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Decreto-lei 46001, de 2 de Novembro

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Sumário

Reestrutura o instituto da revisão de processos de disciplina militar.

Texto do documento

Decreto-Lei 46001

1. No preâmbulo do Decreto-Lei 43310, de 14 de Novembro de 1960, que instituiu na ordem militar a revisão dos processos disciplinares, admitiu-se que tal diploma teria o carácter de experiência que sugerisse as correcções indispensáveis a integrar depois em futuro regulamento de disciplina militar.

Na verdade, bem avisado andou o legislador atribuindo ao referido diploma um carácter experimental, na medida em que a novidade do instituto de revisão dos processos disciplinares iria contemplar um grande número de militares, a maioria com idade avançada e dezenas de anos de afastamento da vida profissional, não sendo possível prever antecipadamente quais os efeitos decorrentes da sua aplicabilidade.

2. Decorridos mais de três anos sobre a vigência do referido diploma, a experiência demonstra que a sua aplicação tem levantado dificuldades insuperáveis no tocante à reintegração nas situações de reserva ou de reforma dos militares reabilitados, em particular no que respeita à promoção aos postos imediatos que lhes competiriam, se não fora a punição agora revogada. E isto porque a obrigatoriedade de satisfação de todas as condições legais de promoção, exigida pelo Decreto-Lei 43310, como condição de promoção subsequente à anulação da pena, só poderá ter aplicação prática em relação aos militares que venham a ser reintegrados no activo. Para os restantes, tal condicionamento é proibitivo em razão da idade.

3. Por outro lado, a falta de definição das consequências decorrentes da reintegração nas várias situações (activo, reserva ou reforma) dos militares reabilitados ao abrigo do Decreto-Lei 43310, já citado, em especial no que se refere à contagem do tempo perdido por efeito de sanções indevidamente aplicadas, levanta problemas cuja resolução é impeditiva por falta de base legal e que, a protelar-se, irá aumentar ainda mais os prejuízos já sofridos pelos militares reabilitados, em particular nos casos de afastamento do serviço activo ocorridos antes da vigência daquele diploma e que não puderam ser resolvidos anteriormente pela ausência do instituto de revisão dos seus processos disciplinares.

4. Finalmente, se bem que na previsão do Decreto-Lei 43310 estivessem abrangidos os processos disciplinares anteriores à sua vigência como medida de elementar justiça, dada a novidade do instituto de revisão criado, a verdade é que nada foi legislado em relação aos militares afastados do serviço activo por motivos disciplinares e reintegrados posteriormente na sua anterior situação, por se ter reconhecido a sua inocência, antes da vigência daquele decreto-lei, e cujas situações de facto são em tudo semelhantes aos reabilitados depois da vigência do mesmo diploma.

5. Dos problemas expostos nos números anteriores, que a prática demonstrou não ser possível solucionar por falta de base legal, resulta a necessidade de reestruturação do instituto de revisão dos processos de disciplina militar, criado pelo Decreto-Lei 43310, por forma a poder-se inseri-lo no novo regulamento de disciplina militar.

No entanto, não seria, porém, justo que se aguardasse a promulgação do regulamento de disciplina militar, de elaboração naturalmente morosa, para contemplar então os militares, no geral muito idosos e com muitos anos de afastamento da vida profissional, que viram agora julgados favoràvelmente os seus pedidos de revisão ou que já foram ilibados de qualquer culpa mas que não poderiam ver satisfeitas, pràticamente, as suas legítimas aspirações.

Nestes termos:

Usando da faculdade conferida pela 1.ª parte do n.º 2.º do artigo 109.º da Constituição, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:

Artigo 1.º Os processos de disciplina militar poderão ser revistos quando se verifiquem circunstâncias ou meios de prova susceptíveis de demonstrar a inocência do condenado e que não puderam ser utilizados pelo arguido no processo disciplinar.

