de 10 de Fevereiro
No quadro das responsabilidades que Portugal tem assumido relativamente a Timor Leste, assente na solidariedade decorrente de mais de quatro séculos de história partilhada e no papel que internacionalmente sempre lhe foi reconhecido, cabe ao Governo Português criar as condições e os mecanismos que incentivem e reforcem a cooperação com o povo de Timor Leste.Com este objectivo e integrando-se no programa de assistência e cooperação já aprovado, que visa a consolidação da paz, da ordem e da tranquilidade naquele território e a reestruturação dos sectores básicos da sociedade timorense, dando resposta aos problemas quotidianos com que o povo de Timor Leste se defronta, o presente diploma institui uma licença especial que possibilita o exercício de funções públicas ou de interesse público em Timor por trabalhadores do sector público ou do sector privado no activo ou aposentados e reformados.
A licença especial ora instituída tem semelhanças com a licença definida no Decreto-Lei 89-G/98, de 13 de Abril, para o exercício de funções no território de Macau, licença esta cujo regime seguia de perto o estabelecido para a licença sem vencimento para o exercício de funções em organismos internacionais, constante hoje dos artigos 89.º a 92.º do Decreto-Lei 100/99, de 31 de Março, mas vai para além dela, atentas as particulares condições de exercício de funções no território de Timor, por um lado, e a sua aplicação aos trabalhadores do sector privado, por outro, já que este sector, por certo, será fonte de potenciais candidatos com perfil e qualificações adequadas ao exercício de funções em áreas chave de economia do território.
Foram ouvidos os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas, a Associação Nacional de Municípios e a Associação Nacional de Freguesias.
Foram cumpridas as disposições relativas à negociação colectiva, nos termos da Lei 23/98, de 26 de Maio.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta, para valer como lei geral da República, o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
O presente diploma institui uma licença especial que visa possibilitar o exercício de funções públicas ou de interesse público em Timor Leste, no quadro das responsabilidades que Portugal assumiu na assistência àquele território.
Artigo 2.º
Âmbito pessoal
1 - O regime estabelecido no presente diploma aplica-se aos trabalhadores sujeitos a um regime de trabalho subordinado, do sector público ou do sector privado.2 - As disposições do presente diploma são também aplicáveis às forças de segurança com as adaptações decorrentes dos seus estatutos especiais.
3 - Aos militares das Forças Armadas, independentemente da situação em que se encontrem, aplicam-se as regras constantes do respectivo estatuto e demais legislação especial, sem prejuízo da aplicação de disposições mais favoráveis previstas no presente diploma.
4 - São ainda aplicáveis as disposições do presente diploma, com as necessárias adaptações, aos aposentados e reformados, bem como às forças de segurança na situação de reserva, salvaguardando quanto aos aposentados e reformados por invalidez a exigência do exercício de actividade diversa daquela pela qual foi reconhecida a respectiva incapacidade.
5 - A concessão da licença especial, prevista no presente diploma, aos trabalhadores das empresas públicas e das empresas privadas será, obrigatoriamente, precedida da requisição às respectivas entidades patronais, a efectuar pelo serviço competente do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Artigo 3.º
Âmbito institucional
1 - O presente diploma é aplicável aos serviços da administração pública central, local e regional autónoma, incluindo os institutos públicos na modalidade de serviços personalizados, fundos públicos e estabelecimentos públicos.2 - O presidente diploma é, ainda, aplicável às empresas públicas e às empresas privadas, mediante o mecanismo de requisição a que se refere o n.º 5 do artigo 2.º
Artigo 4.º
Duração da licença
A licença especial pode ser concedida aos trabalhadores que a requeiram por períodos de duração não superior a dois anos, renováveis, até ao limite de três renovações.
Artigo 5.º
Concessão da licença
1 - A licença é concedida por despacho do Ministro dos Negócios Estrangeiros, mediante requerimento do interessado, devidamente fundamentado.2 - No caso dos trabalhadores de empresas públicas e de empresas privadas, a concessão de licença está condicionada a prévia efectivação da requisição a que se refere o n.º 5 do artigo 2.º 3 - O requerimento deve ainda conter as seguintes indicações:
a) Nome, estado civil, residência e telefone;
b) Habilitações literárias;
c) Qualificações profissionais;
d) Vínculo laboral;
e) Serviço ou entidade onde exerce funções;
f) Tipo de funções desempenhadas e nível de responsabilidade;
g) Duração da licença.
