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Acórdão 583/2016, de 9 de Dezembro

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Sumário

Não julga inconstitucional a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil, na redação introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda desse mesmo prédio

Texto do documento

Acórdão 583/2016

Processo 170/2016

Contestaram os Réus estas pretensões, defendendo não estarem integrados os pressupostos da preferência legal atribuída ao arrendatário habitacional.

1.2 - Inconformados com a decisão, os Autores dela interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, alegando, designadamente, o seguinte:

“[...] III - O direito de preferência do locatário habitacional tem dignidade constitucional

5 - O direito de preferência do locatário habitacional foi instituído pela Lei 63/77, de 25.08, para dar execução ao comando do artigo 65.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, como resulta do preâmbulo desta lei ordinária.

E foi instituído por ser um dos meios de o locatário habitacional aceder a habitação própria, finalidade esta que o Estado ficou obrigado, constitucionalmente, a prosseguir.

Ficou - e continua estando - obrigado a isso já que as sucessivas revisões constitucionais mantiveram aquele comando, ínsito, agora, na alínea c) do n.º 2 do dito artigo 65.º, onde se prescreve que incumbe ao Estado ‘estimular… o acesso à habitação própria’.

[...]

CONCLUSÕES [...] 7.ª-A ordem jurídica nacional criou os meios que permitem exercer o direito de preferência do locatário habitacional, alargando-o a todo o prédio, no caso de o locado não se achar legalmente autonomizado, como é Jurisprudência quase uniforme e como decorre do artigo 1029.º do C.P.C.

8.ª-Entender o nosso ordenamento jurídico, no plano da lei ordinária, como restringindo ou visando restringir esse direito, quando, nos termos da sentença apelada, o mesmo ‘não se pode exercer’, seria propósito ou interpretação gravemente ofensiva do nosso ordenamento constitucional, já que o imperativo constitucional, de acesso à habitação própria, que presidiu à criação da preferência na locação habitacional, se mantém em vigor, atualmente, na alínea c) do n.º 2 do artigo 65.º da CRP. (vide o n.º 3 do mesmo normativo constitucional).

[...]”.

1.2.1 - Foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa (fls. 184/192), julgando improcedente a apelação, com base em fundamentação idêntica à da primeira instância quanto ao alcance do artigo 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC.

1.3 - Persistentemente inconformados, os Autores interpuseram recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, alegando, inter alia, o que ora se transcreve:

“[...] A invocada inconstitucionalidade traduz-se na violação do princípio de acesso à habitação própria consagrado no art. 65.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e na violação do princípio da igualdade, consagrado no art. 13.º do mesmo diploma fundamental.

[...] [A]rguiu-se de inconstitucional [...] a interpretação restritiva que a primeira instância fez do disposto no art. 1091.º, alínea a) do CC, ao sustentar e decidir que o direito de preferência do locatário habitacional só existe se o local arrendado tiver autonomização jurídica.

[...]

CONCLUSÕES [...] 14.ª A tese das instâncias cria uma divisão dicotómica nos arrendatários:

os que podem e os que não podem exercer o direito de preferência (os que têm e os que não têm esse direito, para a segunda instância).

15.ª A tese das instâncias cria inquilinos de primeira e inquilinos de segunda, sendo de presumir que os de segunda serão mais numerosos nos grandes centros urbanos, onde ainda há prevalência de prédios não submetidos ao regime de propriedade horizontal.

[...] 17.ª Mas a tese das instâncias vai mais fundo:

além de violar o princípio constitucional, ínsito no art. 65.º da CRP., de acesso à habitação própria, relativamente a muitos milhares de inquilinos, viola o princípio da igualdade perante a lei, ínsito no art. 13.º da lei fundamental.

18.ª Para as instâncias, todos os arrendatários serão iguais perante a lei, mas, como se viu, uns serão mais iguais que outros:

os arrendatários de frações autónomas.

[...] 20.ª Na conclusão 8.ª do recurso de apelação arguiu-se de inconstitucional a interpretação restritiva que a primeira instância fez - e aplicou - do disposto no art. 1091.º do C.C.

[...] 22.ª Se o art. 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC é inconstitucional se aplicado restritivamente, como o fez a primeira instância, por mais forte razão o é a interpretatio abrogans, do mesmo normativo, feita pela segunda instância.

[...]” (sublinhados acrescentados).

1.3.1 - No Supremo Tribunal de Justiça, admitida a revista excecional, foi proferido Acórdão negando a pretensão dos Autores. Aí se fixou o seguinte entendimento quanto ao direito de preferência do arrendatário habitacional:

“[...] [O] sentido a extrair do disposto no artigo 1091.º, n.º 1, do CC - coincidente com o extraído pelas instâncias - é o seguinte:

1. o direito de preferência do arrendatário está limitado ao local arrendado, objeto do contrato de arrendamento, se se tratar de bem jurídico autónomo;

2. caso o prédio vendido não tenha sido constituído em propriedade horizontal, o arrendatário de parte dele, sem autonomia jurídica, não tem direito de preferência sobre ele ou sobre a totalidade do prédio, em caso de venda ou dação em cumprimento deste último.

[...]” (sublinhado acrescentado).

Especificamente sobre a questão de constitucionalidade, referiu-se o seguinte:

“[...] Os recorrentes entendem que a interpretação do artigo 1091.º do CC no sentido firmado pelas instâncias, e agora por este Tribunal, viola o disposto nos artigos 13.º e 65.º da CRP.

[...] Comece-se por referir que não se alcança - nem os recorrentes explicam - em que medida a interpretação do disposto no artigo 1090.º do Código Civil, na dimensão normativa de que os arrendatários de parte alíquota do prédio não têm direito de preferência na sua venda, briga com o comando constitucional afirmado no art. 65.º da CRP. Nele, apenas se afirma o direito dos cidadãos à habitação e não à habitação própria, como dito pelos recorrentes na mira de justificarem, por detrás desse direito, a consagração do direito de propriedade sobre a habitação.

O que o preceito afirma é o direito à habitação, que no caso dos autores está assegurado por via do contrato de arrendamento, e não também, o direito de propriedade ou à habitação própria, com o que poderia contender o não reconhecimento do direito de preferência. Também dele não consta, na densificação desse direito, qualquer dever de o Estado implementar política conducente à obtenção de habitação própria no âmbito dos contratos de arrendamento, o que poderia sugerir, entre outras soluções, a eleição do direito de preferência do arrendatário na compra do imóvel arrendado como sua concretização primacial.

Portanto, por aqui, não ocorre qualquer inconstitucionalidade material. artigo 13.º da CRP.

E, também não se crê que ela existe por putativa afronta ao O significado da redação de tal princípio está, por um lado, na proibição das desigualdades (sentido primário negativo), que consiste na vedação de privilégios e de discriminações, e, por outro lado, na imposição de tratamento igual de situações iguais (ou tratamento semelhante de situações semelhantes) e de tratamento desigual de situações desiguais (sentido positivo) - Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra, 2005, p. 121.

[...] O princípio constitucional da igualdade caracteriza-se, pois, como proibição do arbítrio, permitindo apenas que se possam estabelecer diferenciações de tratamento, razoável, racional e objetivamente fundadas, sem as quais se incorrerá nesse arbítrio, por preterição do acatamento de soluções objetivamente justificadas por valores constitucionalmente relevantes. É essencial que haja fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada - cf. Ac. TC n.º 319/00.

O princípio da igualdade reclama, essencialmente, que seja conferido tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais, asserção repetidamente salientada na jurisprudência do Tribunal [...]. Em concreto, ainda que possa haver coincidência entre a parte do prédio indiviso e a fração autónoma do prédio constituído em propriedade horizontal, que, quando arrendadas, não facultarão, no primeiro caso, e, facultarão, no segundo caso, direito de preferência na venda, tal coincidência é meramente física e não jurídica.

Com efeito, no primeiro caso, aquela parte não é, no mundo do direito, e mais propriamente por força do disposto nos artigos 202.º e 203.º, ambos do CC, uma coisa, e, por consequência, não tem autonomia jurídica, pelo que não pode por si ser objeto autónomo de relações juridicamente válidas, invalidando, por força do disposto no artigo 1090.º, n.º 1 e 417.º, ambos do CC, o exercício do direito de preferência; já no segundo caso, inversamente, a fração autónoma decorrente da opção voluntária de constituição do prédio em propriedade horizontal tomado pelo proprietário, é uma coisa, que o sistema reputa de juridicamente autónoma, e do que faz decorrer a possibilidade de poder destacar-se de todo o prédio e ser, apenas ela, objeto de negócios jurídicos e fonte, por isso do direito de preferência a favor do arrendatário - artigos 1416.º e 1417.º, ambos do CC.

Sendo os objetos do arrendamento, no caso de um andar de um prédio não constituído e de uma fração de um prédio constituído em propriedade horizontal, realidades jurídicas diferentes, existe, na base, uma situação que o sistema diversifica e que legitima o tratamento diferenciado, e coerente, na negação e na atribuição, respetiva, do direito de preferência.

As situações não são, pois, iguais, legitimando a desigualdade jurídica do objeto o tratamento diferenciado do feixe de direitos que se lhes associam.

Por aqui, então, não existe qualquer afronta do direito de igualdade. Também não haverá quando esteja em causa o direito de preferência em relação à totalidade do prédio, visto que, e desde já, em passo algum se afirma a existência do direito de preferência do arrendatário de fração autónoma sobre a totalidade do prédio, antes tendo, pela nossa parte, concluído que o direito de preferência se circunscreve, originariamente, ao ‘local arrendado’, se passível de autonomização.

Ora, somente do reconhecimento do direito de preferência do arrendatário da fração autónoma relativamente a todo o prédio, poderia decorrer a interrogação sobre o tratamento desigualitário do arrendatário de parte do prédio indiviso, o que se negou.

[...]” (sublinhado acrescentado).

1.4 - Desta decisão interpuseram os Autores recurso para o Tribunal Constitucional nos seguintes termos:

“[...] [T]endo sido notificados do acórdão [...] que julgou improcedente o recurso de revista, vêm interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82.

[...] Os Recorrentes pretendem ver apreciada a questão da inconstitucionalidade da norma do artigo 1091.º do Código Civil, introduzida pela Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a parte arrendada ou sobre a totalidade do prédio, na compra e venda ou na dação em cumprimento desse mesmo prédio, por violação dos princípios da confiança e segurança jurídica e primazia da materialidade subjacente, postulados pelo principio do Estado de Direito Democrático, e dos princípios da igualdade e da proporcionalidade, e do conteúdo essencial dos direitos à propriedade privada e de acesso à habitação própria, consagrados nos arts. 2.º, 13.º, n.º 1, 17.º, 18.º, n.os 2 e 3, 62.º, n.º 1, e 65.º, n.os 1 e 3, todos da Constituição da República Portuguesa, que impõem a proteção do direito real de aquisição de bem imóvel pelo arrendatário, que celebrou contrato de arrendamento celebrado antes da entrada em vigor do Novo Regime do Arrendamento Urbano, segundo a jurisprudência constante do Supremo Tribunal de Justiça ao longo de um período superior a 35 anos de vigência do contrato de arrendamento, no domínio da aplicação sucessiva das normas dos arts. 1.º e 2.º da Lei 53/77, de 25 de agosto, e art. 47.º do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto Lei 321-B/90.

