Clínica Internacional de Campo de Ourique
Pub

Outros Sites

Visite os nossos laboratórios, onde desenvolvemos pequenas aplicações que podem ser úteis:


Simulador de Parlamento


Desvalorização da Moeda

Acórdão 448/2005/T, de 24 de Outubro

Partilhar:

Texto do documento

Acórdão 448/2005/T. Const. - Processo 702/2005. - Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:

1 - A fl. 5113, foi proferido pelo juiz do Tribunal Judicial de Celorico da Beira o despacho previsto no n.º 2 do artigo 25.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, aprovada pela Lei Orgânica 1/2001, de 14 de Agosto, no processo relativo à apresentação de candidaturas às eleições autárquicas a realizar no próximo dia 9 de Outubro para o concelho de Celorico da Beira.

Notificado deste despacho, e apenas para o que agora interessa, o mandatário do Partido Socialista veio, a fl. 5147, impugnar a elegibilidade de Carlos Morgado Portugal, cabeça-de-lista de candidatos à Assembleia de Freguesia de Cortiçô da Serra apresentada pelo Partido Social Democrata, porque "desempenha, ou é titular, do cargo de chefe de divisão no município de Celorico da Beira, encontrando-se destacado no município de Almeida" [alínea d) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei Eleitoral].

E veio ainda, a fl. 5148, impugnar a elegibilidade de Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, cabeça-de-lista de candidatos à Assembleia de Freguesia de Açores apresentada pelo Partido Social Democrata, alegando que o referido candidato "desempenha funções de chefia da Empresa Municipal Celoricense (EMCEL), [...] cujo capital social é detido a 100% pela Câmara Municipal de Celorico da Beira", e que não suspendeu o respectivo exercício [mesma alínea d) do n.º 1 do artigo 7.º].

Pelo despacho de 25 de Agosto, a fl. 5225, foram desatendidas ambas as impugnações.

Relativamente à elegibilidade de Carlos Morgado Portugal, o Tribunal entendeu o seguinte:

"[E]xistem já elementos nos autos que permitem afirmar que o dito candidato exerce funções de director do Departamento Administrativo e Financeiro na Câmara Municipal de Almeida, desde 20 de Novembro de 2001, em regime de comissão de serviço.

O artigo 7.º, n.os 1 e 2, da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, prevê inelegibilidades meramente locais ou territoriais (na terminologia de Maria de Fátima Mendes e Jorge Miguéis, in Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, Anotada e Comentada, 2001, p. 15), que poderemos denominar como inelegibilidades relativas por contraponto com as absolutas (previstas no artigo 6.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais).

Se, nestes casos, a capacidade eleitoral passiva se encontra absolutamente coarctada, não podendo nenhuma das pessoas aí previstas constituir-se como candidatos a qualquer dos órgãos autárquicos, na norma seguinte está em causa um conjunto de indivíduos cuja incapacidade eleitoral passiva é delimitada por um critério territorial: só não serão elegíveis para os órgãos das autarquias locais dos círculos eleitorais onde exercem funções ou jurisdição.

Cada círculo eleitoral identifica-se com o território de cada autarquia local, sendo distintos os círculos eleitorais de Almeida e de Celorico da Beira.

Assim, aparentemente, não se verificariam os fundamentos de inelegibilidade do candidato.

Sustenta, contudo, o Partido Socialista - PS que, atenta a transitoriedade do destacamento, deverá ser aplicado o regime da inelegibilidade.

Por ter especial interesse, passa-se a transcrever parte do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 700/97, in http://www.tribunalconstitucional.pt:

"A questão do âmbito de aplicação do conceito de 'funcionário de órgão representativo da freguesia ou do município' põe-se especialmente nos casos em que se pode dizer que tal funcionário exerce a sua actividade em alguma outra entidade pública, a cujo serviço se encontra adstrito por requisição, mediante licença sem vencimento de longa duração ou em comissão de serviço, por exemplo, ou de cujos órgãos é titular. Deve então, para os fins da inelegibilidade da alínea c) do artigo 4.º, prevalecer o vínculo originário à autarquia ou o novo vínculo funcional a que se encontra adstrito? Posta assim a questão, a jurisprudência maioritária do Tribunal tem sobretudo atendido à força relativa de cada um dos vínculos, como resulta do especial regime da dupla vinculação.

