de 11 de Novembro
Nacionaliza todas as acções representativas do capital social do Banco
Português de Negócios, S. A., e aprova o regime jurídico de apropriação pública
por via de nacionalização.
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
Regime jurídico de apropriação pública
É aprovado em anexo à presente lei, da qual faz parte integrante, o regime jurídico de apropriação pública por via de nacionalização, em execução do disposto no artigo 83.º da Constituição.
Artigo 2.º
Nacionalização do Banco Português de Negócios, S. A.
1 - Verificados o volume de perdas acumuladas pelo Banco Português de Negócios, S.
A., doravante designado por BPN, a ausência de liquidez adequada e a iminência de uma situação de ruptura de pagamentos que ameaçam os interesses dos depositantes e a estabilidade do sistema financeiro e apurada a inviabilidade ou inadequação de meio menos restritivo apto a salvaguardar o interesse público, são nacionalizadas todas as acções representativas do capital social do BPN.
2 - Ao acto de nacionalização previsto no número anterior aplica-se o disposto nos números seguintes, bem como, em tudo o que não esteja disposto de forma especial neste artigo, o regime constante do anexo à presente lei.
3 - Por efeito do disposto no n.º 1 e independentemente de quaisquer formalidades, consideram-se transmitidas para o Estado, através da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças, todas as acções representativas do capital social do BPN, livres de quaisquer ónus ou encargos, para todos os efeitos legais.
4 - A alteração na titularidade das acções produz os seus efeitos directamente por força da presente lei e é oponível a terceiros independentemente de registo.
5 - O BPN passa a ter a natureza de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, continuando a reger-se pelas disposições legais que regulam a respectiva actividade, bem como pelos seus estatutos, na medida em que os mesmos não contrariem o disposto no regime jurídico do sector empresarial do Estado e na presente lei.
6 - A gestão do BPN é atribuída, pela presente lei, à Caixa Geral de Depósitos, S. A., cabendo a esta entidade proceder à designação dos membros dos órgãos sociais daquele.
7 - Cabe à Caixa Geral de Depósitos, S. A., proceder, no prazo de 60 dias, à definição dos objectivos de gestão do BPN, acautelando, designadamente, os interesses dos depositantes, os interesses patrimoniais do Estado e dos contribuintes e a defesa dos direitos dos trabalhadores.
8 - Os objectivos previstos no número anterior são objecto de aprovação prévia pelo membro do Governo responsável pela área das finanças.
9 - As operações de crédito ou de assistência de liquidez que sejam realizadas pela Caixa Geral de Depósitos, S. A., a favor do BPN no contexto da nacionalização e em substituição do Estado, até à data da aprovação dos objectivos de gestão previstos no n.º 7, beneficiam de garantia pessoal do Estado por força da presente lei.
10 - O disposto no número anterior não prejudica a observância do limite máximo legalmente estabelecido para a prestação de garantias pessoais do Estado, cabendo ao ministro responsável pela área das finanças assegurar o respectivo cumprimento.
11 - Pode o despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças que fixar o valor da indemnização determinar a resolução em benefício da massa patrimonial, com as necessárias adaptações, dos actos considerados prejudiciais, nos termos do capítulo v do título iv do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei 53/2004, de 18 de Março.
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Aprovada em 5 de Novembro de 2008.
O Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.
Promulgada em 11 de Novembro de 2008.
Publique-se.O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendada em 11 de Novembro de 2008.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
ANEXO
(a que se refere o artigo 1.º)
Artigo 1.º
Finalidade
Podem ser objecto de apropriação pública, por via de nacionalização, no todo ou em parte, participações sociais de pessoas colectivas privadas, quando, por motivos excepcionais e especialmente fundamentados, tal se revele necessário para salvaguardar o interesse público.
Artigo 2.º
Acto de nacionalização
1 - Os actos de apropriação pública, por via de nacionalização, revestem a forma de decreto-lei, nos termos do presente regime.2 - O decreto-lei referido no número anterior evidencia sempre o reconhecimento do interesse público subjacente ao acto de nacionalização, com a observância dos princípios da proporcionalidade, da igualdade e da concorrência.