[...]” (sublinhado acrescentado).

1.4.1 - Neste Tribunal apresentaram os Autores a motivação do recurso, rematando tal peça processual com as seguintes conclusões:

“[...] a) O princípio da igualdade permite ao Tribunal Constitucional declarar inconstitucional uma lei consagradora de soluções desiguais se e na medida em que não se descortinar qualquer fundamento material bastante para a distinção, sendo a partir da descoberta da ratio da disposição em causa que se poderá avaliar se a mesma possui uma fundamentação razoável.

b) A justificação que preside à atribuição do direito de preferência a favor do arrendatário é a de facilitar a aquisição do prédio urbano, proporcionando o acesso à propriedade a quem beneficia já de um direito de gozo mais ou menos prolongado sobre o imóvel, visando assim promover a estabilidade da habitação, realizando a incumbência constitucional do Estado garantir o acesso à habitação própria, e solidificando a paz social, ao eliminar potenciais conflitos entre senhorio e inquilino.

c) Ora, a ratio da norma do art. 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC acima exposta, com respaldo nos fins que ao Estado incumbe prosseguir fixados pela CRP, não se coaduna com um tratamento desigual dos inquilinos consoante o local por si arrendado seja uma fração autónoma de prédio constituído em propriedade horizontal ou um andar de prédio indiviso.

d) Destarte, perante partes de prédio urbano que constituem unidades habitacionais independentes e individualizadas, não será razoável negar a atribuição do direito de preferência ao inquilino apenas e só por não serem qualificadas juridicamente como frações autónomas, ainda que o sejam materialmente.

e) Com efeito, a constituição da propriedade horizontal sobre o prédio não é fundamento material bastante para o tratamento diferenciado dos arrendatários urbanos decorrente da interpretação do art. 1091.º do CC feita pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão recorrido, não sendo objetivamente justificada por qualquer valor ou interesse constitucionalmente relevantes.

f) Não havendo coincidência necessária entre o objeto do contrato de arrendamento e do direito de preferência do arrendatário, podendo este ter uma extensão material maior que o local arrendado (como resulta do preceituado no art. 417.º do CC, aplicável por remissão do n.º 4 do art. 1091.º do CC), pelo que será perfeitamente legítimo o entendimento dominante de que, se o arrendamento incidir sobre parte de um prédio indiviso, não podendo os inquilinos exercer preferência sobre o andar que arrendaram - por, em si mesmo, não poder ser objeto de compra e venda - terão direito de preferência na venda da totalidade do prédio urbano.

g) Portanto, a interpretação professada pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão recorrido, negando qualquer direito de preferência na venda do imóvel locado, consubstancia uma solução absolutamente desproporcional e profundamente injusta para inúmeros inquilinos, mormente cidadãos idosos como os AA., que vêm habitando há décadas andares de prédios indivisos.

h) E tutelaria de modo diverso situações substantivamente iguais, discriminando negativamente o arrendatário que, não obstante usufruir de parte de prédio não constituído em propriedade horizontal, tem relativamente a ela contrato de arrendamento válido e o frutifica e dele retira benefícios, mesmo de índole social, presumivelmente tão relevantes como os oriundos de contratos incidentes sobre fração juridicamente autónoma.

i) Não é logico e fere o sentido de justiça do cidadão comum, que se aceite a celebração de um contrato de arrendamento de uma parte legalmente indivisa, mas materialmente autonomizada, e depois se lhe tolham os efeitos jurídicos, designadamente a atribuição de preferência na compra e venda do imóvel locado.

j) A existência de um direito de preferência na aquisição de todo o prédio não onera a situação do senhorio, ao qual será indiferente vender o imóvel a A ou a B, visto que o direito de preferência não concede ao preferente qualquer privilégio de redução do preço de venda; pelo contrário, a ausência de um direito de preferência possibilitará especulações imobiliárias suscetíveis de prejudicar os inquilinos. k) Por todo exposto, é forçoso concluir pela inconstitucionalidade da norma do art. 1091.º, n.º 1, do CC, na interpretação propugnada pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão recorrido, por deixar ao arbítrio do senhorio - dependendo da opção deste constituir a propriedade horizontal sobre o prédio - a existência de direito de preferência do arrendatário na compra e venda do imóvel locado, em violação do princípio da igualdade consagrado no art. 13.º, n.º 1, da CRP, que proíbe tratamento desigual das situações essencialmente iguais dos inquilinos de parte indivisa e de fração autónoma de prédio urbano.

l) O direito de preferência assumiu-se como um instrumento de proteção do arrendatário habitacional, enquanto contraente tendencialmente mais débil, e como uma concretização do dever social que recai sobre o Estado de adotar uma política de acesso à habitação própria, nos termos do art. 65.º, n.º 3 da CRP.

m) Aquando da aprovação do NRAU, pela Lei 6/2006 de 27 de fevereiro, não foi invocada qualquer razão substantiva para um retrocesso na tutela da situação dos inquilinos de prédios urbanos indivisos, nem referenciada qualquer opção do Estado em matéria de política de habitação ou condicionamento dos recursos financeiros suscetível de determinar a necessidade, muito menos a adequação, de uma restrição legal do direito de preferência dos arrendatários.

n) Sendo que da hermenêutica do n.º 3 do art. 65.º da CRP, suscetível de lhe atribuir um sentido normativo útil, para além do que já decorre da alínea c), do n.º 2 - segundo os cânones do princípio do aproveitamento das leis e da presunção da racionalidade da legislação (plasmados no art. 9.º, n.º 3, do CC, mas também aplicáveis na interpretação da Constituição, enquanto Lei Fundamental) - parece resultar que, na estruturação do regime jurídico do arrendamento urbano, o legislador ordinário deverá prever o direito de preferência do arrendatário na aquisição do imóvel locado, como meio adequado de promover o acesso à propriedade da habitação por quem se encontra numa situação de ligação estreita aos prédios.

o) Pelo que uma interpretação restritiva da alínea a) do n.º 1 do art. 1091.º, do CC, que exclua o direito de preferência dos inquilinos, tão só por habitarem em andares de prédios indivisos, seria desconforme ao programa constitucional de promoção do acesso à habitação própria, configurando um ablação injustificada e desproporcionada desse direito fundamental dos arrendatários urbanos, em manifesta violação do direito fundamental consagrado no art. 65.º, n.os 1 e 3, da CRP

p) Impondo-se proceder a uma interpretação conforme à Constituição do disposto no art. 1091.º, n.º 1, do CC, no sentido de que os arrendatários de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal continuam a ter direito de preferência na venda ou dação em pagamento do imóvel locado.

q) A Constituição garante um direito de apropriação que incumbe ao Estado promover, sendo amplo o conceito constitucional de propriedade privada, não se esgotando no direito real de propriedade, abrangendo a generalidade dos direitos patrimoniais.

r) O direito legal de preferência dos arrendatários é frequentemente qualificado na doutrina e jurisprudência como um direito de real de aquisição, mas ainda que se considere que reveste natureza obrigacional ou de direito potestativo, é inequívoco que se trata de um direito patrimonial privado, que deve gozar da proteção constitucional da propriedade privada.

s) Ora, a interpretação feita do art. 1091.º do CC pelo Supremo Tribunal de Justiça na decisão recorrida, conducente à exclusão total do direito de preferência dos inquilinos de andares de prédios indivisos, constitui uma restrição do direito fundamental dos arrendatários, que atinge o conteúdo essencial do seu direito de aceder à propriedade do imóvel onde habitam, não sendo necessária para salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos - visto que o direito de preferência do arrendatário não afeta o direito de (transmitir a) propriedade do senhorio (cf. Acórdão 225/00 deste Tribunal Constitucional) - pelo que é patentemente violadora dos arts. 62.º, n.º 1, 17.º, 18.º, n.º 2 e 3, da CRP.

t) Na síntese contida no Acórdão 128/2009 do Tribunal Constitucional, são quatro os requisitos para que haja lugar à tutela jurídico-constitucional da confiança:

1.º o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados expectativas de continuidade;

2.º devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões;

3.º devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do “comportamento” estadual;

4.º é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou as expectativas.

u) No caso em apreço, os Recorrentes são desde 1968 (ponto 1 dos factos provados), portanto há mais de 40 anos, arrendatários habitacionais de um andar de prédio não submetido ao regime da propriedade horizontal (ponto 2 dos factos provados).

v) Segundo a jurisprudência prevalente do Supremo Tribunal de Justiça, ao longo de um período superior a 35 anos de vigência do contrato de arrendamento, no domínio da aplicação sucessiva das normas dos art. 1.º da Lei 53/77 e art. 47.º do RAU - até à prolação do acórdão recorrido em 21/01/2016 - foi reiteradamente decidido que, no caso de prédio não estar constituído em propriedade horizontal, o direito de preferência do arrendatário incide sobre todo o imóvel. w) Daí que, face à postura do Estado legislador, que mantêm a consagração do direito de preferência dos arrendatários habitacionais há quase 40 anos, não obstante as sucessivas reformas do regime do regime do arrendamento urbano, e o entendimento do âmbito daquele direito sufragado pelos Tribunais Superiores, os Recorrentes tivessem fundadas razões e legítimas expetativas de poder preferir na venda do prédio em que se integra o seu andar arrendado.

x) Tendo os AA. cuidado ao longo dos anos pela conservação do andar arrendado que é a sua casa de morada de família, poupando os seus rendimentos de modo a acumular as verbas que lhes permitissem um dia preferir na compra e venda do prédio locado, que só se veio a concretizar em 2012 (ponto 9 dos factos provados), sendo evidente o investimento da confiança dos Recorrentes, que culminou no depósito que tiveram de efetuar nestes autos da quantia de €207.917,27, para acautelar o pagamento do preço e todos os encargos da transmissão do imóvel, em ordem à procedência desta ação de preferência (ponto 11 dos factos provados).

y) Face ao exposto, negar aos AA., e aos demais inquilinos em situações semelhantes, o direito de preferirem na compra dos imóveis em que residem, pela mera circunstância dos respetivos prédios urbanos não estarem ainda constituídos em propriedade horizontal, seria uma consequência jurídica inadmissível num Estado de Direito Democrático, geradora de uma insegurança jurídica inaceitável, desrespeitando as expetativas legítimas e juridicamente criadas “anos a fio” pelas disposições legais vigentes em matéria de arrendamento urbano e as incontáveis decisões judiciais que as aplicaram no sentido de reconhecer a tais arrendatários direito de preferência sobre a totalidade do prédio urbano.

z) Não se vislumbrando, nem sendo explicitado no acórdão recorrido, qualquer interesse público suscetível de justificar a eliminação do direito de preferência dos inquilinos de partes dos prédios não constituídos em propriedade horizontal, inexistindo razões de tal forma ponderosas para o bem comum coletivo que justifiquem o sacrifício das legítimas expetativas de um número muito significativo de cidadãos, arrendatários de longa duração, para os quais a aplicação do art. 1091.º do CC representa uma “mais-valia” na proteção da sua permanência no local arrendado.

aa) No caso vertente, verifica-se o preenchimento de todos os requisitos definidos na jurisprudência deste Tribunal Constitucional para se concluir pela violação do princípio da segurança jurídica, ínsito no princípio do Estado de Direito Democrático consagrado no artigo 2.º da CRP, na sua vertente subjetiva de princípio de proteção da confiança.