[...]

O regime da comissão de serviço tem, entre outras, as seguintes características, definidas no Decreto-Lei 323/89, de 26 de Setembro, modificado pelos Decretos-Leis 34/93, de 13 de Fevereiro e 239/94, de 22 de Setembro, e pela Lei 13/97, de 23 de Maio: o provimento é feito por um período de três anos renováveis por iguais períodos (artigo 5.º, n.º 1); a comissão de serviço suspende-se no caso de exercício, entre outros, do cargo de presidente da câmara municipal, suspende-se igualmente a contagem do prazo da comissão, embora o período de suspensão conte, para todos os efeitos legais, como tempo de serviço prestado no cargo dirigente de origem [isto é, na comissão de serviço] [artigo 6.º, n.os 1, alínea c), 2 e 3]; o tempo de serviço em cargos dirigentes conta, para todos os efeitos legais, designadamente para promoção, progressão na carreira e categoria em que cada funcionário se encontra integrado (artigo 18.º, n.º 1, na redacção do Decreto-Lei 34/93); os funcionários nomeados para cargos dirigentes têm direito, finda a comissão de serviço, ainda que seguida de nova nomeação, ao provimento em categoria superior à que possuíam à data da nomeação para dirigente, a atribuir em função do número de anos de exercício continuado nestas funções, criando-se nos quadros de pessoal dos serviços ou organismos de origem os lugares necessários para tanto (artigo 18.º, n.os 2 e 6, na redacção do Decreto-Lei 34/93); e isto mesmo sem prejuízo do direito de se candidatarem aos concursos de acesso que ocorrerem na pendência da respectiva comissão de serviço (artigo 18.º, n.º 5, na redacção do Decreto-Lei 34/93).

[...] Por outro lado, se regressar ao serviço autárquico de origem (a comissão de serviço não é necessariamente limitada no tempo, ao contrário da requisição, podendo renovar-se indefinidamente), fá-lo-á para um novo lugar criado especialmente ex novo, em categoria superior à que possuía à data da nomeação para dirigente em comissão de serviço, a atribuir em função do número de anos de exercício continuado nestas funções, agrupados de harmonia com os módulos de promoção da carreira e em escalão a determinar, nos termos do Decreto-Lei 533-A/89, de 16 de Outubro [artigo 18.º, n.º 2, alínea a), do Decreto-lei 323/89, na redacção do Decreto-Lei 34/93].

Valem, portanto, no essencial as razões que já levaram a maioria do Tribunal a considerar que na hipótese de licença sem vencimento de longa duração não se preenche o conceito da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º

Tanto mais assim quanto a doutrina maioritária se tem apoiado na do Acórdão 244/85 (Acórdãos ..., n.º 6, pp. 211 e segs.; conforme nomeadamente a remissão do Acórdão 537/85, Acórdãos ..., n.º 14, p. 398): a razão pela qual o legislador estabelece a inelegibilidade consignada na alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º é 'evitar qualquer confusão - e antes garantir uma clara separação - entre o nível, que se poderá dizer ainda político da tomada das deliberações e decisões autárquicas e o nível puramente administrativo da sua execução' (Acórdãos ..., n.º 6, p. 222). Essa separação está garantida, desde logo, pela suspensão da comissão de serviço, que se exerce fora da autarquia, como consequência da eleição para presidente da câmara, e pelo reingresso na mesma comissão e no mesmo cargo não autárquico, quando findar o exercício do cargo electivo, pelo que não se justifica inelegibilidade.