4 - A concessão da licença depende de prévia ponderação do caso pelos serviços competentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros, tendo em conta todos os aspectos integrantes do programa de assistência e cooperação com Timor Leste e da concomitante anuência do membro do Governo que tutela o serviço de origem ou do órgão autárquico ou regional autónomo competente.
5 - Tratando-se de interessados trabalhadores da administração pública local e regional autónoma, a concessão da licença pode ficar condicionada ao não pagamento da remuneração durante o decurso da licença, devendo a sua posição ser comunicada ao Ministério dos Negócios Estrangeiros no prazo de 15 dias a contar da data da consulta que lhe tiver sido feita pelos serviços competentes deste Ministério, sob pena de se considerar tácita e incondicionalmente consentida.
6 - Tratando-se de interessados trabalhadores de empresas públicas e privadas, a concessão da licença depende da prévia anuência das respectivas entidades empregadoras à efectivação da requisição a que se refere o n.º 5 do artigo 2.º 7 - Na comunicação de anuência à requisição referida no número anterior, devem as entidades empregadoras referir a assunção, ou não, dos encargos com as remunerações durante o período da requisição.
8 - Para efeitos da ponderação a que se refere a primeira parte do n.º 4, poderão os serviços competentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros proceder às entrevistas que considerem necessárias, bem como submeter os interessados a exames médicos e psicológicos.
Artigo 6.º
Efeitos da licença
1 - A licença especial não afecta a situação jurídico-laboral em que o trabalhador se encontra e caracteriza-se especialmente por:a) Não determinar a abertura da vaga no quadro de origem, nem a alteração ou perda do vínculo laboral:
b) Não implicar a perda das remunerações que sejam objecto de desconto para o respectivo regime de segurança social;
c) Manter o direito à contagem do tempo de serviço para todos os efeitos legais, havendo lugar à efectivação dos correspondentes descontos legais com base na remuneração do lugar de origem com as alterações remuneratórias que entretanto ocorrerem;
d) Manter o direito à progressão e promoção, devendo os serviços a que pertence o trabalhador notificá-lo da abertura de concursos através do serviço competente do Ministério dos Negócios Estrangeiros;
e) Suspender a comissão de serviço dos dirigentes;
f) Manter todos os direitos inerentes ao correspondente regime de segurança social aplicável;
g) Suspender a requerimento do interessado a contagem dos prazos para apresentação de relatórios ou prestação de provas previstas nos estatutos das carreiras do pessoal docente universitário, de investigação científica e do docente do ensino superior politécnico.
2 - O pagamento das remunerações aos funcionários e agentes dos serviços da administração pública central, incluindo os institutos públicos na modalidade de serviços personalizados, fundos públicos e estabelecimentos públicos, constitui encargo dos serviços ou organismos a que pertencem.
3 - O pagamento das remunerações e das contribuições obrigatórias para regimes de protecção social dos funcionários e agentes da administração local e regional autónoma, quando não haja anuência destes quanto ao seu pagamento, constitui encargo do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
4 - O pagamento das remunerações e das contribuições para a segurança social dos trabalhadores das empresas públicas ou privadas, quando não haja anuência destas quanto ao seu pagamento, constitui encargo do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
5 - Se, no decurso da licença, o trabalhador vier a ser abrangido pelo recrutamento para a prestação do serviço militar, poderá ver o tempo de duração do exercício de funções no território de Timor Leste contado como serviço cívico de interesse nacional, para efeitos de cumprimento dos deveres de serviço militar, mediante despacho conjunto dos Ministros da Defesa Nacional e dos Negócios Estrangeiros, a requerimento do interessado.