[...]”.

II - Fundamentação 2 - Relatado o desenvolvimento do processo que conduziu à presente instância, importa caracterizar o exato objeto temático do recurso de constitucionalidade.

Os Recorrentes pretendem ver apreciada por este Tribunal a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC, na redação introduzida pela Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a parte arrendada ou sobre a totalidade do prédio, na compra e venda ou na dação em cumprimento desse mesmo prédio (estamos a reproduzir a formulação constante do requerimento de interposição transcrito no item 1.4. supra).

Para além de outras condições cuja discussão não releva de momento, o recurso referido a uma específica dimensão interpretativa - o objeto de fiscalização que usualmente se qualifica como “a norma em determinada interpretação” - pressupõe a aplicação na decisão recorrida, enquanto ratio decidendi, da norma tida por inconstitucional por quem recorre, na concreta interpretação correspondente à dimensão normativa delimitada no requerimento de interposição do recurso e que tenha constituído o critério jurídico da decisão atacada. Com efeito, como observa Rui Medeiros, “[o] Tribunal Constitucional deve limitar-se a fiscalizar a constitucionalidade de uma regra abstratamente enunciada para uma aplicação genérica, não podendo controlar a concreta decisão de um caso jurídico” (A Decisão de Inconstitucionalidade, Lisboa, 1999, p. 860).

A respeito desta coincidência necessária entre a norma a fiscalizar e a norma aplicada, com o sentido operante na resolução do caso concreto, impõe-se notar que a norma objeto, o artigo 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC, na redação que aqui está em causa, estabelece o seguinte:

Artigo 1091.º Regra geral

1 - O arrendatário tem direito de preferência:

a) Na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três anos;

------------------------. A letra do preceito contém elementos não contemplados na decisão. Não está em causa qualquer dação em cumprimento. Não se tratou da alienação apenas da parte arrendada, antes foi vendida a totalidade do prédio, até porque, como a própria decisão recorrida entendeu e sublinhou, no caso não era possível alienar apenas a parte arrendada.

A este propósito, observou-se o seguinte (em trecho constante de fls. 290) no Acórdão ora recorrido:

“[...] Ainda que existisse autonomia física do andar arrendado, inserido nesse mesmo prédio urbano, ele não tinha autonomia jurídica ante o conceito de coisa definido pelos artigos 202.º e 203.º, ambos do CC. A autonomia jurídica só seria alcançada se o prédio fosse constituído em propriedade horizontal - artigos 1414.º e 1415.º, ambos do CC.

E, a constituição do prédio em propriedade horizontal por decisão judicial não é defensável, por três razões:

Primeiro, porque ela apenas pode ter lugar em ação de divisão de coisa comum ou em processo de inventário, não em ação declarativa comum como a presente - artigo 1417.º, n.º 1, do CC;

Segundo, porque embora timidamente a refiram, os recorrentes nunca pediram, expressa ou implicitamente, a constituição da propriedade horizontal e, a eventual decisão nesse sentido configuraria violação clara do princípio do dispositivo - artigo 609.º, n.º 1, do CPC;

Terceiro, porque tal decisão não teria qualquer fundamento, visto que, ou existe previamente direito de preferência e o seu exercício é facultado ao arrendatário, ou, ele não existe e não se o vai buscar na imposição da constituição futura do prédio em propriedade horizontal, ingerindo de forma inadmissível na esfera dos poderes do proprietário, a quem compete a decisão livre de o fazer ou não.

[...]”.

E conclui-se a este respeito:

“[...] Tudo o que fica exposto é suficiente para não ser concedido, por via do artigo 417.º, n.º 1, do CC, o direito de os autores arrendatários preferirem em parte do prédio vendido.

[...]”.

Daí que o Supremo Tribunal de Justiça tenha afirmado, “[q]uanto à preferência sobre o prédio”, que “[a] questão [se resolveria] pela interpretação da redação do artigo 1091.º, n.º 1, do CC [...]”.

Foi, pois, sobre um comando normativo em que não estava em causa uma dação em cumprimento, e do qual se excluiu a alienação apenas do local arrendando - por razões assentes na ponderação de normas diversas do artigo 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC e de incidências específicas da situação processual configurada pelos Recorrentes como autores da ação-, que a interpretação considerada inconstitucional se forjou e tornou atuante na solução do caso concreto. Tenha-se presente que os Recorrentes, confrontados com a venda da totalidade do prédio onde se situa o seu locado, se propuseram exercer judicialmente um direito de preferência, que entendem assistirlhes, especificamente quanto ao respetivo locado ou, subsidiariamente, quanto à totalidade do prédio vendido, sendo que, em qualquer dos casos, a possibilidade de formação desse direito de preferência foi considerada afastada em função do objeto da venda corresponder a todo o prédio, extravasando, pois, do espaço predial objeto do arrendamento. Valeria aqui, todavia - é a posição sustentada no recurso -, uma determinada leitura do artigo 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC, que os Recorrentes reputam de constitucionalmente imposta, no sentido de permitir (de impor) a expansão da preferência do arrendatário urbano a todo o espaço predial objeto de transmissão, mesmo que este não coincida, por excesso, com o local arrendado.

No entanto, o Supremo Tribunal de Justiça - como decorre do excerto da fundamentação acima transcrito - excluiu liminarmente que o local arrendado pudesse, só por si, constituir objeto de um negócio jurídico destacado da venda integral do prédio, pelo que - independentemente da enunciação formal - materialmente essa possibilidade não integrou a ratio decidendi, correspondendo antes a passos prévios do percurso em função do qual se alcançou essa ratio, atentas as particularidades da ação (aliás, particularidades de índole processual que foram consideradas inultrapassáveis no quadro desta ação). Tenha-se presente não competir a este Tribunal julgar, substitutivamente às instâncias, a ação de preferência nos seus diversos aspetos, competindolhe apreciar, tãosomente, a questão incidental de inconstitucionalidade diretamente ligada à dimensão normativa correspondente à ratio decidendi. É que, [n]os recursos de inconstitucionalidade” - e citamos de novo Rui Medeiros - “[...], a norma objeto de fiscalização é a norma com o sentido concreto que o tribunal recorrido lhe atribuiu, não podendo o Tribunal Constitucional basear a sua decisão num diferente entendimento da norma em questão” (A Decisão de Inconstitucionalidade, cit., p. 860), configurando vertentes alternativas em que a decisão pudesse assentar.

Não obstante as diferentes perspetivas de abordagem do direito de preferência envolvidas na decisão deste Tribunal de 2000 e no presente recurso, trata-se, na substancia das coisas, do mesmo direito de preferência (assente em normas de conteúdo idêntico) entendido com o mesmo sentido projetivo que aqui se discute (abrangendo a totalidade do prédio alienado quando o arrendamento indutor da preferência se confina a uma parte deste). Aliás, estava em causa, no Acórdão 225/2000, precisamente, uma decisão com o conteúdo aqui almejado pelos Recorrentes. É assim que o percurso argumentativo seguido nesse Acórdão pode interessar à presente decisão, designadamente quando perspetiva o direito de preferência no plano dos valores constitucionais. A este respeito é significativo o seguinte trecho:

“[...] Em anotação ao artigo 62.º da Constituição referem Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, 2.ª edição, 1.º vol., Coimbra, 1984, p. 334):

‘[t]eoricamente, o direito de propriedade abrange pelo menos quatro componentes:

a) o direito a adquirir;

b) o direito a usar e fruir dos bens de que se é proprietário;

c) o direito de a transmitir;

d) o direito de não ser privado dela’. Mais à frente (p. 335) e especificamente sobre o direito de transmissão da propriedade (dimensão que agora poderia estar em causa) referem aqueles autores:

‘[u]m dos aspetos explicitamente garantidos é a liberdade de transmissão, inter vivos ou mortis causa (n.º 1, in fine), não podendo haver bens vinculados ou sujeitos a interdição de alienação. Este direito deve ser entendido no sentido restrito de direito de não ser impedido de a transmitir, mas não no sentido genérico de liberdade de transmissão, a qual pode ser mais ou menos profundamente limitada por via legal, quer quanto à transmissão inter vivos (obrigações de venda, direito de preferência, etc.) quer quanto à transmissão mortis causa...’.

Do que antecede resulta que o estabelecimento na lei de direitos de preferência não afeta, só por si, o conteúdo constitucionalmente reconhecido ao direito de propriedade em qualquer das suas dimensões. Designadamente o direito a transmitir a propriedade não se vê afetado no seu conteúdo essencial. É que o estabelecimento de um direito de preferência no caso de alienação do prédio não obriga o proprietário a vender, nem o impede de vender, mas apenas o obriga a, caso decida vender, atribuir preferência nessa alienação, em igualdade de circunstâncias, no caso ao arrendatário do prédio.

Em causa não está a liberdade de alienação, mas apenas a liberdade de escolha da outra parte no negócio, que pode efetivamente ver-se limitada pela lei ordinária, através da atribuição de um direito de preferência, em atenção à necessidade de proteção de outro tipo de interesses, sem que com isso se viole o disposto no artigo 62.º da Constituição.

Nesse sentido refere Jorge Alberto Aragão Seia, em anotação ao artigo 47.º do RAU (Arrendamento Urbano, Anotado e Comentado, 3.ª edição Revista e Atualizada, Coimbra:

Almedina, 1997, pp. 243 e 244) ‘[p]or outro lado, também não se pode dizer que o proprietário vê limitado o seu direito na alienação do prédio, quando se confere o direito ao arrendatário de preferir na venda de parte ou da sua totalidade, se o local arrendado é vendido globalmente com outras partes ou a totalidade do prédio. É que, não lhe é retirado o direito de alienar parte do prédio ou a sua totalidade, mas apenas se lhe impõe que, tanto por tanto, venda ao arrendatário. Não existe qualquer inconstitucionalidade.’ Acresce que a limitação à liberdade de escolha da outra parte do negócio, traduzida na consagração do direito de preferência, não constitui uma limitação arbitrária ou materialmente infundada. A justificação para essa limitação encontramola na breve exposição de motivos que acompanha a Lei 63/77, de 25 de agosto, fonte histórica do atual artigo 47.º, n.º 1, do RAU. Aí se refere:

‘No domínio dos direitos e deveres sociais, dispõe a Constituição da República que ao Estado compete, além do mais, adotar uma política de acesso à habitação própria (artigo 65.º, n.º 2, da Constituição). Poderá contribuir para a referida política, ainda que em grau reduzido, conferir aos arrendatários habitacionais direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento dos imóveis respetivos’.

[...] Assim, [...] consideramos que o artigo 47.º, n.º 1, do RAU não é inconstitucional, designadamente não viola o disposto no art. 62.º da Constituição, quando interpretado em termos de atribuir ao arrendatário de parte de um prédio urbano, que não está constituído em propriedade horizontal, o direito de preferência na alienação da totalidade do prédio.