§ 1.º A revisão deverá ser pedida no prazo de 180 dias, contados da data em que o interessado obteve a possibilidade de invocar as circunstâncias ou os meios de prova alegados como fundamento da revisão.

§ 2.º A simples alegação de ilegalidade, de forma ou de fundo, do processo e decisão disciplinar não constitui fundamento para a revisão.

§ 3.º Impossibilitando-se ou falecendo o punido, a revisão poderá ser pedida pelos seus ascendentes, descendentes, irmãos, cônjuge ou herdeiros.

§ 4.º A revisão não pode ser pedida mais que uma vez pelos mesmos fundamentos de facto.

Art. 2.º O interessado na revisão de um processo disciplinar apresentará requerimento nesse sentido ao Conselho Superior de Disciplina do Exército ou da Armada ou à Comissão Técnica da Força Aérea, conforme os casos.

§ único. O requerimento indicará as circunstâncias e todos os meios de prova não considerados no processo a rever que ao requerente pareçam justificar a revisão e deverá ser instruído com os documentos indispensáveis.

Art. 3.º Recebido o requerimento, o competente Conselho Superior de Disciplina, ou a Comissão Técnica da Força Aérea, resolverá sobre se deve ou não ser concedida a revisão do processo.

§ único. É definitiva e inatacável a decisão que não conceder a revisão.

Art. 4.º Concedida a revisão, será o respectivo processo apenso ao processo a rever, seguindo-se na instrução e julgamento os trâmites estabelecidos nos artigos 171.º a 185.º do Regulamento de Disciplina Militar que forem aplicáveis.

§ único. Serão recusados os documentos e as diligências desnecessários à descoberta da verdade, podendo ser mandado retirar os documentos que estiverem nessas condições.

Art. 5.º Se o punido estiver impossibilitado de organizar a sua defesa, em virtude de anomalia mental ou física, por motivo de doença, o Conselho Superior de Disciplina respectivo, ou a Comissão Técnica da Força Aérea, nomeará um curador, preferindo no entanto a pessoa a quem competiria a tutela no caso de interdição, segundo a ordem estabelecida nos n.os 1.º, 2.º e 3.º do artigo 320.º do Código Civil.

§ único. Esta nomeação é restrita à revisão dos processos disciplinares, podendo o curador usar de todos os meios de defesa facultados aos infractores.

Art. 6.º No julgamento, o Conselho Superior de Disciplina respectivo ou a Comissão Técnica da Força Aérea pode concluir pela inocência do condenado, ou pela sua menor culpabilidade, ou ainda pela procedência da acusação.

Art. 7.º Julgando-se procedente a revisão, será revogada, total ou parcialmente, a decisão proferida no processo revisto, consoante se concluir pela inocência do arguido ou tão-sòmente pela sua menor culpabilidade.

§ único. A revogação a que se refere este artigo produzirá os seguintes efeitos:

1.º Cancelamento do registo da pena nos documentos de matrícula do reabilitado;

2.º Anulação dos efeitos da pena e reintegração no activo, na reserva ou na reforma, consoante as condições legais para a colocação nessas situações, no posto que caberia ao reintegrado se não tivesse sido punido, observando-se, porém, as disposições contidas nos artigos 8.º a 10.º;

3.º Direito a uma indemnização, se o reabilitado a pedir, nos termos e condições a estabelecer.

Art. 8.º O militar reintegrado no activo, se, entretanto, lhe houvesse competido a promoção, reocupará o seu lugar na escala, depois de ter realizado com aproveitamento os cursos ou concursos que constituem condições especiais de promoção e desde que satisfaça a outras condições de promoção que eventualmente venham a ser exigidas em cada ramo das Forças Armadas por portaria do respectivo Ministro ou Secretário de Estado.

§ 1.º Nas promoções por escolha, o militar será colocado no lugar determinado pelo Conselho Superior do Exército, pelo Conselho Superior da Armada, ou pela Comissão Técnica da Força Aérea, conforme os casos, após ter satisfeito as condições de promoção.