Pode, decerto questionar-se se a faculdade de os funcionários que exerçam funções dirigentes em comissão de serviço se candidatarem aos concursos de acesso que ocorrerem na pendência da respectiva comissão de serviço não implica precisamente a confusão entre as funções políticas e as executivas que se pretende evitar com a inelegibilidade. O candidato A., se eleito presidente da Câmara, poderia concorrer aos concursos de acesso que ocorressem na mesma Câmara Municipal. É certo, mas não poderia integrar nem nomear o respectivo júri, sendo interessado directo no concurso, como acontece com o funcionário nomeado pessoal dirigente do mesmo Ministério (artigos 44.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo). Não estaria, assim, em causa a independência e isenção no exercício do cargo electivo.

Ainda que se entenda que a independência e a isenção do exercício do cargo electivo admitem, na sequência do Acórdão 244/85, inelegibilidades destinadas assegurar que o exercício referido daquele cargo se processe separado do interesse na gestão dos lugares do cargo da autarquia, haverá que reconhecer que tal interesse, na hipótese configurada pelo caso presente, não tem consistência suficiente para justificar a inelegibilidade, no contexto dos outros aspectos referidos no regime da comissão de serviço e da situação que se verifica na comissão de serviço do recorrente.

Também não se diga que estaria, assim, descoberto o meio de evitar a inelegibilidade. O funcionário da autarquia só teria de conseguir ser nomeado para lugar dirigente em comissão de serviço. O mesmo vale para a licença sem vencimento de longa duração ou para a exoneração. Haverá, porventura desvio de poder ou até crime de abuso de poder (artigo 382.º do Código Penal) da autoridade que, para fins de política autárquica, nomear em comissão de serviço, autorizar a licença ou nomear o beneficiário dela para outro lugar, conceder ou recusar a exoneração. Mas só é desejável que os melhores funcionários autárquicos possam ser eleitos para cargos políticos, se afastarem, licitamente, é claro, os obstáculos legais à elegibilidade."

Após esta prolongada transcrição, não se justificam outras considerações, antes se considerando ultrapassadas as dúvidas suscitadas a propósito da candidatura de Carlos Morgado Portugal, que se julga regular e válida, indeferindo a impugnação formulada pelo Partido Socialista - PS."

Quanto a Carlos Alberto Gonçalves da Silva Patrocínio, a impugnação foi igualmente desatendida porque "o impugnante não apresentou qualquer prova relativamente aos factos invocados, sendo a ele que compete essa prova, dado inexistir qualquer derrogação, nesta matéria, ao regime geral".

Foram, assim, admitidas ambas as candidaturas.

2 - De fl. 5274 e fl. 5277, o mandatário do Partido Socialista veio reclamar do despacho acabado de transcrever, no que toca à decisão de admissão das candidaturas, respectivamente, de Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio e de Carlos Morgado Portugal.

Quanto ao primeiro, sustentou, em síntese, ser do "domínio público" que exerce as funções que descreveu, que tentou obter "documentos relativos" à sua candidatura, sem êxito, e que "o processo eleitoral em causa não se compadece com delongas e negas da Câmara Municipal, razão pela qual não se juntaram os elementos de prova".

Quanto a Carlos Morgado Portugal, sustentou que "o candidato em análise quando quiser, ou mesmo sem o querer, após decorrido o acto eleitoral e na hipótese de ser eleito, cessa de certeza funções no município de Almeida e virá ocupar o lugar que desempenha na Câmara Municipal de Celorico da Beira".

3 - O PPD/PSD respondeu à reclamação a fl. 5287, pronunciando-se no sentido do seu indeferimento. Juntou, como doc. 1., uma declaração do presidente do conselho de administração da EMCEL na qual se afirma que Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio é funcionário da empresa com a categoria de subchefe de estação (fl. 5289).

Em 2 de Setembro, a fl. 5297, foram indeferidas as reclamações, "mantendo-se, em consequência, as decisões de admissão das candidaturas de Carlos Alberto Gonçalves da Silva Patrocínio [...], Carlos Morgado Portugal [...]".

