de 17 de Junho
O trabalho portuário carece, ainda hoje, de instrumentos legais que o enquadrem, em termos de permitir a delimitação de um estatuto regulador do exercício da actividade.Pelo presente diploma, cuja publicação se faz acompanhar de outras medidas legislativas que o completam, visa-se lançar as bases gerais para uma regulamentação do trabalho portuário, traçando as grandes linhas de definição do acesso de trabalhadores e empresários à actividade portuária e da intervenção das autoridades portuárias ou de organismos a criar para a supervisão e gestão do trabalho portuário, e contemplando outras matérias, como vencimentos, garantias salariais, reforma, esquemas compensatórios de licenciamento e disciplina no trabalho.
O regime jurídico que assim fica delineado e em cuja elaboração participaram as associações sindicais e patronais interessadas, constitui uma primeira abordagem normativa da problemática relativa ao trabalho portuário, tendo, por consequência, que se esperar colher da sua aplicação prática os ensinamentos necessários a futuras revisões que venham a revelar-se convenientes.
Na elaboração do presente diploma participaram os trabalhadores portuários, de harmonia com o disposto nos artigos 56.º e 58.º da Constituição.
Nestes termos:
O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º - 1 - Nos portos nacionais as actividades relativas a operações de carga e descarga de embarcações de comércio nos entrepostos e cais livres, bem como a movimentação de mercadorias nos armazéns e terraplenos interiores aos limites das áreas de domínio público marítimo, só poderão ser exercidas por trabalhadores portuários titulares de carteira profissional a ser passada em condições a definir por portaria conjunta dos Ministros do Trabalho e dos Transportes e Comunicações, após audição das associações sindicais interessadas.
2 - Serão efectuadas sem recurso aos trabalhadores referidos no número anterior, em condições especiais a definir para cada porto por portaria conjunta do Ministro dos Transportes e Comunicações e do Ministro a que respeite a tutela do sector, as seguintes operações:
a) Movimentação de sobressalentes, material de bordo, mantimentos, abastecimentos, combustíveis e lubrificantes;
b) Peagem e despeagem de cargas;
c) Cargas e descargas de embarcações locais em circunstâncias susceptíveis de serem efectuadas pela tripulação;
d) Cargas, descargas e arrumação de peixe fresco, refrigerado ou congelado, embalado ou a granel, nas instalações privativas das empresas;
e) Cargas e descargas em terminais cujas características imponham regras especiais de actuação e segurança, exigindo a utilização de pessoal especializado;
f) Cargas e descargas em estaleiros e instalações fabris dotadas de cais privativos e com condições para as efectuarem com recurso ao seu próprio pessoal.
3 - Nos portos de comércio marítimo, cujo tráfego justifique a presença de trabalhadores portuários permanentes, os contingentes de pessoal tecnicamente necessários serão fixados por despacho conjunto dos Ministros do Trabalho e dos Transportes e Comunicações.
Art. 2.º - 1 - Para o tratamento à escala nacional das questões atinentes ao trabalho portuário, será criada, como entidade coordenadora de estrutura participativa, integrando representantes dos órgãos da Administração Pública, dos sindicatos e entidades empregadoras ligadas à actividade, o Instituto do Trabalho Portuário, cuja organização, atribuições e funcionamento serão objecto de diploma específico.
2 - Nos portos em que o movimento comercial o justifique, serão criados centros coordenadores do trabalho portuário, que terão a seu cargo a organização, coordenação e racionalização dos vários aspectos da prestação do trabalho portuário, nomeadamente o registo, a identificação e o pagamento dos trabalhadores, bem como a sua distribuição, conforme as solicitações das empresas empregadoras, cobrando a estas os encargos correspondentes.
3 - Os centros coordenadores do trabalho portuário poderão criar delegações nos restantes portos.
Art. 3.º - 1 - Nos portos nacionais, o tráfego portuário poderá ser exercido por empresas ou cooperativas de trabalhadores que como tal sejam reconhecidas por despacho do Ministro dos Transportes e Comunicações, após parecer do Instituto do Trabalho Portuário.
2 - Poderão ainda efectuar operações de tráfego portuário, através de requisição de trabalhadores nas condições do n.º 1 do artigo 1.º, as empresas existentes à data da publicação deste diploma que para o efeito se inscrevam num prazo de trinta dias após a entrada em funcionamento do respectivo centro coordenador do trabalho portuário ou delegação e dêem garantia de cumprimento das disposições legais e contratuais existentes.
3 - As disposições do presente diploma não são aplicáveis às entidades empregadoras abrangidas pelo n.º 2 do artigo 1.º Art. 4.º - 1 - Os trabalhadores inscritos nos centros coordenadores do trabalho portuário terão direito a remuneração certa mensal.