Artigo 7.º
Direitos
1 - Os trabalhadores a quem é concedida a licença especial têm direito:a) Ao pagamento de um subsídio complementar a fixar por despacho dos Ministros dos Negócios Estrangeiros e das Finanças a pagar em Timor Leste em dólares dos Estados Unidos da América (USD);
b) A alojamento em Timor Leste ou a subsídio de renda de casa a fixar por despachos do Ministros dos Negócios Estrangeiros e das Finanças, de acordo com os preços praticados naquele território;
c) A seguro de viagens, de acidentes pessoais, incluindo acidentes de trabalho e doenças profissionais, no caso de a protecção destes riscos não estar assegurada pelo regime de segurança social em que se mantêm enquadrados;
d) Ao pagamento das despesas de transporte de ida e volta para Timor Leste e respectivas bagagens a partir do local de residência em Portugal;
e) À assistência médica, medicamentosa, cirúrgica e hospitalar ou seguro de saúde;
f) A 30 dias úteis de férias por ano;
g) Ao pagamento das despesas de viagem de férias a Portugal caso a licença seja renovada ao fim de dois anos por, pelo menos, mais um ano;
h) A um subsídio de embarque de montante a fixar por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e dos Negócios Estrangeiros, a abonar antes da deslocação para Timor.
2 - O pagamento de todas as remunerações e despesas referidas no n.º 1 constitui encargo do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Artigo 8.º
Fim e renovação da licença
1 - A licença termina no fim do prazo para que foi concedida se o interessado não requerer fundamentadamente a sua renovação até 90 dias antes do seu termo.2 - O Ministério dos Negócios Estrangeiros deve decidir, adoptando o procedimento do n.º 3 do artigo 5.º, até 60 dias antes do seu termo, depois do que, não havendo decisão, se considera que a renovação não foi autorizada.
3 - A licença pode ser dada por finda por motivos de interesse público devidamente fundamentados.
4 - O trabalhador pode requerer o fim antecipado da licença por motivos ponderosos devidamente fundamentados.
5 - Se não forem atendíveis os motivos invocados pelo trabalhador, este obriga-se a reembolsar o Estado dos pagamentos que houverem sido efectuados com a sua viagem e transporte das respectivas bagagens na proporção dos meses que faltarem para completar o período da licença.
6 - A licença é, ainda, dada por finda no caso de doença grave, natural ou de causa profissional, que impossibilite o trabalhador de exercer as suas funções por um período superior a 90 dias.
7 - Ocorrendo a morte do trabalhador em Timor Leste, é aplicável à transladação das cinzas ou do corpo o disposto no Decreto-Lei 308/83, de 1 de Julho, sendo os requerimentos aí previstos endereçados ao Ministro dos Negócios Estrangeiros e as despesas efectuadas custeadas pelos serviços competentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
8 - Haverá ainda lugar, na situação referida no número anterior, se assim for requerido, ao transporte dos bens pessoais do trabalhador para Portugal custeado pelos serviços referidos naquele número.
Artigo 9.º
Apresentação no regresso a Portugal
1 - O titular da licença, uma vez regressado a Portugal, deve apresentar-se no prazo de cinco dias úteis no serviço competente do Ministério dos Negócios Estrangeiros onde receberá guia para o serviço ou entidade a que se encontre vinculado, a fim de ir ocupar o seu lugar e exercer as correspondentes funções.2 - A guia a que se refere o número anterior especificará o dia da apresentação ao serviço ou entidade de origem, dia a partir do qual cessam as responsabilidades do Ministério dos Negócios Estrangeiros pelo pagamento dos respectivos encargos.
Artigo 10.º
Serviços processadores
1 - Os actos administrativos e procedimentais necessários à efectivação da licença especial, designadamente o pagamento de remunerações e outros abonos em Timor Leste, os seguros e as despesas de transporte, são praticados pelos serviços competentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros.2 - Os serviços competentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros devem articular com os serviços ou entidades a que os titulares da licença pertencem, com vista a resolver todas as questões que surjam no decurso da mesma.
Artigo 11.º
Legislação subsidiária
Em tudo o que não esteja expressamente previsto no presente diploma é aplicável o disposto no regime geral da função pública ou na legislação geral do trabalho consoante o regime a que se encontra sujeito o titular da licença.
Artigo 12.º
Salvaguarda de regimes especiais
O disposto no presente diploma não prejudica os direitos dos trabalhadores emergentes de disposições mais favoráveis constantes de regimes especiais.
Artigo 13.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 22 de Dezembro de 1999. - António Manuel de Oliveira Guterres - Luís Filipe Marques Amado - Júlio de Lemos de Castro Caldas - Fernando Manuel dos Santos Gomes - Joaquim Augusto Nunes Pina Moura - Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues - Alberto de Sousa Martins.
Promulgado em 31 de Janeiro de 2000.
Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 3 de Fevereiro de 2000.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.