Para o que agora interessa, o Tribunal entendeu, quanto ao primeiro:

"Efectivamente, inexiste qualquer norma que derrogue as regras gerais relativas ao ónus da prova, o que se traduz na imposição desse ónus sobre aquele que impugna a elegibilidade de um candidato, dela reclama ou recorre (neste sentido, podemos invocar o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 688/97, de 20 de Novembro, in http://www.tribunalconstitucional.pt, em que se sustentou que incumbe ao recorrente o ónus da prova da dívida e da constituição em mora em que funda a impugnação da elegibilidade do candidato, e o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 41/2005, de 26 de Janeiro, in http://www.tribunalconstitucional.pt, no qual se sustentou, ainda que a propósito de outros problemas, que, 'em todo o caso, sempre seria ao apresentante da candidatura que caberia o ónus de provar que a apresentação se realizou dentro do prazo legalmente fixado para o efeito, por aplicação dos critérios gerais de repartição do ónus da prova, já que é a ele que aproveita o facto em dúvida; não tem qualquer cabimento a invocação, neste contexto, do princípio in dubio pro reo', sendo de extrair, com relevo para a presente questão, a posição que adopta as regras gerais do ónus da prova ao nível do processo eleitoral).

[...] E, assim sendo, por um lado, as dificuldades da prova não se traduzem na inversão do ónus. Por outro lado, a nosso ver, nada obstava a que, atempadamente, o ora reclamante tivesse feito prova das dificuldades na obtenção dos elementos documentais necessários a provar os factos alegados, sugerindo a intervenção do Tribunal na aquisição dos mesmos, o que não foi feito.

Importa ainda referir que, de acordo com o artigo 514.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, 'não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral'.

É certo que o Partido Socialista - PS alega serem do domínio público os factos que, alegadamente, conduziriam à inelegibilidade dos candidatos.

Porém, temos de produzir uma interrogação: do domínio público de quem?

Tal interrogação justifica-se pelo absoluto desconhecimento por parte do Tribunal relativamente a tais factos, sendo de notar que 'um facto é notório quando o juiz o conhece como tal, colocado na posição do cidadão comum, regularmente informado, sem necessidade de recorrer a operações lógicas e cognitivas, nem a juízos presuntivos' (conforme anotação de Abílio Neto, in Código de Processo Civil Anotado, 15.ª ed., p. 705, ancorando-se na doutrina de Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, vol. III, pp. 259 e segs; Castro Mendes, in Do Conceito de Prova, pp. 711 e segs; e Vaz Serra, in 'Provas', Boletim do Ministério da Justiça, n.º 110, pp. 61 e segs.).

Encontra-se assim afastada a possibilidade de os factos invocados na reclamação se considerarem notórios e, como tal, não carecerem de prova.

Ainda que o reclamante não tenha produzido qualquer prova relevante, haverá que atender aos elementos que possam resultar dos autos.

Da declaração apresentada pelo PSD - Partido Social Democrata não resulta, antes pelo contrário, que o candidato Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio exerça funções que se traduzam na sua inelegibilidade, isto é, exerça funções de direcção na EMCEL - Empresa Municipal Celoricense - Gestão de Espaços Culturais e Sociais, E. M.

[...]

No que respeita à reclamação acerca da admissão da candidatura de Carlos Morgado Portugal, o reclamante limitou-se a reafirmar o que antes havia alegado, não aduzindo quaisquer argumentos novos, nem questionando directamente os fundamentos que estiveram na base do despacho, fundamentos que, por desnecessidade, não se repetirão, antes se relegando para o teor do despacho."

4 - No mesmo dia 2 de Setembro, o mandatário do Partido Socialista recorreu para o Tribunal Constitucional do despacho que indeferiu a reclamação, relativamente aos dois candidatos agora em causa, nos seguintes termos:

"A promiscuidade de interesses está bem reflectida nas autarquias e até já deixou há muito de ser um caso de polícia para se transformar num problema de regime.