2 - Nos portos em que não vigore o regime de remuneração certa mensal, os trabalhadores portuários do contingente fixado nos termos do n.º 4 do artigo 1.º beneficiarão de uma garantia salarial cujo montante e condições de pagamento serão fixados por portaria conjunta dos Ministros do Trabalho e dos Transportes e Comunicações e que será financiada através da constituição de um fundo de garantia salarial, com receitas provenientes de contribuições das entidades empregadoras, e a administrar pelo centro coordenador do trabalho portuário da respectiva área.
3 - Quando, por razões ligadas à evolução técnica ou económica de um porto, ou por se verificarem reduções sensíveis no trabalho portuário, os contingentes de trabalhadores inscritos no centro coordenadas respectivo, fixados nos termos do n.º 3 do artigo 1.º, se tornarem excessivos, determinando situações deficitárias nos centros coordenadores do trabalho portuário ou nos fundos de garantia salarial, o Fundo de Desemprego poderá facultar as verbas em falta, sem prejuízo de posterior reembolso, mediante despacho conjunto do Secretário de Estado da População e Emprego e do Secretário de Estado da Marinha Mercante.
Art. 5.º A organização do trabalho portuário será, tanto quanto possível, sujeita ao regime de trabalho por turnos, de acordo com as necessidades de cada porto e em obediência a um sistema rotativo de escalas.
Art. 6.º - 1 - Os trabalhadores inscritos nos centros coordenadores do trabalho portuário deverão aceitar e executar o trabalho que lhes for atribuído, salvo motivo reconhecido como válido, observando as normas de organização e disciplina estabelecidas nos correspondentes instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e na regulamentação interna fixada pelos centros coordenadores.
2 - O não cumprimento do disposto no número anterior sujeita o trabalhador, precedendo procedimento disciplinar, a exercer nos termos legais pelo presidente da direcção do respectivo centro coordenador, às seguintes sanções:
a) Repreensão verbal ou por escrito;
b) Multa correspondente aos vencimentos até dez dias;
c) Suspensão de prestação de trabalho com perda da retribuição de dez até sessenta dias;
d) Perda da carteira profissional e correspondentes remunerações e garantias salariais.
Art. 7.º O regime de reforma dos trabalhadores portuários, a definir por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e do Plano, dos Assuntos Sociais e dos Transportes e Comunicações, deverá ter em consideração as especiais condições de prestação de trabalho no sector e visará o progressivo abaixamento da idade da reforma.
Art. 8.º Nos portos dotados de centros coordenadores do trabalho portuário em que os efectivos de pessoal se revelarem superiores aos contingentes fixados nos termos do n.º 4 do artigo 1.º, poderá ser estabelecido um esquema de licenciamento dos trabalhadores portuários em excesso, comportando, independentemente do direito à reforma, indemnizações ou compensações, cujo montante e atribuição serão fixados nas correspondentes convenções colectivas de trabalho ou, na impossibilidade de acordo entre as partes, por portaria conjunta dos Ministros do Trabalho e dos Transportes e Comunicações.
Art. 9.º - 1 - Nos portos dotados com centros coordenadores do trabalho portuário ou em que os trabalhadores beneficiem de remuneração certa mensal, a suspensão do direito à retribuição, prevista no n.º 1 do artigo 7.º da Lei 65/77, de 26 de Agosto, será efectivada por despacho conjunto dos Ministros do Trabalho e dos Transportes e Comunicações.
2 - Nos portos em que não vigore o regime de remuneração certa mensal, poderá ser suspenso o direito ao pagamento das garantias salariais, nos termos e condições previstas no número anterior.
Art. 10.º - 1 - O acesso à profissão de trabalhador portuário só poderá efectuar-se quando os candidatos não tenham sido condenados a penas de prisão superiores ou iguais a dois anos, por sentença judicial transitada em julgado, pelos crimes de furto, roubo, ofensas corporais voluntárias ou homicídio.
2 - A condenação nos termos do número anterior de trabalhadores portuários que já exerçam a profissão implicará a perda da carteira profissional e das correspondentes remunerações e garantias salariais.
3 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, as sentenças condenatórias, transitadas em julgado, serão comunicadas pelos tribunais aos centros coordenadores do trabalho portuário ou, quando não existam, às administrações portuárias da área onde se verificou o crime.
Art. 11.º - 1 - As entidades que empregarem trabalhadores portuários com carácter de continuidade deverão firmar contrato individual de trabalho, a depositar no centro coordenador do trabalho portuário, devendo a rescisão ser comunicada logo que ela se verifique.
2 - Independentemente das disposições previstas nos artigos anteriores, considera-se que a atribuição e prestação de serviços resulta de acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Mário Soares - Vítor Manuel Ribeiro Constâncio - António Manuel Maldonado Gonelha - Manuel Branco Ferreira Lima.
Promulgado em 14 de Junho de 1978.
Publique-se.O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES.