de 5 de Janeiro
A Lei 62-A/2008, de 11 de Novembro, nacionalizou a totalidade das acções representativas do capital social do BPN - Banco Português de Negócios, S. A. (BPN, S. A.), atendendo, designadamente, à situação de ruptura iminente de pagamentos com significativos riscos para a estabilidade do sistema financeiro português.Assim, a nacionalização teve como objectivo, face à inexistência de alternativas viáveis, evitar que o colapso de uma entidade bancária de dimensão relevante pudesse, no momento de grave crise financeira mundial que então se vivia, provocar um efeito de contágio a outras instituições financeiras, com graves consequências para a economia, bem como preservar os interesses dos depositantes, salvaguardando o interesse público. Por outro lado, a nacionalização permitiu, também, contrariar práticas de gestão potencialmente lesivas dos clientes, das empresas e da credibilidade do sistema financeiro, bem como assegurar uma total cooperação com as autoridades judiciárias competentes para investigar as questões criminais suscitadas pela gestão anterior da instituição.
Um ano volvido desde a data da nacionalização, durante o qual a gestão do BPN, S.
A., foi atribuída à Caixa Geral de Depósitos, S. A., não existem razões para a sua manutenção na esfera pública e, estando salvaguardados os referidos interesses, importa agora dispor sobre o futuro da instituição, prevendo o regime da sua alienação ao sector privado, com base na prévia avaliação da empresa a reprivatizar.
Não obstante não estar em causa uma nacionalização anterior à entrada em vigor da Lei 11/90, de 5 de Abril (Lei Quadro das reprivatizações das empresas directamente nacionalizadas após o 25 de Abril de 1974), nem uma nacionalização que tenha decorrido entre o 25 de Abril de 1974 e a adopção da Constituição de 1976, considera-se mais adequada a aplicação da referida lei, que corresponde, numa perspectiva constitucional, ao enquadramento mais exigente nesta matéria, oferecendo garantias acrescidas no plano do rigor e da transparência do respectivo processo.
Nestes termos, foi escolhido o procedimento de alienação por concurso público, não só porque é o que promove a participação dos potenciais interessados na aquisição das acções representativas do capital social do BPN, S. A., mas também porque garante a necessária transparência na escolha do adquirente.
A modalidade de concurso público é aberta a instituições de crédito, empresas de seguros ou a sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) por estas detidas ou que as detenham, para permitir a integração do BPN, S. A., num grupo financeiro que possa dotá-lo da solidez necessária e continuar a assegurar a protecção dos interesses que presidiram à sua nacionalização.
Foi reservada uma parcela de acções representativas do capital social do BPN, S. A., para venda aos trabalhadores, em condições preferenciais, nos termos legalmente exigidos, uma vez que é um direito que assiste aos trabalhadores, independentemente da forma ou modalidade escolhida para o processo de reprivatização.
O objectivo da venda por concurso público, no sentido, já enunciado, de integrar o BPN, S. A., num grupo financeiro sólido, determinou, também, a possibilidade de o concorrente vencedor adquirir posteriormente as acções colocadas no âmbito da reserva destinada aos trabalhadores, acautelando integralmente os direitos e benefícios que a estes assistem.
Foi ouvida a Comissão de Acompanhamento das Reprivatizações.
Assim:
No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei 11/90, de 5 de Abril, e nos termos das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
1 - É aprovada a operação de reprivatização do BPN - Banco Português de Negócios, S. A., adiante designado por BPN, a qual é regulada pelo presente decreto-lei e pelas resoluções do Conselho de Ministros que estabeleçam as condições finais e concretas das operações necessárias à sua execução.
2 - Na operação referida no número anterior, são alienadas todas as acções representativas do capital social do BPN, detidas directamente pelo Estado através da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças.
Artigo 2.º
Processo e modalidades de reprivatização
1 - A operação de reprivatização do BPN consiste na alienação da totalidade das acções representativas do capital social do BPN.
2 - A operação de reprivatização do BPN é realizada directamente pelo Estado através da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças e concretiza-se mediante as modalidades de concurso público e de oferta de venda destinada exclusivamente a trabalhadores do grupo BPN, nos termos dos artigos seguintes.
3 - A operação de reprivatização deve assegurar, em conformidade com as orientações estratégicas para o BPN, a integral preservação do interesse patrimonial do Estado e dos interesses dos contribuintes, dos trabalhadores e dos depositantes.