§ 2.º Se não houver vacatura nos quadros, aquando da promoção do reabilitado, este ficará supranumerário sem qualquer diminuição nos seus vencimentos, até preenchimento da primeira vaga que se verifique no mesmo quadro.

Art. 9.º O militar reintegrado na reserva é dispensado de todas as condições legais de promoção, com excepção dos cursos ou concursos que constituam condições especiais de promoção a sargento, a oficial, a oficial superior e a oficial general, conforme os casos, em condições a fixar, em portaria, pelo Ministro e Secretário de Estado do respectivo departamento militar.

Art. 10.º O militar reintegrado na reforma é dispensado de todas as condições legais de promoção, mas o limito máximo dos postos em que se pode efectuar a reintegração será, conforme os casos, o de cabo ou primeiro-cabo, o de sargento-ajudante e o de capitão-de-mar-e-guerra ou coronel, salvo para os oficiais generais, cuja reintegração se fará no posto que tinham à data da punição.

§ único. O mesmo procedimento se adoptará em relação ao militar que nos termos do artigo 9.º for reintegrado na reserva, quando transitar para a reforma em razão de atingir o limite de idade.

Art. 11.º A simples substituição da pena sòmente produz efeitos a partir da data do respectivo cumprimento.

Art. 12.º São condições para poder beneficiar da reintegração prevista neste diploma:

a) Não ter sido, posteriormente ao afastamento do serviço, condenado a pena maior ou abrangido pelo disposto no artigo 78.º do Código Penal.

b) Estar integrado na ordem social estabelecida.

Art. 13.º Para todos os efeitos, incluindo o da liquidação das respectivas pensões de reserva e de reforma, será contado todo o tempo que o reintegrado permaneceu compulsivamente afastado do activo.

§ 1.º Em nenhum caso serão pagos os vencimentos ou pensões deixados de perceber.

§ 2.º Ao militar reabilitado competirá satisfazer à Caixa Geral de Aposentações o quantitativo das quotas correspondentes ao período durante o qual esteve afastado do serviço.

Art. 14.º A revisão do processo não suspende, em regra, o cumprimento da pena. Se, porém, esta for privativa da liberdade, a entidade que concedeu a revisão poderá autorizar a sua suspensão.

Art. 15.º O presente diploma é igualmente aplicável:

a) Ao militar punido e reintegrado no activo por se ter reconhecido a sua inocência, antes da vigência do Decreto-Lei 43310.

b) Ao militar que, antes de ser declarado inocente, nos termos do artigo 6.º do mesmo decreto-lei, já tenha sido reintegrado no activo mercê de outras disposições legislativas.

c) Ao militar que, antes de ser declarado inocente nos termos da disposição constante da alínea anterior, já tenha passado à situação de reforma por incapacidade de todo o serviço militar, consequente a abalo psíquico sofrido com a punição e comprovado por parecer, homologado ministerialmente, da direcção do serviço de saúde do respectivo departamento.

d) processos já revistos ou pendentes nos termos do referido decreto-lei.

§ 1.º Ao militar nas condições da alínea b) poderá ser concedida dispensa dos cursos ou concursos que constituam condições especiais de promoção, desde que, tendo boas informações, se verifique não os ter podido frequentar por ter sido atingido pelo limite de idade do seu posto, como consequência do tempo que permaneceu afastado do serviço activo, em virtude da punição posteriormente revogada, aplicando-se-lhe, porém, o disposto no artigo 10.º no que se refere aos limites máximos dos postos em que se pode efectuar a reintegração.

§ 2.º O militar nas condições da alínea c) deverá ser sujeito, prèviamente, à junta de saúde do respectivo departamento, para o efeito de saber se deve continuar na situação de reforma ou transitar para a de reserva, aplicando-se-lhe a doutrina do parágrafo anterior.

Art. 16.º Fica revogado o Decreto-Lei 43310, de 14 de Novembro de 1960.

Publique-se e cumpra-se como nele se contém.