[...]” (sublinhados acrescentados).

Como se disse, apreciou-se neste Acórdão 225/2000 a conformidade constitucional do tipo de construção interpretativa da preferência do arrendatário habitacional que os Recorrentes pretendem obter no caso presente, precisamente a interpretação que não foi adotada pelo Supremo Tribunal de Justiça neste processo. Assim, poder-se-ia sustentar que a hipótese que nos interpela justificaria um tratamento diverso do assumido na decisão recorrida, no plano de referenciação a valores constitucionais, reconhecendo-se amplamente o direito de preferência, como sucedeu no Acórdão 225/2000. Porém, não foi nesses termos que o Tribunal Constitucional considerou aí o alargamento do objeto do direito, limitando-se antes a assumir, como não poderia deixar de ser, esse alargamento como o dado interpretativo recebido da decisão que aí era sujeita à apreciação do Tribunal. Daí que se tenha referido nessa ocasião que o direito de preferência (o que se afirma incidir sobre todo o prédio não constituído em propriedade horizontal), “[...] a existir, só pode exercer-se sobre a totalidade do prédio [...]” (sublinhado acres-centado). Ora, a “existência” do direito de preferência com tal alcance constituía, precisamente, a construção interpretativa da preferência do arrendatário que o Tribunal Constitucional recebera nesse processo do Tribunal a quo e, por isso, tinha de apreciar.

Assim, o que cremos valer na presente situação com algum sentido de argumento de semelhança, em vista do quadro de análise traçado no Acórdão 225/2000, é a ideia de neutralidade da Constituição quanto à questão da maior ou menor extensão espacial com a qual o direito de preferência é reconhecido ao arrendatário. Note-se que esta perspetiva de neutralidade foi afirmada pelo Tribunal num contexto argumentativo diverso do que aqui se configura:

foi-o (no Acórdão 225/2000) face ao direito de propriedade do senhorio - quem aí invocava a limitação desse direito, enquanto liberdade de transmissão da propriedade, por via da sujeição desta a um tipo de vinculação exorbitante do espaço do locado e, consequentemente, do sentido com o qual era atribuída ao locatário a preferência. O quadro específico em que esta se colocava e foi tratada pelo Tribunal Constitucional nessa ocasião não nos permite, pois, construir no presente contexto um verdadeiro argumento de identidade de razão, que diretamente induza o resultado do recurso, não nos isentando de apreciar a diferente perspetiva em que o problema ora nos é colocado e os argumentos de constitucionalidade especificamente convocados pelos Recorrentes.

Contudo, esta ideia de neutralidade constitucional quanto à extensão do objeto da preferência do arrendatário não deixa de valer como caracterização da essência profunda da referenciação desse direito ao quadro constitucional como problema essencialmente exterior a este quadro, relativamente ao qual a liberdade de opção legislativa tende a não ser condicionada pela projeção de valores constitucionais. E, face à ausência de uma opção legislativa expressa, esta mesma ideia de neutralidade da questão no plano constitucional não deixa de valer - vale até por maioria de razão - para a jurisprudência, relativamente à interpretação do sentido e do alcance da preferência do arrendatário. Neste caso, poder-se-á contestar, de um ponto de vista das legis artis interpretativas, esta ou aquela construção jurisprudencial do objeto deste tipo de preferência. Essa contestação, no entanto, não obtém, no que aqui interessa, argumentos decisivos na referência a normas e princípios constitucionais. Foi o que sucedeu relativamente à invocação do direito de propriedade no Acórdão 225/2000, e o mesmo não deixará de suceder, como veremos, com o princípio da igualdade, com o artigo 65.º, n.os 1 e 3, da Constituição, com o princípio da proporcionalidade (no quadro de uma suposta restrição do direito do arrendatário de aceder à propriedade do local onde habita) ou com o princípio da proteção da confiança, todos estes esgrimidos pelos Recorrentes no presente recurso.

2.1.1 - Relativamente à outorga de um direito de preferência ao arrendatário desencadeado pela venda do locado, assistimos, numa primeira fase, quanto ao arrendamento urbano, à outorga desse direito apenas ao arrendatário comercial (v. António Menezes Cordeiro, Leis do Arrendamento Urbano Anotadas, Códigos Comentados da Clássica de Lisboa, Coimbra, 2014, pp. 258/261). Só mais tarde o legislador optou por alargar a situação ao arrendatário habitacional, alocando a este um direito de preferência na compra e venda ou na dação em cumprimento. Com efeito, a preferência estabelecida nos anos vinte do século passado para o arrendamento comercial (com a seguinte sequência temporal:

Lei 1:

662, de 04/09/1924;

Lei 2:

030, de 22/06/1948;

Decreto 43.525, de 07/03/1961; artigo 1117.º do CC na versão inicial de 1967), foi estendida em 1977 ao arrendamento habitacional através da Lei 63/77, de 25 de agosto, nos seguintes termos:

Artigo 1.º

Direito de preferência do locatário habitacional

1 - O locatário habitacional de imóvel urbano tem o direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento do mesmo.

2 - O locatário habitacional de fração autónoma de imóvel urbano também goza do direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento da respetiva fração.

Foi este o enquadramento legal que vigorou até à edição do RAU em 1990 (pelo Decreto Lei 321-B/90, de 15 de outubro), passando então a situação a ser regulada pelo artigo 47.º do RAU (integrado numa secção intitulada “Do direito de preferência do arrendatário”), nos termos seguintes:

Artigo 47.º

Direito de preferência

1 - O arrendatário de prédio urbano ou de sua fração autónoma tem o direito de preferência na compra e venda ou na dação em cumprimento do local arrendado há mais de um ano.------------------------Em 2006, finalmente - e assim chegamos à norma ora em causa (tratando-se do exercício de uma preferência relativa a venda ocorrida em 2012)-, com a aprovação do NRAU, pela Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, regressando o fundamental da disciplina do arrendamento ao texto do Código Civil, aparece o artigo 1091.º, n.º 1, estabelecendo, na respetiva alínea a), ter o arrendatário direito de preferência “[n]a compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três anos”.

Observando esta evolução, fixando o trecho temporal iniciado em 1977 com a publicação da Lei 63/77, de 25 de agosto, constatamos terem passado a coexistir no nosso ordenamento jurídico, então, relativamente ao arrendamento urbano, preferências comerciais e preferências habitacionais outorgadas aos arrendatários, sendo que estas últimas foram justificadas, no preambulo do diploma, no quadro de uma política de fomento do acesso dos arrendatários “[...] à habitação própria (artigo 65.º, n.º 2 [da Constituição na versão de 1976])”, afirmando-se aí que “[po-deria] contribuir para a referida política, ainda que em grau reduzido, conferir aos arrendatários habitacionais direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento dos imóveis respetivos”. Ora, porque a preferência do arrendatário relativa ao arrendamento comercial - a única que existiu até 1977-, se referia ao “prédio arrendado” - [“[n]a venda, dação em cumprimento ou aforamento do prédio arrendado, os arrendatários que nele exerçam o comércio ou indústria há mais de um ano têm preferência, sucessivamente e por ordem decrescente das ren-das” (artigo 1117.º, n.º 1, do CC)]-, poderemos caracterizar o sentido da referência, no artigo 1.º, n.º 1, da Lei 63/77, ao direito de preferência do “locatário habitacional de imóvel urbano [...] na compra e venda [...] do mesmo” como o resultado de um certo decalque do regime próprio da preferência que existia quanto ao arrendamento comercial. Foi nesta construção que se alicerçou, no quadro interpretativo da Lei 63/77, o entendimento jurisprudencial segundo o qual a preferência do arrendatário habitacional não deixaria de funcionar, mesmo quando a venda se referisse a todo o imóvel e não somente à parte deste correspondente ao locado (cf. José de Oliveira Ascensão, “Subarrendamento e Direitos de Preferência no Novo Regime do Arrendamento Urbano”, Revista da Ordem dos Advogados, ano 51.º, I, 1991, p. 68).

Com a edição do RAU em 1990 (Decreto-Lei 321-B/90, de 15 de outubro), que operou a revogação da Lei 63/77 (e, igualmente, do artigo 1117.º do CC), a preferência do arrendatário habitacional passou a ser reportada à venda ou dação em cumprimento “[...] do local arrendado [...]” (artigo 47.º, n.º 1, do RAU, acima transcrito), numa alteração da letra da lei que foi entendida, concretamente por alguma doutrina, como visando exautorar a interpretação expansiva da preferência do arrendatário habitacional baseada na letra do artigo 1.º da Lei 63/77. Este entendimento foi sustentado, por exemplo, por José de Oliveira Ascensão:

“[...] Supomos que esta situação é justamente removida pela nova lei do arrendamento urbano [o RAU].

O artigo 1117.º do CC e a Lei 63/77 foram expressamente revogados. [...]. Só restam o artigo 417.º do CC e as disposições da nova lei.

Estes exprimem [...] o princípio de que o direito de preferência incide sobre o objeto do direito preexistente que o justifica, só podendo ir além desse no interesse do sujeito à preferência.

O direito de preferência limita-se ao ‘local arrendado’. Se é alienada uma coisa global - um prédio - em que o local arrendado tenha autonomia jurídica, o direito de preferência não se pode exercer. Em suma:

perante a nova lei [RAU], ou o direito de preferência se pode exercer apenas em relação ao local arrendado, o que supõe a possibilidade de autonomização jurídica deste, ou o seu exercício é impossível.

[...]” (“Subarrendamento e Direitos de Preferência no Novo Regime do Arrendamento Urbano”, cit., p. 68).

Não obstante, mesmo na vigência do RAU, e posteriormente já no domínio do NRAU (que manteve, como vimos, a referência a local arren-dado), não deixaram de subsistir interpretações no sentido de continuar a expandir a preferência fundada no arrendamento urbano a vendas cujo objeto extravasasse do local arrendado, como sucedia com a venda de todo um prédio não constituído em propriedade horizontal (neste sentido, Jorge Alberto Aragão Seia, Arrendamento Urbano, 7.ª ed., Coimbra, 2003, p. 308). É assim que o estado atual do entendimento desta questão é caracterizado por António Menezes Cordeiro nos termos seguintes:

nhados acrescentados).

É o primeiro destes entendimentos jurisprudenciais, a designada teoria expansionista, que os Recorrentes pretendem ver aqui consagrado enquanto imposição constitucional, contra a afirmação da chamada teoria do local, subjacente à decisão recorrida. Trata-se, pois, por banda dos Recorrentes, do que podemos caraterizar como pretensão de captura do futuro da interpretação, com o efeito necessário de condicionar as opções (futuras) do legislador nesta matéria. É que, indicando, como pretendem os Recorrentes, uma das interpretações em jogo como constitucionalmente exigida, define-se a interpretação contraposta a esta, consequentemente, como não conforme à Constituição.