Artigo 3.º
Concurso público
1 - Os concorrentes podem apresentar-se a concurso individualmente ou em agrupamento, devendo as propostas de compra ser apresentadas para 95 % das acções representativas do capital social do BPN, não podendo qualquer entidade adquirir mais do que esta percentagem do capital social do BPN, salvo por efeito do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo seguinte.2 - No caso de os concorrentes se apresentarem em agrupamento, devem indicar, na respectiva proposta, a participação de cada um no número de acções a adquirir, no âmbito do concurso público.
3 - Só são admitidas a concurso instituições de crédito e empresas de seguros, ou sociedades gestoras de participações sociais que as detenham ou sejam detidas a 100 % por aquelas empresas, constituindo obrigatoriamente condições exigidas aos candidatos a adquirentes no concurso, entre outras a fixar no caderno de encargos:
a) A sua experiência de gestão na actividade bancária;
b) A sua dimensão e solidez financeira dos mesmos;
c) A sua capacidade para apoiar o BPN na expansão e na reestruturação financeira, devidamente sustentadas, das suas actividades em termos que contribuam para a consolidação e desenvolvimento do sector financeiro e, paralelamente, para a manutenção de uma concorrência efectiva e equilibrada nesse sector; e d) A sua capacidade para assegurar, em termos compatíveis com a procura e a gestão sã e prudente da instituição, o emprego e o crédito à economia, nomeadamente às pequenas e médias empresas.
4 - Caso os concorrentes se apresentem a concurso em agrupamento, os requisitos previstos no número anterior devem verificar-se necessariamente em relação ao membro que se obriga a adquirir e a manter as acções representativas de, pelo menos, 51 % do capital do Banco, nos termos referidos no n.º 2 do artigo 5.º 5 - Em relação aos demais membros do agrupamento, a resolução do Conselho de Ministros que estabeleça as condições finais e concretas das operações necessárias à reprivatização deve definir, designadamente em função de participação qualificada no Banco que pretendam adquirir, os requisitos a observar.
Artigo 4.º
Oferta de venda reservada a trabalhadores
1 - Das acções a reprivatizar, um lote de acções representativo de 5 % do capital social do BPN é reservado para aquisição por trabalhadores do BPN ou por trabalhadores do grupo de sociedades detidas por este, através de uma oferta de venda em condições preferenciais relativamente às do concurso público.
2 - Para os efeitos do número anterior, são considerados trabalhadores as pessoas que, nos termos do artigo 12.º da Lei 11/90, de 5 de Abril, estejam ou tenham estado ao serviço das referidas sociedades por mais de três anos, excluindo as que tenham sido despedidas em consequência de processo disciplinar e as que, tendo passado a trabalhar noutras empresas com o mesmo objecto social daquelas, o respectivo contrato de trabalho tenha cessado por sua iniciativa.
3 - O vencedor do concurso previsto no artigo anterior obriga-se a adquirir as acções representativas do capital social do BPN não abrangidas pela reserva referida no presente artigo, bem como as acções não colocadas no âmbito da mesma.
4 - A existência deste lote de acções destinado a trabalhadores não prejudica a aplicação, por opção do concorrente vencedor do concurso público previsto no artigo anterior, do disposto no artigo 490.º do Código das Sociedades Comerciais, desde que:
a) A intenção de exercer esta opção esteja prevista na proposta apresentada pelo concorrente, no âmbito do concurso público;
b) A opção seja exercida dentro do prazo de três meses subsequentes à data da adjudicação das acções em resultado do concurso público;
c) Seja dada ao trabalhador a possibilidade de escolher entre receber em numerário o montante equivalente ao preço final pago pelo concorrente no concurso público, ou receber títulos representativos do capital da entidade concorrente que venceu o concurso público por troca das acções do BPN que adquiriu, tendo como referência o preço final das acções do BPN no concurso público.
Artigo 5.º
Indisponibilidade das acções adquiridas por concurso público
1 - Sem prejuízo das demais condições a fixar no caderno de encargos, as acções correspondentes a 51 % do capital social do BPN adquiridas no âmbito do concurso público são indisponíveis por um prazo de cinco anos.
2 - Os agrupamentos concorrentes devem identificar os membros responsáveis pelo cumprimento da regra de indisponibilidade e, em relação a cada um, a quantidade de acções a sujeitar a esse regime de indisponibilidade, bem como o membro que se obriga a adquirir e manter acções representativas de, pelo menos, 51 % do capital social do Banco.
3 - O prazo previsto no n.º 1 conta-se a partir da data de publicação da resolução do Conselho de Ministros que determine o vencedor do concurso.
