de 31 de Dezembro
Em consonância com o estatuído no Regime Jurídico da Formação Desportiva no Quadro da Formação Profissional, estabelecido pelo Decreto-Lei 407/99, de 15 de Outubro, e com o Decreto-Lei 396/2007, de 31 de Dezembro, que estabelece o Regime Jurídico do Sistema Nacional de Qualificações e define as estruturas que asseguram o seu funcionamento, o presente decreto-lei estabelece o regime de acesso e exercício da actividade de treinador de desporto.Esta iniciativa legislativa, na sequência do que se dispôs nos artigos 35.º e 43.º da Lei 5/2007, de 16 de Janeiro - Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto -, assenta no reconhecimento de que a existência de treinadores devidamente qualificados é uma medida indispensável, não só para garantir um desenvolvimento qualitativo e quantitativo das diferentes actividades físicas e desportivas, como também para que a prática desportiva decorra na observância de regras que garantam a ética desportiva e o desenvolvimento do espírito desportivo, bem como a defesa da saúde e da segurança dos praticantes.
Incluem-se, também, no presente decreto-lei algumas matérias que se encontravam omissas no Decreto-Lei 407/99, de 15 de Outubro, designadamente aquelas relativas à fiscalização, taxas e ao regime sancionatório.
É ainda definida a correspondência dos títulos emitidos ao abrigo do já revogado Decreto-Lei 351/91, de 19 de Setembro, e os graus constantes do presente decreto-lei.
Por último, é qualificado como ilegal o exercício da actividade de treinador de desporto por quem não seja titular da cédula de treinador de desporto, prevendo-se o correspondente quadro sancionatório.
Assim:
No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido na Lei 5/2007, de 16 de Janeiro, e nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objecto
O presente decreto-lei estabelece o regime de acesso e exercício da actividade de treinador de desporto.
Artigo 2.º
Objectivos
1 - São objectivos gerais do regime de acesso e exercício da actividade de treinador de desporto:a) A promoção da ética desportiva e do desenvolvimento do espírito desportivo;
b) A defesa da saúde e da segurança dos praticantes, bem como a sua valorização a nível desportivo e pessoal, quer quando orientados para a competição desportiva quer quando orientados para a participação nas demais actividades físicas e desportivas.
2 - São objectivos específicos do regime de acesso e exercício da actividade de treinador de desporto:
a) Fomentar e favorecer a aquisição de conhecimentos gerais e específicos, que garantam competência técnica e profissional na área da intervenção desportiva;
b) Impulsionar a utilização de instrumentos técnicos e científicos, ao longo da vida, necessários à melhoria qualitativa da intervenção no sistema desportivo;
c) Promover o aperfeiçoamento qualitativo e o desenvolvimento quantitativo da prática desportiva, quer seja de iniciação desportiva, de competição ou de alto rendimento;
d) Dignificar as profissões e ocupações do desporto e fazer observar a respectiva deontologia, reforçando os valores éticos, educativos, culturais e ambientais, inerentes a uma adequada prática desportiva;
e) Contribuir para facilitar o reconhecimento, o recrutamento e a promoção de talentos com vista à optimização da prática desportiva;
f) Contribuir para o reconhecimento público da importância social do exercício da actividade e da profissão de treinador de desporto.
Artigo 3.º
Actividade de treinador de desporto
A actividade de treinador de desporto, para efeitos do presente decreto-lei, compreende o treino e a orientação competitiva de praticantes desportivos, bem como o enquadramento técnico de uma actividade física ou desportiva, exercida:a) Como profissão exclusiva ou principal, auferindo por via dela uma remuneração;
b) De forma habitual, sazonal ou ocasional, independentemente de auferir uma remuneração.
Artigo 4.º
Habilitação profissional
A actividade referida no artigo anterior apenas pode ser exercida por treinadores de desporto, qualificados nos termos do presente decreto-lei, designadamente no âmbito:a) De federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva;
b) De associações promotoras de desporto;
c) De entidades prestadoras de serviços desportivos, como tal referidas no artigo 43.º da Lei 5/2007, de 16 de Janeiro.