Celorico da Beira não foge à regra, e eis que nas listas do PSD se constata a inclusão de cerca de meia centena de funcionários autárquicos, o que, diga-se em abono da verdade, ultrapassa as raias da subversão dos princípios éticos da democracia, e denota-se também aqui que se trata de uma mera novela política que em nada abona quem antes deveria pugnar pela licitude dos meios.

Ora, vejamos:

O candidato Carlos Morgado Portugal é funcionário qualificado e com funções directivas no município de Celorico da Beira, prestando uma comissão de serviço, temporário, no município de Almeida (mero alibi).

Há muito que desempenhava as funções de chefe de divisão no município de Celorico da Beira e vem ocupar tal cargo quando bem entender, dado que a comissão de serviço é apenas de carácter temporário e termina quando a ele candidato o aprouver, o que se infere que isso suceda se o mesmo for eleito presidente da Junta de Freguesia de Cortiçô da Serra, onde efectivamente reside.

Acrescenta-se que a esposa de tal candidato é também ela funcionária do município de Celorico da Beira, o que tudo bem revela a oportunidade do intróito destas alegações.

O candidato Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio não suspendeu as funções, que desempenha na EMCEL, como, aliás, fez o seu colega e também candidato Manuel Alberto Almeida Cabral.

Estão assim ambos feridos pelos normativos legais contemplados na Lei Eleitoral, e se não vejamos:

A doutrina firmada em múltiplos acórdãos nesse venerando Tribunal resulta que, tendo em conta o disposto no artigo 251.º da Constituição da República Portuguesa e nos artigos 42.º, n.º 1, e 24.º, n.º 1, primeira parte, da Lei 169/99, de 18 de Setembro, a candidatura no primeiro lugar da lista a uma assembleia de freguesia é simultaneamente uma candidatura à assembleia municipal, apesar de estarem em causa duas autarquias distintas (conforme resulta do disposto no artigo 236.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa e no artigo 10.º da lei que regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais).

Por essa razão, o candidato Carlos Morgado Portugal, com os sinais dos autos, pela função que exerce no município de Celorico da Beira se for candidato a uma assembleia de freguesia do respectivo município, no primeiro lugar da lista, fica ferido da inelegibilidade prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea d), da Lei Eleitoral.

Da mesma forma o candidato Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, pelas funções que desempenhava e desempenha na Empresa Municipal Celoricense (EMCEL), com sede na vila de Celorico da Beira e cujo capital social é detido a 100% pela Câmara Municipal de Celorico da Beira, não pode ser candidato a cabeça-de-lista de uma assembleia de freguesia do mesmo município sem que tenha suspendido as funções na data da propositura da candidatura, o que, efectivamente não sucedeu, e fica assim, também, ferido da inelegibilidade prevista no artigo 7.º, n.º 1, alínea d), da Lei Eleitoral

Assim, os candidatos:

Carlos Morgado Portugal, chefe de divisão do município de Celorico da Beira, tendo sido proposto como cabeça-de-lista do PSD, deve ser declarado inelegível para a Assembleia de Freguesia de Cortiçô da Serra [n.º 1, alínea d), do artigo 7.º da Lei Orgânica 1/2001, de 14 de Agosto]; e

Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, funcionário com funções de chefia na EMCEL, de Celorico da Beira, tendo sido proposto como cabeça-de-lista do PSD, deve ser declarado inelegível para a Assembleia de Freguesia de Açores [n.º 1, alínea d), do artigo 7.º da Lei Orgânica 1/2001, de 14 de Agosto]."

Respondeu o PPD/PSD, sustentando, quanto a Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, que o mesmo não exerce qualquer cargo directivo e, quanto a Carlos Morgado Portugal, que, tendo sido nomeado em comissão de serviço director administrativo e financeiro da Câmara de Almeida, cessou as funções de chefe de divisão para as quais tinha sido nomeado, igualmente em comissão de serviço, na Câmara Municipal de Celorico de Basto, mantendo apenas quanto a esta autarquia a categoria profissional que tem, e que é a de técnico superior de 1.ª classe. Cessando a actual comissão de serviço, para a qual foi nomeado em 2001, regressará ao exercício das funções correspondentes à categoria de técnico superior, como resulta do artigo 29.º da Lei 2/2004, de 15 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pela Lei 51/2005, de 30 de Agosto.