4 - As acções sujeitas ao regime de indisponibilidade não podem ser objecto de negócios jurídicos que visem a transmissão da respectiva titularidade, ainda que com eficácia futura.
5 - Não podem ser celebrados negócios pelos quais o titular das acções sujeitas ao regime de indisponibilidade se obrigue a exercer os direitos de voto inerentes às acções em determinado sentido.
6 - São nulos os negócios jurídicos celebrados em violação dos números anteriores.
7 - O disposto nos números anteriores não prejudica a eventual fusão, incorporação ou reestruturação do BPN no grupo adquirente.
Artigo 6.º
Indisponibilidade das acções adquiridas por trabalhadores
1 - São indisponíveis por um prazo de um mês as acções adquiridas no âmbito da oferta pública de venda a que se refere o artigo 4.º, sem prejuízo do disposto no seu n.º 4.
2 - O referido prazo de indisponibilidade contar-se-á a partir do dia de realização da sessão especial de bolsa destinada a apurar os resultados da oferta.
3 - Durante o prazo de indisponibilidade, as referidas acções não podem ser oneradas nem objecto de negócios jurídicos que visem a transmissão da respectiva titularidade, ainda que com eficácia futura.
4 - São nulos os negócios jurídicos celebrados em violação do número anterior.
5 - Os direitos de voto inerentes a acções adquiridas por trabalhadores no âmbito da oferta pública de venda não podem ser exercidos, durante o prazo de indisponibilidade, por interposta pessoa.
6 - São nulos os negócios jurídicos pelos quais os trabalhadores se obriguem a exercer, durante o prazo de indisponibilidade, os direitos de voto inerentes às acções adquiridas no âmbito da oferta pública de venda em determinado sentido.
Artigo 7.º
Regulamentação da reprivatização
1 - As condições finais e concretas das operações necessárias à realização da reprivatização do BPN são estabelecidas pelo Conselho de Ministros, mediante a aprovação das resoluções necessárias.2 - Nas resoluções referidas no número anterior deve o Conselho de Ministros, nomeadamente e nos termos previstos no presente decreto-lei:
a) Fixar a quantidade de acções a alienar através de cada uma das modalidades previstas no n.º 2 do artigo 2.º, designadamente determinar a quantidade de acções reservadas para aquisição por trabalhadores do BPN;
b) Determinar os critérios e modos de fixação do preço de venda aos trabalhadores;
c) Estabelecer as quantidades mínimas e máximas individuais bem como os critérios de rateio para a venda a trabalhadores;
d) Aprovar o programa do concurso público, estabelecendo as fases desse concurso;
e) Aprovar o caderno de encargos que estabeleça as condições específicas a que deve obedecer o concurso público previsto no n.º 2 do artigo 2.º, incluindo, em especial, a quantidade total de acções a alienar através desta modalidade e o modo de fixação do preço base de licitação do mesmo, tendo por referência o valor resultante da avaliação da empresa a reprivatizar;
f) Fixar os critérios de pré-selecção dos candidatos, se for o caso, e de avaliação das propostas.
Artigo 8.º
Avaliação da empresa
Para efeitos da determinação do preço base de licitação no concurso público, compete ao conselho de administração do BPN propor ao Ministro de Estado e das Finanças o valor da empresa a reprivatizar, com base em avaliação efectuada por duas entidades independentes.
Artigo 9.º
Delegação de competências
São delegados no Ministro de Estado e das Finanças, com faculdade de subdelegação no Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, os poderes bastantes para determinar as demais condições acessórias que se afigurem convenientes e para praticar os actos de execução que se revelarem necessários à concretização da operação de reprivatização prevista no presente decreto-lei.
Artigo 10.º
Convocatória da assembleia geral
No prazo de 30 dias, contados da data de publicação da resolução do Conselho de Ministros que determine o vencedor do concurso referido no n.º 1 do artigo 2.º, o conselho de administração do BPN requer a convocação da assembleia geral, para se reunir no prazo mínimo previsto na lei, a fim de serem eleitos os membros dos órgãos sociais.
Isenções de taxas e emolumentos
Estão isentos de quaisquer taxas e emolumentos todos os actos realizados em execução do disposto do presente decreto-lei.
Artigo 12.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 19 de Novembro de 2009. - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - Fernando Teixeira dos Santos.
Promulgado em 30 de Dezembro de 2009.
Publique-se.O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendado em 4 de Janeiro de 2010.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.