A este respeito, lembramos que qualquer das perspetivas aqui equacionadas - tanto a teoria expansionista como a teoria do local - sempre constituíram construções interpretativas elaboradas face sucessivos textos legais polissémicos, os quais, sendo mais ou menos expressivos num ou noutro sentido, nunca resolveram expressamente o problema da extensão espacial do objeto da preferência atribuída ao arrendatário habitacional. Mesmo no quadro da Lei 63/77, face a um texto contendo uma formulação mais sugestiva quanto à designada teoria expansionista (“locatário habitacional de imóvel urbano” e “direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento do mesmo”), não faltaram decisões de tribunais excluindo essa construção (cf., a título de exemplo, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17/07/1981, na Coletânea de Jurisprudência, 1981, 4.º, p. 87:

“[a] Lei 63/77 consagra o direito de preferência do inquilino no caso de alienação onerosa do prédio urbano, mas não prevê o exercício desse direito relativamente a fração não autonomizada do prédio”). Da mesma forma, face a textos contendo formulações mais próximas da designada teoria do local, aqui adotada pela decisão recorrida, a opção por esta sempre assentou numa justificação interpretativa referida à conjugação de elementos textuais, teleológicos, sistemáticos e à projeção das consequências, mais ou menos convenientes, decorrentes de cada uma das situações (tudo ferramentas interpretativas de captação da mensagem normativa contida em textos polissémicos):

“[...] [A teoria do local], perante as coordenadas atuais [...] do arrendamento urbano é a preferível. Vamos ver. α) A letra da lei:

o artigo 1117.º, versão original, dava preferência na venda do ‘prédio arrendado’, retomando o 66.º/1 da L 2:

030; ora o RAU de 1990 (47.º) limitou a preferência à venda do ‘local arrendado’, numa locução mantida pela L 6/2006, vertida no 1091. º, hoje em vigor:

Ora, devemos presumir que o legislador escolheu as suas palavras com critério, dizendo o que quis dizer (9.º/3):

designadamente o de 2006, que já conhecia o alcance prático da polémica. β) O elemento teleológico, sempre decisivo, diznos que a lei, ao atribuir preferência aos arrendatários, visou facultarlhes o cesso à habitação ou a instalações próprias, pondo termo ao arrendamento. Ora, admitir a preferência para além do local arrendado é interferir no mercado, dando vantagem ao arrendatário que transcende o fim da lei. Transformar o inquilino de um fogo em dono do prédio (só) porque este não estava em propriedade horizontal, é uma operação de todo fora do objetivo legal, que apenas visaria lucrativos negócios imobiliários. χ) A ponderação das consequências mostra que a tese expansionista pode conduzir a resultados inaceitáveis. A multinacional que arrenda um telhado para nele instalar um painel publicitário adquire, por isso, uma preferência na venda do edifício? Nenhuma valoração arrendatícia justificaria, jamais, semelhante resultado:

a teoria expansionista é inconveniente.

[...]” (António Menezes Cordeiro, Leis do Arrendamento Urbano

Anotadas, cit., p. 262).

Da mesma forma, a opção pela teoria expansiva, sempre assentou numa construção interpretativa elaborada sobre uma base textual assumida como aberta a mais de uma leitura, recorrendo-se a elementos interpretativos num quadro de reconstituição do pensamento legislativo, quanto a uma incidência particular não prevista no texto de forma explícita. Veja-se, como exemplo da afirmação da teoria expansiva, o Acórdão do STJ de 12/01/2012, proferido no proc. n.º 72/2001-L1.S1:

“[...] Entendeu o Tribunal ‘a quo’ que a introdução, no texto da lei, da expressão local arrendado limitaria o direito de preferência ao andar ou à parte do prédio efetivamente dada de arrendamento impedindo o ou os arrendatários de preferir na compra e venda da totalidade de um prédio não constituído em propriedade horizontal.

Desde logo o confronto dos dois números em que o artigo se decompõe leva-nos a uma interpretação não restritiva do preceito (‘actus debet interpretari ut aliquid operetur non ut sit inanis et inutilis’). Diz o n.º 2 do art.47.º do RAU que sendo dois ou mais preferentes, abre-se entre eles licitação, revertendo o excesso para o alienante. Os preferentes a que este número se refere são, em princípio, os locatários habitacionais do prédio arrendado. O n.º 2 restaria sem âmbito de aplicação em situações de não constituição da propriedade horizontal, pois não seria curial abrirem-se licitações concorrenciais entre o preferente do andar ou parte do prédio locado e os demais locatários do restante prédio. Em caso de propriedade horizontal o preferente na compra e venda do andar locado é, em princípio, o locatário do andar arrendado e não os demais locatários dos restantes andares.

Não é este, contudo, o argumento decisivo:

é que nem do preâmbulo do decretolei, nem da análise dos trabalhos preparatórios decorre ter o legislador tido a intenção de afastar o direito de preferência do locatário habitacional na compra e venda de todo o imóvel. Pode impressionar o facto de o legislador ter introduzido, no n.º 1 do art.47.º, a expressão “local arrendado”, só que tal expressão não é sinónimo, apenas, de andar arrendado mas de todo o imóvel onde o arrendamento se situa.

Se o legislador tinha a intenção de restringir a preferência aos casos de compra e venda de prédio constituído em propriedade horizontal devia têlo dito no art.47.º, dandolhe redação diversa. Não o tendo feito não pode a interpretação restringir com base em expressões de alcance dúbio (‘favorabilia amplianda, odiosa restringenda’).

[...]” (texto disponível em http:

//www.dgsi.pt/jstj.nsf).

Estando em causa, pois, em qualquer dos casos, uma construção interpretativa, importa apreciar os argumentos de inconstitucionalidade invocados pelos Recorrentes no sentido de obter a qualificação da interpretação do artigo 1090.º, n.º 1, alínea a), do CC pela qual pugnaram ao longo do processo (a correspondente à teoria expansionista) como imposição constitucional, com a consequência de este entendimento envolver a desqualificação constitucional da chamada teoria do local. 2.2 - Vejamos, pois, no que constitui o teste central da pretensão dos Recorrentes, se as razões apresentadas por estes impõem, enquanto exigência de uma interpretação da norma em conformidade com a Constituição, o entendimento antagónico do afirmado pela decisão recorrida.

Apontam os Recorrentes, nas alegações, para os seguintes desvalores:

(a) violação do princípio da igualdade; bem como (b) do “[...] programa constitucional de acesso à habitação própria [...]”, em violação do disposto no artigo 65.º, n.os 1 e 3, da Constituição;

(c) restrição desproporcionada do direito fundamental dos arrendatários de aceder à propriedade do imóvel onde habitam, violadora dos artigos 62.º, n.º 1, 17.º e 18.º, n.º 2 e 3, da CRP; e, por fim, (d) violação do princípio da proteção da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, a que se refere o artigo 2.º da Constituição.

2.2.1 - Inúmeros acórdãos do Tribunal Constitucional se ocuparam das exigências inerentes à previsão constitucional do princípio da igualdade (artigo 13.º). Para o que ora importa apreciar, recorde-se que é jurisprudência estabilizada que a Constituição só proíbe o tratamento diferenciado de situações quando o mesmo se apresente como arbitrário, sem fundamento material, havendo que precisar o sentido da igualdade jurídica. Pode, assim, ler-se no Acórdão 362/2016, seguindo o curso de inúmeras decisões anteriores concordantes:

“[...] Numa perspetiva de igualdade material ou substantiva - aquela que subjaz ao artigo 13.º, n.º 1, da Constituição e que se traduz na igualdade através da lei-, a igualdade jurídica corresponde a um conceito relativo e valorativo assente numa comparação de situações:

estas, na medida em que sejam consideradas iguais, devem ser tratadas igualmente; e, na medida em que sejam desiguais, devem ser tratadas desigualmente, segundo a medida da desigualdade. Tal implica a determinação prévia da igualdade ou desigualdade das situações em causa, porquanto no plano da realidade factual não existem situações absolutamente iguais. Para tanto, é necessário comparar situações em função de um certo ponto de vista. Por isso, a comparação indispensável ao juízo de igualdade exige pelo menos três elementos:

duas situações ou objetos que se comparam em função de um aspeto que se destaca do todo e que serve de termo de comparação (tertium comparationis). Este termo - o

« terceiro (elemento) da comparação »

- corresponde à qualidade ou característica que é comum às situações ou objetos a comparar; é o pressuposto da respetiva comparabilidade. Assim, o juízo de igualdade significa fazer sobressair ou destacar elementos comuns a dois ou mais objetos diferentes, de modo a permitir a sua integração num conjunto ou conceito comum (genus proximum). Porém, a Constituição não proíbe todo e qualquer tratamento diferenciado. Proíbe, isso sim, as discriminações negativas atentatórias da (igual) dignidade da pessoa humana e as diferenças de tratamento sem uma qualquer razão justificativa e, como tal, arbitrárias.

[...] Por outro lado, não é função do princípio da igualdade garantir que todas as escolhas do legislador sejam racionais e coerentes ou correspondem à melhor solução. Nesse particular, justifica-se recordar a jurisprudência constitucional firmada no Acórdão 546/2011:

‘[O] n.º 1 do artigo 13.º da CRP, ao submeter os atos do poder legislativo à observância do princípio da igualdade, pode implicar a proibição de sistemas legais internamente incongruentes, porque integrantes de soluções normativas entre si desarmónicas ou incoerentes. Ponto é, no entanto - e veja-se, por exemplo, o Acórdão 232/2003-, que o caráter incongruente das escolhas do legislador se repercuta na conformação desigual de certas situações jurídico-subjetivas, sem que para a medida de desigualdade seja achada uma certa e determinada razão. É que não cabe ao juiz constitucional garantir que as leis se mostrem, pelo seu conteúdo, ‘racionais’. O que lhe cabe é apenas impedir que elas estabeleçam regimes desrazoáveis, isto é, disciplinas jurídicas que diferenciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente. Só quando for negativo o teste do ‘merecimento’ - isto é, só quando se concluir que a diferença, ou a igualização, entre pessoas e situações que o regime legal estabeleceu não é justificada por um qualquer motivo que se afigure compreensível face à ratio que o referido regime, em conformidade com os valores constitucionais, pretendeu prosseguir - é que pode o juiz constitucional censurar, por desrazoabilidade, as escolhas do legislador.

[...]” (sublinhados acrescentados).

Expostos, em termos gerais, os parâmetros em que a apreciação da alegada violação do princípio da igualdade deve aqui mover-se, observa-se, antes de mais, que não pode afirmar-se igual a situação do arrendatário de uma parte de um imóvel com autonomia jurídica - designadamente, uma fração autónoma - e a do arrendatário de uma parte de um imóvel não autonomizada.

Desde logo, a igualdade não pode aferir-se por referência ao mais simplificado plano de facto, mas à situação global complexa de facto e de direito, já que é de efeitos jurídicos decorrentes da relação de arrendamento que tratamos. Ora, neste plano, é evidente que não estamos perante a mesma situação num qualquer caso em que o arrendamento incida sobre um objeto cujo domínio pode ser autonomamente transacionado e num outro caso em que incida sobre parte não autonomizada de um imóvel. Basta pensar que, no primeiro caso, a natureza da coisa dada em locação permite que a realidade física objeto do negócio sobre o domínio coincida com a realidade física do objeto do arrendamento e, no segundo caso, essa coincidência não é possível. Neste conspecto, o tratamento diferenciado de uma e outra situação não é arbitrário, parecendo razoável que o legislador tenha entendido que a autonomia negocial dos sujeitos (na dimensão de liberdade de escolha da contraparte negocial) não devia ser sacrificada no caso de o objeto do arrendamento não coincidir com o objeto do negócio real de aquisição, até mesmo porque, desse modo, se proporcionaria ao arrendatário a aquisição de mais do que o locado em função do qual a preferência é atribuída.