Artigo 5.º
Exercício da actividade de treinador de desporto
É condição de acesso ao exercício da actividade de treinador de desporto a obtenção de cédula de treinador de desporto, adiante designada por cédula.
CAPÍTULO II
Regime da cédula de treinador profissional
Artigo 6.º
Cédula de treinador de desporto
1 - A cédula pode ser obtida através de:a) Habilitação académica de nível superior ou qualificação, na área do desporto, no âmbito do sistema nacional de qualificações;
b) Experiência profissional;
c) Reconhecimento de títulos adquiridos noutros países.
2 - A emissão e renovação da cédula compete ao Instituto do Desporto de Portugal, I.
P.
3 - O modelo da cédula é definido por despacho conjunto dos membros do Governo responsáveis pelas áreas do desporto, do emprego, da formação profissional e da educação.
4 - Para efeitos da alínea a) do n.º 1, os referenciais de formação na componente tecnológica para a obtenção de uma qualificação e os requisitos para homologação dos cursos conducentes à obtenção da mesma integram o catálogo nacional de qualificações e são definidos através de despacho do presidente do Instituto do Desporto de Portugal, I. P., em articulação com a Agência Nacional para a Qualificação, I. P., publicado no Diário da República.
5 - A obtenção da cédula através da alínea b) do n.º 1 é regulada através de despacho do presidente do Instituto do Desporto de Portugal, I. P., publicado no Diário da República.
Artigo 7.º
Graus da cédula
1 - A cédula confere competências ao seu titular, nos termos dos artigos seguintes, do seguinte modo:a) Grau I;
b) Grau II;
c) Grau III;
d) Grau IV.
2 - A correspondência entre os níveis de qualificação previstos no âmbito do sistema nacional de qualificações e os graus previstos no número anterior é definida por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas do desporto, do emprego, da formação profissional e da educação.
3 - A obtenção de cédula de determinado grau confere ao seu detentor as competências previstas nos artigos seguintes para o seu grau e para os graus inferiores.
Artigo 8.º
Treinador de desporto de grau i
O grau i corresponde ao nível mais elementar do exercício da profissão, conferindo ao seu titular, tendo em vista a consolidação de valores e hábitos desportivos para a vida, competências para:a) A condução directa das actividades técnicas elementares associadas às fases iniciais da actividade ou carreira dos praticantes ou a níveis elementares de participação competitiva, sob coordenação de treinadores de desporto de grau superior;
b) A coadjuvação na condução do treino e orientação competitiva de praticantes nas etapas subsequentes de formação desportiva.
Artigo 9.º
Treinador de desporto de grau ii
O grau ii confere ao seu titular competências para:a) A condução do treino e orientação competitiva de praticantes nas etapas subsequentes de formação desportiva;
b) A coordenação e supervisão de uma equipa de treinadores de grau i ou ii, sendo responsável pela implementação de planos e ordenamentos estratégicos definidos por profissionais de grau superior;
c) O exercício, de forma autónoma, de tarefas de concepção, planeamento, condução e avaliação do processo de treino e de participação competitiva;
d) A coadjuvação de titulares de grau superior, no planeamento, condução e avaliação do treino e participação competitiva.
Artigo 10.º
Treinador de desporto de grau iii
O grau iii confere ao seu titular competências para o planeamento do exercício e avaliação do desempenho de um colectivo de treinadores detentores de grau igual ou inferior, coordenando, supervisionando, integrando e harmonizando as diferentes tarefas associadas ao treino e à participação competitiva.
Artigo 11.º
Treinador de desporto de grau iv
O grau iv confere competências no âmbito de funções de coordenação, direcção, planeamento e avaliação, cabendo-lhe as funções mais destacadas no domínio da inovação e empreendedorismo, direcção de equipas técnicas pluridisciplinares, direcções técnicas regionais e nacionais, coordenação técnica de selecções regionais e nacionais e coordenação de acções tutorais.