E juntou, com a resposta, uma declaração do presidente da Câmara de Celorico da Beira atestando que este candidato pertence ao quadro da autarquia com a categoria de técnico superior de 1.ª classe, tendo cessado as funções de chefe de divisão, em 19 de Novembro de 2001, com a nomeação em comissão de serviço já referida.

5 - O recurso foi interposto por quem tem legitimidade e de uma "decisão final relativa à apresentação de candidaturas", ou seja, de uma decisão que indeferiu a reclamação contra a admissão dos referidos candidatos apresentados pelo PPD/PSD, e foi interposto dentro do prazo (artigos 29.º, n.º 1, 31.º e 32.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais).

Assenta, em ambos os casos, na alegação de verificação da inelegibilidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei Eleitoral, rectificada pela declaração de rectificação 20-A/2001, de 17 de Outubro (Diário da República, 1.ª série-A, suplemento, de 12 de Outubro de 2001), da qual, combinada com o corpo deste n.º 1, resulta que "[n]ão são elegíveis para os órgãos das autarquias locais dos círculos eleitorais onde exercem funções ou jurisdição: [...] d) [o]s funcionários dos órgãos das autarquias locais ou dos entes por estas constituídos ou em que detenham posição maioritária que exerçam funções de direcção, salvo no caso de suspensão obrigatória de funções desde a data de entrega da lista de candidatura em que se integrem".

Como o Tribunal Constitucional já por diversas vezes observou, esta inelegibilidade - que em qualquer caso representa "uma restrição ao um direito fundamental (à participação política) e, consequentemente, uma compressão (ou limite negativo) da capacidade eleitoral passiva dos cidadãos por ela visados" (Acórdão 705/93, in Diário da República, 2.ª série, de 14 de Fevereiro de 1993) - tem "por fundamento ou justificação decisiva [...]", basicamente, a preservação da "independência do exercício dos cargos electivos autárquicos" e a garantia de que "os respectivos titulares desempenhem esses cargos com isenção e 'desinteresse', ou seja, com 'imparcialidade'" (Acórdão 515/2001, in Diário da República, 2.ª série, de 20 de Dezembro de 2001).

Tem, em consonância com tal objectivo, um âmbito de aplicação territorialmente limitado à área da autarquia na qual os candidatos se apresentam à eleição. E abrange, desde a Lei Eleitoral vigente, que neste ponto alterou o regime anterior [artigo 4.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei 701-B/76, de 29 de Setembro - "funcionários dos órgãos representativos das freguesias e dos municípios"], apenas os funcionários que tenham "funções de direcção", embora possam exercer funções quer em "órgãos das autarquias locais" quer em órgãos "dos entes por estes constituídos ou em que detenham posição maioritária".

6 - Verifica-se em ambos os casos que se tratam de candidatos que ocupam a posição de cabeça-de-lista à eleição para assembleias de freguesias do concelho de Celorico da Beira, sendo certo que é invocada como fundamento de inelegibilidade a titularidade de cargos municipais, no âmbito daquele município.

Ora, como o Tribunal Constitucional já por diversas vezes observou, e se escreveu, por exemplo no Acórdão 516/2001, o qual indica jurisprudência no mesmo sentido, (Diário da República, 2.ª série, de 20 de Dezembro de 2001), "a candidatura, no primeiro lugar da lista, a uma assembleia de freguesia é simultaneamente uma candidatura à assembleia municipal - apesar de estarem em causa duas autarquias distintas". Assim decorre do disposto nos artigos 251.º da Constituição e 42.º, n.º 1, e 24.º, n.º 1, primeira parte, da Lei 169/99, de 18 de Setembro, alterada pela Lei 5-A/2002, de 11 de Janeiro.