É certo que esta atribuição do direito de preferência a favor do arrendatário visa proporcionar o acesso à propriedade a quem beneficia já de um direito de gozo prolongado sobre o imóvel, com o que daí vem implicado de estabilidade na habitação, mas - até a essa luz - não pode dizer-se que há igualdade na situação de aquisição do espaço de habitação e na situação de aquisição de maior superfície, incluindo área que não correspondia à anterior habitação (que, aliás, até pode corresponder à habitação de terceiros).

Por outro lado, o objeto da propriedade não tem, forçosamente, que coincidir com o objeto do arrendamento, tratando-se de direitos de natureza diferente, podendo o legislador - por razões de segurança jurídica, ordenação do território, publicidade e boa gestão do registo predial e da realidade cadastral, entre outras - exigir que a propriedade tenha por objeto uma realidade física e jurídica unitária com certas características, não se fazendo sentir as mesmas exigências no caso de locação. Assim sendo, mostrando-se razoável a exigência da autonomia jurídica da coisa para que possa constituir objeto de um negócio translativo da propriedade, é também razoável que o direito de preferência a partir do arrendamento se projete por referência à mesma unidade jurídica, sendo ele tendente à aquisição do direito real. Este ponto é determinante, uma vez que a afirmação da igualdade entre situações que os Recorrentes procuram sustentar reduz os termos da questão à realidade puramente física da locação, esquecendo que o direito de preferência interfere com os termos do negócio real de compra e venda ou de dação em cumprimento.

2.2.2 - Em suma, não estando vedada ao legislador a previsão, como objeto da preferência, de um direito tão amplo como aquele que resulta da atuação da dita teoria expansionista (disse-o este Tribunal no citado Acórdão 225/2000), a circunscrição desse objeto nos termos resultantes da chamada teoria do local, também não está vedada, pois a distinção de regimes envolvida nesta última opção não se apresenta arbitrária ou carecida de fundamento racional na diferenciação das situações envolvidas:

as que, no quadro de uma pretensão de exercício da preferência pelo arrendatário habitacional, podem conduzir a um tratamento diferenciado de quem é confrontado com a venda, exclusivamente, do seu “local arrendado” e quem é confrontado com um negócio abrangendo um espaço mais amplo do qual não é juridicamente destacável o espaço correspondente ao objeto do arrendamento.

Como tal, não se mostra violado o princípio da igualdade. 2.2.3 - No que respeita à invocada desconformidade com o “pro-grama constitucional de acesso à habitação própria”, em violação do disposto no artigo 65.º, n.os 1 e 3, da Constituição, importa apurar se a Constituição exige, de algum modo em certas condições, que o direito à habitação se proporcione através de uma transformação, por via de um direito de preferência, da habitação arrendada em habitação própria.

2.2.3.1 - O artigo 65.º da Constituição visa garantir, antes de mais, “[...] o direito a uma morada digna, onde cada um possa viver com a sua família” (Jorge Miranda, Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª ed., Coimbra, 2010, pp. 1325 e ss.), ou, nos dizeres do Acórdão 151/92:

“[...] Todos, pois, têm direito a uma morada decente, para si e para a sua família; uma morada que seja proporcionada ao número dos membros do respetivo agregado familiar, por forma a que seja pre-servada a intimidade de cada um deles e a privacidade da família no seu conjunto; uma morada que, além disso, permita a todos viver em ambiente fisicamente são e que ofereça os serviços básicos para a vida da família e da comunidade.

[...]”.

Este direito está em conexão com outros direitos fundamentais, como o da intimidade da vida privada e familiar (artigo 26.º), e com a ideia de tutela da família (artigo 67.º), entre outros (Jorge Miranda, Rui Medeiros, ob. cit., p. 1326). Assim genericamente entendido, o direito à habitação tanto pode ser assegurado por via do arrendamento como por via da propriedade (habitação própria) - cf., a propósito, o artigo 65.º, n.º 2, alínea c), da Constituição.

É certo que o n.º 3 do artigo 65.º da Constituição encarrega o Estado de adotar uma política de acesso a habitação própria, mas essa finalidade pode alcançar-se por diversas vias - “[...] como ‘promo-tor’ de habitação, quer indiretamente, enquanto ‘indutor’ de habitação, apoiando a iniciativa quer dos entes públicos autónomos [...], quer da iniciativa privada [...], quer da iniciativa cooperativa e das comunidades locais - em especial a denominada autoconstrução” (Jorge Miranda, Rui Medeiros, ob. cit., p. 1328).

Trata-se, aliás, de matéria em que o legislador goza de ampla margem de conformação, como foi justamente se assinala no Acórdão 806/93:

“[...] A conceção constitucional quanto à efetivação do direito à habitação é, assim, uma conceção

« plural » ou
« aberta » quanto aos meios, que tanto pode ser canalizada na promoção e regulação da oferta habitacional, como da sua procura. [...] [E]stá em causa uma pura opção de política social, adotada ao abrigo da liberdade que assiste ao legislador, dentro dos limites constitucionalmente estabelecidos. Não pode, pois, um juízo de constitucionalidade incidir sobre as finalidades dessa política, mas tão somente sobre o confronto dos normativos que a corporizam com os pertinentes preceitos constitucionais

[...]”.

Por outro lado, o direito à habitação, por si só, “[...] não se esgota ou, ao menos, não aponta, ainda que de modo primordial ou a título principal, para o direito a ter uma habitação num imóvel da propriedade do cidadão [...]” (Acórdão 649/99) ou, nas palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira, “[...] o direito à habitação não se reduz ao direito a habitação própria (o que o transformaria num caso de direito à propriedade), podendo ser realizado também por via do direito de arrendamento” (Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª ed., Coimbra, 2014, p. 836).

2.2.3.2 - Para além da margem de liberdade de que goza no estabelecimento do regime jurídico que entende ser mais adequado à satisfação do direito à habitação, o legislador também pode transformálo ao longo do tempo. A este propósito, Jorge Miranda e Rui Medeiros (ob. cit., p. 1329), observam o seguinte, com particular pertinência para o caso dos presentes autos:

“[...] [O] legislador ordinário nem sequer está vinculado às opções legislativas adotadas num determinado momento histórico Aliás como resulta do Ac. n.º 465/01, não só é de duvidar da consagração constitucional de um tal princípio, não resultando de nenhum dos diversos números do artigo 65.º qualquer ‘obrigação geral de manter soluções jurídicas anteriormente estabelecidas’, como também não é possível obliterar que, em matéria de arrendamento para habitação, mesmo existindo um aparente retrocesso na perspetiva da situação dos inquilinos existentes, uma conclusão definitiva no sentido da verificação de um retrocesso só pode ser alcançada depois da ponderação, para além da situação dos próprios senhorios, dos efeitos das medidas em causa sobre o mercado do arrendamento em geral.

[...]” (sublinhado acrescentado).

Ou seja, como se lê no Acórdão 346/93:

“[...] [N]esta matéria do direito constitucional à habitação, tem de ponderar-se que o seu grau de realização fica dependente sempre, em última análise, das opções que o Estado seguir em matéria de política de habitação, as quais são sempre condicionadas pelos recursos financeiros de que o próprio Estado possa dispor em cada momento (a chamada ‘reserva do possível’) e pelo grau de sacrifício que o legislador considerar razoável impor aos proprietários privados, senhorios de casas de habitação.

[...]”.

No conflito de interesses entre o senhorio e o inquilino, a proteção deste, por razões de tutela constitucional da habitação, justificar-se-á com mais intensidade quando esteja em causa a efetiva ablação desse direito (como vimos, não é o caso), devendo - no mais - conferir-se “[...] total primazia ao legislador” e, nessa medida, admitindo “[...] a constitucionalidade da generalidade das soluções gizadas pela lei [...]” (Jorge Miranda, Rui Medeiros, ob. cit., p. 1332).

2.2.3.3 - O exposto - designadamente, a ampla margem de que goza o legislador - permite concluir, com segurança, que do artigo 65.º da Constituição não pode extrair-se a exigência imperativa de que uma das vias de realização do direito à habitação seja a da previsão legislativa de aquisição, através do direito de preferência, em termos gerais, a quem já dispõe de uma habitação arrendada, do direito de propriedade sobre um bem imóvel que exceda o locado. Acresce que não está em causa, na interpretação normativa em análise, proporcionar originariamente a habitação (porque o arrendatário já dela dispõe), mas apenas dotála de maior estabilidade, por via do direito de propriedade, e à custa de algum grau de sacrifício da autonomia negocial relativamente a uma parte do imóvel que não é sequer objeto do arrendamento, o que é situação bem diversa e, claro está, reclamando uma tutela muito menos intensa. Afirmar que tal solução decorre do artigo 65.º da Constituição constituiria uma limitação assinalável à liberdade do legislador e à liberdade negocial do proprietário que, num caso e no outro, não encontraria fundamento bastante no contexto acabado de expor.

2.2.3.4 - As conclusões que antecedem permitem afirmar que a Constituição não prevê ou acolhe o direito de o arrendatário habitacional adquirir, através do exercício do direito de preferência, o direito de propriedade sobre um bem imóvel que exceda o espaço correspondente ao locado. Tem, assim, forçosamente, resposta negativa a questão da alegada restrição desproporcionada do direito fundamental dos arrendatários de aceder à propriedade do imóvel onde habitam, que, no entender dos Recorrentes, seria violadora dos artigos 62.º, n.º 1, 17.º e 18.º, n.º 2 e 3, da CRP. Em primeiro lugar (e tanto bastaria), porque, como se concluiu, tal direito não existe com a pretendida configuração (enquanto direito fundamental previsto na Constituição), pelo que afastado está que tenha sido desproporcionadamente restringido. Em segundo lugar, porque, como também se analisou, o direito à habitação não se confunde com o direito de propriedade e não tem que se realizar necessariamente (em geral e, especialmente, em hipóteses como a dos presentes autos) por via do direito de propriedade, que, manifestamente, não está em causa. Os Recorrentes não se viram privados ou afetados em qualquer direito de propriedade de que fossem titulares, nem sequer de um direito real de aquisição que só numa particular interpretação da lei infraconstitucional lhes era reconhecido, sem que o legislador expressamente tivesse optado por qualquer das interpretações consabidamente em jogo.

2.2.4 - Quanto à invocada violação do princípio da tutela da confiança, deve começar por afirmar-se a linha jurisprudencial do Tribunal a tal respeito, segundo a qual essa tutela não pode paralisar absolutamente o legislador.