Artigo 12.º
Deveres de regulação das federações desportivas
1 - A cada grau correspondem etapas de desenvolvimento dos praticantes desportivos abrangidos pela actividade do treinador de desporto.
2 - A correspondência referida no número anterior é proposta, no prazo máximo de 180 dias, pelas federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva ao Instituto do Desporto de Portugal, I. P.
3 - Validada a correspondência referida no número anterior, deve a mesma ser adoptada pelos regulamentos da respectiva federação desportiva, no prazo de 90 dias, contados da data da validação.
4 - Na falta da proposta referida no n.º 2, ouvido o Conselho Nacional do Desporto, é estabelecida por despacho do presidente do Instituto do Desporto de Portugal, I. P., para cada modalidade desportiva, a correspondência referida no n.º 1.
CAPÍTULO III
Fiscalização e taxas
Artigo 13.º
Fiscalização
1 - Sem prejuízo da competência atribuída por lei às entidades competentes, as federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva devem fiscalizar o cumprimento do presente decreto-lei relativamente às respectivas modalidades desportivas.2 - As federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva em que se disputem competições desportivas de natureza profissional podem delegar nas ligas profissionais a competência referida no número anterior.
3 - As federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva devem, no prazo máximo de 180 dias após a entrada em vigor do presente decreto-lei, estabelecer nos seus regulamentos mecanismos de fiscalização do cumprimento de normas relativas à cédula.
Artigo 14.º
Taxas
1 - É devido o pagamento de taxas pelos actos relativos ao processo de emissão e renovação da cédula ao Instituto do Desporto de Portugal, I. P.2 - As taxas referidas no número anterior são fixadas por despacho do membro do Governo responsável pela área do desporto e constituem receita do Instituto do Desporto de Portugal, I. P.
CAPÍTULO IV
Regime sancionatório
Artigo 15.º
Exercício ilegal da actividade
É ilegal o exercício da actividade de treinador de desporto prevista nos artigos 8.º a 11.º por quem não seja titular da cédula.
Artigo 16.º
Cassação da cédula
O Instituto do Desporto de Portugal, I. P., procede à cassação da cédula quando verificada a falsidade de qualquer elemento comprovativo dos requisitos que conduziram à sua emissão.
Artigo 17.º
Contra-ordenações
1 - Constitui contra-ordenação, para efeitos do disposto no presente decreto-lei:a) O exercício da actividade de treinador de desporto por quem não seja titular da cédula;
b) A autorização para o treino de praticantes desportivos ou para o ensino, animação e enquadramento técnico de uma actividade física ou desportiva, a qualquer título, por parte de federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva, ligas profissionais, entidades prestadoras de serviços desportivos, associações promotoras de desporto, ou quaisquer entidades, públicas ou privadas, de quem não seja titular da cédula;
c) A contratação para o exercício da actividade de treinador de desporto de quem não seja titular da cédula pelos clubes ou sociedades anónimas desportivas que participem em competições desportivas profissionais, sob qualquer forma.
2 - A tentativa e a negligência são puníveis, sendo os limites mínimo e máximo da coima aplicada reduzidos a metade.
Artigo 18.º
Coimas
1 - As contra-ordenações previstas na alínea c) do n.º 1 do artigo anterior são punidas com coima entre (euro) 3500 e (euro) 10 000, se o infractor for uma pessoa colectiva.2 - As contra-ordenações previstas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo anterior são punidas com coima entre (euro) 2000 e (euro) 3500, se o infractor for uma pessoa singular ou colectiva.
Artigo 19.º
Determinação da medida da coima
A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico ou desportivo que este retirou da prática da contra-ordenação.
Artigo 20.º
Instrução do processo e aplicação da coima
1 - A instrução dos processos de contra-ordenação referidos no presente decreto-lei compete ao Instituto do Desporto de Portugal, I. P.