Artigo 3.º
Procedimento
1 - No decreto-lei referido no artigo anterior devem constar todos os elementos e as condições das operações a realizar e, em caso de nacionalização parcial, a identificação das participações sociais a nacionalizar.2 - No caso de as participações sociais nacionalizadas pertencerem a pessoa colectiva admitida à negociação em mercados regulamentados, deve a entidade gestora do respectivo mercado proceder à suspensão da negociação da totalidade das acções da pessoa colectiva, a partir do momento do anúncio público da nacionalização, por forma a acautelar os interesses dos investidores e o regular funcionamento do mercado.
Artigo 4.º
Indemnização
1 - Aos titulares das participações sociais da pessoa colectiva, bem como aos eventuais titulares de ónus ou encargos constituídos sobre as mesmas, é reconhecido o direito a indemnização, quando devida, tendo por referência o valor dos respectivos direitos, avaliados à luz da situação patrimonial e financeira da pessoa colectiva à data da entrada em vigor do acto de nacionalização.2 - No cálculo da indemnização a atribuir aos titulares das participações sociais nacionalizadas, o valor dos respectivos direitos é apurado tendo em conta o efectivo património líquido.
Artigo 5.º
Avaliação
1 - Para os efeitos previstos no artigo anterior, o Governo promove a realização de uma avaliação a efectuar, pelo menos, por duas entidades independentes, designadas por despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças.2 - A avaliação prevista no número anterior deve estar concluída no prazo de 30 dias, prorrogável por igual período por pedido devidamente justificado pelas entidades avaliadoras.
3 - Com base na avaliação a que se refere o número anterior, o membro do Governo responsável pela área das finanças fixa, por despacho, no prazo de 15 dias, o valor da indemnização, após audição prévia dos representantes dos anteriores titulares das participações sociais, se como tal estiverem constituídos.
4 - Quando tal estiver expressamente previsto no diploma de nacionalização, pode o despacho referido no número anterior determinar a resolução em benefício da massa patrimonial, com as necessárias adaptações, dos actos considerados prejudiciais, no termos do capítulo v do título iv do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei 53/2004, de 18 de Março.
5 - O direito ao pagamento da indemnização suspende-se enquanto estiverem em curso, contra os anteriores titulares, directos ou indirectos, das participações sociais, processos judiciais ou inquéritos, por indícios de práticas lesivas dos interesses patrimoniais da pessoa colectiva e até decisão judicial com trânsito em julgado, da qual não resulte a sua condenação.
Artigo 6.º
Transmissão das participações sociais para o Estado
1 - Consideram-se transmitidas para o Estado, para todos os efeitos legais e independentemente de quaisquer formalidades, as participações sociais abrangidas pela nacionalização aprovada pelo decreto-lei referido no artigo 2.º, livres de ónus e encargos.
2 - A alteração na titularidade das participações sociais produz os seus efeitos directamente por força do decreto-lei previsto no artigo 2.º, e é oponível a terceiros independentemente de registo.
3 - O disposto no n.º 1 não impede a eventual e posterior transferência das participações sociais para sociedade cujo capital seja integralmente detido, directa ou indirectamente, pelo Estado.
Artigo 7.º
Manutenção da personalidade jurídica e da natureza jurídica
1 - A nacionalização das participações sociais de uma pessoa colectiva nos termos previstos no presente regime não extingue a respectiva personalidade jurídica, nem altera a respectiva natureza jurídica.
2 - O disposto no número anterior não prejudica eventuais decisões subsequentes de fusão da pessoa colectiva.
Artigo 8.º
Direitos e obrigações
1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior, mantém-se na titularidade da pessoa colectiva a universalidade de bens, direitos e obrigações, legais ou contratuais, de que esta seja titular à data da nacionalização, designadamente os emergentes dos contratos de trabalho em que a pessoa colectiva seja parte, respeitando-se integralmente os direitos dos trabalhadores.2 - A pessoa colectiva continua a exercer todas as funções que lhe estejam cometidas por força de lei, de contrato ou dos seus estatutos.