A este respeito, pode ler-se no Acórdão 156/95:

“[...] Haverá, assim, que proceder a um justo balanceamento entre a proteção das expectativas dos cidadãos decorrente do princípio do Estado de direito democrático e a liberdade constitutiva e conformadora do legislador, também ele democraticamente legitimado, legislador ao qual, inequivocamente, há que reconhecer a licitude (senão mesmo o dever) de tentar adequar as soluções jurídicas às realidades existentes, consagrando as mais acertadas e razoáveis, ainda que elas impliquem que sejam

« tocadas » relações ou situações que, até então, eram regidas de outra sorte.

Um tal equilíbrio, como o Tribunal tem assinalado, será alcançado nos casos em que, ocorrendo mudança de regulação pela lei nova, esta [não] vai implicar, nas relações e situações jurídicas já antecedentemente constituídas, uma alteração inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente, alteração com a qual os cidadãos e a comunidade não poderiam contar, expectantes que estavam, razoável e fundadamente, na manutenção do ordenamento jurídico que regia a constituição daquelas relações e situações. Nesses casos, impor-se-á que atue o subprincípio da proteção da confiança e segurança jurídica que está implicado pelo princípio do Estado de direito democrático, por forma a que a nova lei não vá, de forma acentuadamente arbitrária ou intolerável, desrespeitar os mínimos de certeza e segurança que todos têm de respeitar.

Como reverso desta proposição, resulta que, sempre que as expectativas não sejam materialmente fundadas, se mostrem de tal modo enfraquecidas “que a sua cedência, quanto a outros valores, não signifique sacrifício incomportável” (cf. Acórdão 365/91 no Diário da República, 2.ª série, de 27 de agosto de 1991), ou se não perspetivem como consistentes, não se justifica a cabida proteção em nome do primado do Estado de direito democrático.

[...]”.

Mais recentemente, no Acórdão 128/2009, os critérios atrás enunciados foram arrumados em quatro requisitos ou testes (referidos, sucessivamente, nos Acórdãos n.os 188/2009, 187/2013, 862/2013, 575/2014, 241/2015 e 509/2015):

“[...] Os dois critérios enunciados [no Acórdão 287/1990] (e que são igualmente expressos noutra jurisprudência do Tribunal) são, no fundo, reconduzíveis a quatro diferentes requisitos ou ‘testes’. Para que haja lugar à tutela jurídicoconstitucional da

« confiança » é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legisla-dor) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados
« expectativas » de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do
« comportamento » estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa.

Este princípio postula, pois, uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na estabilidade da ordem jurídica e na constância da atuação do Estado. Todavia, a confiança, aqui, não é uma confiança qualquer:

se ela não reunir os quatro requisitos que acima ficaram formulados a Constituição não lhe atribui proteção.

Por isso, disse-se ainda no Acórdão 287/90 - e importa ter este dito presente no caso - que, em princípio, e tendo em conta a autorevisibilidade das leis, ‘não há [...] um direito à nãofrustração de expectativas jurídicas ou a manutenção do regime legal em relações jurídicas duradoiras ou relativamente a factos complexos já parcialmente realizados’.

[...]” (sublinhados acrescentados).

Os Recorrentes alegaram que as quatro condições enunciadas se verificam na hipótese dos presentes autos, mas não existem motivos bastantes para sustentar essa conclusão.

Em primeiro lugar, não se verifica que o Estado (mormente o legis-lador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados expectativas de continuidade ou exclusividade de uma determinada interpretação do alcance, quanto ao objeto, da preferência atribuída ao arrendatário habitacional. Na verdade, como justamente se afirma no Acórdão 128/2009, não existe, à partida, um direito à nãofrustração de expectativas jurídicas ou à manutenção do regime legal em relações jurídicas duradouras (como é o caso da relação de arrendamento). Ademais, a simples maior ou menor expressão de uma corrente jurisprudencial relativa ao alcance do direito de preferência do arrendatário - é disso que aqui se trata-, não configura qualquer “comportamento” (ativo) - seguramente não do legislador - gerador nos destinatários das normas de uma expectativa de manutenção ou de prevalência de uma ou outra das correntes interpretativas em jogo.

Não existindo, propriamente, expectativas dignas de tutela num quadro em que se confrontam diferentes interpretações de uma norma por diversos Tribunais, não podem afirmar-se legítima ou fundada em boas razões (que, em qualquer caso, não se anteveem) a pretensão de ver estabilizada, à margem da intervenção do legislador, uma ou outra das interpretações em jogo.

Note-se, aliás, que não está em causa, sequer, a respeito da interpretação do artigo 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC, um aspeto central do regime do arrendamento urbano, atinente às suas obrigações principais, mas, tãosomente, a regulação jurídica de um facto eventual e não essencial do contrato. E, note-se, enfim, que a interpretação que é referenciada como teoria do local não deixa de encontrar justificação no interesse de fazer coincidir o objeto da preferência com o objeto do arrendamento, não sacrificando a autonomia negocial do proprietário para além do que a proteção que se pretendeu conceder ao arrendatário justifica.

2.3 - Em face do exposto, deve concluir-se que a norma que constitui objeto do recurso - a norma na interpretação aqui adotada na decisão recorrida - não viola os parâmetros constitucionais assinalados pelos Recorrentes (nem quaisquer outros). É o que resta afirmar, com a con-sequente improcedência do recurso.

2.4 - Sumário elaborado pelo relator (artigo 663.º, n.º 7 do Código de Processo Civil, ex vi do disposto no artigo 69.º da LTC):

I - Relativamente ao direito de preferência do arrendatário na aquisição do prédio arrendado, o Tribunal Constitucional, no Acórdão 225/2000, decidiu não julgar inconstitucional o artigo 47.º, n.º 1, do (então vigente) Regime do Arrendamento Urbano (RAU), quando interpretado em termos de atribuir ao arrendatário de parte de um prédio urbano, que não está constituído em propriedade horizontal, precisamente, o direito de preferência na alienação da totalidade do prédio (a denominada “teoria expansionista”);

II - Este precedente não permite, no quadro de um argumento de identidade de razão, uma transposição de argumentos para uma interpretação com o sentido (perspetivado inversamente) de negar ao arrendatário de parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, o direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda deste (a denominada teoria do local). Não obstante, não deixa de se retirar do Acórdão 225/2000 a ideia de uma tendencial neutralidade da Constituição quanto à maior ou menor extensão espacial com a qual o direito de preferência é reconhecido ao arrendatário;

III - No arrendamento urbano, numa primeira fase (1924/1967), o direito de preferência era concedido unicamente arrendatário comercial. Só mais tarde o legislador optou por alargar a situação ao arrendatário habitacional, através da Lei 63/77, de 25 de agosto;

IV - Com a aprovação do RAU (Decreto-Lei 321-B/90, de 15 de outubro), a preferência do arrendatário habitacional passou a ser reportada à venda ou dação em cumprimento “[...] do local arrendado [...]”, alteração que foi entendida, por uma parte da doutrina e da jurisprudência, como visando afastar a interpretação expansiva da preferência do arrendatário de parte de um prédio urbano, que não está constituído em propriedade horizontal. A partir do RAU, segundo tal doutrina, seria negado ao arrendatário, nesse caso, o exercício do direito de preferência na alienação da totalidade do prédio. Tal entendimento não era, todavia, unânime, tal como não o era o entendimento contrário no quadro da Lei 63/77;

V - Não cabendo ao Tribunal Constitucional tomar posição sobre a melhor interpretação do direito infraconstitucional, a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do CC, na redação introduzida pela Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda desse mesmo prédio, só pode ser afastada por este Tribunal se se concluir que a Constituição impõe solução diversa, ou seja, que alguma norma ou princípio constitucional obriga ao reconhecimento do direito de preferência na hipótese descrita, correspondente à chamada “teoria expansionista”

;

VI - A interpretação normativa indicada no ponto anterior não viola o princípio da igualdade, pois não pode afirmar-se igual a situação do arrendatário de uma parte de um imóvel com autonomia jurídica - designadamente, uma fração autónoma - e a do arrendatário de uma parte de um imóvel não autonomizada, desde logo porque a igualdade não pode aferir-se por referência ao mais simplificado plano de facto, mas à situação global complexa de facto e de direito;

VII - No aludido plano, não estamos perante a mesma situação num caso em que o arrendamento incide sobre um objeto cujo domínio pode ser autonomamente transacionado e num caso em que incide sobre parte não autonomizada de um imóvel. A atribuição do direito de preferência a favor do arrendatário visa proporcionar o acesso à propriedade a quem beneficia já de um direito de gozo prolongado sobre o imóvel, com o que daí vem implicado de estabilidade na habitação, mas - até a essa luz - não pode dizer-se que há igualdade na situação de aquisição do espaço de habitação e na situação de aquisição de maior superfície, incluindo área que não correspondia à anterior habitação;

VIII - O objeto da propriedade não tem, forçosamente, que coincidir com o objeto do arrendamento, tratando-se de direitos de natureza diferente, podendo o legislador exigir que a propriedade tenha por objeto uma realidade física e jurídica unitária com certas características, não se fazendo sentir as mesmas exigências no caso de locação. Mostrando-se razoável a exigência da autonomia jurídica da coisa para que possa constituir objeto de um negócio translativo da propriedade, é também razoável que o direito de preferência a partir do arrendamento se projete por referência à mesma unidade jurídica, sendo ele tendente à aquisição do direito real;

IX - Não estando vedado ao legislador a previsão, como objeto da preferência, de um direito tão amplo como aquele que resulta da atuação da teoria expansionista, a circunscrição desse objeto nos termos resultantes da chamada teoria do local também não está vedada, pois a distinção de regimes envolvida nesta última opção não se apresenta arbitrária ou carecida de fundamento racional na diferenciação das situações envolvidas:

as que, no quadro de uma pretensão de exercício da preferência pelo arrendatário habitacional, podem conduzir a um tratamento diferenciado de quem é confrontado com a venda, exclusivamente, do seu “local arrendado” e quem é confrontado com um negócio abrangendo um espaço mais amplo do qual não é juridicamente destacável o correspondente ao objeto do arrendamento;

X - O n.º 3 do artigo 65.º da Constituição encarrega o Estado de adotar uma política de acesso a habitação própria, mas essa finalidade pode alcançar-se por diversas vias, tratando-se de matéria em que o legislador goza de ampla margem de conformação. Por outro lado, o direito à habitação, por si só, não se reconduz unicamente no direito a habitar um imóvel propriedade própria, podendo realizar-se pela via do arrendamento;

XI - Do artigo 65.º da Constituição não pode extrair-se a exigência imperativa de que uma das vias de realização do direito à habitação seja a da previsão legislativa de aquisição da propriedade, através do direito de preferência, a quem já dispõe de uma habitação arrendada, sobre um bem imóvel que exceda o locado;

XII - Neste caso, não pode falar-se de restrição desproporcionada do direito dos arrendatários de aceder à propriedade do imóvel onde habitam, designadamente porque tal direito não existe com a pretendida configuração (enquanto direito fundamental previsto na Constituição), pelo que afastado está que possa ser desproporcionadamente restringido;

XIII - Não se verifica que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados expectativas de continuidade ou exclusividade de uma determinada interpretação do alcance, quanto ao objeto, da preferência atribuída ao arrendatário habitacional. Na verdade, não existe, à partida, um direito à nãofrustração de expectativas jurídicas ou à manutenção do regime legal em relações jurídicas duradouras (como é o caso da relação de arrendamento) e a simples maior ou menor expressão de uma corrente jurisprudencial relativa ao alcance do direito de preferência do arrendatário, não configura qualquer “comportamento” (ativo) - seguramente não do legislador - gerador nos destinatários das normas de uma expectativa de manutenção ou de prevalência de uma ou outra das correntes interpretativas em jogo;

XIV - Não existindo expectativas dignas de tutela num quadro em que se confrontam diferentes interpretações de uma norma pelos Tribunais, não podem afirmar-se legítima ou fundada em boas razões a pretensão de ver estabilizada, à margem da intervenção do legislador, uma ou outra das interpretações em jogo;

XV - A interpretação que é referenciada como teoria do local não deixa de encontrar justificação no interesse em fazer coincidir o objeto da preferência com o objeto do arrendamento, não sacrificando a autonomia negocial do proprietário para além do que a proteção que se pretendeu conceder ao arrendatário justifica;

XVI - Assim, não é inconstitucional a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do CC, na redação introduzida pela Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda desse mesmo prédio.