2 - A aplicação das coimas é da competência do presidente do Instituto do Desporto de Portugal, I. P.
Artigo 21.º
Produto das coimas
O produto das coimas reverte em 60 % para o Estado e em 40 % para o Instituto do Desporto de Portugal, I. P.
Artigo 22.º
Direito subsidiário
Ao processamento das contra-ordenações e à aplicação das correspondentes sanções previstas na presente lei aplica-se subsidiariamente o regime geral das contra-ordenações.
Artigo 23.º
Ilícitos disciplinares
1 - Constitui ilícito disciplinar o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 17.º, quando o infractor se encontrar inscrito em federação desportiva titular do estatuto de utilidade pública desportiva.2 - Constitui igualmente ilícito disciplinar o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º
Artigo 24.º
Aplicação de sanções disciplinares
A aplicação das sanções disciplinares previstas em regulamento disciplinar decorrentes dos ilícitos disciplinares previstos no artigo anterior está cometida às federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva ou às ligas profissionais, consoante o caso, a quem cabe igualmente a instrução dos processos disciplinares.
CAPÍTULO V
Disposições finais e transitórias
Artigo 25.º
Correspondência de títulos
1 - Os títulos emitidos ao abrigo do Decreto-Lei 351/91, de 19 de Setembro, correspondem às cédulas nos seguintes termos:a) Os certificados do curso de treinador de nível i, 4.º grau ou similar, correspondem ao grau i de treinador de desporto;
b) Os certificados do curso de treinador de nível ii, 3.º grau ou similar, correspondem ao grau ii de treinador de desporto;
c) Os certificados do curso de treinador de nível iii, 2.º grau ou similar, correspondem ao grau iii de treinador de desporto;
d) Os certificados do curso de treinador de nível iv, 1.º grau ou similar, correspondem ao grau iv de treinador de desporto.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, os titulares dos certificados devem, no prazo de um ano a contar da data de entrada em vigor do presente decreto-lei, requerer a substituição do título que detêm pela respectiva cédula.
3 - A partir da data prevista no número anterior, os títulos emitidos ao abrigo do Decreto-Lei 351/91, de 19 de Setembro, deixam de ser válidos para o exercício da actividade de treinador prevista nos artigos 8.º a 11.º do presente decreto-lei.
4 - Os candidatos que não reúnam condições para a obtenção de grau correspondente à actividade desenvolvida como treinador podem realizar formação complementar específica nos termos a definir na portaria prevista no n.º 2 do artigo 7.º
Artigo 26.º
Regime transitório
1 - Às federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva que não cumpram o disposto no artigo 12.º do presente decreto-lei aplica-se o disposto nos artigos 21.º, 22.º e 23.º do Decreto-Lei 248-B/2008, de 31 de Dezembro.2 - Os regulamentos federativos podem permitir, a título transitório e mediante autorização do Instituto do Desporto de Portugal, I. P., enquanto inexistam treinadores de desporto titulares de cédula de graus superiores, que as tarefas referidas nos artigos 9.º, 10.º e 11.º sejam exercidas por treinadores de desporto titulares de cédula de graus inferiores.
3 - Nos casos previstos no número anterior, as federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva obrigam-se a promover a formação de treinadores de desporto para que obtenham cédula dos graus em falta.
Artigo 27.º
Regime supletivo
O disposto no Decreto-Lei 407/99, de 15 de Outubro, aplica-se supletivamente à qualificação, formação e certificação dos treinadores de desporto.
Artigo 28.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor 90 dias após a data da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 7 de Novembro de 2008. - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - Fernando Teixeira dos Santos - Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira - Alberto Bernardes Costa - José António Fonseca Vieira da Silva - Maria de Lurdes Reis Rodrigues.
Promulgado em 30 de Dezembro de 2008.
Publique-se.O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendado em 30 de Dezembro de 2008.
Pelo Primeiro-Ministro, Fernando Teixeira dos Santos, Ministro de Estado e das Finanças.