Daqui resulta, desde já, que estaria preenchido o âmbito territorial abrangido pela incompatibilidade em causa.

7 - Aqui chegados, importa distinguir.

Relativamente a Carlos Morgado Portugal, a alegação de inelegibilidade assenta num equívoco: o de que o candidato mantém a titularidade do cargo de chefe de divisão no município de Celorico da Beira.

É certo que o cargo de chefe de divisão municipal é expressamente qualificado por lei como um cargo de direcção [artigo 2.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei 93/2004, de 20 de Abril, que adaptou à administração local o regime definido pela Lei 2/2004, de 15 de Janeiro, entretanto alterada pela Lei 51/2005, de 30 de Agosto].

Mas é igualmente certo que, ao ser nomeado em regime de comissão de serviço para exercer as funções de director de Departamento Administrativo e Financeiro na Câmara Municipal de Almeida, cessaram as suas funções como chefe de divisão, mantendo apenas como vínculo ao município de Celorico da Beira o que corresponde ao lugar que ocupa no quadro de pessoal respectivo: técnico superior de 1.ª classe, como prova a declaração do respectivo presidente da Câmara, a fl. 5327, cargo que não é de direcção, como resulta da lista constante dos diplomas acabados de citar.

Não continuando a ser titular de um cargo dirigente no município de Celorico da Beira, nem se torna necessário ir averiguar que efeito teria uma eventual cessação da comissão de serviço no município onde actualmente presta funções, contrariamente ao que o Tribunal Constitucional se viu forçado a investigar, por exemplo, no seu Acórdão 700/97 (Diário da República, 2.ª série, de 14 de Janeiro de 1998), amplamente transcrito no despacho a fl. 5225, para o qual remeteu a decisão ora recorrida.

8 - Quanto ao candidato Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, verifica-se, como também se entendeu no despacho recorrido, que o recorrente não fez prova quanto ao exercício de funções de direcção no âmbito da Empresa Municipal Celoricense, E. M.

Com efeito, e admitindo-se como assente que o candidato é funcionário da referida empresa, e que tem a categoria de subchefe de estação, como aliás afirma o presidente do conselho de administração respectivo no documento a fl. 5289, a verdade é que não só não está demonstrada nos autos a exacta relação da empresa com o município de Celorico da Beira nem tão-pouco a que funções corresponde o lugar de subchefe de estação, funções essas que naturalmente dependerão da organização interna da empresa.

Como o Tribunal Constitucional também já afirmou, é ao recorrente que incumbe o ónus da prova dos factos constitutivos da inelegibilidade que invoca (cf. Acórdão 688/97, in Diário da República, 2.ª série, de 9 de Janeiro de 1998), como resulta das regras gerais vigentes em matéria de ónus da prova (artigo 342.º do Código Civil).

Não estando provado o desempenho de funções de chefia num ente constituído pelo município de Celorico da Beira ou no qual o mesmo município tenha posição maioritária, não pode o Tribunal concluir pela sua inelegibilidade.

Solução contrária só poderia decorrer da existência de uma presunção de inelegibilidade, presunção que nem existe nem seria conforme à natureza atrás apontada para as inelegibilidades.

9 - Nestes termos, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão de julgar elegíveis Carlos Morgado Portugal e Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio.

Lisboa, 16 de Setembro de 2005. - Maria dos Prazeres Beleza - Maria Helena Brito - Paulo Mota Pinto - Pamplona de Oliveira - Maria João Antunes - Maria Fernanda Palma - Mário Torres - Vítor Gomes - Benjamim Rodrigues - Rui Moura Ramos - Gil Galvão - Bravo Serra - Artur Maurício.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/2346977.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1976-09-29 - Decreto-Lei 701-B/76 - Ministério da Administração Interna

    Estabelece o regime eleitoral para a eleição dos órgãos das autarquias locais, nomeadamente: capacidade eleitoral, organização do processo eleitoral, campanha eleitoral, eleição, ilícito eleitoral.

