteração à Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional), segunda alteração à Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de agosto (Lei dos Partidos Políticos), sétima alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho (Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais), e primeira alteração à Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de janeiro (Lei de Organização e Funcionamento da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos)

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