Artigo 9.º
Dissolução dos órgãos sociais
1 - No caso em que a nacionalização abranja a totalidade ou a maioria das participações sociais, consideram-se dissolvidos, com efeitos imediatos, os órgãos sociais da pessoa colectiva em causa e das sociedades que com esta se encontrem em relação de domínio ou de grupo.
2 - Os membros cessantes dos órgãos sociais mantêm-se em funções até serem designados novos membros e ficam obrigados a prestar aos seus sucessores todas as informações e esclarecimentos necessários para o normal exercício das respectivas funções.
3 - Salvo se procedimento diverso resultar da aplicação de regime especial de supervisão, os membros cessantes dos órgãos de administração da pessoa colectiva e das sociedades referidas no n.º 1 não podem praticar quaisquer actos ou celebrar contratos susceptíveis de alterar a situação patrimonial da pessoa colectiva que não se reconduzam à sua gestão corrente, sob pena de nulidade dos actos e contratos em causa e da responsabilidade pessoal pelos danos resultantes daqueles.
4 - A limitação prevista no número anterior estende-se aos actos de execução de decisões tomadas antes da dissolução dos órgãos sociais.
5 - A dissolução a que se refere o n.º 1 não confere direito a qualquer indemnização, não obstante disposição contratual em contrário.
Artigo 10.º
Designação de membros para os órgãos de administração ou de fiscalização
Em caso de nacionalização parcial, o Estado pode proceder à designação de um ou mais membros para os órgãos de administração ou de fiscalização da pessoa colectiva, sem necessidade de observância do limite estatutário à composição daqueles órgãos.
Artigo 11.º
Mandato e objectivos de gestão
1 - A gestão da pessoa colectiva cujas participações sociais tenham sido nacionalizadas pode ser atribuída a entidade terceira de natureza pública, nos termos e condições definidos em despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças, cabendo a esta entidade a designação dos membros dos órgãos sociais da pessoa colectiva.2 - Pode ainda ser atribuída à entidade terceira referida no número anterior, a definição dos objectivos de gestão da pessoa colectiva, mediante prévia aprovação pelo membro do Governo responsável pela área das finanças.
3 - Quando a entidade terceira seja uma empresa pública, não são aplicáveis aos membros dos respectivos órgãos sociais ou aos membros de entidades que com esta se encontrem em relação de domínio ou de grupo, que sejam designados nos termos do n.º 1, as restrições ao exercício de funções previstas no capítulo iv do Estatuto do Gestor Público.
Artigo 12.º
Transformação em empresa pública
1 - Sempre que da nacionalização resulte a aplicação de alguma das circunstâncias previstas no n.º 1 do artigo 3.º do regime do sector empresarial do Estado, aprovado pelo Decreto-Lei 558/99, de 17 de Dezembro, alterado pelo Decreto-Lei 300/2007, de 23 de Agosto, a pessoa colectiva é transformada em sociedade anónima de capitais públicos.2 - Na situação prevista no número anterior, o Governo aprova, por decreto-lei, no prazo de 30 dias, os novos estatutos da pessoa colectiva.
Artigo 13.º
Atribuição de competências
São atribuídos ao ministro responsável pela área das finanças, com faculdade de delegação, os poderes bastantes para, por despacho, determinar as demais condições acessórias que se afigurem convenientes e para praticar os actos de execução que se revelarem necessários à concretização da operação de nacionalização prevista no presente regime.
Artigo 14.º
Efeitos do reconhecimento do interesse público
O reconhecimento do interesse público tal como previsto no decreto-lei a que se refere o artigo 2.º dispensa a adopção da resolução fundamentada a que se refere o n.º 1 do artigo 128.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos para que a eventual impugnação de quaisquer actos ou normas adoptados em execução do disposto no presente regime não produza efeitos suspensivos.
Artigo 15.º
Sector social e cooperativo
O presente regime aplica-se, com as necessárias adaptações, ao sector social e cooperativo.