  • Tem documento Em vigor 1989-09-26 - Decreto-Lei 323/89 - Ministério das Finanças

    Revê o estatuto do pessoal dirigente da função pública.

  • Tem documento Em vigor 1993-02-13 - Decreto-Lei 34/93 - Ministério das Finanças

    Altera o Decreto Lei 323/89, de 26 de Setembro que aprova o estatuto do pessoal dirigente, na parte referente ao direito a carreira.

  • Tem documento Em vigor 1994-09-22 - Decreto-Lei 239/94 - Ministério das Finanças

    ALTERA O DECRETO LEI 323/89, DE 26 DE SETEMBRO (REVÊ O ESTATUTO DO PESSOAL DIRIGENTE DA FUNÇÃO PÚBLICA). DETERMINA QUE A CRIAÇÃO DE LUGARES NECESSÁRIA À EXECUÇÃO DO DIREITO À CARREIRA CONSIGNADO NO NUMERO 2 DO ARTIGO 18 DO DECRETO LEI 323/89, DE 26 DE SETEMBRO, NA REDACÇÃO DADA PELO DECRETO LEI 34/93, DE 13 DE FEVEREIRO, PASSE A FAZER-SE POR PORTARIA DOS MINISTROS DAS FINANÇAS E DA RESPECTIVA PASTA, A PUBLICAR NA II SÉRIE DO 'DIÁRIO DA REPÚBLICA'.

  • Tem documento Em vigor 1997-05-23 - Lei 13/97 - Assembleia da República

    Revê o Estatuto do Pessoal Dirigente da Função Pública, alterando o Decreto-Lei 323/89, de 26 de Setembro. Prevê que as normas regulamentares do disposto no presente diploma, nomeadamente sobre o júri, a abertura e o funcionamento dos concursos, serão aprovadas pelo Governo mediante decreto-lei, aplicando-se-lhe subsidiariamente o regime geral de recrutamento e selecção de pessoal para os quadros da Administração Pública. Dispõe que o presente diploma apenas se aplica aos titulares dos cargos dirigentes nom (...)

  • Tem documento Em vigor 1999-09-18 - Lei 169/99 - Assembleia da República

    Estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos orgãos dos municípios e das freguesias.

  • Tem documento Em vigor 2001-08-14 - Lei Orgânica 1/2001 - Assembleia da República

    Aprova a lei que regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais. Altera o regime de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 2001-10-12 - Declaração de Rectificação 20-A/2001 - Assembleia da República

    Rectifica a Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto - lei que regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais e segunda alteração à Lei n.º 56/98, de 18 de Agosto, com a redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 23/2000, de 23 de Agosto, que altera o regime do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

  • Tem documento Em vigor 2002-01-11 - Lei 5-A/2002 - Assembleia da República

    Altera a Lei nº 169/99, de 18 de Setembro, que estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias. Republicado em anexo aquele diploma com as alterações ora introduzidas.

  • Tem documento Em vigor 2004-01-15 - Lei 2/2004 - Assembleia da República

    Aprova o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado.

  • Tem documento Em vigor 2004-04-20 - Decreto-Lei 93/2004 - Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente

    Procede à adaptação à administração local autárquica da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, que aprova o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado.

  • Tem documento Em vigor 2005-08-30 - Lei 51/2005 - Assembleia da República

    Estabelece regras para as nomeações dos altos cargos dirigentes da Administração Pública. Procede à alteração das Leis n.ºs 2/2004, (republicada em anexo com as alterações ora introduzidas), 3/2004, 4/2004, todas de 15 de Janeiro, relativas, respectivamente, ao estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado, à lei quadro dos institutos públicos, e aos princípios e normas de organização da administração directa do Estado. Altera também o Decreto-L (...)

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

O URL desta página é:

Clínica Internacional de Campo de Ourique
Pub

Outros Sites

Visite os nossos laboratórios, onde desenvolvemos pequenas aplicações que podem ser úteis:


Simulador de Parlamento


Desvalorização da Moeda