Paços do Governo da República, 2 de Novembro de 1964. - AMÉRICO DEUS RODRIGUES THOMAZ - António de Oliveira Salazar - José Gonçalo da Cunha Sottomayor Correia de Oliveira - Manuel Gomes de Araújo - Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior - João de Matos Antunes Varela - António Manuel Pinto Barbosa - Joaquim da Luz Cunha - Fernando Quintanilha Mendonça Dias - Alberto Marciano Gorjão Franco Nogueira - Eduardo de Arantes e Oliveira - António Augusto Peixoto Correia - Inocêncio Galvão Teles - Luís Maria Teixeira Pinto - Carlos Gomes da Silva Ribeiro - José João Gonçalves de Proença - Francisco Pereira Neto de Carvalho - Francisco António das Chagas.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/1964/11/02/plain-257710.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/257710.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga ao seguinte documento (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1960-11-14 - Decreto-Lei 43310 - Presidência do Conselho - Gabinete do Ministro da Defesa Nacional

    Regula o instituto da revisão de processos de disciplina militar.

Ligações para este documento

Este documento é referido nos seguintes documentos (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1965-03-29 - Portaria 21202 - Ministério do Exército - Repartição do Gabinete do Ministro

    Fixa as condições em que deverá processar-se a reintegração e promoção no activo ou na reserva dos militares reintegrados nos termos do Decreto-Lei n.º 46001.

  • Tem documento Em vigor 1967-12-26 - Decreto-Lei 48156 - Presidência do Conselho - Secretaria de Estado da Aeronáutica

    Reorganiza o Conselho Superior da Aeronáutica e a Comissão Técnica da Força Aérea e reestrutura os órgãos componentes da Secretaria de Estado da Aeronáutica.

  • Tem documento Em vigor 1969-08-13 - Portaria 24234 - Ministério da Marinha - Gabinete do Ministro

    Regula as condições em que se processa a reintegração no activo e na reserva dos militares da Armada reabilitados ao abrigo do instituto de revisão dos processos disciplinares reestruturado pelo Decreto-Lei n.º 46001.

  • Tem documento Em vigor 1970-03-26 - Portaria 160/70 - Presidência do Conselho - Secretaria de Estado da Aeronáutica

    Regula as condições em que se processa a reintegração dos militares da Força Aérea reabilitados ao abrigo do instituto de revisão dos processos disciplinares, bem como a promoção dos mesmos aos diferentes postos.

  • Tem documento Em vigor 1971-08-11 - Decreto-Lei 346/71 - Presidência do Conselho - Defesa Nacional - Gabinete do Ministro

    Faculta a revisão dos processos aos indivíduos punidos aquando da invasão do Estado da Índia.

  • Tem documento Em vigor 1974-09-30 - Decreto-Lei 498-F/74 - Conselho dos Chefes dos Estados-Maiores das Forças Armadas

    Fixa normas relativas à reintegração nas suas funções dos militares abrangidos pelo disposto no art. 2º do Decreto-Lei nº 173/74 de 26 de Abril.

  • Tem documento Em vigor 1974-12-19 - Decreto-Lei 727/74 - Conselho dos Chefes dos Estados-Maiores das Forças Armadas

    Anula as penas impostas aos militares, em virtude dos acontecimentos ocorridos durante a invasão do Estado Português da Índia pelas forças armadas da União Indiana, em Dezembro de 1961.

  • Tem documento Em vigor 1975-06-09 - DESPACHO DD4881 - ESTADO MAIOR-GENERAL DAS FORÇAS ARMADAS

    Determina que as disposições do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 46001, de 2 de Novembro de 1964, sejam aplicáveis aos militares reintegrados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 173/74, de 26 de Abril.

  • Tem documento Em vigor 1975-06-09 - Despacho - Ministério da Agricultura e Pescas - Secretaria de Estado das Pescas

    Determina que as disposições do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 46001, de 2 de Novembro de 1964, sejam aplicáveis aos militares reintegrados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 173/74, de 26 de Abril

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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