III - Decisão 3 - Em face do exposto, na improcedência do recurso, decide-se não julgar inconstitucional a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil, na redação introduzida pela Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda desse mesmo prédio.

Custas pelos Recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta, tendo em atenção os critérios definidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto Lei 303/98, de 7 de outubro (cf. artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma).

Lisboa, 3 de novembro de 2016. - Teles Pereira - Maria de Fátima MataMouros - João Pedro Caupers - Claudio Monteiro (vencido, conforme declaração de voto anexa) - Costa Andrade.

Declaração de voto Votei vencido, na parte em que se decidiu não conhecer do pedido, e não julgar inconstitucional, a alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil, na redação introduzida pela Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, quando interpretada no sentido de que o arrendatário de parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal não tem direito de preferência na aquisição dessa parte.

1 - Ao contrário do entendimento sufragado pela maioria, entendo que o objeto do presente recurso abrange os dois segmentos interpretativos da norma em apreciação, relativos, respetivamente, ao exercício de um direito de preferência restrito à parte arrendada do prédio ou extensível à totalidade do mesmo.

Além de o recurso assim ter sido configurado pelos recorrentes no seu requerimento de interposição, em conformidade com a forma como delimitaram o pedido na ação principal, e como suscitaram a questão de constitucionalidade em todas as instâncias do processo, assim também decidiu o Supremo Tribunal de Justiça de uma forma clara.

A esse propósito o acórdão recorrido afirmou perentoriamente que (cf. fls. 295) “o sentido a extrair do disposto no artigo 1091.º, n.º 1 do CC - coincidente com o extraído pelas instâncias - é o seguinte:

1 - o direito de preferência do arrendatário está limitado ao local arrendado, objeto do contrato de arrendamento, se se tratar de bem jurídico autónomo;

2 - caso o prédio vendido não tenha sido constituído em propriedade horizontal, o arrendatário de parte dele, sem autonomia jurídica, não tem direito de preferência sobre ele ou sobre a totalidade do prédio, em caso de venda ou dação em cumprimento deste último.”

E prosseguiu discorrendo longamente nas três páginas subsequentes sobre as razões pelas quais o sentido que extraiu daquela disposição - no segmento em que não se reconhece o direito de preferência sobre a parte arrendada do prédio - não é inconstitucional, invocando, entre outras razões, que (cf. fls 297) “sendo os objetos do arrendamento, no caso de um prédio não constituído e de uma fração de um prédio constituído em propriedade horizontal, realidades jurídicas diferentes, existe, na base, uma situação que o sistema diversifica e que legitima o tratamento diferenciado, e coerente, na negação e na atribuição respetiva do direito de preferência.

As situações não são, pois, iguais, legitimando a desigualdade jurídica do objeto o tratamento diferenciado do feixe de direitos que se lhes associam.

Por aqui, então, não existe qualquer afronta ao direito de igual-dade.”

Para só depois concluir que “Também não haverá (afronta ao direito de igualdade) quando esteja em causa o direito de preferência em relação à totalidade do prédio (.)”.

É, pois, inequívoco que a alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil constituiu a ratio decidendi, tanto do pedido principal de exercício do direito de preferência relativamente à parte arrendada do prédio, como do pedido subsidiário de exercício daquele direito relativamente à totalidade do mesmo, e que em relação a ambos os pedidos o tribunal a quo aplicou aquela norma por entender que a mesma não padece, em nenhum dos segmentos interpretativos identificados, de nenhuma das inconstitucionalidades que lhe foram apontadas pelos autores e ora recorrentes.

2 - Assim delimitado o objeto do recurso, como julgo que deveria ser, o sentido do meu voto não seria unívoco, na medida em que acompanho a maioria no entendimento de que o preceito legal em questão não é inconstitucional, se interpretado no sentido de não atribuir ao arrendatário de parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal o direito de preferência sobre a totalidade desse prédio, mas não subscreveria idêntica interpretação relativamente a um direito de preferência restrito à parte do prédio que constitui o objeto do arrendamento, se essa interpretação tivesse sido explicitamente assumida.

Em minha opinião, não existem razões materiais que justifiquem a diferença de tratamento entre arrendatários de frações autónomas e de partes de prédios não constituídos em propriedade horizontal, pelo que que, nessa interpretação, a alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil viola o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição.

Desde logo, porque essas razões materiais haveriam de se encontrar numa diferente situação de facto e de direito dos arrendatários de andares em prédios não constituídos em propriedade horizontal, e não na diferente situação jurídica do local arrendado, que é estranha à relação locatícia e cuja configuração não depende da sua vontade, na medida em que a propriedade horizontal pode ser livremente constituída e desconstituída pelo(s) proprietário(s) no decurso daquela relação, sem com ela interferir.

Se o legislador considera - e teria em minha opinião liberdade para não o fazer - que a atribuição do direito de preferência na compra e venda do local arrendado constitui um caminho para a concretização do direito à habitação dos arrendatários consagrado no artigo 65.º da Constituição, na medida em que consolida e estabiliza a relação jurídica que estes mantêm com a sua casa de morada, teria que justificar em que é que o facto de aquele local não constituir uma unidade predial autónoma altera a natureza dos interesses tutelados.

Não altera, obviamente, porque aqueles arrendatários não precisam menos de estabilidade jurídica do que os arrendatários de frações autónomas. Pelo contrário até, em caso de venda da totalidade do prédio ficam mais expostos à possibilidade de denúncia do contrato pelo senhorio para demolição ou realização de obras de remodelação ou restauro profundo, nos termos da alínea a) do artigo 1101.º do Código Civil, do que ficariam no caso de venda apenas da sua fração.

Mas não altera, também, porque a sua posição jurídica enquanto arrendatários em nada difere das dos demais, já que o objeto e o regime do contrato de arrendamento não se definem pelo objeto e o regime do direito de propriedade do senhorio. O arrendamento é um direito pessoal de gozo que tem por objeto a coisa ou parte dela, e não aquele direito de propriedade.

Por maioria de razão, o direito de preferência dos arrendatários tem de se definir pelo objeto do seu direito (de arrendamento) e não pelo objeto do direito (de propriedade) do senhorio.

A questão de saber se o facto de o local arrendado não constituir uma unidade predial autónoma é ou não um obstáculo ao exercício do direito de preferência é uma questão que interessa menos no plano constitucional do que no plano da legislação ordinária, já que o que este Tribunal tem de decidir, antes de mais, é se à luz das disposições constitucionais aplicáveis o legislador pode não permitir o exercício daquele direito naqueles casos, quando permite em todos os demais.

Não se vê, no entanto, como é que uma interpretação da norma em apreço em conformidade com a Constituição não constituísse habilitação legal suficiente para que a preferência se exercesse em relação a parte do prédio, independentemente da maior ou menor dificuldade em acomodar o novo direito de propriedade dele resultante à situação jurídica do prédio, que passaria necessariamente a ser objeto de uma propriedade comum ou partilhada.

Sendo o direito de preferência um direito real de aquisição normativamente atribuído, nada obsta a que ele permita a aquisição apenas da parte do prédio que corresponde ao objeto do direito do arrendatário, como aliás a doutrina e a jurisprudência tem entendido ser juridicamente possível, mesmo sem norma legal expressa, em casos de aquisição originária parcial resultante de usucapião ou de acessão imobiliária fundadas na posse ou na ocupação de apenas parte de um prédio.

3 - As razões que invoco no sentido da inconstitucionalidade da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil, quando interpretada no sentido de que ela não confere ao arrendatário de parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal o direito de preferência na aquisição dessa parte não são, contudo, extensíveis à hipótese de não atribuição daquele direito sobre a totalidade do prédio.

O direito de preferência não pode deixar de entendido, ele próprio, como uma restrição ao direito de propriedade do senhorio, na medida do condicionamento da sua liberdade de disposição, pelo que uma preferência sobre a totalidade do prédio, que não radica já na concretização do direto à habitação do arrendatário, seria excessiva e por isso desproporcional, em violação do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição. - Claudio Monteiro.

210059377

TRIBUNAL DA COMARCA DOS AÇORES

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2816208.dre.pdf .

Ligações deste documento

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  • Tem documento Em vigor 1913-07-01 - Lei 1 - Ministério do Interior - Direcção Geral de Administração Política e Civil

    Organiza a Guarda Nacional Republicana (GNR).

  • Tem documento Em vigor 1913-07-01 - Lei 2 - Ministério do Fomento - Secretaria Geral

    Autoriza o Governo a construir, na cerca da Casa Pia de Lisboa, um pavilhão destinado ao jogo do Golf. (Lei n.º 2)

  • Tem documento Em vigor 1913-07-16 - Decreto 43 - Ministério da Marinha - Majoria General da Armada - 1.ª Repartição - 3.ª Secção

    Decreto n.º 43, estabelecendo várias disposições com relação à permanência dos oficiais inferiores e praças de marinhagem no desempenho de serviços a bordo ou em terra

  • Tem documento Em vigor 1977-07-26 - Lei 53/77 - Assembleia da República

    Concede ao Governo autorização para legislar sobre revisão do Código Civil.

  • Tem documento Em vigor 1977-08-25 - Lei 63/77 - Assembleia da República

    Aprova o direito de preferência na alienação onerosa de prédios urbanos.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1990-10-15 - Decreto-Lei 321-B/90 - Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

    Aprova o regime do arrendamento urbano.

  • Tem documento Em vigor 1998-10-07 - Decreto-Lei 303/98 - Ministério da Justiça

    Dispõe sobre o regime de custas no Tribunal Constitucional.

  • Tem documento Em vigor 2006-02-27 - Lei 6/2006 - Assembleia da República

    Aprova o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), que estabelece um regime especial de actualização das rendas antigas, e altera o Código Civil, o Código de Processo Civil, o Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e o Código do Registo Predial. Republica em anexo o capítulo IV do título II do livro II do Código Civil.

Ligações para este documento

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